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Intervenção fonoaudiológica com a utilização de software em casos de distúrbios dos sons da fala

Intervenção fonoaudiológica com a utilização de software em casos de distúrbios dos sons da fala

Autores:

Laura Karolainy Barcelos Sotero,
Karina Carlesso Pagliarin

ARTIGO ORIGINAL

CoDAS

versão On-line ISSN 2317-1782

CoDAS vol.30 no.6 São Paulo 2018 Epub 11-Out-2018

http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20182018008

INTRODUÇÃO

Crianças com distúrbios dos sons da fala (DSF), no âmbito fonológico, merecem atenção quando estes distúrbios permanecem na fase escolar, pois alterações no sistema fonológico podem envolver tanto a produção do som como a percepção da fala ou ainda a organização e compreensão das regras fonológicas(1). Tais regras são importantes no processo de aquisição da leitura e da escrita, uma vez que o início do processo de alfabetização é mediado principalmente pela oralidade(2,3).

Desta forma, é importante que crianças escolares e pré-escolares com DSF sejam identificadas o mais cedo possível e inseridas em programas de intervenção que estimulem não apenas a fala em si, mas a consciência fonológica, a fim de evitar futuras dificuldades no desenvolvimento da escrita(4).

A consciência fonológica é a capacidade da criança de manipular os sons da fala, sendo uma habilidade importante para o processo de alfabetização que ajudará no entendimento da relação fonema-grafema e que consiste na primeira etapa deste processo(2,4). Crianças que apresentam DSF no âmbito fonológico geralmente apresentam déficits em consciência fonológica(5).

Ademais, salienta-se a importância da consciência fonoarticulatória, parte da consciência fonológica, pois é uma habilidade que permite à criança perceber e distinguir os diferentes pontos de articulação dos sons da fala. Tal habilidade, além de auxiliar na percepção e produção, facilita a aprendizagem de um sistema de escrita alfabético(6).

Uma das formas que tem sido bastante utilizada no tratamento fonoaudiológico é o uso de softwares, que são ferramentas que, além de atrativas, são rápidas para a remediação dos déficits(7).

A maioria dos softwares comercializados atualmente para terapia de estimulação de fala e/ou linguagem utiliza como base a consciência fonológica, e pesquisas têm demonstrado o quanto eles auxiliam no processo de aprendizagem(8,9).

O computador pode ser considerado um instrumento de comunicação que promove a interatividade, viabiliza a estimulação multissensorial e proporciona diferentes oportunidades de aprendizagem, além de facilitar as trocas de experiências (8).

Até onde se sabe, apenas um software, o SINFALA, é destinado especificamente para tratamento de crianças com DSF e com estudo comprovando sua eficácia (7). Até o momento, não há estudos na literatura que utilizaram o software “Pedro: em uma noite Assustadora”, que estimula a consciência fonológica e fonoarticulatória em crianças com alterações de fala.

Hipotetiza-se que a estimulação da consciência fonológica e da fonoarticulatória auxiliam na aquisição dos sons da fala, além de contribuir no processo de alfabetização. Por este motivo, o presente artigo tem como objetivo verificar os efeitos da terapia fonoaudiológica com enfoque na consciência fonológica e fonoarticulatória nas habilidades de fala e no processo de alfabetização de crianças com DSF.

APRESENTAÇÃO DO CASO CLÍNICO

A pesquisa seguiu as recomendações éticas das resoluções 466/12 e 510/16 do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde e foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob número 1.969.101. Todos os responsáveis assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) autorizando a participação da criança na pesquisa, bem como as crianças assentiram na sua participação.

Participantes

A seleção da amostra foi por conveniência, sendo que as crianças faziam parte da lista de espera de uma clínica-escola, do sul do país. Os critérios de inclusão estabelecidos neste estudo foram: apresentar diagnóstico prévio de DSF em âmbito fonêmico (conforme triagem fonoaudiológica da lista de espera); apresentar o TCLE assinado pelos responsáveis; apresentar audição dentro dos padrões de normalidade; não apresentar dificuldades de vocabulário receptivo (avaliado por meio do instrumento Teste de Vocabulário Auditivo) (10), expressivo (avaliado por meio do Teste Infantil de Nomeação) (11) e de discriminação auditiva (avaliada a partir do Teste de Discriminação Fonológica)(11); não apresentar diagnóstico prévio de doenças motoras, cognitivas, psiquiátricas, neurológicas e/ou orgânicas (a partir dos dados coletados na anamnese); não apresentar fissura submucosa, alterações dos tecidos moles como adenoides, amígdalas, palato mole, entre outras alterações (segundo observação clínica).

A amostra inicial foi constituída por quinze sujeitos, destes, três não compareceram para início das avaliações e dois foram excluídos, pois apresentavam fatores perinatais de risco. Desta forma, deu-se início à terapia de dez sujeitos, dos quais somente sete completaram as oito sessões. Tais sujeitos apresentavam idade entre seis e sete anos, sendo um do gênero feminino e seis do masculino, e todos encontravam-se em processo de alfabetização.

Procedimentos e instrumentos

As crianças que se encaixaram nos critérios de inclusão foram submetidas às seguintes avaliações pré-intervenção:

Avaliação Fonológica da Criança – AFC(12) com o intuito de obter amostra de fala, por meio da nomeação e fala espontânea, de todos os fonemas do Português Brasileiro em todas as posições da palavra. A partir desta avaliação, foi possível confirmar o DSF e os processos realizados, bem como calcular a gravidade do distúrbio. Para a obtenção do grau, foi utilizado o percentual de Consoantes Corretas - Revisado (PCC-R)(13). A gravidade da DSF foi classificada da seguinte forma: Leve (PCC-R de 86% a 100%); Levemente-Moderado (PCC-R de 66% a 85%); Moderado-Grave (PCC-R- de 51% a 65%) e Grave (PCC-R inferior a 50%).

O Exame Articulatório tem como objetivo identificar possíveis distorções de fala. Este instrumento avalia a produção articulatória de todos os fonemas do Português Brasileiro (PB), em todas as posições da palavra, a partir da repetição de palavras eliciadas pelo terapeuta sem auxílio de pista visual.

O Instrumento de Avaliação da Consciência Fonoarticulatória - CONFIART(5) avalia a capacidade de identificação e produção dos movimentos articulatórios para um determinado som. Esta avaliação é dividida em 4 partes, sendo o escore máximo de 16 pontos. A tarefa 1 busca a identificação da imagem fonoarticulatória a partir do som. A tarefa 2 busca a produção do som a partir da imagem fonoarticulatória, ou seja, compete à criança evocar os sons. A tarefa 3 busca a identificação da imagem fonoarticulatória a partir da imagem de um objeto, ou seja, a criança deve realizar associação do primeiro som da palavra-alvo com a imagem fonoarticulatória. A tarefa 4 busca a produção da palavra a partir da imagem fonoarticulatória. Em todas as tarefas, os escores máximos são de 4 pontos. Ao analisar a avaliação, foi feita a soma das tarefas de identificação (tarefas 1 e 3), produção (tarefas 2 e 4), unidade do som (tarefas 1 e 2) e unidade da palavra (tarefas 3 e 4).

A Prova de Consciência Fonológica por Produção Oral – PCFO(11) avalia a capacidade da criança em manipular os sons da fala, expressando oralmente o resultado dessa manipulação. A prova apresenta dez subtestes com quatro itens cada: síntese e segmentação silábica, síntese e segmentação fonêmica, julgamento de rimas e aliterações, manipulação silábica e fonêmica e transposição silábica e fonêmica. Cada subteste é composto por dois itens de treino e quatro de teste. O resultado das crianças na PCFO é apresentado como escore ou frequência de acertos, sendo, o máximo possível, 40 acertos.

A Avaliação da Escrita de Palavras(14) tem como objetivo classificar a hipótese de escrita em pré-silábica (ausência da correspondência entre os elementos gráficos e sonoros), silábica (as letras são usadas para representar as sílabas), silábico-alfabética (fase de transição em que algumas letras ainda são usadas para representar sílabas enquanto outras apresentam valor fonético) e alfabética (correspondência entre letra e fonema). A avaliação é composta por quatro palavras, uma palavra monossílaba, uma dissílaba, uma trissílaba, uma polissílaba, e uma frase pertencentes ao mesmo campo semântico. As palavras e a frase escolhidas para avaliação foram as seguintes: Pão, Gato, Cavalo, Borboleta e “O gato bebe leite”.

As avaliações pré-intervenção foram realizadas uma semana antes do início da intervenção, em duas sessões de aproximadamente 30 minutos. As avaliações foram conduzidas em uma sala silenciosa e ventilada, administradas pela segunda autora desta pesquisa.

Intervenção fonoaudiológica

Após a realização das avaliações, as crianças foram submetidas à terapia fonoaudiológica individual, conduzida pela primeira autora, em uma sala silenciosa. Todas as sessões foram realizadas com a utilização do software “Pedro em uma noite assustadora”, o qual trabalha as habilidades de consciência fonológica em nível de fonema, a consciência fonoarticulatória e relação som-letra(15). O software apresenta sete níveis, sendo eles “Kamikaze”, “Roda Gigante”, “Viking 1”, “Viking 2”, “Cemitério”, “Naves” e “Montanha Russa”. Em cada sessão, foi abordado um nível do software, com objetivos diferentes, com exceção da segunda fase que necessitou ser realizada em duas sessões, por apresentar maior número de atividades. Desta forma, totalizaram-se oito sessões terapêuticas, as quais tiveram duração de 30 minutos cada, com frequência semanal.

Na primeira sessão, foi realizado o nível “Kamikaze” que tem como objetivo estimular a identificação e comparação dos fonemas iniciais (nível I) e finais (nível II) da palavra. Subdivididos em ênfase nas vogais, fricativas, plosivas, nasais e líquidas. Primeiramente, era dado somente estímulo auditivo de duas palavras, para que a criança realizasse a identificação e a comparação dos fonemas iniciais ou finais. Se necessário era acionado no software o estímulo visual, em que eram apresentadas as palavras escritas para a criança analisar. Caso a criança ainda apresentasse dificuldade de identificar o fonema-alvo, a terapeuta auxiliava com estratégia perceptivo-auditiva de prolongamento do fonema-alvo, tanto dentro da palavra como isoladamente.

Na segunda sessão, foi realizado nível “Roda Gigante” que consistia em realizar a síntese fonêmica das palavras, enfatizando as fricativas, nasais, líquidas e plosivas. A criança foi orientada a escutar os fonemas da palavra-alvo e, em seguida, identificar a figura correspondente. A atividade foi feita inicialmente sem apoio das letras para identificação da palavra. Quando necessário, era acionado no software o apoio visual das letras durante a tarefa. Após a identificação da figura correspondente, a terapeuta solicitava que a criança escrevesse a palavra.

Na terceira sessão, deu-se continuidade à atividade da “Roda Gigante”, mantendo-se a mesma estratégia da sessão anterior, porém foram enfatizadas todas as classes de fonemas, as primeiras palavras apresentavam até quatro sons e, posteriormente, cinco a sete sons.

Na quarta sessão, passou-se ao nível “Viking 1”, o qual teve como objetivo a realização da segmentação e contagem fonêmica a partir de uma imagem dada. A criança foi orientada a ver e nomear a imagem. A seguir, foi realizada a segmentação fonêmica das palavras-alvo. Se a criança não conseguisse, era acionada a segmentação automática no software. Ainda, a terapeuta estimulava a criança a realizar a conversão fonema-grafema, solicitando que a criança prestasse atenção em todos os fonemas, para transcrevê-los em uma folha e então selecionar o número de grafemas correspondente à palavra ouvida.

Na quinta sessão, foi realizado nível “Viking 2”, o qual tinha como objetivo a realização da segmentação e contagem fonêmica. Inicialmente a criança sorteava o número de fonemas e selecionava entre cinco imagens a que tivesse o mesmo número de fonemas sorteados. Após a realização da atividade, a terapeuta solicitava que a criança escrevesse em uma folha a palavra escolhida.

Na sexta sessão, foi realizado o nível do “Cemitério”, que tinha como objetivo a identificação fonêmica em palavras e sílabas complexas. A atividade consistia em identificar a posição do fonema-alvo na palavra ouvida. A criança ouvia a palavra e, em seguida, o fonema-alvo a ser localizado dentro da palavra, e então deveria escolher a posição correta do fonema solicitado.

Na sétima sessão, foi realizado o nível das “Naves”, que objetivava realizar a associação do som e da letra com a imagem fonoarticulatória. Nesta fase, a terapeuta produzia o modelo articulatório (ponto e modo) para auxiliar na identificação fonoarticulatória. Nesta mesma sessão, a terapeuta também solicitou que cada criança escrevesse o grafema correspondente quando dado o som-alvo.

Por fim, na oitava sessão, foi realizado o nível “Montanha Russa”, que objetivava realizar atividade de conversão fonema-grafema. Inicialmente a criança ouvia o fonema-alvo e deveria selecionar o grafema correspondente. A terapeuta auxiliava produzindo os fonemas-alvos junto com a criança, para que ela percebesse o som e o modo articulatório. Nesta atividade, a criança também era orientada a escrever os grafemas correspondentes aos fonemas-alvos.

Durante as sessões, foram dadas pistas visuais, táteis e auditivas, dos pontos e modos articulatórios dos fonemas, com o intuito de reforçar a estimulação da consciência fonoarticulatória.

Todas as crianças foram reavaliadas com os mesmos instrumentos utilizados na avaliação pré-intervenção duas semanas após o término das sessões, sendo as avaliações conduzidas pela segunda autora.

Análise dos dados

Realizou-se análise descritiva dos dados quantitativos e análise qualitativa do desempenho dos participantes. Ainda, foi realizada a comparação entre o escore pré e pós-intervenção das tarefas do CONFIART por meio do teste t modificado.

As Tabelas 1 e 2 apresentam, respectivamente, os resultados da Avaliação Fonológica da Criança e do Exame Articulatório de cada sujeito pré e pós-intervenção.

Tabela 1 Desempenho na Avaliação Fonológica da Criança- AFC pré e pós-intervenção de cada sujeito  

Sujeitos Grau do DSF pré-intervenção PCC-R Processos
Realizados Pré-intervenção
Grau do DSF pós-intervenção R*PCC-R Processos Realizados Pós-intervenção
S1 Leve 91% REC
Omissão de /s/ em CM
- 100% Sem alterações
S2 Leve 92% REC com fonema /r/
Omissão de /s/ em CM
- 100% Sem alterações
S3 Levemente-Moderado 77% Omissão de /r/ em CM, CF, OM
Omissão de /s/ em CM
Semivocalização de /l/ e /λ/
Semivocalização de /r/
REC
Posteriorização de /s/
Sonorização de /∫/
Leve 86% Omissão de /r/ em CM, CF, OM e OI
Semivocalização de /λ/
S4 Levemente-moderado 84% Semivocalização de /r/
REC
Posteriorização de /s/
Leve 94% Posteriorização de /s/
Sonorização de /s/
S5 Leve 94% REC
Omissão de /r/ em CM e CF
- 100% Sem Alterações
S6 Levemente-Moderado 74% REC
Omissão de /r/ em CM e CF
Leve 86% Semivogalização de /r/
S7 Levemente- Moderado 70% Semivogalização de /λ/
Dessonorização de /g/ e /z/
Posteriorização de /s/
Omissão de /r/ em CM
REC
Levemente-moderado 85% REC; Omissão de /r/ em CM e CF
Posteriorização de /s/
Semivogalização de /λ/ e /r/

Legenda: DSF= distúrbios dos sons da fala; R*= reavaliação; CM = Coda medial; CF= Coda final; OI= Onset inicial; OM= Onset medial; REC= redução de encontro consonantal

Tabela 2 Desempenho de cada sujeito no Exame Articulatório pré e pós-intervenção  

Sujeitos Pré-intervenção Pós-intervenção
S1 Sem alterações articulatórias Sem alterações articulatórias
S2 Sem alterações articulatórias Sem alterações articulatórias
S3 Sem alterações articulatórias Sem alterações articulatórias
S4 Ceceio lateral no fone /s/ Ceceio lateral no fone /s/
S5 Ceceio anterior do fone /s/ Sem alterações articulatórias
S6 Ceceio anterior do fone /s/ Ceceio anterior do fone /s/
S7 Ceceio anterior do fone /s/ Sem alterações articulatórias

A partir da análise dos dados da Tabela 1 , pode-se perceber que todos os sujeitos obtiveram melhora na fala, sendo que as três crianças com gravidade leve do DSF supriram todas as alterações. As demais crianças, apesar de ainda apresentarem alterações de fala pós-terapia, obtiveram aumento no PCC-R.

Na Tabela 2 , pode-se observar que alguns sujeitos que apresentavam ceceio adequaram o padrão articulatório. No entanto, algumas crianças mantiveram as dificuldades articulatórias encontradas na avaliação pré-intervenção. A Tabela 3 apresenta os resultados da avaliação e reavaliação da Prova de Consciência Fonológica por produção oral (PCFO).

Tabela 3 Total de acertos e desempenho em cada subteste da Prova de Consciência Fonológica por Produção Oral (PCFO), na avaliação e reavaliação de cada sujeito  

Subteste Sujeitos Total de acertos na avaliação Desempenho Total de acertos na Reavaliação Desempenho
Síntese Silábica/4 S1 4 Médio 4 Médio
S2 4 Médio 4 Médio
S3 4 Médio 4 Médio
S4 4 Médio 4 Médio
S5 4 Médio 4 Médio
S6 4 Médio 4 Médio
S7 4 Médio 4 Médio
Síntese Fonêmica/4 S1 1 Médio 1 Médio
S2 0 Baixo 0 Baixo
S3 0 Baixo 0 Baixo
S4 1 Médio 2 Médio
S5 0 Baixo 2 Médio
S6 0 Baixo 2 Médio
S7 0 Baixo 0 Baixo
Rima/4 S1 2 Médio 2 Médio
S2 2 Médio 3 Médio
S3 1 Baixo 1 Baixo
S4 2 Médio 4 Alta
S5 3 Médio 4 Alta
S6 3 Médio 3 Médio
S7 0 Baixo 2 Médio
Aliteração/4 S1 1 Baixo 1 Baixo
S2 2 Médio 2 Médio
S3 0 Baixo 1 Baixo
S4 2 Médio 2 Médio
S5 3 Médio 2 Médio
S6 1 Baixo 0 Baixo
S7 0 Baixo 0 Baixo
Segmentação
Silábica/4
S1 4 Médio 4 Médio
S2 4 Médio 4 Médio
S3 0 Baixo 3 Médio
S4 4 Médio 4 Médio
S5 4 Médio 4 Médio
S6 4 Médio 4 Médio
S7 4 Médio 4 Médio
Segmentação Fonêmica/4 S1 0 Baixo 2 Médio
S2 0 Baixo 0 Baixo
S3 0 Baixo 0 Baixo
S4 1 Médio 0 Baixo
S5 0 Baixo 0 Baixo
S6 0 Baixo 0 Baixo
S7 0 Baixo 0 Baixo
Manipulação
Silábica/4
S1 0 Baixo 0 Baixo
S2 0 Baixo 1 Médio
S3 0 Baixo 1 Médio
S4 3 Alto 3 Alto
S5 2 Médio 3 Alto
S6 1 Baixo 0 Baixo
S7 0 Baixo 1 Médio
Manipulação Fonêmica/4 S1 0 Baixo 0 Baixo
S2 0 Baixo 0 Baixo
S3 0 Baixo 0 Baixo
S4 0 Baixo 2 Alto
S5 1 Médio 2 Médio
S6 0 Baixo 2 Médio
S7 0 Baixo 0 Baixo
Transposição
Silábica/4
S1 0 Baixo 0 Baixo
S2 0 Baixo 0 Baixo
S3 0 Baixo 0 Baixo
S4 4 Alto 3 Alto
S5 4 Alto 1 Médio
S6 0 Baixo 0 Baixo
S7 0 Baixo 0 Baixo
Transposição
Fonêmica/4
S1 0 Baixo 0 Baixo
S2 0 Baixo 0 Baixo
S3 0 Baixo 0 Baixo
S4 0 Baixo 0 Baixo
S5 0 Baixo 0 Baixo
S6 0 Baixo 0 Baixo
S7 0 Baixo 0 Baixo
Total de acertos/40 S1 12 Médio 14 Médio
S2 12 Médio 14 Médio
S3 05 Baixo 10 Baixo
S4 21 Médio 24 Médio
S5 21 Médio 22 Médio
S6 13 Médio 15 Médio
S7 08 Baixo 11 Baixo

Conforme observado na Tabela 3 , nas tarefas de síntese silábica, aliteração, segmentação silábica e fonêmica, transposição silábica e fonêmica, os sujeitos após a terapia mantiveram o desempenho apresentado na avaliação inicial, estando ou não adequado. Pode-se observar ainda melhora principalmente nas tarefas de Síntese Fonêmica, Rima, Manipulação Silábica e Manipulação Fonêmica. Na tarefa de manipulação silábica, apenas dois sujeitos (S1 e S6) não obtiveram desempenho adequado pós-terapia. Já, na segmentação fonêmica, apenas o S1 apresentou desempenho dentro do esperado para sua idade na reavaliação. Em relação ao valor total da avaliação, pode-se perceber que os sujeitos permaneceram no mesmo nível de desempenho, porém, a partir dos escores brutos de acertos, pode-se perceber melhora. A Tabela 4 apresenta os resultados do CONFIART de cada sujeito pré e pós-intervenção.

Tabela 4 Desempenho de cada sujeito em cada tarefa do Instrumento de Avaliação da Consciência Fonoarticulatória pré e pós-intervenção  

Sujeitos Tarefas Pré-intervenção Pós-intervenção p*
Pontuação por tarefa Pontuação Total Desempenho Pontuação por tarefa Pontuação Total Desempenho
S1 Identificação (1 e 3) 4/8 4/16 Baixo 8/8 11/16 Médio ≤ 0,001
Produção (2 e 4) 0/8 3/8
Unidade do Som (1 e 2) 3/8 6/8
Unidade da Palavra (3 e 4) 1/8 5/8
S2 Identificação (1 e 3) 8/8 9/16 Baixo 8/8 12/16 Médio ≤ 0,01
Produção (2 e 4) 1/8 4/8
Unidade do Som (1 e 2) 5/8 7/8
Unidade da Palavra (3 e 4) 4/8 5/8
S3 Identificação (1 e 3) 7/8 8/16 Baixo 6/8 10/16 Médio 0,07
Produção (2 e 4) 1/8 4/8
Unidade do Som (1 e 2) 5/8 5/8
Unidade da Palavra (3 e 4) 3/8 5/8
S4 Identificação (1 e 3) 6/8 8/16 Baixo 7/8 12/16 Médio ≤ 0,01
Produção (2 e 4) 2/8 5/8
Unidade do Som (1 e 2) 6/8 7/8
Unidade da Palavra (3 e 4) 2/8 5/8
S5 Identificação (1 e 3) 5/8 9/16 Baixo 8/8 12/16 Médio ≤ 0,01
Produção (2 e 4) 4/8 4/8
Unidade do Som (1 e 2) 5/8 6/8
Unidade da Palavra (3 e 4) 3/8 6/8
S6 Identificação (1 e 3) 2/8 3/16 Baixo 4/8 8/16 Baixo ≤ 0,001
Produção (2 e 4) 1/8 4/8
Unidade do Som (1 e 2) 2/8 4/8
Unidade da Palavra (3 e 4) 1/8 4/8
S7 Identificação (1 e 3) 1/8 4/16 Baixo 7/8 11/16 Médio ≤ 0,001
Produção (2 e 4) 3/8 4/8
Unidade do Som (1 e 2) 3/8 7/8
Unidade da Palavra (3 e 4) 1/8 4/8

Legenda: * = valor de p referente ao Teste t modificado em relação à Pontuação Total

A partir da Tabela 4 , é possível verificar que a maioria dos sujeitos na reavaliação pós-terapia modificaram seu desempenho de baixo para médio, ou seja, tiveram melhoras nas habilidades de consciência fonoarticulatória. Na análise das diferenças pré e pós-intervenção, seis dos sete participantes apresentaram desempenho significativamente superior ao término da terapia. A Tabela 5 apresenta os resultados de cada sujeito pré e pós-intervenção na Avaliação de Escrita de Palavras.

Tabela 5 Desempenho de cada sujeito pré e pós-intervenção na Avaliação da Escrita de Palavras  

Avaliação Sujeitos Hipótese de Escrita
Pré-intervenção Pós-intervenção
Avaliação da Escrita de Palavras S1 Silábica Silábico-alfabética
S2 Pré-silábica Silábica
S3 Pré-silábica Pré-silábica
S4 Silábica Alfabética
S5 Silábica Alfabética
S6 Silábica Alfabética
S7 Pré-silábica Silábico

Na Tabela 5 , pode-se observar que seis sujeitos evoluíram na hipótese de escrita de pré-silábica para silábica, de silábica para silábica alfabética e/ou alfabética. Porém, apenas um sujeito não apresentou melhora na hipótese de escrita permanecendo no nível pré-silábico.

DISCUSSÃO

Os resultados desta pesquisa confirmaram a hipótese inicial, pois a maioria das crianças que participaram deste estudo além da melhora nas habilidades de consciência fonológica e de consciência fonoarticulatória apresentaram evolução na hipótese de escrita e mudança nos padrões de fala a partir da terapia abordada.

Destaca-se que todos os sujeitos obtiveram aumento do PCC-R, sendo que apenas um sujeito manteve o nível de gravidade do desvio fonológico pós-intervenção ( Tabela 1 ). Além disso, pode-se perceber melhora das alterações articulatórias ( Tabela 2 ). Por este motivo, deve-se pensar que o trabalho realizado com enfoque em consciência fonológica e fonoarticulatória foi efetivo para a adequação dos padrões de fala.

Estudos anteriores que enfocaram as habilidades de consciência fonológica no tratamento de crianças com DSF obtiveram resultados semelhantes ao desta pesquisa (1,5). No entanto, a abordagem a partir de software aliando as habilidades de consciência fonoarticulatória e consciência fonológica não haviam sido estudadas até o momento.

A consciência fonológica e a fonoarticulatória dentro da terapia fonoaudiológica de fala tem o papel de trazer para a criança não só a consciência dos fonemas, mas também a ideia de que todos os fonemas apresentam uma imagem motora (6). Esta associação foi primordial para o entendimento dos sujeitos sobre o seu próprio DSF e para manipulação dos fonemas tanto nos aspectos orais como de escrita.

Outro fator importante para o sucesso das habilidades estimuladas a partir do software foi a intervenção do mediador (terapeuta), sendo este capaz de perceber a necessidade de inserir na sessão estratégias visuais, táteis e auditivas, bem como reforço do ponto e modo articulatório a fim de complementar os estímulos abordados pelo software(8). Apesar de o software ser autoexplicativo e ter atividades que abordam as habilidades de consciência fonológica e fonoarticulatória, é de suma importância que ele seja aplicado com a supervisão de um mediador que tenha conhecimento sobre as habilidades metafonológicas trabalhadas, evitando assim que as crianças façam as atividades sem pensar nas habilidades. Ademais, é importante salientar que em apenas oito sessões de terapia já foi possível observar resultados positivos.

Em relação aos resultados obtidos referentes às habilidades de consciência fonológica ( Tabela 3 ), pode-se perceber desempenho dentro do esperado para a idade de todos os sujeitos nas habilidades de síntese silábica e segmentação silábica, mesmo que estas habilidades não tenham sido diretamente trabalhadas a partir do software, pois, como detalhado anteriormente, este enfatiza habilidades de consciência fonológica no nível de fonema(15). As habilidades de síntese e segmentação silábica são apontadas pela literatura como aquelas de maior facilidade para a criança, pois a sílaba constitui uma unidade fonológica mais natural(4). Achados do presente estudo comprovam a importância da estimulação da consciência fonológica em nível fonêmico na aquisição da linguagem escrita(4) ( Tabela 4 ).

Sendo a consciência fonoarticulatória sub-habilidade da consciência fonológica, esta influencia tanto a percepção e produção dos sons da fala, bem como auxilia na aquisição da escrita alfabética (6). Este fato vai ao encontro dos achados deste estudo, pois, ao comparar as habilidades de consciência fonológica e consciência fonoarticulatória com a hipótese de escrita de crianças com DSF, pode-se observar melhora nos resultados da maioria dos sujeitos desta pesquisa em ambas as habilidades trabalhadas.

A evolução da hipótese de escrita na maioria dos sujeitos deste estudo está de acordo com as informações encontradas na literatura ( Tabela 5 ). Pois, os estudos que procuraram estimular as habilidades de consciência fonológica mostraram a influência do trabalho destas habilidades na aquisição da escrita alfabética(4,5).

Apenas um sujeito permaneceu na hipótese pré-silábica após intervenção ( Tabela 5 ). Pode-se verificar, a partir dos resultados obtidos na prova de Consciência fonológica, que este sujeito (S3) ainda não realiza as tarefas em nível fonológico e também apresentou menor escore total da avaliação supracitada ( Tabela 3 ). Tal fato, está diretamente relacionado à aquisição da linguagem escrita(4).

Apesar de este estudo trazer resultados interessantes, apresenta algumas limitações importantes, principalmente em relação ao tamanho da amostra, o que impossibilitou a realização de análises estatísticas mais detalhadas. Por esse motivo, recomenda-se que sejam feitos estudos futuros com amostra maior e a realização de estudos randomizados.

COMENTÁRIOS FINAIS

De acordo com os resultados encontrados nesta pesquisa, pode-se constatar que o trabalho da consciência fonológica, da consciência fonoarticulatória por meio do software “Pedro em uma noite assustadora”, durante oito sessões, colaborou para a organização dos padrões de fala e aquisição da linguagem escrita da maioria dos sujeitos.

Salienta-se a necessidade de introduzir nas terapias fonoaudiológicas estas habilidades, visto que trouxeram benefícios às crianças estimuladas, mesmo sendo por um período curto de terapia.

REFERÊNCIAS

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