versão On-line ISSN 2317-6431
Audiol., Commun. Res. vol.19 no.1 São Paulo jan./mar. 2014
http://dx.doi.org/10.1590/S2317-64312014000100016
O aleitamento materno traz inúmeros benefícios, tanto para o bebê como para a genitora ( 1 ) . Especificamente com relação à Fonoaudiologia ( 2 ) , a amamentação propicia o bom desenvolvimento das funções estomatognáticas do recém-nascido (RN), uma vez que, ao sugar o peito, estabelece um estímulo adequado aos músculos orofaciais ( 2 , 3 ) .
O desenvolvimento de estratégias que promovam o aleitamento materno é extremamente importante, tanto para garantir a sobrevivência da espécie humana, favorecendo a imunidade, a digestão e a absorção de nutrientes ( 4 ) , quanto pelo fato de a amamentação ser considerada, em vários contextos culturais e sociais, como um ato de amor. Autores ( 5 ) referem que o ato de amamentar promove maior interação da díade mãe-bebê, ampliando laços afetivos.
O nascimento de um bebê de risco (baixo peso e/ou prematuro) pode acarretar inúmeras dificuldades de adaptação à vida extrauterina, dada a imaturidade das funções respiratória, circulatória e gastrointestinal. Antes da década de 60, era raro o recém-nascido prematuro (RNPT) de muito baixo peso (MBP) sobreviver. Entretanto, com o avanço tecnológico e os recursos da medicina, a sobrevivência dessa população tem aumentado consideravelmente ( 5 - 7 ) .
Sobre os critérios de risco, o Ministério da Saúde ( 8 ) classifica como baixo peso os RNs nascidos com menos de 2500 g; como muito baixo peso, aqueles que nascem com peso inferior a 1500 g e como extremo baixo peso, os RNs com peso ao nascimento menor que 1000 g. Em relação à prematuridade, a literatura ( 9 ) considera como recém-nascido a termo todo RN com idade gestacional entre 37 e 41 semanas; como pré-termo, os casos em que o bebê nasce com menos de 37 semanas completas ( 10 ) ; como pós-termo, aqueles com IG superior ou igual a 42 semanas ( 9 ) ; como limítrofes, quando sua IG está entre 35 e 37 semanas; como moderados, aqueles com IG entre 31 e 34 semanas e como extremos, entre 24 e 30 semanas de IG ( 11 ) .
Da nona semana de gestação até o nascimento (período de desenvolvimento fetal) ( 12 , 13 ) , vários comportamentos estão sendo desenvolvidos. Movimentos de deglutição iniciam-se, aproximadamente, na 11ª semana e, em seguida, reflexos orais e movimentos labiais. Princípios de sucção ocorrem entre a 17ª e a 24ª semana, porém, sem coordenação entre essas funções. É aproximadamente entre a 25ª e 27ª semana que ocorre a presença de movimentos respiratórios ( 13 ) . Vários autores ( 14 - 17 ) referem que somente na 34ªou 35ª semana, a sucção estará coordenada globalmente com a deglutição e com a respiração. Porém, alguns estudos ( 18 , 19 ) propõem que o RNPT clinicamente estável, com prontidão para mamada, possa iniciar estimulações orais “treino de sucção” com acompanhamento do fonoaudiólogo e alimentação por via oral mais precocemente.
Dificuldades para estabelecer o momento adequado para iniciar a alimentação no seio materno podem ocorrer entre os profissionais da saúde e já houve época em que apenas a idade gestacional e o peso eram utilizados como indicadores para o início da alimentação por via oral. Todavia, a prontidão e o sucesso da alimentação oral dependem, não somente da idade gestacional e do peso, mas de outras variáveis, como estabilidade fisiológica e clínica, tônus muscular, ganho ponderal, experiência de sucção prévia, habilidades motoras orais, presença de reflexo de busca durante o contato pele a pele, coordenação entre as funções de sucção/deglutição/respiração (S/D/R), organização comportamental do bebê, controle do ambiente e da postura e coordenação para ingerir o volume de dieta prescrito ( 4 , 20 , 21 ) .
No Brasil, as afecções perinatais que, a princípio, contribuem para a mortalidade e a morbidade neonatais e perinatais, são problemas muito comuns em RNPTs e de baixo peso ( 22 ) . Tendo em vista a imaturidade e as dificuldades apresentadas pelo RNPT, faz-se necessário um acompanhamento diferenciado que garanta a sobrevivência e a qualidade de vida dos recém-nascidos de risco.
Em relação à alimentação, ainda que a oferta de dieta por via oral (VO), especialmente no seio materno, seja a ideal e desejada ( 1 ) , a utilização de vias alternativas, como a sonda gástrica, é, em alguns casos, a única forma de garantir a sobrevivência do RNPT ( 1 , 22 ) , embora o uso prolongado seja considerado por alguns autores ( 19 - 23 ) como prejudicial para o desenvolvimento da coordenação S/R/D.
Em sintonia com a “Norma de Atenção Humanizada ao Recém-nascido de Baixo Peso” do Ministério da Saúde ( 22 ) e conforme Portaria nº 930, de 10 de Maio de 2012, o fonoaudiólogo é profissional capacitado ( 24 ) e deve ser inserido nas unidades neonatais e no Método Canguru, integrado à equipe interdisciplinar.
O fonoaudiólogo pode atuar na promoção da prática do aleitamento materno precoce, promover e estimular, de modo seguro, a alimentação oral, auxiliar na transição do uso da sonda para seio materno, contribuindo para a melhora da qualidade de vida desses RNs, visto que tais ações podem favorecer a diminuição do tempo de internação, permitindo a alta hospitalar mais precocemente ( 24 ) .
O Método Canguru é uma assistência neonatal voltada para o atendimento do recém-nascido prematuro, que consiste em colocar o bebê em contato pele a pele com a genitora ( 22 ) . A ideia do método é o posicionamento do RN junto ao peito da mãe contato esse que proporcionará maior estabilidade térmica, além de substituir as incubadoras, permitir a alta precoce, diminuir a taxa de infecção hospitalar e, consequentemente, melhorar a qualidade da assistência com menor custo para o sistema de saúde.
O método é desenvolvido em três etapas ( 22 ) : a primeira inicia-se no pré-natal, identificando-se as gestantes com risco de dar à luz uma criança de baixo peso. Nessa situação, a mãe recebe orientações específicas sobre os cuidados a serem tomados com ela e com o bebê após o nascimento, caso haja a necessidade de permanência do RN na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN). Nesse período, é importante que seja iniciado o estímulo da mãe à lactação (ordenha manual). Na segunda etapa, o neonato apresenta-se clinicamente estável e com peso igual ou superior a 1250 g. É necessário que a mãe esteja orientada e segura para manejar o RN, demonstrando disponibilidade e interesse para permanecer com seu filho no alojamento conjunto, onde será realizada a posição canguru. Nessa fase, a amamentação será estimulada e a equipe interdisciplinar deverá observar e apoiar todos os procedimentos necessários para o sucesso do projeto. Por fim, a terceira etapa ocorre após a alta hospitalar, representando a fase de acompanhamento ambulatorial para a atenção ao crescimento e desenvolvimento do RN, interação família-bebê e detecção precoce de situações de risco. Preconiza-se que a terceira etapa só poderá ocorrer se a criança estiver com o peso mínimo de 1600 g, clinicamente estável e ganhando peso, preferencialmente, em aleitamento materno exclusivo.
Nesse contexto, o fonoaudiólogo pode contribuir para o acompanhamento e a efetividade da técnica da transição de sonda gástrica diretamente para seio materno (sonda-peito). A estimulação da sucção na “mama vazia”, concomitante à oferta de dieta por sonda é apontada como a técnica de sucção não nutritiva (SNN), oferecendo menos riscos para o RN, evitando que ele engasgue, enquanto não apresenta coordenação S/R/D. A partir do momento em que o RN adquire essa coordenação, o treino de deglutição é realizado em “mama parcialmente cheia”, simultaneamente à dieta ofertada por sonda. Quando é observado o efetivo ganho de peso, a quantidade de complemento é diminuída, até que o RN se alimente exclusivamente em seio materno ( 22 ) .
O objetivo geral deste estudo foi verificar a idade gestacional corrigida e o peso de recém-nascidos do Método Canguru, nas fases da técnica de transição da alimentação sonda-peito, bem como o tempo de intervenção fonoaudiológica necessário para alimentação da dieta por via oral exclusiva e a alta fonoaudiológica, uma vez que essa técnica favorece o aleitamento materno precoce e, consequentemente, promove a alta hospitalar. Como objetivo específico, buscou-se observar esses aspectos no momento do início da oferta de dieta por via oral (“mama parcialmente cheia”) e na oferta do seio materno exclusivo.
O estudo foi realizado com aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da Universidade Federal de Sergipe (UFS), sob nº CAAE - 02304812.0.0000.0058. Todos os responsáveis pelos recém-nascidos receberam informações referentes à pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Trata-se de um estudo observacional e descritivo, realizado por meio de levantamento de dados de prontuário médico e fonoaudiológico de 38 recém-nascidos, de ambos os gêneros, internados na Unidade de Cuidado Intermediário Neonatal Canguru (UCINCA), em uma maternidade pública do município de Aracaju (SE), no período de agosto de 2012 a abril de 2013.
Os sujeitos deste estudo foram divididos em dois grupos, de acordo com o Quadro 1.
Como intercorrências médicas importantes, foram considerados os casos de neuropatias, cardiopatias e/ou doenças respiratórias graves, anormalidades congênitas, síndromes e sepse e os casos que demandaram maior tempo de permanência na unidade de terapia intensiva neonatal, impossibilitando a transferência desses recém-nascidos para a unidade Canguru e a intervenção fonoaudiológica precoce.
Optou-se pela divisão em grupos, de acordo com a presença ou não de intercorrências médicas importantes, a partir do pressuposto que essa variável pudesse interferir nos resultados, em relação ao tipo e ao tempo de intervenção fonoaudiológica realizada com os recém-nascidos.
Foram excluídos do estudo os recém-nascidos que apresentaram pelo menos uma das seguintes características: nascimento a termo, pós-termo e aqueles cujos responsáveis não consentiram com sua participação na pesquisa.
A partir do consentimento da mãe ou responsável, era realizado o estudo dos prontuários médico e fonoaudiológico dos recém-nascidos, com o levantamento de alguns dados (Quadro 2), registrados em protocolo específico (Anexo 1).
Anexo 1. Protocolo de coleta de dados sobre a forma de oferta de dieta na transição da alimentação por sonda gástrica para SM em RNs do Método Canguru
No período que antecedeu a indicação/liberação da oferta do seio materno, todos os RNs inclusos no presente estudo tinham que, obrigatoriamente, ter feito uso de dieta exclusiva por sonda, sem nenhuma experiência prévia com alimentação por via oral. O início da estimulação não nutritiva se dava somente após liberação médica, verificada a estabilidade clínica, uma vez que o peso não contraindicava estimulação fonoaudiológica dentro dessa unidade Canguru. A técnica de transição da alimentação de sonda direto para seio materno (sonda-peito) está descrita a seguir (Quadro 3).
É importante ressaltar que as etapas descritas no Quadro 3 eram realizadas de maneira gradativa e sucessiva, de acordo com o horário de alimentação estabelecido pelo médico/rotina hospitalar, que ocorria, na maioria das vezes, a cada três horas. Como a equipe de fonoaudiologia não permanecia na maternidade em período integral, houve o apoio da equipe de enfermagem para a execução dos passos. O segundo passo era fundamental para que o RN treinasse a sucção no peito, ao mesmo tempo em que a dieta era oferecida através da sonda, possibilitando a sensação de saciedade enquanto sugava, mesmo não estando apto para coordenar as funções S/D/R por via oral. Considerou-se a presença de coordenação S/D/R quando observado o equilíbrio entre a eficiência alimentar e as funções de sucção, deglutição e respiração, sem sinais de estresse (tosse, engasgo, cansaço, oscilação frequência cardíaca e de saturação de O 2 ). Conforme o RN apresentava adequação das estruturas orofaciais e condições para coordenar S/D/R, a mama era esvaziada de forma apenas parcial e a dieta por sonda gástrica era administrada em menor volume, após o treino da sucção no seio materno.
Posteriormente (terceiro passo), com a melhora das condições de deglutição desses RNs, a “mama cheia” (seio materno sem ordenhar) era liberada, mediante complemento por sonda, se ainda fosse necessário, sendo o volume desse complemento reduzido gradativamente, conforme prescrição médica, ganho ponderal diário e necessidades nutricionais do RN. Quando o complemento por sonda gástrica não se fazia mais necessário, a dieta era ofertada em seio materno, à livre demanda (SMLD), de modo exclusivo (quarto passo), possibilitando a alta fonoaudiológica.
No tratamento estatístico, foi utilizado o teste não paramétrico de Mann-Whitney, para comparar os grupos G1 e G2. Esse teste é indicado quando se quer comparar dois grupos de informações com nível de mensuração numérica, amostras independentes e não se deseja assumir suposições acerca da distribuição das amostras analisadas ( 25 ) .
Também foi utilizado o coeficiente de correlação de Pearson (c) ( 25 ) para os seguintes cruzamentos de dados: peso ao nascimento com dias de vida, no momento da avaliação fonoaudiológica; peso ao nascimento com peso, durante a avaliação fonoaudiológica; idade gestacional ao nascimento com idade gestacional corrigida, durante a avaliação fonoaudiológica. Os dados foram considerados como significantes a 0,05 ou a 0,01, sendo utilizada, neste estudo, a seguinte classificação de correlação:
Se | c | < 0,40 - correlação fraca
Se 0,40 < | c | < 0,70 - correlação moderada
Se 0,70 < | c | < - 0,90 correlação boa
Se | c | > 0,90 - correlação ótima
Durante o período da coleta de dados na Unidade Canguru, foram assistidos na maternidade 96 RNPT de baixo peso, dos quais apenas 38, de ambos os gêneros, atendiam aos critérios de inclusão descritos anteriormente, sendo que 17 deles compuseram o G1 e 21, o G2.
A média de IGN do G1 foi superior à encontrada no G2. O PAVF apresentou médias semelhantes nos dois grupos. No momento da avaliação fonoaudiológica, os RNs do G1 tinham idade gestacional corrigida (IGCAVF) com média menor que a dos RNs do G2. Sobre a transição da oferta de dieta por sonda para seio materno de modo exclusivo (sonda-peito), em cada uma das etapas, o treino da sucção não nutritiva em “dedo enluvado” ou “mama vazia” (SNN DE/MV) foi realizado durante um período médio maior no G1 do que no G2 (Tabela 1).
Tabela 1 Dados sobre a idade gestacional ao nascimento, peso no momento da avaliação fonoaudiológica, idade gestacional corrigida do recém-nascido no momento da avaliação fonoaudiológica. Tempo de treino da estimulação não nutritiva em dedo enluvado ou mama vazia
Grupo |
Total | Valor de p | Resultados | |||
---|---|---|---|---|---|---|
G1 | G2 | |||||
IGN | Média | 33,18 | 32,29 | 32,69 | 0,308 | 1 = 2 |
DP | 2,01 | 1,88 | 1,96 | |||
Mínimo | 30 | 27,57 | 27,57 | |||
Máximo | 38,42 | 35,57 | 38,42 | |||
n | 17 | 21 | 38 | |||
| ||||||
PAVF (g) | Média | 1502,06 | 1520,71 | 1512,37 | 0,750 | 1 = 2 |
DP | 147,56 | 135,00 | 138,13 | |||
Mínimo | 1255 | 1310 | 1255 | |||
Máximo | 1790 | 1720 | 1790 | |||
n | 17 | 21 | 38 | |||
| ||||||
I GCAVF | Média | 34,68 | 35,43 | 35,10 | 0,136 | 1 = 2 |
DP | 1,82 | 2,32 | 2,12 | |||
Mínimo | 32,14 | 30,28 | 30,28 | |||
Máximo | 39,85 | 39,85 | 39,85 | |||
n | 17 | 21 | 38 | |||
| ||||||
SNN DE/MV (dias) | Média | 0,65 | 0,57 | 0,61 | 0,663 | 1 = 2 |
DP | 0,61 | 0,68 | 0,64 | |||
Mínimo | 0 | 0 | 0 | |||
Máximo | 2 | 2 | 2 | |||
n | 17 | 21 | 38 |
A oferta da “mama parcialmente cheia”, que corresponde ao início de oferta por via oral, foi iniciada pelo G1 com média de IGCVO inferior à do G2. Finalmente, na fase relativa à oferta do seio materno sem uso de complemento por sonda, onde a dieta VO era feita de modo exclusivo no seio materno, o G2 iniciou com média de IGCSME superior ao G1 e a média de tempo (em dias) dos recém-nascidos submetidos ao uso de sonda foi maior no G2 do que no G1, sendo que os RNs do G2 permaneceram em atendimento fonoaudiológico (ATENDF) mais dias do que os do G1 (Tabela 2).
Tabela 2 Dados sobre a idade gestacional corrigida do recém-nascido no momento do início da dieta por via oral (mama parcialmente cheia), idade gestacional corrigida do início da via oral exclusiva (seio materno), tempo que o RN esteve submetido ao uso de sondas, tempo de atendimento fonoaudiológico até a alta do recém-nascido submetido à técnica de transição da sonda para o seio materno
Grupo |
Total | Valor de p | Resultados | |||
---|---|---|---|---|---|---|
G1 | G2 | |||||
IGCVO | Média | 34,73 | 35,44 | 35,13 | 0,161 | 1 = 2 |
DP | 1,82 | 2,32 | 2,11 | |||
Mínimo | 32,14 | 30,28 | 30,28 | |||
Máximo | 39,85 | 40 | 40 | |||
n | 17 | 21 | 38 | |||
IGCSME | Média | 35,79 | 36,94 | 36,4 | 0,052 | 1 = 2 |
DP | 1,67 | 2,26 | 2,07 | |||
Mínimo | 33,57 | 31,85 | 31,85 | |||
Máximo | 40,28 | 41,14 | 41,14 | |||
n | 17 | 21 | 38 | |||
SONDA (dias) | Média | 8,18 | 9,81 | 9,08 | 0,486 | 1 = 2 |
DP | 4,45 | 6,92 | 5,92 | |||
Mínimo | 2 | 2 | 2 | |||
Máximo | 17 | 36 | 36 | |||
n | 17 | 21 | 38 | |||
ATENDF (dias) | Média | 9,35 | 12,10 | 10,85 | 0,308 | 1 = 2 |
DP | 4,34 | 8,51 | 7,02 | |||
Mínimo | 3 | 3 | 3 | |||
Máximo | 19 | 37 | 37 | |||
n | 17 | 21 | 38 |
No momento da alta fonoaudiológica, os recém-nascidos do G2 apresentaram média de IGCA superior aos do G1. O PN dos RNs do G1 foi, em geral, superior ao do G2. Os RNs do G2 apresentaram, durante a avaliação fonoaudiológica, a média de dias de vida (DVAVF) superior à do G1 (Tabela 3).
Tabela 3 Dados sobre a idade gestacional corrigida no momento da alta fonoaudiológica, peso do recém-nascido ao nascimento e dias de vida no momento da avaliação fonoaudiológica
Grupo |
Total | Valor de p | Resultados | |||
---|---|---|---|---|---|---|
G1 | G2 | |||||
IGCA | Média | 36,41 | 37,60 | 37,07 | 0,068 | 1 = 2 |
DP | 1,93 | 2,34 | 2,22 | |||
Mínimo | 34,14 | 32,14 | 32,14 | |||
Máximo | 40,42 | 41,57 | 41,57 | |||
n | 17 | 21 | 38 | |||
PN (g) | Média | 1563,53 | 1409,62 | 1478,47 | 0,033* | 1 > 2 |
DP | 275,97 | 247,63 | 268,50 | |||
Mínimo | 810 | 850 | 810 | |||
Máximo | 1910 | 1795 | 1910 | |||
n | 17 | 21 | 38 | |||
DVAVF | Média | 11,18 | 22,05 | 17,18 | <0,001* | 1 < 2 |
DP | 10,09 | 15,12 | 14,06 | |||
Mínimo | 3 | 9 | 3 | |||
Máximo | 47 | 54 | 54 | |||
n | 17 | 21 | 38 |
Foi utilizado o coeficiente de correlação de Pearson para correlacionar o PN com DVAVF, apresentando correlação entre moderada a boa com sentido inverso. Esse resultado significa que, quanto maior o peso ao nascimento, menos dias de vida no momento da avaliação fonoaudiológica. No cruzamento entre os parâmetros IGN com a IGCAVF, obteve-se correlação de fraca a moderada no sentido direto, ou seja, quanto maior a idade gestacional ao nascimento, maior a idade gestacional corrigida no momento da avaliação fonoaudiológica. É importante destacar que todas as correlações foram significantes. Os dados sobre o coeficiente de correlação de Pearson estão dispostos na Tabela 4.
Tabela 4 Correlações entre peso ao nascimento e dias de vida durante a avaliação fonoaudiológica; peso ao nascimento e peso durante a avaliação fonoaudiológica; e idade gestacional ao nascimento e idade gestacional corrigida durante a avaliação fonoaudiológica
Correlações | Coeficiente de Correlação de Pearson | |
---|---|---|
Grupo 1 | Grupo 2 | |
PN x DVAVF | -0,755** | -0,587** |
PN x PAVF | 0,783** | 0,789** |
IGN x IGCAVF | 0,688** | 0,342* |
Durante o acompanhamento do processo da técnica nos recém-nascidos, certos aspectos limitaram a anotação de alguns dados nos protocolos do estudo. Um deles foi o fato de, algumas vezes, não constar nos prontuários dos RNs a estimulação com dedo enluvado, pois o fonoaudiólogo não havia sido o primeiro profissional a realizar a intervenção. Nesses casos, o início da SNN era feito por mama vazia. Isso impossibilitou a comparação entre as técnicas (dedo enluvado e mama vazia), neste estudo. Outro aspecto limitador foi a escassez de literatura recente de alta relevância, que abordasse a técnica de transição alimentar da sonda direto para o seio materno, com intervenção fonoaudiológica, dentro da Unidade Canguru.
No presente estudo, considerando a Idade Gestacional ao Nascimento (IGN), não houve diferença significativa, quando comparados os grupos G1 e G2, não sendo possível estabelecer relação direta entre a classificação de prematuridade e a incidência de intercorrências médicas importantes (neuropatias, cardiopatias e/ou doenças respiratórias graves, anormalidades congênitas, síndromes e sepse) nessa população. Havia a expectativa que o grupo 1 apresentasse idade gestacional superior ao grupo 2, uma vez que a literatura refere que quanto maior é a IGN, menores são as intercorrências ( 26 ) , sendo que o nascimento prematuro pode causar problemas importantes, tais como as afecções respiratórias, mas isso não ocorreu.
De acordo com a caracterização da população, em relação à idade gestacional ao nascimento, foi observado que os recém-nascidos estudados não eram tão prematuros, uma vez que o critério para inserção no Programa Método Canguru diz respeito ao baixo peso e não necessariamente à prematuridade.
O fato do grupo 2 contar com bebês que necessitaram de maior tempo de internação para iniciar a avaliação fonoaudiológica, sendo superior à média do grupo 1, pode estar relacionado tanto às complicações, como infecções, síndrome do desconforto respiratório, anoxia neonatal, hemorragia peri-intraventricular, enterocolite necrosante, como à menor média de peso ao nascimento ( 27 ) , visto que os recém-nascidos do grupo 2, que nasceram com peso significativamente menor, tiveram o seu tempo de internação prolongado, até obter peso adequado, para serem transferidos à Unidade Canguru a fim de tentar-se a estimulação da alimentação.
Ainda em relação ao peso, o fato de ter sido obtida correlação de moderada a boa com sentido inverso, ou seja, quanto maior o peso ao nascimento, menos dias de vida no momento da avaliação fonoaudiológica, pode ser considerado um dado importante, pois apesar de os recém-nascidos estudados serem classificados como muito baixo peso, foi possível iniciar o acompanhamento fonoaudiológico precocemente ( 22 ) . De acordo com o Ministério da Saúde ( 22 ) , para que o RN passe para a segunda fase do Método Canguru, precisa estar com o peso mínimo de 1250 gramas, o que foi observado nessa população.
O fato de os bebês terem nascido com diferença de peso significativa entre os grupos, mas terem apresentado peso e idade gestacional corrigida semelhantes, no momento da avaliação fonoaudiológica, pode estar relacionado à circunstância de que as condições clínicas e o peso em si (pertencer ao grupo 1 ou 2) não estiveram diretamente vinculadas ao início do atendimento fonoaudiológico, porém eram critérios considerados importantes para a entrada desses bebês na Unidade Canguru da Maternidade em questão, onde iniciariam o acompanhamento na técnica de transição sonda-peito e a intervenção fonoaudiológica.
Em relação ao peso, a literatura ( 28 , 29 ) aponta uma média que varia entre 1400 a 1800 gramas, ao início da estimulação da SNN, devendo o RN apresentar-se clinicamente estável, o que concorda com o que foi encontrado no presente estudo, uma vez que a maternidade segue as diretrizes do Ministério da Saúde ( 22 ) e os RNs somente vão para Unidade Canguru quando alcançam o peso mínimo de 1250 gramas e estabilidade clínica.
O presente estudo constatou que o ganho de peso é relevante para o acompanhamento do processo de transição da técnica nos recém-nascidos de risco, sendo importante que o fonoaudiólogo esteja atento às prescrições médicas e nutricionais sobre as necessidades energéticas dessa população, visto que a maioria dos prematuros saudáveis costuma ganhar peso adequadamente, quando recebe em torno de 120 cal/kg/dia ( 22 ) , desde que não sejam submetidos a gastos energéticos excessivos durante a estimulação.
Com relação à idade gestacional, vários autores ( 28 , 29 ) sugerem que a atuação fonoaudiológica na transição da alimentação gástrica para a alimentação por via oral pode iniciar com idade gestacional corrigida compreendida entre a 32ª e a 34ª semana e, no caso da população aqui estudada, as médias de IGC, tanto do grupo 1 como do grupo 2 estavam de acordo com o indicado pela literatura. Em contrapartida, em estudo semelhante ( 19 ) , realizado com recém-nascidos prematuros não participantes do Método Canguru, observou-se média superior (35,29 semanas) à indicada pela literatura e à encontrada neste estudo, para que se desse início ao atendimento fonoaudiológico, média essa considerada tardia, uma vez que o método permite que a intervenção fonoaudiológica na transição de retirada da sonda para oferta de dieta por via oral ocorra em idade mais precoce ( 22 ) , e consequentemente, a amamentação efetiva em seio materno exclusivo. Entretanto, enquanto o peso parece ter sido uma característica importante no início da avaliação fonoaudiológica, a idade gestacional não foi parâmetro de restrição, dado esse que concorda com estudos ( 18 , 19 ) que apontam que há uma tendência de intervenção em idade precoce nos aspectos que dizem respeito à estimulação da sucção e da alimentação, já com a idade gestacional corrigida de 32 a 34 semanas, justamente coincidindo com o perfil da população aqui estudada.
Alguns autores ( 5 , 15 , 29 , 30 ) acreditam, em contrapartida, que antes de 34 semanas de idade gestacional, ainda não há coordenação S/D/R. Apesar da baixa idade gestacional ao nascimento no momento da avaliação fonoaudiológica (IGCAVF), os RNs apresentavam ganho ponderal seguro para a intervenção e média de 35,10 semanas, confirmando a literatura ( 5 , 15 , 29 , 30 ) , e já estariam com condições maturacionais adequadas para iniciar o treino de deglutição.
Estatisticamente, não houve diferença significativa para os parâmetros IGC no momento da avaliação fonoaudiológica e IGC no momento do início da dieta por VO, coincidindo com a literatura ( 12 , 14 ) , que aponta que, a partir da 34ª semana, o recém-nascido já estaria apto a coordenar os movimentos de S/R/D. Neste estudo, ambos os grupos iniciaram o treino em “mama parcialmente cheia” com idade gestacional próxima àquela que os autores afirmam como indicada.
Com relação aos dias em atendimento fonoaudiológico, não houve diferença entre os grupos, conforme demonstram os resultados. Todavia, quando os dados são entendidos clinicamente, uma média de três dias de diferença de permanência em atendimento fonoaudiológico pode ser extremamente importante, quando se trata do desenvolvimento das habilidades sensoriais e motoras do recém-nascido. A alta fonoaudiológica precoce pode favorecer a diminuição do tempo de internação hospitalar, o risco de infecção inerente a esse ambiente, influenciando, inclusive, a condição psicológica da genitora/família e contribuindo para a redução de custos da maternidade ( 5 ) .
O estudo contribuiu para esclarecer sobre a importância do atendimento fonoaudiológico precoce nas unidades neonatais, especificamente nas unidades canguru, uma vez que, quando utilizada a técnica de transição alimentar da sonda direta para o peito em recém-nascidos de risco com média de idade gestacional semelhante e mesmo tempo de intervenção fonoaudiológica, os bebês demonstram aptidão para coordenar os movimentos de sucção/respiração/deglutição, e consequentemente, a amamentação efetiva em seio materno exclusivo.
Sugere-se a realização de novos estudos utilizando a técnica de transição de alimentação da sonda para o seio materno em recém-nascidos prematuros e de baixo peso, dentro das diversas unidades neonatais, a fim de atentar para a importância da fonoaudiologia nessas unidades e, consequentemente, garantir o atendimento humanizado a esses indivíduos e seus familiares.