versão On-line ISSN 2526-8910
Cad. Bras. Ter. Ocup. vol.26 no.3 São Carlos jul./set. 2018
http://dx.doi.org/10.4322/2526-8910.ctoar0981
Brazil presents a vertiginous population growth in relation to the group of people aged 60 years or older. In this scenario, a high prevalence of chronic degenerative diseases that require care, including dementia, is identified.
Identify and analyze studies that present model, feature, and results of non-pharmacological interventions in informal caregivers of elderly people with dementia syndrome. Method: Articles were selected according to the methodology proposed by the Cochrane Handbook for Systematic Reviews in a search at the PubMed, LILACS and SciELO databases using the following descriptors: caregivers, elderly, intervention, and dementia.
Of the 1069 studies found, 38 articles were selected after application of the inclusion and exclusion criteria, and only 12 of them were included in the final analysis. Randomized studies with control group accounted for 58% (n = 07) of the analyzed articles, whereas studies classified as quasi-experimental were 42% (n = 05). It was also identified that 41.6% (n = 05) of the interventions were classified as Psycho-educational, 33.4% (n = 04) as Behavioral Cognitive Therapy actions, 16.6% (n = 02) as Psychosocial, and 8.4% (n = 01) as Mindfulness therapy.
After evaluation of the articles, it was possible to conclude that most of the studies obtained significant results and contributed to reduce some aspects such as depression, stress, and physical and emotional overload, in addition to acquiring skills and knowledge about dementia syndrome. Thus, this study evidences the importance of conducting new research in this scenario.
Keywords: Elderly; Caregivers; Dementia; Clinical Trial; State of the Art Review
O Brasil apresenta um crescimento populacional vertiginoso em relação à faixa etária de pessoas com 60 anos ou mais. Com o aumento da população idosa, crescem paralelamente as doenças crônicas não transmissíveis (CHAIMOWICZ et al., 2013), aqui, em especial, as crônicas degenerativas, que geram o aumento no número de idosos com limitações funcionais (INOUYE; PEDRAZZANI; PAVARINI, 2010).
A síndrome demencial é caracterizada pelo declínio progressivo e global das funções cognitivas (CARAMELLI; BARBOSA, 2002). As incapacidades provocadas pela doença fazem do idoso um ser dependente, podendo promover uma relação de aumento de assistência nas atividades/ocupações cotidianas do idoso e modificações no contexto diário de quem cuida (SEIMA; LENARDT, 2011).
Com a independência funcional do idoso em declínio, o cuidador assume a responsabilidade de exercer os cuidados das atividades da vida diária, que incluem os cuidados instrumentais, assim como os cuidados básicos, como higiene, medicação de rotina e alimentação (SANTOS; PAVARINI, 2011).
Logo, a tarefa do cuidar é atribuída a uma pessoa que pode ser membro ou não da família, seja profissional ou não (FUHRMANN et al., 2015). Dois terços das pessoas com demência recebem cuidados em casa, o que, muitas das vezes, é intenso e pesado (PINQUART; SORENSEN, 2006), ou seja, cuidadores destes pacientes carregam um fardo maior quando comparado aos cuidadores de pessoas com doenças crônicas (SPIJKER et al., 2009; GRATÃO et al., 2012) e podem estar expostos a adoecimento (BALLARIN et al., 2016).
Neste sentido, nota-se a necessidade de ações/intervenções que deem suporte para melhores condições de saúde ao cuidador, sendo esse cenário um meio de compartilhar saberes com o objetivo de possibilitar, ao cuidador, compreender melhor o diagnóstico (CARAMELLI; BOTTINO, 2007; GUERRA et al., 2011), criar estratégias de enfrentamento (FIALHO et al., 2012) e mobilizar o apoio das redes familiares existentes (JOLING et al., 2012).
Estudos nacionais e internacionais apontam que as intervenções direcionadas aos cuidadores apresentam resultados significativos, principalmente no alívio da sobrecarga e na redução dos sintomas depressivos (ELLIOTT; BURGIO; DECOSTER, 2010), além de retardar a institucionalização do idoso demenciado (CRUZ et al., 2015).
Contudo, no estudo de Lopes e Cachioni (2012), foram identificadas intervenções com diferentes abordagens multifacetadas, porém sem uma padronização na descrição do estudo, provocando um fator limitante para possíveis ações. Carbone et al. (2013) também apontam, em seu estudo, para as limitações atreladas à pouca evidência científica dos resultados gerados.
Neste contexto, este estudo de revisão sistemática justifica-se pela necessidade de obtenção de dados sobre o cenário das intervenções na população de cuidadores informais de idosos com síndrome demencial e tem, como objetivo principal, identificar e analisar estudos que apresentem modelo, característica e efeitos das intervenções não farmacológicas realizadas em grupo de cuidadores informais de idosos com síndrome demencial.
Trata-se de um estudo de revisão sistemática de produção científica com abordagem qualitativa. Este segue os sete passos estabelecidos para a execução de revisão sistemática segundo o Cochrane Handbook for Systematic Reviews of Interventions (HIGGINS; GREEN, 2011): Formulação da pergunta; Localização e seleção dos estudos; Avaliação crítica dos estudos; Coleta de dados; Análise e apresentação dos dados; Interpretação dos resultados, e Aperfeiçoamento e atualização.
O presente estudo foi submetido ao Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), sendo aprovado sob o Protocolo n.º 471.704/13.
O refinamento da pesquisa aconteceu por meio do acesso a computadores na Biblioteca da Universidade Federal de São Paulo. O período de busca e de inclusão dos artigos ocorreu nos meses de janeiro a março de 2016. A primeira fase aconteceu com a identificação dos estudos obtidos pela estratégia de busca inicial nas bases de dados: PubMed, Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências e Saúde (LILACS) e Scientific Electronic Library Online (SciELO). Os descritores utilizados na busca, em português, foram padronizados com a utilização do DeCS (Descritores em Ciências de Saúde): cuidadores, idosos, intervenção e demência; no MeSH (Medical Subject Headings), em inglês: caregivers, elderly, intervention and dementia.
Na segunda fase, os estudos identificados foram selecionados de acordo com os critérios de inclusão apresentados na Tabela 1, seguidos de leitura dos títulos e resumos. Na terceira fase, houve a leitura na íntegra dos estudos selecionados, permanecendo somente os que apresentaram os critérios de elegibilidade de acordo com o tema proposto.
Tabela 1 Critérios de inclusão utilizados na seleção dos estudos (Santos-SP, 2016).
Domínios | Critérios de Inclusão |
---|---|
Ano de publicação | Janeiro de 2011 a Dezembro de 2015. |
Artigos | Completos, disponíveis on-line e gratuitamente em periódicos nacionais e internacionais. |
Idioma | Português, Espanhol e Inglês. |
Intervenções | Não farmacológicas com cuidadores. |
Os critérios aplicados para eleger os artigos foram: estudos que apresentassem como objetivo principal avaliar, identificar, analisar e investigar as intervenções; apresentar a descrição da intervenção; apresentar o foco da intervenção no cuidador ou cuidador/idoso, e apresentar resultados da intervenção.
Os estudos eleitos para a revisão na íntegra foram analisados por meio de um roteiro estruturado que contemplava os seguintes critérios: autor/ano do estudo, desenho do estudo, amostra, características da intervenção e resultados. Foram identificados também os países de origem dos estudos, a formação profissional dos autores, o número de participantes, a duração e os modelos das intervenções.
O nível de evidência aplicado aos estudos eleitos teve como critério; clareza e a justificativa do estudo, desenho metodológico, descrição da coleta de dados e seus instrumentos (MEDINA; PAILAQUILÉN, 2010).
Os critérios de inclusão são abordados na Tabela 1. Os critérios de exclusão foram: 1) artigos repetidos em diferentes bases de dados; 2) revisões; 3) relato de casos e experiência; 4) estudo realizado apenas com o idoso; 5) artigos que não abordassem apenas a intervenção; e 6) artigos sem informações da amostra e resultados.
Os artigos selecionados para análise, no presente estudo, foram avaliados por dois profissionais, ambos com atuação no campo da saúde, de forma independente e cega, segundo o método Cochrane (HIGGINS; GREEN, 2011); no caso de dúvida, um terceiro avaliador decidiu. Os estudos selecionados que atenderam aos critérios de inclusão foram armazenados em um banco de dados, criado com o programa Excel do Windows. Os artigos foram organizados pelos seguintes itens: título, autor(es) e ano de publicação. Os dados foram obtidos através da análise na íntegra dos artigos selecionados, de forma descritiva.
Após a busca nas três bases de dados (Pubmed, Scielo e Lilacs), por meio dos descritores, foram identificados 1.069 artigos. Na segunda fase da busca, com a aplicação dos critérios de inclusão, foram excluídos 792 artigos, restando 241, os quais foram lidos considerando seus títulos e resumos. Após essa primeira leitura, foram aplicados os critérios de exclusão e, ao final desta segunda fase, obtivemos 38 artigos.
Foi realizada a leitura na íntegra dos 38 artigos selecionados, obtendo a inclusão de 12 artigos que responderam ao roteiro estruturado (autor/ano do estudo, desenho do estudo, amostra, características da intervenção e resultados) elaborado para o presente estudo. Assim, 26 artigos não seguiram para a análise final, pois não se enquadraram nas conformidades e critérios metodológicos propostos pelo presente estudo. A Figura 1 aponta o fluxograma de seleção dos artigos utilizados para a análise dos resultados.
Como pode ser observado na Tabela 2, identificou-se que apenas 25% (n = 03) das intervenções realizadas ocorreram na América Latina, sendo que 50% (n = 06) das intervenções ocorreram na Europa. Em relação à área de atuação profissional, a psicologia esteve presente em 75% (n = 09) dos artigos, seguida da assistência social 41,6% (n = 05), da enfermagem 33,4% (n = 4) e da terapia ocupacional e neurologista, ambas com 16,6% (n = 02) cada.
Tabela 2 Artigos analisados, entre janeiro de 2011 e dezembro de 2015, sobre intervenções em cuidadores de idosos com síndrome demencial (Santos-SP, 2016).
Autor/ Ano do estudo | Modelo de Intervenção | Desenho de Estudo | Amostra | Instrumentos | Características da Intervenção | Resultados |
---|---|---|---|---|---|---|
Blom et al. (2015) | Estudo de intervenção cognitivo comportamental. | Clínico randomizado. | N = 251 | (CES-D); (HADS-A); (SSCQ); (RMPBC); (SPPIC) | Avaliou-se a eficácia da intervenção realizada pela internet sobre demência aos cuidadores de idosos demenciados. | Identificou-se que os cuidadores do grupo experimental apresentaram redução significativa nos sintomas depressivos e de ansiedade. |
Paller et al. (2015) | Estudo de intervenção mindfulness. | Clínico quase-experimental. | N = 37 | (QOL-AD); (GDS); (PSQI); (BAI); (RBANS); (SF-36); (ADLQ); (RMPBC) | Investigou-se a intervenção focada em treinar habilidades mentais com os cuidadores e pacientes com síndrome demencial. | Os resultados encontrados mostraram que houve melhoras nas variáveis percepção da qualidade de vida e sintomas depressivos dos pacientes e seus cuidadores. |
Cove et al. (2014) | Estudo de intervenção cognitivo comportamental. | Randomizado controlado. | N = 72 | (QOL-AD); (QCPR); (MMSE); (ADAS-Cog) | Avaliar a eficácia da terapia de estimulação cognitiva e determinar qualquer adicional quando reforçada com um programa de treinamento com cuidador. | Não houve diferenças significativas entre os grupos dos pacientes e nem dos cuidadores em nenhum dos resultados avaliados. |
Kwok et al. (2014) | Estudo de intervenção cognitivo comportamental. | Controlado randomizado. | N = 36 | (BPSD); (CSE-RDB); (CSE-CUT); (NPI-Q); (RSCSE) | ||
Carbone et al. (2013) | Estudo de intervenção psicoeducacional. | Sem grupo controle. | N = 22 | (MMSE); (NPI); (BADL); (IADL); (CBI); (CSI) | Avaliaram-se os efeitos da intervenção domiciliar para idosos com a doença de Alzheimer e os níveis de estresse dos cuidadores. | Apresentou melhora significativa com a redução no nível de estresse dos cuidadores assistidos pela intervenção. |
Kwok et al. (2013 | Estudo de intervenção psicoeducacional, clínico. | Randomizado controlado. | N = 38 | (SE-OR); (SE-RDB); (SE-CUT); (GDS); (ZBI) | Investigou a eficácia de uma intervenção psicoeducacional realizada por telefone no apoio a cuidadores de idosos com demência. | Houve redução de sobrecarga e ganho na autoeficácia dos cuidadores. |
Lopes e Cachioni (2013) | Estudo de intervenção psicoeducacional. | Clinico quase-experimental. | N = 21 | (ESGV); (ESVRD); (GDS) | Investigou o impacto de uma intervenção psicoeducacional a cuidadores de idosos em relação às avaliações sobre ônus e benefícios das tarefas de cuidar. | Aumento das respostas nos domínios psicológico positivo e social positivo sobre a percepção da situação de cuidar |
Joling et al. (2012) | Estudo de intervenção psicoeducacional. | Clínico, multicêntrico e randomizado. | N = 192 | (CES-D); (HADS-A); (IADL); (MMSE); (NPI-Q) | Ofereceu técnicas de resolução de problemas e mobilização das redes familiares dos cuidadores. | A intervenção não reduziu a sobrecarga do cuidador. |
Waldorff et al. (2012) | Estudo de intervenção psicossocial. | Multicêntrico e randomizado controlado. | N = 330 | (MMSE); (EQ-VAS); (GDS); (QOL-AD); (NPI-Q); (ADSC-ADL) | Avaliou a eficácia do programa de aconselhamento e apoio psicossocial a pacientes com a doença de Alzheimer e seus cuidadores. | Não houve diferenças nos resultados após a intervenção. |
Fialho et al. (2012) | Estudo de intervenção cognitivo comportamental. | Sem grupo controle. | N = 40 | (NPI); (QOL-AD); (JCS); (ZBI); (LSS); (A-trait); (DAD); (MMSE); (STAI) | Examinou os efeitos de uma intervenção do programa de Terapia Comportamental Cognitiva em cuidadores familiares de idosos com demência. | Obteve redução no nível de ansiedade significativamente. |
Dahlrup et al. (2011) | Estudo de intervenção psicoeducacional. | Randomizado controlado. | N = 262 | (MMSE); (GBS-scale); (BS); (KATZ) | A intervenção psicossocial para cuidadores familiares foi avaliada sobre os possíveis efeitos proporcionados para a compreensão da síndrome demencial. | Os cuidadores familiares apresentaram melhor compreensão dos sintomas e comportamentos da síndrome demencial. |
Guerra et al. (2011) | Estudo de intervenção psicossocial. | Clínico randomizado controlado. | N = 58 | (ZBI); (NPI-Q); (QOL); (BPSD); (SRQ-20) | Programa de intervenção educacional para cuidadores de idosos com demência. | A intervenção contribuiu significativamente para redução na sobrecarga dos cuidadores. |
(ADAS-Cog) Alzheimer’s Disease Assessment Scale-Cognition; Instrumental; (ADLQ) Activities of Daily Living Questionnaire; (A-trait) Trait Anxiety Scale; (ADSC-ADL) Alzheimer’s Disease Cooperative Study Activities of Daily Living Scale; (BADL) Barthel index - Basal activities of daily living; (BPSD) Behavioral and Psychological Symptoms of Dementia; (BS) Berger Scale; (CBI) Caregiver Burden Inventory; (CSI) Caregiver Stress Index; (CES-D) Center for Epidemiologic Studies Depression Scale; (CSE-CUT) Caregiving Self-Efficacy - Controlling Upsetting Behaviors; (CSE-RDB) Caregiving Self-Efficacy - Responding to Disruptive Behaviors; (DAD) Disability Assessment for Dementia; (ESGV) Escala de Satisfação Geral com a Vida; (ESVRD) Escala de Satisfação com a Vida Referenciada a Domínios; (EQ-VAS) European quality of life visual analogue scale; (GDS) Global Deterioration Scale; (GBS-scale) Gorrfries brane Steen; (HADS-A) Hospital Anxiety and Depression Scales; (IADL) Instrumental Activities of Daily Living; (JCS) Jalowiec Coping Scale; (LSS) List of Stress Symptoms; (MMSE) Mini Mental State Examination; (NPI-Q) Neuropsychiatric Inventory-Questionnaire; (PSQI) Pittsburg Sleep Quality Inventory; (QoL-AD) Quality of Life Scale for Alzheimer’s Disease; (QCPR) Quality of Caregiver and Patient Relationship; (RBANS) Repeatable Battery for the Assessment of Neuropsychological Status; (RMPBC) Revised Memory Problem and Behavior Checklist; (ZBI) Zarit Burden Interview; (RSCSE) Revised Scale Careging Self Efficacy; (SF-36) Short Form Health Survey; (SSCQ) Short Sense of Competence Questionnaire; (SPPIC) Self Perceived Pressure from Informal Care Scale; (SRQ-20) Self Reporting Questionnaire; (STAI) State Trait Anxiety Inventory; (SE-OR) Self-Efficacy - Obtaining Respite; (SE-RDB) Self Efficacy - Responding Disturbing Behaviors; (SE-CUT) Self Efficacy - Controlling Upset Thoughts; (BAI) Beck Anxiety Invetory; (KATZ) Index of Independence in Activities of Daily Living; (QOL) Quality of Life; (NPI) Neuropsychiatric Inventory. Fonte: Artigos publicados no período entre janeiro de 2011 a dezembro de 2015.
Em 58,3% (n = 07) dos artigos analisados, observaram-se estudos randomizados com grupo controle, e 41,6% (n = 05) foram estudos classificados como quase-experimentais. O grupo de intervenção com maior número de participantes foi entre cuidadores e idosos (n = 330), e com menor número foi o grupo com apenas (n = 21).
Além disso, identificou-se que 41,6% (n = 05) das intervenções eram classificadas pelo modelo psicoeducacional, 33,4% (n = 04) por ações da Terapia Cognitiva Comportamental, 16,6% (n = 02) como intervenções psicossociais e 8,4% (n = 01) por terapia mindfulness.
A intervenção com maior duração foi de 12 meses e a com menor duração, de cinco semanas. Em relação aos resultados obtidos pós-intervenção, 83,3% (n = 10) alcançaram melhora estatisticamente significativa em pelo menos uma variável avaliada.
Os 12 estudos eleitos que apresentaram os critérios metodológicos adotados para essa revisão estão resumidamente descritos na Tabela 2.
No presente estudo, foi possível identificar e analisar diversos modelos e características de intervenções não farmacológicas no cenário nacional e internacional. Um número variado de nomenclaturas foi identificado nos diferentes modelos de intervenções entre os artigos selecionados; contudo, a classificação destas foi norteada segundo o modelo de intervenção descrita conforme as informações obtidas em títulos e resumos.
As intervenções psicoeducacionais, psicoterapêuticas e psicossociais foram identificadas, no presente estudo, em maior número, além das ações, como grupo de apoio, aconselhamento e reunião familiar. Esses resultados estão em concordância com estudos nacionais e internacionais (SÖRENSEN et al., 2006; LOPES; CACHIONI, 2012).
A literatura tem sido clara ao apontar que os cuidadores familiares desempenham papel central na vida de pacientes demenciados, à medida que estes cuidadores assumem essa responsabilidade da qual não lhe foi permitido escolher hora, mês, ano e lugar. Assim, destaca-se a importância das intervenções em forma de cursos ou mesmo um espaço de trocas destinado a estes cuidadores, visto que a satisfação do cuidar está diretamente relacionada à qualidade da ação que é realizada (INOUYE; PEDRAZZANI; PAVARINI, 2010).
Nesse sentindo, analisaram-se as características que permeiam as ações psicoeducacionais, modalidade identificada em maior número no presente estudo. Segundo Santos et al. (2011), esse modelo de intervenção possui modalidade de cunho educacional, que possibilita compartilhar saberes sobre a demência: os diferentes estágios da doença; os sintomas psicológicos e comportamentais; os cuidados gerais do paciente. Além disso, contribui com orientações sobre criar estratégias de enfrentamento, gerenciar questões emocionais, diminuindo sentimentos negativos (ansiedade, estresse e depressão) e pensamentos disfuncionais (SANTOS et al., 2011; LOPES; CACHIONI, 2012).
Os estudos analisados com abordagem psicoeducacional apresentaram ações, como: avaliação inicial sobre as alterações cognitivas e funcionais dos idosos, sobre o conhecimento e compressão da demência, o nível de sobrecarga do cuidador, além de identificar quais eram os membros da família inseridos no cuidado e quais problemas comportamentais estavam em evidência (GUERRA et al., 2011; CARBONE et al., 2013; KWOK et al., 2013).
Analisaram-se também determinados aspectos, como a duração, o número de participantes, o local e o país em que foram realizadas as intervenções. Carbone et al. (2013) desenvolveram as ações de modelo psicoeducacional durante o programa de assistência ao domicilio na Itália, com 22 duplas idosos/cuidadores, durante três meses, três vezes por semana; Kwok et al. (2013) realizaram a intervenção por telefone em 12 sessões, de 30 minutos cada, sendo uma vez por semana, com 42 cuidadores familiares chineses; Guerra et al. (2011) proporcionaram uma intervenção para 58 cuidadores peruanos, composta de três módulos, realizadas em cinco sessões com duração de 30 minutos cada; Lopes e Cachioni (2013) realizaram intervenção quase-experimental, sem grupo controle, composta por 15 sessões em que foram abordados cinco eixos de conhecimentos, com 21 cuidadores familiares brasileiros.
As intervenções proporcionaram aos cuidadores diversos benefícios, como gerenciamento em relação aos comportamentos problemáticos identificados e redução da sobrecarga (GUERRA et al., 2011); houve aumento da percepção na qualidade de vida dos cuidadores nos domínios psicológico positivo e social (LOPES; CACHIONI, 2013); melhora no estado emocional e redução da carga física e social dos cuidadores (CARBONE et al., 2013), e redução significativa na carga de cuidado e melhora na autoeficácia (KWOK et al., 2013).
Joling et al. (2012) ofertaram estudo randomizado com grupo controle na forma de reuniões familiares em casa e no centro de reuniões para paciente com demência, na Holanda, com o objetivo de uma ação psicoeducacional, abordando temas, como: ensinar técnicas de resolução de problemas e mobilizar as redes familiares existentes do paciente e cuidador principal, a fim de melhorar o apoio emocional e instrumental. A intervenção consistiu em duas sessões individuais e quatro reuniões familiares, que ocorriam uma vez a cada dois meses. Questões relevantes foram identificadas, como gestão de problemas de comportamento do paciente, além de lidar com sentimento de culpa e motivar a família em ajudar o cuidador a delegar tarefas. Ao final do estudo, não foram constatados efeitos preventivos em relação à saúde dos cuidadores; no entanto, alguns cuidadores familiares puderam sentir-se apoiados e satisfeitos com a intervenção.
Desse modo, é importante ressaltar que embora resultados pós-intervenção nem sempre alcancem valores estatísticos, ainda assim vale lembrar que as intervenções psicoeducacionais, em particular, têm demostrado aumentar conhecimentos e competências em relação aos cuidadores (SORENSEN et al., 2006), além de contribuir na melhora da percepção de saúde do cuidador e na redução da sobrecarga (CHIEN et al., 2011).
Os apontamentos suprarrealizados reforçam importantes ações que são compartilhadas e que possibilitam, ao cuidador, adquirir e aplicar novos conceitos e habilidades, desmitificando mitos e estereótipos, e aumentando o sentimento de autovalorização (GUERRA et al., 2011), além de proporcionar resultados positivos na redução no nível de depressão, sobrecarga, estresse e ansiedade (KWOK et al., 2013). Dessa forma, esse modelo de programa tem sido reconhecido como um suporte que atende fortemente às necessidades psicológicas e emocionais dos cuidadores (LOPES; CACHIONI, 2013).
Além do modelo psicoeducacional, a literatura aponta também como importante ferramenta de apoio aos cuidadores ações categorizadas como psicossociais. Segundo Santos et al. (2011), estas apresentam características, como incentivar o cuidador a mobilizar os familiares e amigos, conhecer e compreender sobre os serviços e recursos públicos e privados direcionados aos idosos demenciados e seus cuidadores familiares, contribuindo para a criação e/ou o fortalecimento de uma rede de apoio tanto formal quanto informal. Identifica-se também que esse modelo de intervenção pode funcionar como um alívio da sobrecarga e tensão advindas da tarefa de cuidar de um idoso com demência, além de acarretar diminuição dos sintomas neuropsiquiátricos do paciente e um adiamento de sua possível institucionalização.
Dahlrup et al. (2011) desenvolveram uma intervenção de modelo psicossocial na Suécia, com 262 cuidadores e idosos, na forma de reuniões durante cinco semanas, duas horas por semana. O programa incluiu educação geral sobre demências, consequências e prognóstico, sintomas comportamentais e formas de responder ao comportamento problemático dos pacientes, bem como informações sobre os serviços disponíveis, legislação e custos. Ao final da intervenção, observou-se melhora da compreensão da doença e redução da tensão percebida pelos cuidadores.
Segundo Signe e Elmståhl (2008), a intervenção psicossocial faz uso de mecanismos de ação cognitiva, comportamental e/ou social, com o objetivo de contribuir para o enfrentamento das questões emocionais e sociais que produzem constantes desafios.
Com a mesma proposta de intervenção psicossocial, Waldorff et al. (2012) realizaram, na Dinamarca, uma ação que contou com 330 duplas cuidadores/idosos. A intervenção ocorreu durante 12 meses, com sessões de duas horas, desenvolvendo ações que incluíam conhecimento básico sobre a doença e suas consequências, juntamente com o estabelecimento de um fórum para a troca de experiências dos pacientes e dos cuidadores, além de estratégias de enfrentamento. Porém, ao avaliar os resultados finais da intervenção para a díade cuidadores/idosos, não se identificaram diferenças entre os dois grupos nos desfechos primários e secundários.
Contudo, pode-se inferir que a falta de um modelo de intervenção padronizado − ou com características comuns − pode contribuir para a não consonância dos resultados entre os estudos, pois a realização de uma intervenção requer um embasamento científico que vise construir com o melhor modelo, no intuito de obter os melhores resultados.
Neste contexto, a ausência na descrição de informações, como o número de sessões e a duração das intervenções, foi identificada, como um fator que pode limitar a compreensão dos estudos, uma vez que a padronização da abordagem e da estrutura poderiam tornar as evidências mais precisas, de acordo com o modelo de intervenção utilizado (LOPES; CACHIONI, 2012).
Além dos modelos citados, psicoeducacional e psicossocial, analisaram-se as ações caracterizadas por psicoterapêuticas, que envolvem o desenvolvimento de terapias com cuidadores familiares de pacientes com demência, mediante a utilização de técnicas da terapia cognitivo-comportamental, modelo de habilidades utilizado para o enfretamento do estresse. Parece que o desgaste físico e psicológico do cuidador pode tornar-se ainda mais acentuado diante de crenças e pensamentos disfuncionais, que influenciam ações, emoções e comportamentos, afetando o bem-estar e acarretando aumento de tensão (SANTOS et al., 2011).
Cove et al. (2014) trabalharam com estimulação de terapia cognitiva em 72 duplas de cuidadores/idosos ingleses divididos em três grupos. As ações foram realizadas semanalmente durante 14 semanas, com duração de aproximadamente 45 minutos. A intervenção procurou proporcionar formação sobre a natureza e a lógica da estimulação da terapia cognitiva, e assim introduzir habilidades essenciais em torno da interação entre o cuidador e a pessoa cuidada, possibilitando que cuidadores se sentissem fortalecidos para exercer as orientações da estimulação da terapia cognitiva; contudo, ao final da intervenção, não identificaram diferença entre os grupos.
A intervenção realizada, no Brasil, por Fialho et al. (2012), baseada na Terapia Cognitiva Comportamental (TCC), desenvolveu especificamente o Treinamento de Habilidades Sociais (TSS) seguindo o aporte teórico de Goldsmith e McFall, sendo que, com o desenvolvimento de competências em situações críticas proporcionadas pelo cenário no qual os cuidadores estão inseridos, possibilitaria adquirir novas ferramentas de enfrentamento. O modelo também apresentou um componente voltado para o treinamento de técnicas comportamentais específicas, tais como relaxamento, incentivo à realização de atividades prazerosas e manejo dos sintomas neuropsiquiátricos do paciente. Ao final do programa, houve diminuição dos sintomas neuropsiquiátricos nos pacientes e no nível de ansiedade dos cuidadores (FIALHO et al., 2012).
Kwok et al. (2014) realizaram intervenção em Hong Kong de forma on-line com 36 cuidadores familiares, durante nove semanas, com base no modelo da terapia cognitiva comportamental. O programa ofereceu o suporte on-line individualizado aos cuidadores, objetivando ajudar a modificar pensamentos mal adaptados e assim possibilitar a motivação para uma atitude mais positiva em relação às tarefas de cuidado; ao final, identificou-se redução dos sintomas psicológicos e comportamentais dos pacientes com demência, assim como do estresse do cuidador.
Com a mesma proposta de utilizar a internet como ferramenta, Blom et al. (2015) realizaram, na Holanda, intervenção on-line, composta por oito aulas com material de texto e vídeos para 251 cuidadores. As temáticas trabalhadas nas aulas foram resolução de problemas comportamentais, técnicas de relaxamento e restruturação cognitiva. Os resultados apresentados apontaram redução significativa para os sintomas depressivos e de ansiedade, após intervenção.
É importante ressaltar que as intervenções realizadas pela internet possibilitaram ao cuidador obter informações em casa, criando outra possibilidade de aprender sobre demência. Esse cenário é favorável a esse modelo de intervenção, pois, nas últimas décadas, as possibilidades entre internet e saúde tem aumentado de forma significativa. Segundo Kwok et al. (2014), o último censo de 2012, em Hong Kong, apontou que 90% dos residentes com idade entre 25 a 44 anos usavam internet, estando conectados de 10 a 30 horas por semana. Outros estudos apontam que intervenções ofertadas pela internet podem ajudar a melhorar nível de ansiedade e depressão de cuidadores de idosos demenciados (SPEK et al., 2007; ANDERSSON; CUIJPERS, 2009).
Por fim, analisou-se o estudo realizado por Paller et al. (2015), desenvolvido nos Estados Unidos, durante oito sessões, para 37 duplas cuidadores/idosos, com uma sessão a cada semana (duração de 90 minutos/sessão), em que houve intervenção baseada no programa mindfulness, que está estreitamente ligado a treinar a mente no enfrentamento de pensamentos angustiantes de forma isolada e sem julgamento, levando à diminuição da depressão e da ansiedade, e possibilitando sensação de autoeficácia (WAELDE; THOMPSON; GALLAGHER-THOMPSON, 2004). Ao final da intervenção, os resultados indicaram melhora nas variáveis de percepção da qualidade de vida e redução no nível de depressão nos pacientes e cuidadores (PALLER et al., 2015).
Torna-se importante relatar que o presente estudo baseou-se nas nomenclaturas descritas nos artigos analisados e assim os classificou, conforme as definições. Entende-se, ainda, que alguns estudos apresentam classificações, denominadas de modelos multifacetados, questão essa já apontada na literatura (LOPES; CACHIONI, 2012).
Além disso, constatou-se que os modelos de intervenções apresentaram a participação dos mais diversos profissionais da área da saúde: psicólogo, assistente social, enfermeiro, terapeuta ocupacional, neurologista, fisioterapeuta e gerontólogo.
Essa característica confirma o que a literatura mais recente tem apontado para intervenções multidisciplinares/interdisciplinares, caminhando para um modelo ainda mais resolutivo, podendo apresentar características de interações entre os profissionais (BERTAZONE et al., 2016). Por outro lado, a maioria dos artigos avaliados neste estudo aponta, ao leitor, o entendimento de que as intervenções não ocorreram de forma interprofissional e sim multiprofissional.
É importante destacarmos aqui a distinção entre multiprofissional e interprofissional, embora não haja consenso por parte dos estudiosos nessa temática. O termo multiprofissional define-se como duas ou mais profissões que atuam paralelamente, sem haver o diálogo, diferentemente do termo interprofissional, cuja atuação ocorre pautada na interação e no diálogo dos profissionais (PEDUZZI et al., 2013).
Logo, cabe destacar a necessidade de promover possibilidades de atuação para estudantes e profissionais de saúde para que estes superem os limites anatomopatológicos, caminhando para uma integração e interação que contribuam com maior resolução nos serviços de saúde. Cabe aqui ressaltar também que a maioria dos artigos analisados não descreveu as ações de seus profissionais, apenas três artigos citam quem realizou os contatos, reuniões, palestras, treinamentos e aplicação dos instrumentos.
Essa discussão nos leva a refletir que a intervenção realizada por dois ou mais profissionais e por diferentes abordagens possibilitam alcançar melhores resultados (LEITE et al., 2014; BERTAZONE et al., 2016), embora a realidade das práticas ainda seja, em grande parte, realizada por ações uniprofissionais (PEDUZZI et al., 2013). Contudo, é possível notar maior expressão de intervenções multiprofissional/multidisciplinar com o objetivo de alcançar modelos de ações interdisciplinares/interprofissional, na busca de maior resolutividade nas ações e serviços, quando comparamos a intervenções de décadas atrás.
Embora, os estudos anteriormente citados apresentem resultados contundentes em relação às intervenções com cuidadores e seus idosos, diante do fenômeno do envelhecimento e do aumento das doenças crônicas degenerativas e não degenerativas, pode-se dizer que estas ações ainda são muito diminutas frente à demanda existente, principalmente no Brasil.
Dos 38 artigos inicialmente selecionados, apenas cinco foram publicados na América Latina ou em países em desenvolvimento. Guerra et al. (2011) já apontavam para a necessidade de um maior número de pesquisas nessa temática. Assim, fica evidente o número reduzido de intervenções neste âmbito frente a demanda e produção de conhecimento nesta área, e que, apesar de existir uma variedade de pressupostos teóricos e metodológicos para as intervenções, os modelos encontrados neste estudo estavam quase sempre dentro da mesma configuração: psicoeducacional, psicoterapêutico e psicossocial.
O presente estudo possibilitou identificar e analisar os modelos e as características de intervenções não farmacológicas em grupo de cuidadores informais de idosos com síndrome demencial.
As diversas características apresentadas nos estudos analisados enfatizam a falta de padronização desses modelos intervencionistas; porém, servem de guias teóricos para alcançar modelos que sejam possivelmente mais eficazes e proporcionem, ao sistema de saúde, novas ferramentas de enfrentamento desse desafio. Por outro lado, é evidente que há um número pequeno de intervenções não farmacológicas no âmbito dos cuidadores familiares, especialmente nos países em desenvolvimento, sendo estas embasadas, em sua maioria, apenas em modelos psicoeducacionais.
Apesar da falta de padronização, a maioria dos estudos obteve resultados de forma significativa e contribuiu para redução de alguns aspectos, como nível de pressão, estresse, sobrecarga física e emocional, além de contribuir também para a aquisição de habilidades e conhecimentos sobre a demência. Assim, este artigo aponta para a importância da realização de novos estudos que contribuam para o alcance de uma assistência de promoção, prevenção e recuperação em saúde, para cuidadores de idosos demenciados.