On-line version ISSN 1982-0194
Acta paul. enferm. vol.30 no.2 São Paulo Mar./Apr. 2017
http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201700027
A introdução de tecnologias cada vez mais complexas nos serviços de saúde pode facilitar o processo de trabalho da equipe de enfermagem e aumentar a qualidade da assistência prestada. Porém, na ausência ou em situação de capacitação inadequadamente planejada, a incorporação de equipamentos tecnológicos pode, ao contrário, dificultar a atuação do profissional em sua rotina na unidade e causar prejuízos a essa assistência.(1)
Portanto, o avanço tecnológico exige, para a sua devida incorporação pelos profissionais de enfermagem, a aquisição de conhecimentos e práticas apropriados, obtidos a partir de formação específica, informação e atualização contínua.(2)
Entre vários equipamentos inseridos em unidades neonatais e utilizados pela equipe de enfermagem destaca-se a incubadora, que viabiliza a manutenção de ambiente aquecido aos recém-nascidos prematuros e àqueles com determinadas condições patológicas.(3)
A incubadora previne a hipotermia, agravo que tem sido motivo de grande preocupação de instituições e profissionais de saúde, pois está associada ao aumento da mortalidade e morbidade neonatal.(3)Seu uso gera outros benefícios ao recém-nascido, como fornecimento de ambiente umidificado, isolamento a agentes contaminantes e a completa visualização e acesso ao neonato.(4)
Como qualquer equipamento tecnológico, as incubadoras neonatais podem apresentar mau funcionamento e estar sujeitas ao manuseio inadequado dos profissionais. Seu uso pode provocar hipotermia no neonato, tanto decorrente de falhas de aquecimento, quanto por variações em sua temperatura interna, decorrente da abertura constante de suas portinholas pelos profissionais durante o cuidado.(4,5)Outras possíveis ocorrências prejudiciais aos recém-nascidos, associadas ao uso de incubadoras incluem: exposição à hipertermia, quedas, ruído e controle inadequado de oxigênio, podendo resultar em eventos adversos irreversíveis.(4,6,7) Assim, para que essa tecnologia resulte em assistência segura e efetiva é necessário, além de recursos materiais apropriados, o manuseio por profissionais capacitados.(2,8)
Considerando que os profissionais de enfermagem são os principais responsáveis pela assistência direta ao recém-nascido hospitalizado e que o enfermeiro é responsável pelo uso adequado de equipamentos e gerenciamento dessa assistência, que deve ser qualificada e livre de riscos, propôs-se o presente estudo, que tem como objetivos comparar conhecimentos e práticas de manuseio de incubadoras neonatais por enfermeiras e técnicas/auxiliares de enfermagem.
Adotou-se o termo práticas de manuseio para expressar as maneiras pelas quais o profissional de enfermagem opera tecnicamente o equipamento e suas ações relacionadas ao manejo deste, que podem influenciar a adequação de seu funcionamento e a segurança do recém-nascido.
Estudo transversal e analítico, realizado com a equipe de enfermagem neonatal de hospital de ensino do interior do Estado de São Paulo, referência para atendimento a recém-nascidos de alto risco.
Nesta instituição, a unidade neonatal é constituída pelas subunidades: Unidade de Terapia Intensiva (UTI), Unidade de Cuidados Intermediários (UCI) e Unidade de Cuidados Especiais (UCE), com capacidade para 17, oito e sete leitos, respectivamente e duas salas de recepção em Centro Obstétrico (CO), com estrutura para quatro atendimentos simultâneos. No total, a unidade neonatal conta com 75 profissionais da equipe de enfermagem, das quais 74 aceitaram participar desta pesquisa: duas auxiliares de enfermagem, 57 técnicas de enfermagem e 15 enfermeiras, atuantes durante todos os turnos nas subunidades, em sistema de revezamento de escala.
Para manutenção das incubadoras neonatais a instituição possui um núcleo técnico, responsável pela realização de manutenção preventiva semestralmente, além de manutenção corretiva sempre que necessário. Todas as incubadoras eram da marca FANEM®, havendo quatro modelos diferentes para as incubadoras estacionárias, sendo avaliadas como apropriadas para o uso na unidade neonatal, durante todo o período de coleta de dados desta pesquisa.
A coleta de dados sobre as participantes e seus conhecimentos sobre o tema em foco foi realizada por questionário autoaplicável, contendo perguntas abertas e fechadas, e ocorreu entre os meses de novembro de 2014 e janeiro de 2015. Foram consideradas as seguintes variáveis para caracterização das participantes: anos de trabalho (mediana, mínima e máxima), sexo (feminino, masculino), participação em treinamento inicial (sim, não), atualização periódica (sim, não), sentir-se apta para manusear incubadora (sim, não); motivo para sentir-se apto ou inapto e história de erro com a incubadora (sim, não). A história de erro com a incubadora foi caracterizada pela ocorrência de incidentes não intencionais causadores de eventos adversos envolvendo o profissional ou o neonato, durante o cuidado prestado na unidade neonatal.
Ainda por esse questionário, foram utilizadas as seguintes variáveis para avaliação dos conhecimentos entre os profissionais: conhece benefício(s) do uso da incubadora (sim, não), benefício(s) do uso da incubadora, conhece risco(s) do uso da incubadora (sim, não), risco(s) do uso da incubadora, tem dúvida(s)/dificuldade(s) no manuseio das incubadoras (sim, não), dúvida(s)/dificuldade(s) sentida(s). As dúvida(s)/dificuldade(s) relatadas foram relacionadas às áreas mecânica (sim, não) e aos cuidados com o recém-nascido (sim, não).
Para avaliação das práticas de manuseio, foi realizada observação direta e estruturada, não participante, dos cuidados prestados pelas profissionais, nos meses de fevereiro e março de 2015, por uma das autoras, profissional do serviço onde o estudo foi realizado. Foi observada amostra de um terço das participantes, sendo essa constituída por cinco enfermeiras (20%) e 20 técnicas/auxiliares de enfermagem (80%), atuantes nos diferentes plantões e nas subunidades UTI, UCI e UCE.
Durante as observações, foi utilizado instrumento tipo checklist elaborado especificamente para este estudo e teve como base as recomendações do Ministério da Saúde(4)e do fabricante das incubadoras neonatais (9) utilizadas na unidade. Foi composto por 13 práticas para as quais foi assinalado sim (prática adequada) ou não (prática inadequada): uso de modo de ajuste pele, mantém cobertor sobre a cúpula sem obstruir a entrada de ar, não apoia objetos sobre a cúpula, não produz ruído sobre a cúpula, não mantém objetos na saída de circulação de ar, não mantém objetos no colchão, não utiliza cobertores sobre o recém-nascido, mantém as portinholas fechadas, mantém manga-íris fechada, mantém incubadora com manga-íris, mantém rodízios travados, mantém a incubadora protegida do sol e mantém o sensor de pele sobre o recém-nascido. No momento da observação, todas as incubadoras contavam com portinholas, travas nos rodízios e sensor de pele.
O instrumento checklist final foi definido após sua aplicação em três observações distintas, iniciadas no momento em que o profissional assumia o leito para realização dos cuidados de rotina, como verificação de sinais vitais, aspiração de vias aéreas, mudança de decúbito, rodizio de sensor de oximetria e higienização, entre outros, estendendo-se pelo tempo necessário para sua finalização, com afastamento do leito observado e inicio de outra atividade, como limpeza concorrente de mobiliários ou de outros equipamentos, realização de cuidados com outro recém-nascido ou diálogo com mães. Nos três casos, o tempo gasto pelos profissionais foi inferior e próximo a 30 minutos, de forma que durante a coleta de dados esse foi o tempo estabelecido para as observações.
Os horários para a realização dos cuidados de rotina na unidade do estudo independem do grau de complexidade e gravidade do recém-nascido e são estabelecidos a cada seis horas, segundo os três turnos: manhã (8:00 horas), tarde (14:00 horas) e noturno (20:00 horas e 02:00 horas), sendo que nesse último a observação foi realizada às 20:00 horas. Ocorreram seis observações (24%) em UCI, cinco (20%) em UCE e 14 (56%) em UTI; nove (36%) no período da manhã, cinco (20%) no período da tarde e 11 (44%) no período da noite.
Na avaliação final do manuseio da incubadora utilizou-se escore, estabelecido para cada participante: a cada prática adequada atribuiu-se um ponto, variando o escore de 0 a 13 pontos. Considerou-se que quanto maior a pontuação obtida, melhor a prática do profissional. Adotou-se na análise, o escore mediano (com valor mínimo e máximo) do conjunto de práticas de manuseio adequado, comparando enfermeiras e técnicas/auxiliares de enfermagem.
Foram utilizadas como variáveis independentes, as categorias profissionais referentes à equipe de enfermagem (técnicas/auxiliares de enfermagem e enfermeiras). As variáveis dependentes relacionaram-se aos conhecimentos e práticas individuais de manuseio de incubadoras e pelo escore de práticas adequadas.
A comparação foi realizada pelos testes exato de Fisher e qui quadrado. Todas as análises foram realizadas com o software SPSS v21.0, considerando-se p < 0,05 para o nível de significância estatística. O estudo obteve parecer favorável de Comitê de Ética em Pesquisa local, com número 837.424.
Caracterização das participantes indica que todas eram do sexo feminino; o tempo mediano de trabalho na unidade entre técnicas/auxiliares foi de sete anos (0,5-28,5 anos) e entre enfermeiras 1,4 anos (1-14 anos); relataram participar de treinamento ao ingressar na unidade 34 (57,6%) técnicas/auxiliares de enfermagem e quatro (26,7%) enfermeiras; 46 (78%) técnicas/auxiliares de enfermagem e 11 (73,3%) enfermeiras participaram de atualização periódica do manejo de incubadoras e três (5,1%) técnicas/auxiliares e uma (6,7%) enfermeira disseram ter experenciado algum tipo de erro durante o manuseio do equipamento.
Declararam sentirem-se aptas para utilizar a incubadora 50 (84,7%) técnicas/auxiliares de enfermagem e 11 (73,3%) enfermeiras. Entre as primeiras, os principais motivos apresentados foram: treinamento recebido (31 casos) e experiência profissional (11 casos) e, entre as enfermeiras, a possibilidade de tirar dúvida com outros profissionais (quatro casos) e treinamento recebido (três casos). Quanto à sensação de inaptidão, técnicas/auxiliares de enfermagem mencionaram desconhecer as funções do equipamento (seis casos) e todas as enfermeiras que se sentiam inaptas (quatro casos) referiram que o treinamento foi inadequado.
Comparação entre os conhecimentos quanto aos benefícios do uso de incubadoras e riscos e dúvidas/dificuldades pelos dois grupos de profissionais encontra-se nas tabelas 1 e 2, respectivamente.
Tabela 1 Comparação entre técnicas/auxiliares de enfermagem (n=59) e enfermeiras (n=15) quanto aos conhecimentos sobre os benefícios para o recém-nascido com o uso de incubadoras
Variáveis sobre incubadoras | Técnica/Auxiliar n(%) | Enfermeira n(%) | p-value |
---|---|---|---|
Conhece benefício(s) do uso | |||
Sim | 57(96,6) | 15(100,0) | 1,000(I) |
Não | 2(3,4) | 0(0,0) | |
Benefícios mencionados | |||
Manutenção da temperatura | |||
Sim | 54(91,5) | 15(100,0) | 0,576(I) |
Não | 5(8,5) | 0(0,0) | |
Umidificação do ar | |||
Sim | 22(37,3) | 9(60,0) | 0,040(II) |
Não | 37(62,7) | 6(40,0) | |
Visualização/monitorização | |||
Sim | 15(25,4) | 5(33,3) | 0,429(II) |
Não | 44(74,6) | 10(66,7) | |
Conforto | |||
Sim | 12(20,3) | 0(0,0) | 0,109(I) |
Não | 47(79,7) | 15(100,0) | |
Isolamento ambiental | |||
Sim | 11(18,6) | 5(33,3) | 0,102(II) |
Não | 48(81,4) | 10(66,7) | |
Desenvolvimento extrauterino | |||
Sim | 10(16,9) | 4(26,7) | 0,462(I) |
Não | 49(83,1) | 11(73,3) | |
Segurança | |||
Sim | 8(13,6) | 0(0,0) | 0,194(I) |
Não | 51(86,4) | 15(100,0) | |
Proteção contra ruído | |||
Sim | 7(11,9) | 3(20,0) | 0,413(I) |
Não | 52(88,1) | 12(80,0) | |
Oferta de oxigênio | |||
Sim | 4(6,8) | 1(6,7) | 1,000(I) |
Não | 55(93,2) | 14(93,3) | |
Pesagem | |||
Sim | 2(3,4) | 1(6,7) | 0,498(I) |
Não | 57(96,6) | 14(93,3) | |
Transporte | |||
Sim | 2(3,4) | 0(0,0) | 0,202(I) |
Não | 57(96,6) | 15(100,0) | |
Acesso à manipulação | |||
Sim | 1(1,7) | 0(0,0) | 1,000(I) |
Não | 58(98,3) | 15(100,0) | |
Barreira luminosa | |||
Sim | 0(0,0) | 1(6,7) | 1,000(I) |
Não | 59(100,0) | 14(93,3) |
(I) Teste Exato de Fisher; (II) Teste Qui-quadrado
Tabela 2 Comparação entre técnicas/auxiliares de enfermagem (n=59) e enfermeiras (n=15) sobre os riscos e dúvidas quanto ao uso de incubadoras
Variáveis sobre incubadoras | Técnica/Auxiliar n(%) | Enfermeira n(%) | p-value |
---|---|---|---|
Conhece risco(s) do uso de incubadora | |||
Sim | 52(88,1) | 12(80,0) | 0,413(I) |
Não | 7(11,9) | 3(20,0) | |
Risco informado | |||
Desequilíbrio de temperatura | |||
Sim | 44(74,6) | 12(80,0) | 1,000(I) |
Não | 15(25,4) | 3(20,0) | |
Queda | |||
Sim | 16(27,1) | 2(13,3) | 0,333(I) |
Não | 43(72,9) | 13(86,7) | |
Excesso de ruído | |||
Sim | 11(18,6) | 5(33,3) | 0,995(II) |
Não | 48(81,4) | 10(66,7) | |
Desequilíbrio na concentração de oxigênio | |||
Sim | 9(15,3) | 1(6,7) | 0,675(I) |
Não | 50(84,7) | 14(93,3) | |
Higienização inadequada | |||
Sim | 7(11,9) | 0(0,0) | 0,332(I) |
Não | 52(88,8) | 15(100,0) | |
Tem dúvidas/dificuldades | |||
Sim | 41(69,5) | 11(73,3) | 1,000(I) |
Não | 18(30,5) | 4(26,7) | |
Dúvidas/dificuldades sobre mecânica | |||
Sim | 24(40,7) | 10(66,7) | 0,135(II) |
Não | 35(59,3) | 5(33,3) | |
Dúvidas/dificuldades sobre a assistência ao recém-nascido | |||
Sim | 27(45,8) | 7(46,7) | 0,201(II) |
Não | 32(54,2) | 8(53,3) |
(I) Teste Exato de Fisher; (II) Teste Qui-quadrado
A tabela 3 é relativa às práticas observadas nos dois grupos de profissionais.
Tabela 3 Comparação de práticas observadas no manuseio de incubadoras por técnicas/auxiliares de enfermagem (n=20) e enfermeiras (n=5)
Práticas adequadas | Técnica/Auxiliar n(%) | Enfermeira n(%) | p-value(I) |
---|---|---|---|
Uso do modo de ajuste pele | 0(0,0) | 1(20,0) | 0,200 |
Mantém cobertor sobre a cúpula sem obstruir a entrada de ar | 20(100,0) | 5(100,0) | 1,000 |
Não apoia objetos sobre a cúpula | 4(20,0) | 0(0,0) | 0,549 |
Não produz ruído sobre a cúpula | 18(90,0) | 5(100,0) | 1,000 |
Não mantém objetos na saída de circulação de ar | 13(65,0) | 2(40,0) | 0,358 |
Não mantém objetos no colchão | 18(90,0) | 5(100,0) | 1,000 |
Não utiliza cobertores sobre o recém-nascido | 19(95,0) | 5(100,0) | 1,000 |
Mantém portinholas fechadas | 20(100,0) | 5(100,0) | 1,000 |
Mantém manga-íris fechada | 17(85,0) | 4(80,0) | 1,000 |
Mantém incubadora com manga-íris | 20(100,0) | 5(100,0) | 1,000 |
Mantém rodízios travados | 1(5,0) | 0(0,0) | 1,000 |
Posiciona a incubadora protegida do sol | 20(100,0) | 5(100,0) | 1,000 |
Usa sensor de pele sobre o recém-nascido | 4(20,0) | 2(40,0) | 0,562 |
(I) Teste Exato de Fisher
O escore mediano das práticas de técnicas/auxiliares de enfermagem e enfermeiras foi de 9 (7-11) e 9 (7-10), respectivamente, p=0,723. Como o máximo valor possível era 13, a pontuação de ambos os grupos representa 69,2% do máximo valor possível.
Constitui-se uma fragilidade do estudo a utilização de amostra por conveniência na seleção dos participantes na etapa de observação, aspecto minimizado pela observação dos profissionais em distintos horários, unidades e plantões. O questionário utilizado também apresentou uma limitação, pois sua validação não foi realizada, condição a ser solucionada antes de novas aplicações.
De modo geral, não houve diferenças entre técnicas/auxiliares de enfermagem e enfermeiras quanto aos conhecimentos e práticas. Porém, os achados obtidos indicam a ocorrência de falhas da equipe de enfermagem no manuseio de incubadoras, demonstrando a realidade em nível institucional que pode se repetir em outros serviços e, assim, a pesquisa pode subsidiar gestores, profissionais da área de tecnologia e enfermeiras na oferta de ações de capacitação para a equipe de enfermagem, de forma a evitar a ocorrência de eventos adversos e ampliar a qualidade da assistência prestada aos recém-nascidos, estendendo-se também para outros equipamentos tecnológicos.
A observação realizada durante a rotina de trabalho de enfermeiras e técnicas/auxiliares de enfermagem é, em geral, considerada vantajosa, quando comparada às fontes de dados secundários ou aplicação de questionários aos participantes, visto que o pesquisador, de maneira sistemática, observa os acontecimentos no ambiente e no momento em que ocorrem. O fato de o observador ser profissional da unidade estudada também favoreceu a coleta de dados, já que as participantes deste estudo estavam ambientadas com sua presença, condição que minimiza a possibilidade de mudança nas práticas por saberem que estavam sendo observadas. Além disso, caso as práticas tenham sido influenciadas pelos profissionais saberem-se observados, o manejo das incubadoras teria sido realizado com mais cautela e empenho e, mesmo assim, os resultados mostraram a adoção frequente de práticas inadequadas.
Tomando por base o escore de práticas observadas, não houve diferença entre os grupos profissionais, já que para ambos este correspondeu a aproximadamente 70% de acertos. Considera-se, entretanto, que os resultados poderiam ser mais satisfatórios, visto tratar-se de profissionais de enfermagem inseridos em unidade especializada, pertencente a hospital de ensino de alta complexidade, onde o uso de incubadoras é muito frequente.
Tem-se por pressuposto que toda tecnologia, para ser eficiente, não depende apenas da disponibilidade de recursos materiais, mas se torna completa pelo conjunto de conhecimentos e habilidades da equipe que dela se utiliza.(2,8,10)Nesse contexto, esperava-se melhor desempenho das práticas pelas enfermeiras, já que são responsáveis pela capacitação da equipe e pelas tecnologias que se inserem nos serviços de enfermagem, o que inclui vigilância dos aparelhos, domínio do maquinário e observação da linguagem tecnológica.(11,12)
Assim, evidencia-se a necessidade da enfermeira estar apta, segura e capacitada para multiplicar seus conhecimentos, visto que deve assegurar o papel da equipe de enfermagem nas dimensões científica, tecnológica e humanizada do cuidado.(10)
Quanto à análise individual das práticas de manipulação, o fato de não haver diferença significativa entre técnicas/auxiliares de enfermagem e enfermeiras indica que ocorreram práticas inadequadas igualmente em ambos os grupos, especialmente em relação ao apoio de objetos sobre a cúpula da incubadora, permanência de objetos na saída de circulação de ar, manutenção dos rodízios da incubadora destravados, uso do sensor de pele sob o recém-nascido e ajuste de temperatura pelo modo ar.
O apoio de objetos sobre a cúpula da incubadora durante a realização dos cuidados pode danificá-la e inviabilizar sua abertura em caso de emergência, além possibilitar a geração de ruído no ambiente do recém-nascido. Manter objetos na saída de ar pode ocasionar falhas na circulação, com possíveis repercussões negativas para o recém-nascido.(4) A manutenção dos rodízios das incubadoras destravados durante seu manuseio também pode causar aumento na produção de ruído e instabilidade da incubadora.(9)
O uso de sensor de pele sob o recém-nascido é inadequado, podendo ocasionar medidas imprecisas de temperatura, impactando na correta monitorização e no superaquecimento da incubadora se esta estiver controlada pelo modo de ajuste pele. O modo de ajuste pele, preterido pelos profissionais que quase unanimemente usaram o ajuste ar, ao contrário, permite o controle da temperatura da incubadora de acordo com a necessidade do neonato, contribuindo para a manutenção constante de sua temperatura. Em geral, é indicado que apenas o aquecimento inicial seja realizado pelo modo de ajuste ar, mantendo-se, após a admissão do recém-nascido na incubadora, o ajuste pelo modo pele.(9)
Corroborando com essa afirmação, estudo americano avaliou a variação da temperatura pelos modos pele e ar e encontrou que, no modo pele, a temperatura do recém-nascido permaneceu constante com variações na temperatura do ar. Já no modo ar, a temperatura do recém-nascido elevou-se e a temperatura do ar apresentou flutuações.(13) Em outro estudo, realizado em 186 unidades de saúde da França, o controle de temperatura pelo modo pele foi mais utilizado entre recém-nascidos com idade gestacional inferior a 28 semanas.(14)
Pequeno número de técnicas/auxiliares de enfermagem e enfermeiras relatou ter vivenciado situação de erro no manuseio de incubadora neonatal. Não foram encontrados na literatura dados desse tipo de ocorrência com incubadoras, sejam eles envolvendo profissionais ou pacientes. Entretanto, pesquisa desenvolvida em UTI Neonatal do Nordeste brasileiro encontrou a ocorrência de 29% de eventos adversos envolvendo distúrbios da termorregulação, dos quais 65,9% envolveram hipotermia e 5,4% hipertermia neonatal, frequentemente secundária à tentativa de correção de hipotermia. Como se tratavam de recém-nascidos de alto risco supõe-se que muitos utilizavam a incubadora neonatal. Nesse estudo, destacou-se a importância de melhores práticas para diminuir tais incidentes.(15)
No presente estudo, a baixa frequência de erros relatados deve ser vista com cautela, pela possibilidade de estar subestimada, seja pelo receio de assumir que poderiam ter causado algum prejuízo ao paciente, seja pelo desconhecimento de que o fato ocorrido foi erro, já que a utilização de equipamentos tecnológicos durante a rotina de trabalho pode estar sujeita a anomalias de funcionamento.(16)De fato, considera-se baixa a frequência de erros identificada, especialmente, levando em conta a elevada proporção de profissionais que relatou não ter recebido treinamento, que não se considerou apta para operar incubadoras e que realizou práticas inadequadas de manuseio durante a observação.
Os dois grupos de profissionais afirmaram conhecer, em proporção semelhante, pelo menos um benefício do uso de incubadoras neonatais com recém-nascidos. Entre os benefícios igualmente citados estão: manutenção da temperatura, segurança do recém-nascido e oferta de oxigênio.
Enfermeiras relataram mais frequentemente a umidificação do ar como benefício, em comparação às técnicas/auxiliares de enfermagem, demonstrando que essas últimas utilizam a função da umidificação de incubadoras sem conhecerem seu benefício.
Parte dos profissionais de ambos os grupos citaram inadequadamente a proteção contra ruído como benefício das incubadoras. Sabe-se que, ao contrário, esse equipamento é produtor de várias formas de ruídos, dependendo da qualidade da manutenção periódica e das práticas de quem o manipula.(4)
Nos dois grupos profissionais, foram reconhecidos mais benefícios do que riscos do uso de incubadoras. Entre os riscos informados foram citadas consequências por desequilíbrio da temperatura, higienização inadequada do equipamento, ruído, desequilíbrio na concentração de oxigênio e queda do neonato, dados corroborados pela literatura científica.(4,6,7,17)
Quando questionadas sobre dúvidas/dificuldades, elevada e semelhante proporção de técnicas/auxiliares de enfermagem e enfermeiras relataram tê-las, envolvendo o funcionamento mecânico da incubadora e/ou o cuidado do recém-nascido durante a utilização do equipamento, aspectos a serem considerados em futuras atividades de educação permanente com a equipe.
Conhecimentos acerca do manuseio de incubadoras não diferiram entre enfermeiras e técnicas/auxiliares de enfermagem, exceto quanto ao benefício da função de umidificação para os recém-nascidos, citado com mais frequência por enfermeiras. Com relação às práticas observadas, tanto consideradas individualmente quanto no escore total, também não houve diferença de manuseio entre os grupos.