versão impressa ISSN 1414-8145versão On-line ISSN 2177-9465
Esc. Anna Nery vol.23 no.2 Rio de Janeiro 2019 Epub 28-Fev-2019
http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2018-0325
O termo letramento refere-se ao desenvolvimento do processo de aprendizagem da leitura e da escrita.1 Já o Letramento em Saúde (LS) é a capacidade que a pessoa tem de obter, processar e compreender as informações em saúde e os serviços básicos disponibilizados que podem favorecer as ações de autocuidado.2 Ao longo dos anos, o LS vem sendo considerado um determinante no processo saúde-doença. Nessa direção, os pacientes classificados como adequados em LS são aqueles que possuem habilidades básicas de leitura, escrita e numeramento, as quais podem favorecer a sua participação no plano de cuidados, desde o planejamento até a avaliação dos resultados das ações terapêuticas propostas.
A classificação de letramento de uma pessoa pode contribuir para se conhecer a sua situação econômica, social, cultural, política e de saúde. Desse modo, ao longo dos anos a população tem sido cada dia mais motivada a buscar conhecimento e incorporar as novas metodologias de aprendizagem para alcançar e compreender as diversas informações em saúde disponíveis.
Estudo aponta que o baixo LS pode contribuir para o aparecimento e o agravamento de diversas Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT), dentre elas o Diabetes Mellitus (DM). A sua relevância está relacionada ao aparecimento de complicações crônicas do DM, ou seja, a nefropatia, a retinopatia, a neuropatia periférica, a cardiopatia, entre outras.3
Dessa forma, o reconhecimento da capacidade de compreensão das informações em saúde é importante para que as pessoas recebam instruções que efetivamente possam ser colocadas em prática para a manutenção do estado de saúde.4
Para o cuidado efetivo relacionado aos pilares do tratamento: uso dos medicamentos, prática de exercício físico e seguimento do plano alimentar, é necessário o desenvolvimento de uma série de habilidades e conhecimentos pela pessoa com DM para o sucesso da adesão ao tratamento.
Nesse sentido, o LS inadequado pode comprometer a adesão ao tratamento de pacientes com Diabetes Mellitus tipo 2 (DM2), pelo uso irracional de medicamentos, bem como pelas práticas de autocuidado inadequadas que desencadeiam complicações agudas e crônicas relacionadas à doença. O impacto do baixo LS na adesão é tão relevante que, nos Estados Unidos da América, o Conselho Nacional de Informação ao Paciente e Educação o reconheceu como uma das dez prioridades para melhorar a adesão ao tratamento medicamentoso5, que se refere ao uso dos medicamentos prescritos ou o cumprimento de outras orientações em pelo menos 80%, considerando horário, dose e tempo de tratamento.6
As pesquisas no Brasil sobre LS são recentes. As primeiras foram realizadas no final dos anos 2000.7 Esse fato pode explicar a ausência de publicações nacionais sobre a relação entre letramento em saúde e adesão ao tratamento medicamentoso. Por se tratar de um estudo inovador, elaborou-se a seguinte pergunta de investigação: Qual é a relação entre o LS e a adesão ao tratamento medicamentoso em pessoas com DM2?
O baixo nível de LS das pessoas pode implicar menor adesão aos tratamentos de saúde, pois para aqueles indivíduos classificados como inadequados, as informações em saúde e as ações de educação em saúde podem não ter o alcance satisfatório e resolutivo como planejado, mesmo quando orientadas por profissionais. Assim, investigar o conhecimento do LS dos pacientes com DM2 pode oferecer subsídios para o planejamento de atividades educativas, ao utilizar linguagem acessível ao público-alvo, para melhorar as práticas de autocuidado, entre estas a adesão ao tratamento medicamentoso, favorecendo o cuidado equânime, integral e de qualidade.
Diante do exposto, o estudo teve o objetivo de analisar a relação entre LS e a adesão ao tratamento medicamentoso entre pessoas com DM2.
Estudo quantitativo e transversal desenvolvido em Estratégias de Saúde da Família (ESFs) da cidade de Picos-PI. Atualmente, o município possui 36 ESF, sendo 25 localizadas na zona urbana e 11 na zona rural. Este estudo foi realizado em cinco ESF da zona urbana, selecionadas devido ao maior percentual de pessoas com DM2 cadastradas.
A população da pesquisa foi constituída por 303 pacientes, de ambos os sexos, com DM2, cadastrados e acompanhados nas cinco ESF referidas. Estabeleceu-se como critérios de inclusão: pessoas cadastradas na UBS e no e-SUS, idade superior a 18 anos e diagnóstico médico de DM2, há no mínimo dois anos. Os critérios de exclusão foram: apresentar déficit visual, não saber ler e escrever e não ser capaz de ler e escrever a frase “FECHE OS OLHOS” do MiniExame do Estado Mental (MEEM). Tais critérios foram verificados por meio de observação e relato dos pacientes.
Para o cálculo amostral, utilizou-se a fórmula com o valor total da população (N = 303), percentual de 11% a variável reduzida (Z=1,96), erro amostral relativo (α=5%), erro absoluto (E=5%), e o nível de confiança (95%).8
Os 11% de prevalência são baseados na estimativa global de adultos com diabetes no ano de 2015, que foi estimada em 7,2% a 11,4%.9 Assim, a amostra foi de 101 pacientes com DM2, porém devido às dificuldades para a obtenção da amostra completa, tais como falta de acesso aos domicílios, critérios de exclusão, falta de colaboração da equipe de saúde, e recusa dos pacientes em participar da pesquisa, a amostra final foi constituída por 78 participantes.
Para a coleta de dados, foram utilizados três instrumentos: um formulário contendo as variáveis sociodemográficas; o Short Test of Functional Helathy Literacy in Adults (S-TOFHLA), na versão curta do Test of Functional Health Literacy inAdults (TOFHLA); e a Medida de Adesão aos Tratamentos (MAT).
O S-TOFHLA é um instrumento que permite a obtenção de dados para avaliar o LS e é composto por dois subtestes, um avalia a compreensão textual, e o outro, a matemática ou numeramento. A habilidade de leitura é avaliada através de 36 itens, e o nume ramento por quatro itens. A pontuação total é de 100 pontos, sendo 72 pontos referentes à leitura (peso 2 para cada item), e 28 pontos referentes ao numeramento (peso 7 para cada item), permitindo categorizar o responden te em três níveis de letramento funcional em saú de: inadequado (0 a 53 pontos), limítrofe (54 a 66 pontos), e adequado (67 a 100 pontos). O nível de LS é alcançado pelos participantes através da pontuação do item de compreensão de leitura somado ao de numeramento.10
O MAT é um questionário utilizado para avaliar a adesão ao tratamento medicamentoso, ou seja, o comportamento do paciente em relação ao uso diário dos medicamentos prescritos. É composto por sete itens, em uma esca la tipo Likert de seis pontos, de 1 (sempre) a 6 (nunca). A adesão é determinada pela média global do instrumento, ou seja, somam-se os pontos de cada item e divide-se pelo número de itens (sete). Considera-se “adesão” ao tratamento quando a média obtida apresenta valores entre cinco e seis pontos, e “não adesão” quando a média for inferior a cinco pontos.11-12
A coleta de dados aconteceu no período de fevereiro a maio de 2018, após a identificação do cadastro das pessoas com DM2 nas ESF. Em seguida, buscou-se conhecer o dia da semana em que estava agendada a consulta dos participantes do estudo. No primeiro contato, foram informados dia, hora e local aos que concordaram em participar da pesquisa. Antes da aplicação do formulário e dos questionários foram esclarecidos os objetivos e a natureza do estudo. Após o consentimento do participante, a partir da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), realizou-se o teste de leitura por meio da aplicação do “Cartão de Avaliação da Capacidade de Leitura” do MEEM. Os questionários foram entregues após explicação do preenchimento e recolhidos pelos pesquisadores.
Os dados foram processados no software IBM Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 20.0. Para a análise, foram realizados os cálculos estatísticos das variáveis quantitativas sociodemográficas, do nível de LS e do grau de adesão ao tratamento medicamentoso quanto às frequências absoluta e relativa, média e desvio-padrão.
Com o intuito de avaliar a significância estatística dos itens que compõem o LS aplicou-se o teste Coeficiente de Correlação de Person. Os testes T de Student e ANOVA one way foram utilizados, a fim de comparar as médias da variável LS com as variáveis sociodemográficas e de adesão ao tratamento medicamentoso. Para todas as análises estatísticas inferenciais foram consideradas como estatisticamente significantes aquelas com p < 0,05.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da UFPI, conforme parecer n° 2.429.535, cumprindo as normas da Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde - CNS/MS.
Dos 78 (100%) participantes, 71,8% eram do sexo feminino, com média de idade de 58,15±11,44 anos. Quanto ao estado civil, 66,7% eram casados ou viviam em união estável. Em relação à escolaridade, identificou-se média de 8,81±5,29 anos de estudo, sendo que 82% frequentaram escolas de ensino público. No que se refere à situação laboral, 52,6% dos pacientes eram aposentados.
Quanto ao nível de LS dos participantes, 51,3% foram classificados como inadequados, e apenas 32,1% como adequados (Gráfico 1). Em contrapartida, no que se refere à adesão ao tratamento medicamentoso, 87,2% dos pacientes foram considerados aderentes à terapia medicamentosa.
Gráfico 1 Nível de Letramento em Saúde dos usuários diabéticos. Picos – PI, 2018. (N=78). Fonte: Dados da pesquisa. Picos, Piauí, Brasil, 2018.
O Gráfico 2 mostra que houve correlação estatisticamente significativa entre a pontuação geral do LS e os itens de compreensão de leitura e de numeramento (p=0,000). Observa-se que a maioria dos participantes apresentou letramento inadequado, sendo que o item de leitura foi o que mais interferiu no resultado, apresentando uma correlação mais forte (r = 0,956).
Gráfico 2 Correlação entre a pontuação geral de letramento em saúde e os itens de compreensão de leitura e numeramento, Picos-PI, 2018. (N=78).
A Tabela 1 mostra que houve variação da média do LS de acordo com o nível de adesão ao tratamento medicamentoso. Os participantes que foram classificados com o nível de LS adequado não aderiam à terapêutica medicamentosa. Em contraposição, aqueles pacientes que apresentaram um nível de LS inadequado tinham adesão ao tratamento medicamentoso (p=0,025).
Tabela 1 Comparação entre letramento em saúde com o nível de adesão à terapêutica medicamentosa. Picos – PI, 2018. (N=78).
Letramento em Saúde | ||
---|---|---|
Variável | Média±DP* | Valor de p |
Nível de ATM*** | 0,025** | |
Adesão | 50,62±20,848 | |
Não Adesão | 66,80±20,746 |
Fonte: Dados da pesquisa. Picos, Piauí, Brasil, 2018.
*DP: Desvio Padrão;
**T de Student;
***Adesão ao Tratamento Medicamentoso.
A Tabela 2 mostra que houve associação entre as médias da pontuação geral do LS e as variáveis sociodemográficas. Os participantes na faixa etária entre 30 e 49 anos apresentaram média de LS limítrofe ou adequada (61,80±18,986). Em relação à escolaridade, observou-se que quanto mais anos de estudo, melhor o desempenho no teste de LS (73,33±3,055). Já os pacientes com menos de 10 anos de estudo apresentam LS inadequado ou limítrofe (44,02±17,620).
Tabela 2 Associação entre letramento em saúde e os dados sociodemográficos. Picos – PI, 2018. (N=78).
Letramento em Saúde | ||
---|---|---|
Variáveis | Média±DP* | Valor de p |
1. Sexo | 0,900** | |
Feminino | 52,50±20,816 | |
Masculino | 53,18±23,337 | |
2. Faixa Etária | 0,002*** | |
30-49 | 61,80±18,986 | |
50-69 | 53,00±20,899 | |
70-89 | 33,00±16,186 | |
3. Estado civil | 0,024*** | |
Casado (a) ou união estável | 56,46±22,341 | |
Solteiro | 55,38±19,574 | |
Viúvo (a) | 36,54±12,346 | |
Divorciado (a) | 51,20±16,664 | |
4. Anos de estudo | 0,000*** | |
0 – 9 anos | 44,02±17,620 | |
10 – 19 anos | 61,32±21,983 | |
20 – 30 anos | 73,33±3,055 | |
5. Tipo de escola frequentada | 0,003*** | |
Pública | 51,66±20,146 | |
Particular | 35,00±15,281 | |
Pública e particular | 77,57±20,074 | |
Outras | 43,00±14,142 | |
6. Situação laboral | 0,014*** | |
Trabalha informalmente | 54,92±20,488 | |
Trabalha formalmente | 62,31±21,048 | |
Não trabalha | 58,50±21,564 | |
Desempregado (a) | 73,75±16,399 | |
Aposentado (a) | 45,61±19,926 |
Fonte: Dados da pesquisa. Picos, Piauí, Brasil, 2018.
*DP: Desvio Padrão;
**T de Student;
***ANOVA one way.
O presente estudo analisou a relação entre LS e adesão ao tratamento medicamentoso entre 78 pessoas com diabetes mellitus tipo 2, de ambos os sexos, sendo que as mulheres compuseram a maioria da amostra, estando, assim, em consonância com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), realizada em 2015, que apresenta a composição brasileira de mulheres correspondendo a 51,5% da população.13
Ao analisar o nível de LS verificou-se que a maioria (51,3%) dos participantes apresentou um nível inadequado no desempenho do LS, com uma média geral de 52,69±21,404 pontos. Tal resultado está em consonância com outros estudos descritivos nacionais que buscaram analisar a mesma variável. 4,14-15
O nível de LS é alcançado pelos participantes através da pontuação do item de compreensão de leitura somado ao de numeramento. Os resultados obtidos mostram que a maioria dos participantes tem um nível de LS inadequado, sendo que o item de compreensão de leitura é o principal influenciador desse resultado, pois expressa uma correlação mais forte (r = 0,956) que o item de numeramento (r=0,447).
Um estudo que avaliou o LS de um grupo de 114 idosos com DM assistidos em uma unidade de saúde municipal do SUS, na região Norte do Brasil, mostrou um resultado similar ao do presente estudo, uma vez que cerca de 52,6% dos idosos conseguiram compreender e responder as perguntas referentes ao item de compreensão de numeramento.14
Os autores desse estudo justificam esse achado explicando que pelo fato de o entrevistador fazer a pergunta ao participante sobre o que consta no cartão, isso contribuiu para melhorar o nível de compreensão dos investigados. Já no item de compreensão textual, o resultado inadequado sugere que o teste aplicado apresenta as informações escritas de difícil compreensão, exigindo um nível de escolaridade mais alto, ou pode conter expressões que dificultam o entendimento.14
Percebeu-se, ainda durante a aplicação do teste de compreensão de leitura, a necessidade de adaptação do instrumento para a realidade cultural da população brasileira, visto que a maioria dos participantes questionou a existência de radiografia de estômago, uma vez que relacionam tal exame apenas às estruturas corporais ósseas. Outro fator identificado, foi a dificuldade de concluir por completo as 36 lacunas do teste em um tempo de apenas sete minutos. Observou-se que os participantes com baixa escolaridade, na maioria, completaram apenas os itens antes de chegar na parte relacionada ao dia do Raio X, contribuindo, assim, para o resultado de inadequação do grau de LS.
No que se refere à adesão ao tratamento medicamentoso, verificou-se um resultado satisfatório, visto que 87,2% da amostra aderem ao tratamento. Esse resultado é semelhante a outros estudos16-17-18 que utilizaram o MAT como instrumento de análise desse dado.
Dessa forma, é possível perceber que mesmo a pesquisa apresentando uma boa adesão ao tratamento medicamentoso ainda é necessária a elaboração de planejamento por parte da equipe de saúde da Atenção Primária de Saúde, para que a cobertura de 100% de adesão seja alcançada. Para isso, é essencial que sejam identificadas as limitações que influenciam a não adesão à terapêutica e, partir disso, implementar um plano de cuidado compatível com as necessidades dos usuários.
O presente estudo buscou também relacionar o nível de LS com o grau de adesão ao tratamento medicamentoso e obteve um resultado estatisticamente significativo (p=0,025), porém a hipótese inicial foi refutada, pois verificou-se que os participantes mesmo apresentando, em sua maioria, (51,3%) um inadequado LS, são aderentes à terapêutica medicamentosa (87,2%).
Comparando esse resultado com dois estudos, um nacional19 e outro internacional20, verificaram-se resultados divergentes, pois nenhum apresenta relação estatisticamente significante entre as duas variáveis, LS e adesão ao tratamento medicamentoso. Esses estudos19-20 buscam justificar os achados em relação a adesão à terapêutica medicamentosa, atribuindo as limitações dos estudos ao instrumento utilizado para a investigação, o MAT, pois o mesmo utiliza-se de informações autorreferidas que podem ser influenciadas pelo viés da memória e da informação, e os sujeitos ficam suscetíveis a alteração de respostas ao instrumento em função do que é mais adequado.
Através da comparação entre as médias a partir da aplicação do teste T de Student constatou-se que os pacientes que possuem um adequado LS não aderem à terapêutica medicamentosa. Tal resultado pode ser explicado analisando o perfil geral dos participantes que apresentaram um adequado LS. As melhores médias foram alcançadas por pacientes do sexo masculino (53,18±23,337), na faixa etária de 30 a 49 anos (61,80±18,986), com 20 a 30 anos de estudo (73,33±3,055).
Considerando essas informações, percebe-se que os homens são mais imprudentes com o uso de medicamentos. O estudo de Saccomann, Souza Neta e Martins (2015)21 mostrou que os homens tendem a ser mais descuidados em relação à tomada dos medicamentos que as mulheres, o que pode ser justificado pela menor preocupação com a saúde. Além disso, esse mesmo estudo21 revela que os pacientes que trabalham fora tendem a se esquecer de tomar a medicação com maior frequência, e isso pode se relacionar com a faixa etária, pois a idade de 30 a 49 anos corresponde à fase em que a maioria das pessoas se encontra em situação empregatícia ativa.
No tocante ao grau de escolaridade, White et al. (2013)22, ao investigarem 149 pacientes com DM, mostraram que pacientes com LS limitado apresentavam maior confiança nas informações orientadas por profissionais, maior autocuidado e maior adesão ao regime nutricional e medicamentoso, porém pacientes com maior nível de escolaridade mostraram ponderar seu envolvimento na tomada de decisão médica como um processo compartilhado entre eles. Isso envolve verificar a veracidade da informação e buscar opções além do que é dado pelo profissional de saúde.
Constata-se que o conhecimento dos aspectos sociodemográficos da população é de grande importância para identificar os fatores que contribuem para determinar os resultados encontrados sobre adesão ao tratamento medicamentoso e os níveis de LS. Possibilita, assim, intervir nas limitações encontradas pelos usuários do sistema de saúde.
Segundo Cortez (2015),23 as particularidades sociodemográficas e clínicas agregadas ao planejamento de ações prévias podem direcionar o gerenciamento do cuidado e programas educativos pela equipe de saúde e, em especial, pela enfermagem.
Assim, visando a um melhor entendimento dos resultados encontrados sobre os níveis de LS, foi investigada a associação entre a média da pontuação geral de LS e os dados sociodemográficos. O presente estudo mostra que baixos escores de LS estão, estatisticamente, associados a pessoas de idade mais avançada, viúvas, aposentadas, com menor nível de escolaridade e que frequentaram escola de ensino particular.
Na pesquisa de Passamai, Sampaio e Lima (2013)24, realizada com 506 usuários da Atenção Básica do Sistema Único de Saúde (SUS) em Fortaleza-CE, verificou-se uma concordância com os resultados do presente estudo, pois os percentuais de limitado LS foram progressivamente aumentando com o avanço da idade, com diferença significante entre as faixas etárias (p<0,001/teste do qui-quadrado). Além disso, 93,6% da população que possuíam de 1 a 3 anos de estudo apresentaram um LS limitado.
Tais resultados são confirmados em uma revisão integrativa de literatura25 em que os autores mostraram que na análise dos artigos quantitativos o baixo LS está relacionado com a baixa escolaridade, a idade mais avançada, a baixa renda e ser do sexo masculino.
Dessa forma, o baixo LS em pacientes com DM2 pode impossibilitar o adequado autocuidado e o gerenciamento de qualidade do tratamento, e assim prejudicar diretamente a compreensão e aquisição de práticas de saúde, bem como possibilitar o aumento e o surgimento de complicações e incapacidades.
Este estudo teve algumas limitações, como a dificuldade de encontrar pessoas alfabetizadas para ler e responder aos questionários. No que concerne ao instrumento de LS, observou-se a incompreensão do mesmo, isso porque os participantes desconheciam a realização do procedimento descrito nas perguntas. Muitos associavam as perguntas à sua realidade, não entendendo que se tratava de uma simulação, e não conseguiam responder todos os itens no tempo estimado. Partindo disso, percebe-se a necessidade da realização de estudos que busquem adaptar o instrumento de LS para a realidade cultural dos investigados.
A população estudada apresentou alta prevalên cia de inadequação em LS, seguida de uma adequada adesão ao tratamento medicamentoso. A comparação feita entre essas duas variáveis obteve um resultado estatisticamente significativo. Observou-se que os pacientes, mesmo apresentando em sua maioria um LS inadequado, aderem à terapêutica medicamentosa. Em contrapartida, os participantes com um LS adequado não são aderentes ao tratamento medicamentoso.
Tal achado foi justificado pela análise das características sociodemográficas. Estudos referem que pacientes com baixa escolaridade tendem a confiar e aderir de forma adequada às orientações dos profissionais de saúde. Já os indivíduos com o LS adequado, que foram, em sua maioria, os do sexo masculino, de menos idade, e com mais anos de escolaridade, tendem a ser descuidados, esquecidos e negligentes com o tratamento.
Assim, destaca-se a importância deste trabalho, por explorar um assunto novo e pouco avaliado entre os pacientes com DM2. É de fundamental importância também para os profissionais de saúde, em especial enfermeiros, uma vez que possibilita conhecer as dificuldades presentes nos pacientes e promover práticas de saúde que se enquadrem na realidade de cada indivíduo, garantindo, assim, maior envolvimento entre o profissional e o paciente, proporcionando um tratamento adequado e, consequentemente, maior empoderamento do usuário com DM2 no seu processo de saúde-doença.