versão impressa ISSN 1808-8694
Braz. j. otorhinolaryngol. vol.80 no.1 São Paulo jan./fev. 2014
http://dx.doi.org/10.5935/1808-8694.20140015
A leucemia é uma patologia caracterizada pela produção excessiva e progressiva de leucócitos na medula óssea, que passam a circular no sangue na sua forma imatura.1,2 A proliferação disseminada dos blastos leva a uma substituição dos elementos normais da medula, causando um acúmulo de células imaturas no sangue. A etiologia da leucemia ainda é considerada incerta, mas muitos estudos apontam para fatores causais como infecção viral, exposição à radiação e exposição química.3 Existem subtipos diferentes de linfócitos, e portanto tipos diferentes de leucemia, que são classificados de acordo com a célula envolvida, a duração e o caráter da doença.1-4
A leucemia linfocítica aguda (LLA) acomete cerca de 80% das leucemias e ocorre na maioria dos casos em crianças.1 A LLA resulta na produção excessiva e descontrolada de blastos do tipo linfoide, dificultando a produção normal de glóbulos vermelhos, brancos e plaquetas. As chances de sobrevida aumentaram com os avanços nos tipos de tratamento antineoplásico.2,3
Os primeiros sinais da leucemia podem surgir regularmente na cavidade oral, principalmente na fase aguda do câncer, por meio de lesões comuns nessa fase da doença, e podem ser visualizadas e reconhecidas pelo cirurgião-dentista primariamente.4,5 As manifestações mais frequentes da leucemia na cavidade oral são hemorragia e hiperplasia gengival, infecções oportunistas e alterações ósseas.
Durante o tratamento antineoplásico as lesões tornam-se ainda mais intensas, pois o tratamento quimioterápico atua em células pouco diferenciadas ou com alto metabolismo, atingindo além das células blásticas as células normais do organismo.3,4
O cirurgião-dentista precisa ter conhecimento das lesões causadas pela leucemia e pelo tratamento antineoplásico para melhorar a saúde bucal do paciente. Diante do exposto, nosso objetivo é realizar uma revisão sistemática da literatura sobre as complicações orais secundárias à quimioterapia realizada em crianças portadoras de leucemia linfocítica aguda.
Uma busca sistemática de artigos em língua inglesa, portuguesa e espanhola publicados entre janeiro de 1992 e abril de 2013 foi executada nas bases de dados PubMed/Medline, Science Direct, Scielo e Scopus. Foram selecionados estudos que tiveram como população-alvo crianças de dois a 18 anos, portadoras de leucemia linfocítica aguda e que avaliaram as complicações do tratamento antineoplásico na cavidade oral.
Nas buscas foram utilizados os seguintes termos: manifestações orais, leucemia, leucemia linfocítica aguda, LLA, quimioterapia e crianças, assim como seus sinônimos e correspondentes nas línguas inglesa e espanhola. Foram utilizados nas bases de dados possíveis os operadores booleanos AND, OR, NOT. As estratégias de busca são apresentadas na tabela 1.
Tabela 1 Estratégias de busca e número de artigos encontrados nas bases de dados
Estratégias | A | B | C | D |
---|---|---|---|---|
(Oral lesions OR oral manifestation OR mouth lesion OR mouth manifestation OR oral pathology) AND leukemia AND chemotherapy AND children. | 0 | 88 | 32 | 801 |
(Oral lesions OR oral manifestation OR mouth lesion OR mouth manifestation OR oral pathology) AND acute lymphocytic leukemia AND chemotherapy AND children. | 0 | 37 | 0 | 128 |
(Oral lesions OR oral manifestation OR mouth lesion OR mouth manifestation OR oral pathology) AND acute lymphocytic leukemia AND (chemotherapy OR antineoplastic agents) AND children. | 0 | 34 | 1 | 134 |
A, Scielo; B, Science Direct; C, Scopus; D, PubMed/Medline.
Após busca inicial e obtenção dos resumos quatro avaliadores independentes selecionaram os trabalhos pertinentes de acordo com os critérios de inclusão e de exclusão. Estudos clínicos controlados longitudinais ou transversais que avaliaram as manifestações orais em crianças portadoras de leucemia linfocítica aguda foram incluídos na realização da revisão sistemática. Foram excluídos estudos em línguas diferentes das escolhidas primariamente, estudos in vitro, estudos em animais, revisão da literatura, relatos de caso, estudos que não apresentassem relação com a população-alvo da pesquisa ou as manifestações orais da doença.
Uma primeira etapa de seleção dos trabalhos foi feita a partir da análise dos títulos e dos resumos. Posteriormente, todos os estudos cujos títulos ou resumos foram julgados pertinentes ao tema foram obtidos na íntegra e analisados por completo. Ao final, os artigos analisados e selecionados pelos cinco avaliadores após reunião de consenso foram incluídos na sistematização dos dados.
Entre os estudos selecionados primariamente, 18 demonstraram potencial para participar da revisão sistemática. Entretanto, após análise completa dos estudos, apenas oito preencheram todos os critérios de inclusão. Entre os estudos selecionados, cinco foram realizados em países em desenvolvimento e três em países desenvolvidos. A metodologia e os resultados dos artigos estão disponíveis nas tabelas 2 e 3.
Tabela 2 Metodologia e objetivos dos estudos selecionados na pesquisa
Estudo | Objetivo | Número de pacientes/ idade/ grupos estudados | Avaliação da saúde oral | Variáveis analisadas (fatores de risco) |
---|---|---|---|---|
Subramaniam et al. (India, 2008)2 | Avaliar as manifestações orais em crianças com LLA durante o processo de quimioterapia | 58 (49 crianças do grupo estudado e 19 crianças do grupo de controle). Idades não informadas | Realizado por meio de exames intraorais | 1. Saúde oral |
2. Comparar os resultados entre os grupos estudados | ||||
3. Locais mais comuns das manifestações orais | ||||
4. Sexo | ||||
5. Fase da quimioterapia | ||||
Torres et al. (México, 2010)6 | Determinar a prevalência de manifestações bucais em pacientes pediátricos com LLA ao receber quimioterapia e avaliar fatores de risco | 49 crianças entre dois e 14 anos | Realizado através de exames intraorais | 1. Saúde oral |
2. Sexo | ||||
3. Idade | ||||
4. Tempo e tipo de tratamento | ||||
5. Fase da quimioterapia | ||||
Pels Elzbieta, et al. (Poland, 2012)7 | Avaliar o estado de higiene oral em crianças com LLA durante tratamento anticâncer | 156 (78 do grupo estudado e 78 do grupo de controle), com idades entre dois e 18 anos | Exame intraoral (índice de higiene oral simplificado (IHO-S)/ índice de placa e índice gengival). Período de exames: | 1. Higiene oral |
1° exame: um mês antes da quimioterapia; | 2. Doença gengival | |||
2° exame: de um a cinco meses a partir do início do tratamento; | 3. Comparar os resultados entre os grupos do estudo | |||
3° exame: de seis a 18 meses a partir do início do tratamento. | 4. Tratamento utilizado | |||
Sonis AL et al. (USA, 1995)8 | Avaliar a prevalência de cárie e doença periodontal em crianças portadoras de LLA, comparando três modalidades de tratamento | 64 crianças: 1° grupo (tratado por quimioterapia), 2° grupo (tratado por quimioterapia associada a 1.800 cGy craniana), 3° grupo (tratado por quimioterapia associada a 2.400 cGy craniana). Idades inferiores a cinco anos | Realizado por meio de exames intraorais(CPO-D, HIO-M, IG-M) | 1. Saúde oral |
2. Cárie dentária | ||||
3. Placa bacteriana | ||||
4. Doença gengival | ||||
5. Comparar os resultados entre os grupos do estudo | ||||
6. Tratamento utilizado | ||||
Pinto LP et al. (Brazil, 2006)9 | Avaliar os aspectos clínicos da mucosa bucal de crianças com LLA e determinar o efeito de clorexidina 0,12% na prevenção de complicações orais nesses pacientes | 33 crianças. Grupo I (23 crianças): solução oral de clorexidina 0,12%, duas vezes ao dia. Grupo II (10 crianças): não recebeu essa solução. Idades entre dois e 15 anos | Exame clínico da cavidade oral/ palpação digital da mucosa oral, e esfregaços citológicos (obtidos a partir da mucosa bucal no início da quimioterapia intensificação) | 1. Presença de mucosite |
2. Efeitos da clorexidina a 0,12% | ||||
3. Comparar os resultados entre os grupos do estudo | ||||
Soares AF et al.(Brazil, 2011)10 | Avaliação das alterações da mucosa ora e alterações qualitativas da microbiota em crianças portadoras de LLA em tratamento quimioterápico | 17 crianças, idades entre dois e 12 anos | Exame clínico da mucosa oral para a detecção de lesões orais | 1. Presença da mucosite |
2. Efeitos da clorexidina a 0,12% na microbiota oral | ||||
Williams MC.(England, 1992)11 | O objetivo deste estudo foi investigar a incidência de alterações na mucosa oral em um grupo de crianças durante os primeiros seis meses | 24 crianças (12 crianças do grupo estudado e 12 do grupo de controle). Idades não informadas | 1. Exame intraoral objetivando a avaliação da presença de manifestações orais | 1. Saúde oral |
2. Fluxo salivar | 2. Quantidade de saliva | |||
3. Quantidade de cândida | ||||
3. Presença de cândida na mucosa oral | 4. Número de neutrófilos | |||
4. Exame hematológico | Comparar os resultados entre os grupos do estudo | |||
Mendonça et al. (2012, Brazil)12 | Avaliar a associação do HVS-1, Cândida spp. e bactérias bucais sobre a gravidade da mucosite oral em crianças com LLA | 71 pacientes, idades não informadas | Exames orais objetivando a avaliação da presença de manifestações orais nas crianças | 1. Saúde oral |
2. Avaliar a presença de Candida spp. e a gravidade da mucosite nos pacientes com LLA |
Tabela 3 Resultados obtidos pelos estudos selecionados na pesquisa
Estudo | Manifestações orais mais frequentes no grupo de estudo | Locais mais frequentes das manifestações | Resultados obtidos |
---|---|---|---|
Subramaniam et al. (India, 2008)2 | Mucosite (20,6%) + comum; ulcerações (5,2%); candidíase (3,5%) | Mucosa jugal 20 (34,4%); mucosa labial 14 (24,1%); língua 13 (22,4%);palato 04(6,9%) | Todas as crianças submetidas à quimioterapia demonstraram manifestações orais mais frequentes comparadas àquelas crianças do grupo de controle. As manifestações orais são mais comuns na fase de indução |
Torres et al. (México, 2010)6 | Gengivite, 91,84%; cárie, 81,63%; mucosite, 38,77%; periodontite, 16,32%;queilite, 18,36%;herpes de repetição, 12,24%, gengivoestomatite, 2,04% outras manifestações: boca seca, palidez das mucosas, petéquias na mucosa e úlceras/ candidíase oral 6,12% | Não mencionado no estudo | Foi observado que LLA combinada à má higiene oral é fator de risco importante para o desenvolvimento da candidíase e da gengivite |
Pels Elżbieta; Blaszczak MA. (Poland, 2012)7 | O índice gengival foi superior em crianças com LLA comparado às crianças do grupo de controle | Não foi mencionado no estudo | Apesar de as crianças com LLA possuírem melhor higiene oral, maior índice de doenças gengivais foi observado em crianças sofrendo de LLA, comparado às crianças do grupo de controle sem LLA |
Sonis, AL et al. (USA, 1995)8 | Não houve diferença na presença de cárie entre crianças do grupo de controle e do grupo de teste estudado. Pacientes que receberam 2.400 cGy exibiram maior risco de desenvolver a doença periodontal comparado ao grupo de controle | Não foi mencionado no estudo | Os resultados deste estudo sugerem que crianças com LLA tratadas com quimioterapia não possuem maior risco de desenvolver cáries. Foi observado maior risco de desenvolver doença periodontal entre as crianças do grupo de teste |
Pinto LP et al. (Brazil, 2006)9 | A mucosite foi observada em seis crianças do grupo I e em oito do grupo II, e foi caracterizada pela presença de edema, eritema e úlceras | Não foi mencionado no estudo | A clorexidina demonstrou ser um agente de efeitos benéficos na diminuição das manifestações orais em crianças |
Soares AF. Et al. (Brazil, 2011)10 | A mucosite foi a manifestação oral mais frequente, afetando cinco crianças | Não mencionado no estudo | O uso profilático de gluconato de clorexidina 0,12% reduz a frequência de mucosite oral e patógenos orais em crianças com LLA sob quimioterapia |
Williams MC. (England, 1992)11 | A principal manifestação oral foi a presença de ulcerações | Não mencionado no estudo | O principal problema oral foi ulceração, que foi associada ao baixo número de neutrófilos |
Mendonça et al. (2012, Brazil)12 | Candidíase demonstrou associação com a mucosite | Não mencionado no estudo | A presença de HVS e Candida spp. está associada ao aumento de severidade da mucosite em crianças com LLA |
Em relação ao perfil dos estudos, a amostra dos participantes oscilou entre 17 e 156 crianças, sendo o tamanho da amostra total de 472 crianças com idade que variou entre dois e 18 anos. Os estudos selecionados foram publicados entre os anos de 1992 e 2012. Destes, sete apresentaram corte transversal, e apenas o estudo de Williams et al.11 possuía corte longitudinal. Todos os trabalhos selecionados tinham como objetivo principal a avaliação das complicações orais em decorrência do tratamento quimioterápico em pacientes portadores de LLA.
Nos estudos de Torres et al.6 e Subramaniam et al.2 foi avaliada a incidência das manifestações orais entre os gêneros. No estudo de Torres et al.6, de 49 crianças, 26 (53%) eram do sexo masculino e 23 (47%) do sexo feminino. Já no de Subramaniam et al.2, de 58 crianças, 37 (63,8) eram do sexo masculino e 21 (36,2%) do sexo feminino. Os autores não estabeleceram relação entre o sexo e a frequência de manifestações orais. Os demais estudos incluídos nesta revisão sistemática não avaliaram seus pacientes de acordo com o sexo. Em todos os estudos selecionados, o exame intraoral foi usado para estabelecer o diagnóstico das lesões bucais durante o tratamento quimioterápico. De todos os estudos avaliados, apenas Pells et al,7 relataram a realização do exame clínico intraoral antes do início da quimioterapia. Entre as variáveis analisadas pelos autores estavam tratamento quimioterápico, tipo de medicamentos utilizados pelas crianças com leucemia linfocítica aguda, uso do gluconato de clorexidina, higienização oral e local de moradia.
Apesar de seis2,6-9,12 dos oito artigos que fazem parte do estudo citarem as drogas utilizadas durante a quimioterapia, não se estabeleceu correlação clara entre complicações orais e tipo de droga utilizada. Pells et al,7 estabeleceram relação entre a fase da quimioterapia e complicações orais. Para os autores, as manifestações orais são mais comuns na fase de indução.
As lesões orais mais frequentes foram mucosite,2,6,9-12 candidíase,2,6,12 periodontite6-8 e gengivite.6 Os locais mais frequentes de acometimento das manifestações orais foram a mucosa oral e a mucosa labial, de acordo com o estudo de Subramaniam et al.2 As manifestações orais e locais mais frequentes dos estudos selecionados podem ser visualizadas na tabela 3.
A prevalência das manifestações bucais estava relacionada à má higienização oral6 dos pacientes e ao tratamento antineoplásico.2,8 Nos estudos selecionados nenhuma droga específica foi relacionada à presença das manifestações orais. Outro fator importante relacionado a tais manifestações foi a qualidade de vida e a classe social dos pacientes portadores de LLA.6 A presença de HVS e de Candida spp. está associada ao agravamento da mucosite em crianças com LLA.12
Os estudos selecionados nesta revisão sistemática avaliaram as manifestações orais em pacientes portadores de leucemia linfocítica aguda. Nos estudos de Torres et al.6 e Subramaniam et al.2 foi avaliada a incidência entre os gêneros, mas não se estabeleceu relação entre o sexo e a frequência de manifestações orais. Foi observado ainda que nenhum outro estudo apresentou tal relação.
No estudo de Subramaniam et al.2 manifestações bucais foram observadas em 77,8%, 36,4%, 70% e 66,7% crianças respectivamente, de acordo com os grupos subdivididos no estudo. No estudo de Torres et al.6 aproximadamente 95% dos pacientes apresentaram algum tipo de manifestação oral. Tais resultados colaboram com os achados obtidos em outros estudos.13,14
O tratamento quimioterápico pode ser diretamente tóxico e afetar a mucosa oral por meio da circulação sistêmica. Além disso, muitas vezes, ocorre à secreção pela saliva das drogas utilizadas, o que resulta na exposição do medicamento na cavidade oral.15 Contudo, entre os estudos selecionados apenas seis2,6-9,12 mencionaram as combinações medicamentosas utilizadas na quimioterapia e nenhum correlacionou diretamente as manifestações orais presentes a um tipo específico de medicamento.
Entre as drogas mais associadas às manifestações orais encontra-se teniposide, paclitaxel, metotrexato, idarrubicina, epirrubicina, doxorrubicina, cisplatina e citarabina, que estão associadas a mucosite, xerostomia, sangramento gengival e outras patologias da cavidade oral.16,17 Metotrexato, bleomicina, doxorrubicina, cisplatina, vinblastina e vincristina são drogas que produzem toxicidade direta de alguns de seus antimetabólicos, e outros agentes sintéticos como hidroxiureia e hidrocloridrato de procarbazina levam a degeneração glandular, alterações no colágeno e displasia epitelial.15,18 A combinação medicamentosa utilizada durante a quimioterapia nos estudos pode ser visualizada na tabela 4.
Tabela 4 Quimioterápicos utilizados e fases da quimioterapia
Estudo | Quimioterápicos utilizados | Fases da quimioterapia |
---|---|---|
Subramaniam et al.(India, 2008)2 | Terapia de indução: daunorubicin 30mg, vincristine 1.4 mg, L-asparaginase, methotrexate 12 mg | Quatro fases |
Terapia de indução com radioterapia: mercaptopurine 75 mg, cyclophospamide 750 mg, methotrexate 12 mg | ||
Repetição: daunorubicin 30 mg, vincristine 1.4 mg, 6.000 U L-asparaginase, methotrexate 12 mg | ||
Consolidação: mercaptopurine 75 mg, cyclophospamide 750 mg, vincristine 14 mg, cytarabine | ||
Manutenção: vincristine 1.4 mg, methotrexate 15 mg, L-asparaginase 6.000 U, daunorubicin 30 mg, prednisolone 40 mg | ||
Torres et al. (México, 2010)6 | Todos os pacientes foram tratados de acordo com o protocolo quimioterápico utilizado e tempo de tratamento: | Três fases |
0-7 semanas: consistiu em doxorubicina, vincristina, prednisona, a L-asparaginase e metotrexato | ||
7-14 semanas: consistiu em doses elevadas de metotrexato, dexametasona, arabinosid de citosina, citarabina e ciclofosfamida | ||
14 semanas a três anos: consistiu em metotrexato, 6-mercaptopurina, ciclofosfamida, citarabina ou uma combinação de terapia: prednisona, vincristina e arabinoside citosina | ||
Pels Elzbieta et al. (Poland, 2012)7 | Foi utilizado o protocolo Berlin-Frankfurt-Münster no tratamento das crianças com LLA13 | Não mencionado |
Sonis, AL et al.(USA, 1995)8 | Para o tratamento foram utilizado protocolos quimioterápicos de acordo com o estágio da neoplasia14,15 | Três fases |
Pinto LP et al. (Brazil, 2006)9 | Foi utilizado o protocolo para o tratamento da leucemia aguda proposto pela Sociedade Brasileira de Oncologia Pediátrica.16 O metotrexato foi uma das drogas utilizadas nesta terapia. O gluconato de clorexidina 0,12% foi administrado por 10 dias consecutivos, após cada infusão de metotrexato durante a quimioterapia intensificação | Não mencionado |
Soares AF. Et al.(Brazil, 2011)10 | Não mencionou as combinações utilizadas no tratamento quimioterápico | Não mencionado |
Williams MC.(England, 1992)11 | Não mencionou as combinações utilizadas no tratamento quimioterápico | Não mencionado |
Mendonça et al.(Brazil, 2012)12 | Foi utilizado o protocolo para o tratamento da leucemia aguda proposto pela Sociedade Brasileira de Oncologia Pediátrica16 | Não mencionado |
Mucosite foi a manifestação oral mais comum no estudo realizado por Subramaniam et al.2, afetando 20.6% dos pacientes portadores de leucemia. Entre as crianças que não estavam em tratamento apenas 3,4% apresentaram mucosite. Para a maioria dos pesquisadores, a mucosite é causada pelo tratamento quimioterápico e ocorre devido a um dinâmico processo, resultando na destruição das células basais. Afirmação semelhante é feita por Sonis,19 1998, que mencionava que danos ao tecido conjuntivo também eram causados pelo contato direto com os agentes antineoplásicos. No estudo de Torres et al.6 a mucosite não foi a doença mais frequente; entretanto, afetou aproximadamente 38.7% das crianças.
No estudo de Pels et al.7, apesar de as crianças com LLA terem apresentado melhor higienização oral, apresentaram mais manifestações orais que as crianças do grupo de comparação, sendo a mucosite a lesão oral mais frequente entre os pacientes tratados por quimioterápicos. Pinto et al.9 chegaram à conclusão de que uma boa higienização oral associada ao uso de 0,12% gluconato de clorexidina previne as manifestações orais em crianças com LLA, especialmente a mucosite, devido à sua capacidade de interferir na adesão microrganismos quando usado como antisséptico na cavidade oral.
O estudo de Soares et al.10 apresentou resultados semelhantes ao estudo de Pinto et al. As crianças do estudo que utilizavam gluconato de clorexidina apresentaram menos manifestações orais em relação ao grupo de comparação. Foi observada em análise microbiológica a redução de microrganismos patogênicos na cavidade oral, e a mucosite, manifestação oral mais frequente, foi observada em cinco crianças, 29,4% da amostra. Outros estudos também avaliaram o uso da clorexidina em pacientes com LLA, apresentando resultados positivos na diminuição das manifestações orais causadas pela quimioterapia.20,21
No estudo de Torres et al.6 a manifestação oral mais frequente foi a gengivite, afetando 91,84%. O alto índice de gengivite neste estudo foi relacionado, além do tratamento quimioterápico, à higiene precária dos pacientes. A fase de quimioterapia também apresentou relação com o aparecimento de gengivite. Para Subramaniam et al.,2 o índice de gengivite foi inferior, com índice menor que 2% entre os pacientes. Tal diferença pode ser causada pela melhor higienização oral das crianças participantes dos estudos de Subramaniam et al.,2 que corroboram os achados de Trindade et al.14 ao afirmarem que a higiene oral deve ser incentivada em qualquer fase do tratamento, visto que pacientes com cuidadosa higiene oral podem prevenir manifestações orais e sistêmicas.
O estudo de Sonis et al.8 chegou à conclusão de que pacientes com LLA em tratamento com quimioterápicos possuem a mesma possibilidade de apresentar cárie que as crianças do grupo de controle. Para os autores, a presença de cárie, quando diagnosticada, estava relacionada à má higienização oral dos participantes. Tais resultados contribuem com os achados de Sepet et al.,22 que avaliou a presença de cárie entre crianças na fase de manutenção da quimioterapia e um grupo de crianças saudáveis, também não havendo correlação entre a presença de cárie e o uso dos medicamentos quimioterápicos.
A gengivoestomatite herpética primária foi de 2.04% e o herpes recorrente foi de 12,24% entre os pacientes do estudo de Torres et al.6 A presença de herpes nesse estudo pode ser causada pela baixa imunidade dos participantes associada à fácil exposição ao vírus. Tal resultado contribui com outros estudos que também relatam a presença de estomatite herpética em crianças com LLA.23,24
No estudo longitudinal de Williams et al.11 todos os pacientes apresentaram ulcerações na mucosa oral. Já a candidíase oral foi observada em 10% dos exames realizados durante o período de estudo. A presença da patologia foi relacionada ao baixo número de neutrófilos dos pacientes leucêmicos associado ao baixo fluxo salivar causado pela quimioterapia. No estudo de Mendonça et al.,12 a candidíase oral também foi associada à presença e à gravidade da mucosite, sendo sugerida a profilaxia antifúngica em pacientes com LLA que apresentem mucosite. Essa mesma sugestão foi feita no estudo de Pinho et al. em 2010.25 Outras manifestações orais encontradas nos estudos foram xerostomia, sangramento gengival, eritema oral, odontalgia e estomatite herpética primária.
A condição de saúde bucal dos portadores de leucemia linfócitica aguda varia conforme um conjunto de fatores. Osresultados dos estudos identificaram que grande parte dos pacientes com LLA apresentam alguma lesão na cavidade oral durante ou após o início da quimioterapia. Ao cirurgião dentista compete reconhecer as lesões e intervir na saúde bucal desses pacientes, e dessa forma contribuir para o tratamento e a melhoria da qualidade de vida dos mesmos. A realização de novos estudos torna-se necessária para melhor elucidação do assunto, principalmente no que diz respeito à prevenção e ao controle dessas manifestações orais.