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Maternal depressive symptoms during immediate postpartum: associated factors

Maternal depressive symptoms during immediate postpartum: associated factors

Autores:

Marcela Muzel Poles,
Ana Paula Pinho Carvalheira,
Maria Antonieta de Barros Leite Carvalhaes,
Cristina Maria Garcia de Lima Parada

ARTIGO ORIGINAL

Acta Paulista de Enfermagem

Print version ISSN 0103-2100On-line version ISSN 1982-0194

Acta paul. enferm. vol.31 no.4 São Paulo July/Aug. 2018

http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201800050

Resumen

Objetivo

Investigar la prevalencia y factores de riesgo para síntomas depresivos maternos en el período inmediatamente posterior al parto.

Métodos

Estudio transversal realizado con 1099 parturientas. La presencia de síntomas depresivos maternos se logró con la escala de Depresión Postnatal de Edimburgo, aplicada en el segundo día después del parto, adoptándose como punto de corte la puntuación de ≥10. Se recogieron datos en Botucatu-SP, en el período de enero a junio de 2012. Los factores asociados a los síntomas depresivos fueron investigados inicialmente por regresión logística múltiple y los asociados a nivel de p<0,20 se incluyeron en el modelo de regresión final, teniendo en cuenta el nivel crítico de significancia p<0,05 con un intervalo de confianza del 95%. Este estudio fue aprobado por el Comité de Ética en Investigación y contempló las recomendaciones para investigaciones con seres humanos.

Resultados

La prevalencia de síntomas depresivos fue del 6,7%. El uso de medicación antidepresiva en la gestación, violencia sufrida en la gestación y cesárea, se asociaron a síntomas depresivos en el puerperio inmediato en dos, cuatro y dos veces, respectivamente.

Conclusión

Se debe prestar especial atención a las mujeres usuarias de medicamentos antidepresivos, a las que han sufrido violencia durante el embarazo y a las que han tenido una cesárea, ya que estos eventos fueron identificados como factores de riesgo para síntomas depresivos.

Palabras-clave: Periodo posparto; Depresión; Epidemiología analítica; Factores de riesgo

Introdução

Os períodos pré e pós-parto têm sido particularmente identificados como aqueles que compõem fase da vida da mulher onde o risco de apresentar algum transtorno mental é maior. Ao tornar-se mãe, a mulher deixa suas atividades sociais (algumas formas de lazer ou trabalho, atividades anteriormente praticadas e que podem ter sua frequência reduzida após o nascimento do filho) para cuidar da criança e esse fato, aliado à adaptação aos novos papeis exigidos, pode gerar demanda psicológica individual nas relações e nos recursos existentes. Também, certa instabilidade emocional é natural às transições da vida e adaptações às mudanças, sendo o processo de gravidez, parto e nascimento de um filho importante momento de transição.(1) Destaca-se que um terço das mulheres que desenvolvem sintomas depressivos no puerpério mantém o quadro além do primeiro ano após o parto.(2)

Entre os transtornos mentais que acometem a mulher no ciclo gravídico-puerperal, a depressão é o principal: sua prevalência é de 10% durante a gravidez e 13% após o parto em mulheres de países de alta renda. Nos países em desenvolvimento as taxas são ainda maiores: 15,6% durante a gravidez e 19,8% após o parto.(3) Assim, a depressão tanto em países subdesenvolvidos quanto em países em desenvolvimento, constituem problema relevante.(4)

Na atualidade, há entendimento de que a depressão pós-parto possa ser a continuidade da depressão pré-parto e que quanto mais precocemente o estado for identificado, maiores as chances de intervenções que reduzam seu impacto negativo. Evidências demonstram que a depressão pré-parto é o principal fator de risco para depressão pós-parto, sendo esta, muitas vezes, continuação da depressão iniciada na gestação.(5) É importante ressaltar que a depressão no ciclo gravídico-puerperal pode gerar consequências graves para a mulher, família e criança, sendo esta tanto na formação do feto, quanto no vínculo mãe-bebê e consequente prejuízo no seu desenvolvimento, o que evidencia a importância dos sintomas depressivos serem investigados na assistência pré-natal.(6)

Entre os fatores de risco para o surgimento de quadros depressivos (pré e pós-parto) já identificados na literatura, encontram-se: história pregressa de depressão; ausência de suporte social, familiar ou marital; gravidez não desejada; estresse extremo e ansiedade; dependência de álcool, tabaco ou outras drogas; história de violência doméstica e situação de pobreza. Grande parte das pesquisas admitem que tais fatores atuam inter-relacionados na gênese da depressão. De modo geral, os fatores de risco associados à depressão no ciclo gravídico-puerperal em países em desenvolvimento foram os mesmos encontrados nos países desenvolvidos, com exceção de alguns relativos a contextos economicamente desfavoráveis, como baixa escolaridade, desemprego, dificuldades financeiras e violência, que foram predominantes nos estudos em países de baixa renda.(3,5,7,8)

Diante do exposto, o objetivo do presente estudo é investigar a prevalência e fatores de risco para sintomas depressivos maternos no puerpério imediato. Acredita-se que as respostas poderão orientar ações na atenção pré-natal e ao parto no nível local e irão ampliar o entendimento desse importante aspecto de saúde na atualidade.

Métodos

Estudo epidemiológico e transversal. Os dados são provenientes de um estudo maior “O binômio mãe-filho em Botucatu: estudo epidemiológico com ênfase na morbimortalidade materna e infantil”.

O estudo foi realizado em Botucatu, município situado na região centro-sul do estado de São Paulo, que conta com população estimada para 2018 de 138.590 habitantes e faz parte do Departamento Regional de Saúde VI (DRS VI), Bauru, com outros 67 municípios. Em 2016, nasceram vivos neste município 1735 crianças, a taxa de mortalidade infantil municipal era de 12,6 por mil nascidos vivos, aproximadamente metade da população (47,2%) possuía emprego formal na área de serviços e o rendimento médio mensal dos trabalhadores nessa área era de R$ 3.458,30. A cidade tem índice de desenvolvimento humano (IDH) de 0,800, que é superior ao do estado (IDH=0,783).(9)

A coleta de dados foi realizada nas maternidades dos dois hospitais do município, sendo um público e outro pertencente à rede de saúde suplementar, no período de janeiro a junho de 2012. A população de interesse eram as puérperas (N=1395) que tiveram filhos em Botucatu nesse período. A amostra foi selecionada por conveniência, sem o cálculo do número mínimo necessário, uma vez que se pretendia captar, no período estabelecido, todas as puérperas. O único critério de inclusão foi ter o parto realizado em uma das duas maternidades do município. Por impossibilidade de contato antes da alta hospitalar, das 1395 foram contatadas 1317 puérperas e, destas, excluíram-se 22 casos de gestação gemelar e 196 casos com dados incompletos sobre variáveis relativas à mãe e/ou bebê, resultando em amostra intencional de 1099 puérperas incluídas nesse estudo.

Os dados foram obtidos durante visita às maternidades no puerpério imediato, no segundo dia após o parto, a partir dos prontuários, anotações da sala de parto, cartão de pré-natal e por entrevista com as puérperas, após assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Utilizou-se para coleta de dados, instrumentos especificamente construídos para a pesquisa “mãe”.

As variáveis de exposição incluíram dados sociodemográficos maternos: idade no parto (anos), cor da pele autorreferida (branca, não branca), ensino fundamental completo ou mais (sim, não) e presença de companheiro (sim, não); história obstétrica: número de gestações, partos, abortos e filhos nascidos vivos prévios; peso pré-gestacional (quilogramas); problema de saúde anterior à gestação (sim, não); dados da gestação atual: idade gestacional na primeira consulta pré-natal e no parto (semanas), acompanhamento pré-natal (sim, não), número de consultas pré-natais, gestação planejada (sim, não) e gestação classificada como de risco (sim, não); presença na gestação de: tabagismo (sim, não), uso de álcool (sim, não), uso de drogas ilícitas (sim, não), violência sofrida na gestação (sim, não), uso de medicação antidepressiva auto relatada (sim, não) e doença intercorrente na gestação (sim, não); via de parto (parto vaginal, cesariana); intercorrência no parto (sim, não) e peso do recém-nascido ao nascer (gramas). A variável de desfecho foi presença de sintomas depressivos (sim, não).

A aferição de sintomas depressivos e sua posterior classificação foram realizadas com a Escala de Depressão Pós-natal de Edimburgo (Edinburgh Postnatal Depression Scale - EPDS). Trata-se de escala que pode ser aferida por entrevista ou autoaplicável, mede a presença e intensidade de sintomas depressivos nos sete dias anteriores à coleta de dados. Foi aplicada a partir de entrevista, em conjunto com as demais questões contidas nos instrumentos utilizados pelas entrevistadoras. O resultado da aplicação da EPDS pode variar de zero (melhor situação) a 30 (pior situação). Diversos estudos apontam o escore ≥10 como valor preditivo positivo na triagem da depressão, e este valor foi adotado no presente estudo.(10-12)

Para avaliação dos fatores associados aos sintomas depressivos maternos realizou-se regressão logística múltipla, com todas as variáveis de interesse. Em seguida, as variáveis mais fortemente associadas (p<0,20) foram incluídas em um segundo modelo múltiplo final, quando se adotou p<0,05 para considerar associação entre exposição e desfecho. Relações foram consideradas estatisticamente significativas se p<0,05, adotando-se Intervalo de Confiança (IC) de 95%. A análise foi realizada com o software SPSS v 21.0.

Este estudo seguiu as recomendações da Resolução 466/12 e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina de Botucatu da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (CAAE 65750817.0.0000.5411, Parecer de Aprovação: 1.997.274). As mulheres com escore ≥10 na EPDS foram atendidas na rotina da atenção básica, com possibilidade de encaminhamento para serviço especializado quando necessário.

Resultados

A prevalência de sintomas depressivos entre as puérperas do estudo foi de 6,7% (74 puérperas), sendo o escore máximo obtido na EPDS 26, um único caso. A idade materna mediana foi de 26 anos (13-48 anos); a mediana do número de gestações prévias, partos e filhos nascidos vivos foi 1 (0-9); o número mediano de consultas de pré-natal foi 9 (1-20) e o peso mediano do recém-nascido ao nascer foi 3190 gramas (880-5210 gramas), conforme demonstrado na tabela 1.

Tabela 1 Características maternas e dos recém-nascidos incluídos no estudo 

Características Mediana (mínimo-máximo)
Idade no parto (anos) 26(13 - 48)
Número de gestações prévias 1(0 - 9)
Número de partos prévios 1(0 - 9)
Número de abortos prévios 0(0 - 5)
Número de filhos nascidos vivos previamente 1(0 - 9)
Peso pré-gestacional (quilogramas) 62(40- 145)
Idade gestacional (semanas) na 1a consulta pré-natal 9(5 - 40)
Número de consultas pré-natais 9(1 - 20)
Idade gestacional (semanas) no parto 38(26 - 42)
Peso do recém-nascido ao nascer (gramas) 3190(880 - 5210)
Variáveis n(%)
Cor da pele autorreferida
Branca 851(77,4)
Não branca 248(22,6)
Ensino fundamental completo ou mais
Sim 888(80,8)
Não 211(19,2)
Presença de companheiro
Sim 934(85,0)
Não 165(15,0)
Gestação planejada
Sim 488(44,4)
Não 611(55,6)
Realização de pré-natal
Sim 1094(99,5)
Não 5(0,5)
Problema de saúde prévio à gestação
Sim 588(53,5)
Não 511(46,5)
Gestação classificada como de risco
Sim 392(35,7)
Não 707(64,3)
Tabagismo na gestação
Sim 137(12,5)
Não 962(87,5)
Uso de álcool na gestação
Sim 41(3,7)
Não 1058(96,3)
Uso de drogas ilícitas na gestação
Sim 5(0,5)
Não 1094(99,5)
Violência sofrida na gestação
Sim 13(1,2)
Não 1086(98,8)
Uso de medicação antidepressiva na gestação
Sim 30(2,7)
Não 1069(97,3)
Doença intercorrente na gestação
Sim 252(22,9)
Não 847(77,1)
Via de parto
Parto vaginal 514(46,8)
Cesariana 585(53,2)
Intercorrência no parto
Sim 206(18,7)
Não 893(81,3)

A maioria das puérperas possuía ensino fundamental completo ou mais e possuía companheiro. Quase a totalidade (99,5%) havia feito pré-natal e mais da metade referiu algum problema de saúde durante a gestação. Foram classificadas como gestantes de risco 35,7% das participantes do estudo. O tabagismo esteve presente em 12,5% das gestantes e o consumo de álcool em 3,7% delas. Usaram drogas ilícitas e sofreram violência na gestação aproximadamente 1% das puérperas. O nascimento do recém-nascido por cesariana ocorreu em 53,2% dos casos (Tabela 1).

Fatores associados a presença de sintomas depressivos maternos constam da tabela 2. Cor da pele, uso de medicação antidepressiva na gestação, peso pré-gestacional, realização de pré-natal, violência sofrida na gestação, idade gestacional no parto e nascimento por cesariana foram as variáveis selecionadas para serem incluídas no modelo de regressão logística múltipla final (Tabela 3), pois foram as variáveis mais fortemente associadas aos sintomas depressivos no puerpério imediato (p<0,20).

Tabela 2 Regressão logística múltipla das variáveis sociodemográficas, relativas à história obstétrica e clínica, considerando-se o desfecho sintomas depressivos maternos 

Variáveis OR IC95% p-value
Idade no parto (anos) 1,01 0,96 1,05 0,816
Cor da pele branca 1,52 0,87 2,65 0,139
Ensino fundamental completo ou mais 1,15 0,56 2,33 0,703
Presença de companheiro 0,87 0,42 1,80 0,710
Número de gestações prévias 1,66 0,61 4,52 0,324
Número de partos prévios 0,83 0,42 1,64 0,594
Número de abortos prévios 1,03 0,38 2,76 0,958
Número de filhos nascidos vivos previamente 0,85 0,32 2,30 0,753
Peso pré-gestacional (quilogramas) 1,01 1,00 1,03 0,097
Problema de saúde prévio à gestação 1,00 0,56 1,79 1,000
Doença intercorrente na gestação 0,92 0,44 1,94 0,834
Uso de medicação antidepressiva na gestação 3,68 1,45 9,30 0,003
Idade gestacional (semanas) na 1ª consulta pré-natal 1,03 0,98 1,08 0,244
Gestação planejada 1,21 0,71 2,09 0,481
Realização de pré-natal 0,17 0,02 1,71 0,134
Número de consultas de pré-natal 0,94 0,84 1,05 0,277
Gestação classificada como de risco 0,71 0,37 1,38 0,310
Tabagismo na gestação 1,24 0,59 2,62 0,572
Uso de álcool na gestação 0,88 0,27 2,89 0,839
Uso de drogas ilícitas na gestação 2,92 0,21 41,49 0,429
Violência sofrida na gestação 4,36 1,03 18,44 0,045
Idade gestacional (semanas) no parto 0,91 0,80 1,04 0,177
Cesariana 2,58 1,43 4,65 0,002
Intercorrência no parto 0,71 0,36 1,38 0,308

Tabela 3 Modelo de regressão logística múltipla final entre variáveis sociodemográficas, clínicas e obstétricas e sintomas depressivos maternos. 

Variáveis OR IC95% p-value
Cor da pele branca 1,63 0,97-2,76 0,068
Uso de medicação antidepressiva na gestação 2,07 1,12-3,61 0,010
Peso pré-gestacional (quilogramas) 1,01 0,99-1,02 0,206
Realização de pré-natal 0,19 0,02-1,81 0,149
Violência sofrida na gestação 4,06 1,02-16,19 0,047
Idade gestacional (semanas) no parto 0,91 0,82-1,01 0,086
Cesariana 2,07 1,22-3,53 0,007

A tabela 3 é relativa ao modelo de regressão logística múltipla final. De maneira independente, uso de medicação antidepressiva na gestação, sofrer violência na gestação e ser submetida à cesariana se associaram à presença de sintomas depressivos maternos. Usar medicação antidepressiva aumentou em duas vezes (OR=2,07, IC 95%=1,12-3,61); sofrer violência na gestação aumentou em quatro vezes (OR=4,06, IC 95%=1,02-16,19) e evoluir para cesariana aumentou em duas vezes (OR=2,07, IC 95%=1,22-3,53) as chances de sintomas depressivos no puerpério imediato.

Discussão

O presente estudo investigou a ocorrência de sintomas depressivos em puérperas, as quais foram avaliadas dois dias após o parto, por meio de instrumento consistente, validado e de ampla utilização na literatura. Adotando o ponto de corte ≥10, 6,7% das puérperas apresentaram sintomas depressivos. Como na EPDS os sintomas depressivos referem-se aos sete dias que antecedem a aplicação e a referida escala foi usada durante a internação para o parto, com aplicação no segundo dia de puerpério, avaliou-se a prevalência de sintomas depressivos no puerpério imediato. Eventualmente, tais sintomas podem ser a continuidade de outros semelhantes, ocorridos na gestação ou mesmo em fases anteriores da vida, como as pesquisas de Pereira et al., Ghaedrahmati et al. e Faisal-Cury et al. permitem supor.(5,13,14)

Identificaram-se três fatores associados de modo independente a maior chance de sintomas depressivos: uso de medicação antidepressiva na gestação, sofrer violência na gestação e nascimento do filho por cesariana. Considerando que é comum o sub-diagnóstico de depressão gestacional e que há relutância na prescrição e uso de medicamentos nesse período,(15) é possível que as puérperas que usaram medicação antidepressiva no pré-natal sejam aquelas que apresentaram sintomas depressivos anteriores à gestação, desde o início da gravidez ou com maior gravidade. Porém, foi investigado o uso de antidepressivo na gestação, sem abordar o uso prévio, o que constitui limitação deste estudo.

O American College of Obstetricians and Gynecologists advoga que as obstetrizes investiguem sistematicamente estressores psicossociais e depressão a cada trimestre gestacional e no pós-parto, e atuem com o necessário cuidado, em casos positivos.(16) Na principal política pública materno infantil vigente, a Rede Cegonha, aponta-se o período pós-parto como fundamental para detecção de problemas em relação a situações que podem levar à depressão e que demandem acompanhamento clínico.(17)

Na literatura científica tem sido encontrada associação entre transtorno de saúde mental durante a gestação e ocorrência de depressão pós-parto: Ghaedrahmati et al. em revisão de literatura entre os anos 2000 e 2015, apontou que a história anterior de depressão e ansiedade estavam entre os fatores mais fortemente associados à depressão pós-parto.(13) Faisal-Cury et al. em estudo realizado com 831 mulheres na cidade de São Paulo, encontrou risco de depressão pós-parto 2,4 vezes maior entre mulheres que apresentaram depressão pré-parto.(14) Tais estudos reforçam a importância da avaliação precoce das puérperas para rastreamento de sintomas depressivos. Ainda nesse contexto, em estudo realizado no Rio Grande do Sul em 2013, aplicou-se a EPDS até dois dias após o parto e estabeleceu-se ponto de corte ≥10. Os sintomas depressivos pós-parto foram significativamente associados à depressão em algum momento da gestação ou à tristeza durante o último trimestre da gravidez, o que corrobora com os achados dessa pesquisa e apoia o rastreamento sistemático de depressão na atenção pré-natal e em maternidades.(18,19)

A violência sofrida na gestação apareceu como determinante negativo para sintomas depressivos no puerpério imediato, aumentando o reconhecimento já presente na literatura das graves consequências para a mulher e o bebê da violência na gravidez. Pesquisa japonesa apontou que tanto a violência física, quanto a violência verbal são determinantes causais para o desenvolvimento de sintomas depressivos nas mães durante a gestação, ressaltando a importância dos enfermeiros em identificarem a violência durante seus atendimentos com gestantes, e realizarem oportuno encaminhamento para apoio psicossocial, como forma de prevenir os sintomas depressivos no pré e pós-parto(19) e também de reduzir suas repercussões negativas sobre o binômio mãe-filho.

Estudo realizado na Tanzânia com 1013 mulheres apontou que uma em cada três foram expostas à violência por parceiros íntimos durante a gestação, o que contribuiu para a estreita associação ao desenvolvimento da depressão pós-parto. A exposição à violência doméstica pelo menos uma vez aumentou o risco de depressão pós-parto em mais de três vezes.(20) Resultado semelhante foi obtido em Bangladesh, em estudo no qual mais da metade das mulheres que sofreram violência física, sexual ou psicológica durante a gravidez desenvolveram depressão pós-parto.(21) Pesquisa indiana também encontrou relação entre exposição à violência por parte do parceiro no puerpério imediato, depressão pós-parto e ideação suicida.(22)

Outro fator associado aos sintomas depressivos no presente estudo foi ter sido submetida à cesariana, situação que aumentou em duas vezes a chance de escore ≥10 na EPDS. Esse resultado, ainda que difícil de explicar completamente, também encontra respaldo na literatura: revisão sistemática apontou a cesariana como fator de risco para sintomas depressivos pós-parto, sendo a hipótese explicativa o trauma cirúrgico ou os problemas que levaram à indicação da cirurgia, como a dor pélvica, a disfunção gastrointestinal, entre outros, todos potencialmente capazes de afetar o estado psicológico materno.(23) Recente estudo realizado na Califórnia, com 223 mulheres, expos que participantes que deram à luz por parto vaginal apresentaram quase metade da chance de terem sintomas depressivos pós-parto quando comparadas àquelas que sofreram cesariana.(24) O estudo mais próximo do presente foi realizado na Itália, com 950 mulheres avaliadas com a EPDS no segundo dia após o parto e adotando o mesmo ponto de corte da presente pesquisa, e este também identificou associação positiva entre cesariana e sintomas depressivos.(25)

A análise realizada e o resultado obtido são relevantes, em especial face a elevada taxa de cesarianas no Brasil. É difícil avaliar a direção da associação, pois tanto sintomas depressivos prévios ao parto podem favorecer a cesariana quanto o inverso, ou seja, a cesariana pode desencadear sintomas depressivos na mulher.(23) Apenas com estudos prospectivos a temporalidade dessa relação poderá ser melhor conhecida.

Comparar a prevalência de sintomas depressivos maternos obtida em Botucatu com os resultados reportados por outros autores é tarefa difícil, uma vez que nos estudos podem ser utilizados instrumentos de aferição e/ou pontos de corte diferentes, bem como variação no tempo de aferição dos sintomas. Além disso, há de se levar em conta que fatores socioculturais podem ser importantes e refletirem nos resultados dos estudos. Ainda assim, merecem ser apresentados alguns resultados de pesquisas.

Em 2014, pesquisa realizada na Espanha e França, encontrou alta taxa, 39,3% de depressão pós-parto, porém, apesar de adotar o mesmo instrumento de coleta de dados utilizado no presente estudo, o ponto de corte foi mais alto (≥12) e a aplicação do instrumento foi realizada quatro semanas após o parto.(4) É possível que diferenças nas características da amostra possam ser a principal causa da diferença de prevalência entre esses resultados.

Revisão de literatura que incluiu estudos desenvolvidos em nove países, inclusive no Brasil, apontou taxa de depressão pós-parto muito variada: 4,9% no Nepal, com aplicação da EPDS entre cinco e dez semanas após o parto e ponto de corte >12 e 59,4% na Índia, com aplicação a partir de seis meses após o parto e com ponto de corte para a mesma escala ≥10.(26)

Estudo brasileiro realizado em Minas Gerais encontrou prevalência de depressão pós-parto de 26,9% também utilizando ponto de corte ≥10,(12) enquanto outro, realizado em Bauru, interior de São Paulo, utilizou ponto de corte 12 e obteve prevalência de 29,5%.(27) Faisal-Cury et al., encontrou prevalência de 15,9%, sendo a coleta de dados no décimo dia de puerpério e adotando o Beck Depression Inventory como instrumento de aferição da depressão.(28)

As duas pesquisas mais próximas do presente estudo encontraram prevalências maiores: em hospital público no município de São Paulo, aplicando a EPDS no segundo ou terceiro dia de puerpério e o mesmo ponto de corte (≥10), a prevalência foi 18%(29) e no município de Rio Grande/RS, com a mesma escala e ponto de corte, a prevalência foi de 14%, sendo a medida realizada no segundo dia de puerpério.(18)

Pelo exposto, a comparação da prevalência obtida em Botucatu com outras encontradas no Brasil e no exterior deve ser feita com cautela, tendo em vista as diferenças relativas ao momento de avaliação, escala utilizada e ponto de corte adotado.

Mesmo com prevalência mais baixa que outros estudos, constatar que 6,7% das puérperas apresentaram sintomas depressivos é relevante e justifica a atenção das equipes de maternidade, pelo potencial impacto negativo sobre os cuidados iniciais à criança. O uso da EPDS no puerpério imediato remete aos sintomas depressivos vivenciados pelas mulheres em um período delicado, que inclui os últimos dias da gestação e os primeiros dias de vida do bebê. Desta forma, reconhecer a presença de sintomas depressivos e os fatores associados, ainda na maternidade, pode resultar em ações preventivas à depressão por parte da equipe de saúde no pós-parto.

Não foi possível identificar o momento de início dos sintomas depressivos e avaliar o uso de antidepressivo na gestação ou anteriormente a ela, uma vez que não houve acompanhamento das mulheres na gestação, limitação inerente ao desenho transversal adotado. Também vale apontar que, embora exista um quadro conhecido como tristeza puerperal ou baby blues, com sintomas semelhantes aos da depressão, ao avaliar as mulheres no segundo dia de puerpério, as chances de ter-se identificado esse quadro e não os sintomas depressivos que de fato eram o foco do presente estudo são pequenas, visto que o baby blues tem início entre três e quatro dias pós-parto.(30)

Conclusão

A prevalência de sintomas depressivos no puerpério imediato foi de 6,7%. Puérperas que fizeram uso de medicação antidepressiva na gestação, sofreram algum tipo de violência na gestação ou foram submetidas à cesariana apresentam maiores chances de sintomas depressivos. Considerando esses resultados, mulheres com essas características devem receber atenção especial das equipes de saúde de maternidade.

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