versão impressa ISSN 0066-782X
Arq. Bras. Cardiol. vol.104 no.2 São Paulo fev. 2015 Epub 09-Dez-2014
https://doi.org/10.5935/abc.20140190
Distúrbios da motilidade do intestino proximal no infarto agudo do miocárdio podem desencadear sintomas digestivos como náuseas e vômitos. O infarto do miocárdio ocasiona retardo do esvaziamento gástrico (EG) de líquido em ratos.
Investigar se existe a influência do nervo vago (VGX), adrenoreceptores α-1, receptores GABAB do sistema nervoso central e participação do núcleo paraventricular (NPV) do hipotálamo no esvaziamento gástrico (EG) e complacência gástrica (CG) em ratos infartados.
Ratos Wistar (n = 8-15) foram divididos em: grupo infarto (INF), sham (SH) e subdivididos. O infarto foi realizado por ligadura da artéria coronária descendente anterior. A complacência gástrica foi estimada com curvas pressão-volume. Realizada vagotomia por secção dos ramos dorsal e ventral. Para verificar a ação dos receptores GABAB foi injetado baclofeno por via intra ventrículo-cerebral. Simpatectomia química foi realizada com prazosina intravenosa (iv), e na lesão do núcleo paraventricular do hipotálamo foi utilizada corrente elétrica de 1mA/10s, com esvaziamento gástrico determinado por medição da retenção gástrica (% RG) de uma refeição salina.
Não houve diferença significativa na CG. A vagotomia (VGX) reduziu significativamente a %RG; no grupo INF, o tratamento intra ventrículo-cerebral (ivc) com baclofeno reduziu significativamente a % RG; não houve conclusivamente envolvimento dos receptores GABAB em retardar o EG; o tratamento intravenoso com prazosina reduziu significativamente a %RG no grupo INF. A lesão do NPV aboliu o efeito do infarto do miocárdio no EG.
O nervo vago, receptores α-adrenérgicos e núcleo paraventricular estão envolvidos no retardo do esvaziamento gástrico no infarto agudo do miocárdio em ratos.
Palavras-Chave: Ratos; Esvaziamento Gástrico; Infarto do Miocárdio; Núcleos da Linha Média do Tálamo; Receptores de GABA; Motilidade Gastrointestinal
In pathological situations, such as acute myocardial infarction, disorders of motility of the proximal gut can trigger symptoms like nausea and vomiting. Acute myocardial infarction delays gastric emptying (GE) of liquid in rats.
Investigate the involvement of the vagus nerve, α 1-adrenoceptors, central nervous system GABAB receptors and also participation of paraventricular nucleus (PVN) of the hypothalamus in GE and gastric compliance (GC) in infarcted rats.
Wistar rats, N = 8-15 in each group, were divided as INF group and sham (SH) group and subdivided. The infarction was performed through ligation of the left anterior descending coronary artery. GC was estimated with pressure-volume curves. Vagotomy was performed by sectioning the dorsal and ventral branches. To verify the action of GABAB receptors, baclofen was injected via icv (intracerebroventricular). Intravenous prazosin was used to produce chemical sympathectomy. The lesion in the PVN of the hypothalamus was performed using a 1mA/10s electrical current and GE was determined by measuring the percentage of gastric retention (% GR) of a saline meal.
No significant differences were observed regarding GC between groups; vagotomy significantly reduced % GR in INF group; icv treatment with baclofen significantly reduced %GR. GABAB receptors were not conclusively involved in delaying GE; intravenous treatment with prazosin significantly reduced GR% in INF group. PVN lesion abolished the effect of myocardial infarction on GE.
Gastric emptying of liquids induced through acute myocardial infarction in rats showed the involvement of the vagus nerve, alpha1- adrenergic receptors and PVN.
Key words: Rats; Gastric Emptying; Myocardial Infarction; Midline Thalamic Nuclei Receptors; GABA; Gastrointestinal Motility
O processo de esvaziamento gástrico (EG) resulta da ação dos mecanismos que inibem ou estimulam a atividade motora do estômago, do piloro e do duodeno. O sistema nervoso central conecta-se com o sistema nervoso entérico através do nervo vago e do sistema nervoso simpático, que participam no controle do EG1. O nervo vago controla o movimento do alimento através do trato digestivo. Se este estiver danificado, os músculos do estômago e intestinos não funcionam normalmente e o transporte de alimentos é retardado ou para completamente.
O complexo vagal dorsal é formado pelo núcleo do trato solitário com neurônios que recebem informações aferentes, área postrema e núcleo dorsal do vago, onde os neurônios motores estimuladores e inibidores estão localizados, sendo os axônios eferentes as vias do nervo vago2. O complexo vagal dorsal é mais influenciado por estruturas superiores, tais como o núcleo paraventricular (NPV) do hipotálamo o qual, sob certas condições, podem modificar a motilidade gástrica e o EG2-4. Em ratos, os receptores GABAB estão localizados nas terminações aferentes pré-sinápticas do vago que se projeta para o núcleo do trato solitário5.
Os receptores GABAB pré-sinápticos estão envolvidos na regulação da liberação de neurotransmissores, uma vez que o efeito de (um agonista desses receptores) é o de reduzir a liberação de transmissores sinápticos estimuladores e inibidores6,7. Em situações patológicas, como infarto agudo do miocárdio, distúrbios da motilidade do intestino proximal podem desencadear sintomas como náusea e vômito8
Estudos experimentais sobre a associação entre infarto do miocárdio e esvaziamento gástrico9,10 são muito raros, e um estudo10 considerou que o retardo do esvaziamento gástrico pode ser devido ao estresse causado pela isquemia. No entanto, os mecanismos subjacentes de esvaziamento gástrico retardado não foram abordados. Portanto, o presente estudo teve como objetivo determinar o envolvimento de mecanismos neurais relacionados ao retardo do esvaziamento gástrico.
Ratos Wistar machos (n = 8-15) foram utilizados para realizar essa experiência, pesando 220-300 g, fornecidos pelo Biotério Central da Universidade Estadual de Campinas.
O protocolo do estudo foi aprovado pelo SBCAL (Sociedade Brasileira de Ciência em Animais de Laboratório) (www.ib.unicamp.br/ceea/principios) (Protocolo n º 1021-2).
Os ratos tiveram um período de adaptação de quatro semanas para as condições de laboratório com temperatura controlada (22-26ºC) e ciclo de luz artificial de 12 horas e água fornecida ad libitum. Em procedimentos cirúrgicos como uma vagotomia ou implantação de cânula no ventrículo lateral do cérebro ou lesão eletrolítica do núcleo paraventricular, os ratos foram sedados previamente com injeção intraperitoneal (ip) de 75 mg tiopental/kg. Após os procedimentos ou o estudo, os animais foram mantidos em gaiolas individuais e também receberam água e ração ad libitum. A fim de estudar a CG, os animais foram anestesiados com administração ip de cetamina (85 mg/kg) + xilazina (10 mg/kg).
As drogas prazosina (PRA) e baclofeno (BAC) (ambos Sigma, EUA) foram diluídas no momento do estudo, utilizando solução salina estéril como veículo (V).
O infarto do miocárdio foi induzido por ligadura da artéria coronária descendente anterior, de acordo com a técnica recomendada por Johns e Olson11. Os ratos foram anestesiados com éter e uma toracotomia foi executada. Através de uma leve pressão aplicada ao hemitórax direito, o coração foi exposto e uma ligadura foi colocada ao redor da artéria coronária esquerda proximal em seu segmento proximal, entre o cone da artéria pulmonar e o ápice do átrio esquerdo. Apenas os animais com grande área de infarto foram considerados para o estudo, afetando 40% ou mais de toda a área do ventrículo esquerdo. Vinte e quatro horas após o procedimento cirúrgico foram realizados estudos de avaliação da complacência gástrica (CG), vagotomia, intra ventrículo-cerebral com GABAB, tratamento intravenoso com prazosina e lesões eletrolíticas do núcleo paraventricular.
A fim de medir a CG, os ratos foram divididos em três grupos 24 horas antes: os ratos foram submetidos ao infarto do miocárdio (INF), e também ao infarto simulado ou sham (SH) e sem tratamento (NA). Apenas os grupos INF e o SH foram usados para determinar o EG. Os ratos em todos os grupos foram submetidos a jejum e o EG ou a CG foram avaliados 24 horas após a formação desses grupos, entre as 14:00-17:00 horas, com acesso a água interrompido uma hora antes do teste.
Com o objetivo de medir a CG, foi utilizada a técnica descrita por Bustorff-Silva e cols.12. Em resumo, foram realizados os seguintes procedimentos em ratos anestesiados: traqueostomia, incisão abdominal, a ligadura do piloro, fixação do esôfago distal de um tubo orogástrico de polietileno preenchido com solução salina e conectado através de um registro de três vias a uma bomba de infusão (modelo LF 2001 Lifemed, Brasil) e um monitor de pressão (Biomotor 7.0, BESE, Belo Horizonte - Brasil). Trinta minutos após esses procedimentos foi infundida no estômago de cada animal uma solução salina a 37 º C, a uma taxa de 1,5 mL /100 g de peso/min, intermitentemente a cada 20 segundos (s) em intervalos de 1 min. A cada 20 s (1/3 do volume) a infusão era interrompida e o sistema balanceado para 50 s, com um registro de pressão intragástrica (PIG). Foram registadas (pressões intragástricas correspondentes a 1/3, 2/3 e o volume total. O procedimento foi repetido duas vezes com intervalos de 30 min. O resultado de cada animal correspondeu à média de três medições em cada ponto da PIG. Foram construídas curvas de volume/pressão para estimar a CG, calculadas através da seguinte fórmula:
Complacência (mL/mmHg) = V1 - V0 / P1 - P0,
Onde V0 = volume inicial e V1 = volume final
PO = PIG inicial e P1 = PIG final.
Uma solução salina contendo vermelho fenol (6 mg/dL) no volume de 1,5 mL/100 g de peso corporal foi utilizada como refeição teste no estudo de EG. O esvaziamento gástrico foi avaliado indiretamente em ratos acordados, para determinar o percentual de retenção gástrica (% GR) da refeição teste, após 10 minutos da administração orogástrica, usando uma técnica padronizada13.
Os ratos foram colocados na vertical e a refeição teste administrada por sonda esofágica para atingir o estômago. Após a administração, os animais permaneceram na gaiola durante 8 min e 30 seg. Depois de anestesiados com éter, foi introduzido o tubo orogástrico, mantendo os ratos anestesiados com inalação de éter. O abdômen foi aberto longitudinalmente e o piloro pinçado exatamente 10 minutos após a infusão orogástrica. Todas as etapas foram cronometradas. O resíduo gástrico foi aspirado e, em seguida, foram realizadas cinco lavagens com 2 mL de água destilada de cada vez, tendo o cuidado de aspirar sempre com a mesma seringa. O esvaziamento completo foi confirmado através da visualização direta das vísceras. A sonda foi então removida e a pressão negativa aplicada no animal sacrificado. O resíduo gástrico obtido mais as lavagens foram transferidos para um cilindro graduado de 25 mL, e os instrumentos de aspiração (sonda e seringa), foram lavados três vezes com um mL de água de cada vez, e o volume adicionado ao béquer.
Para determinar a porcentagem de retenção gástrica (RG%) foi tomado 2,0 mL do volume total recuperado de e transferido, em duplicata, para balões volumétricos de 10 mL, aos quais foram adicionados 5,0 mL de uma solução de fosfato de trisódio na concentração de 27,5 g/L. O mesmo procedimento foi realizado com 1 mL da refeição teste. O volume final foi completado até 10 mL com água destilada. As leituras foram feitas em um espectrofotômetro (espectrofotômetro B 382, Micronal) no comprimento de onda de 560 nm. Para calcular a RG foi utilizada a seguinte fórmula:
RG = vrg × arg ÷ vrp × arp e o resultado multiplicado por 100.
Onde: vrg = volume de resíduo gástrico; arg = absorbância do resíduo gástrico; vrp = volume da refeição teste; arp = absorbância da refeição teste.
Duas semanas antes do estudo da vagotomia, os ratos foram submetidos à vagotomia subdiafragmática (VGX), na qual foram seccionados os ramos dorsal e ventral do nervo vago, enquanto outros animais foram submetidos a uma cirurgia simulada (VGS), os quais foram considerados os controles. Vinte e quatro horas antes do procedimento de EG, os animais VGX e VGS foram submetidos à infarto cirúrgico (INF), enquanto os outros foram submetidos à mesma cirurgia simulada (SH).
Para estudar o envolvimento de receptores GABAB no sistema nervoso central de cada animal, oito dias antes do estudo de EG os ratos foram submetidos a implante no ventrículo lateral direito de uma cânula (21G), utilizando técnicas e as coordenadas relacionadas ao bregma14, conforme descrito anteriormente15. Vinte e quatro horas antes do estudo de EG os ratos foram submetidos a cirurgia de infarto e os outros para a mesma cirurgia simulada. Dez minutos antes da determinação do EG, os dois grupos foram tratados com injeção intra ventrículo-cerebral (ivc) de 10 μL de solução salina (V) ou um volume igual de uma solução contendo 1 µg de BAC. A dose de BAC utilizada foi baseada na literatura16. Dez minutos após a injeção, o EG foi avaliado.
Para estudar o envolvimento de receptores adrenérgicos alfa-1 nos grupos INF e SH, 24 horas após a cirurgia, os grupos foram tratados por via intravenosa (iv) através de uma veia da cauda, com solução salina como veículo (V) ou prazosina na dose de 1 mg/ kg, e a dose dada foi baseada no literatura17. O EG foi avaliado quinze minutos após a injeção.
Para avaliar o envolvimento do núcleo paraventricular, 10 dias antes do estudo de EG, os animais foram submetidos a uma lesão limitada do núcleo paraventricular (grupo PVNX) em dois pontos, bilateralmente, com passagem de uma corrente eléctrica de lesão de 1 mA/10 s, utilizando-se eletrodo de níquel e cromo de 0,25 milímetros de diâmetro. As coordenadas em relação à bregma foram as seguintes: anteroposterior (AP) -1,2 e -1,5 mm, lateral ± 0,5 mm, vertical 7,8 milímetros e 8,0 pontos correspondentes à AP, já vista em outro estudo15. Em ratos com lesão simulada (PVNS), foram utilizadas as mesmas coordenadas, exceto a vertical, na qual a profundidade foi de 7,5 mm, sem a passagem de uma corrente elétrica.
Vinte e quatro horas antes do procedimento de EG, os animais PVNX e PVNS foram divididos em grupos INF e SH. Após os experimentos, todos os ratos foram sacrificados. No grupo INF, os corações foram removidos, seccionados no plano sagital, utilizando como pontos de referência a aurícula esquerda, o sulco interventricular e via de saída do ventrículo esquerdo. Em seguida, as duas metades foram fixadas em formalina a 10% e embebidos em parafina. Os cortes histológicos corados com hematoxilina-eosina, foram usados para determinar a % da área infartada em relação à área total do ventrículo esquerdo usando uma técnica padronizada18.
No grupo PVNX, os cérebros foram removidos, fixados, embebidos em parafina e os cortes histológicos foram corados com azul de toluidina. Para confirmar o local da lesão, as imagens dos cortes da lesão foram comparados, utilizando microscópio, com imagens no atlas de Paxinos e Watson19 em outro estudo realizado no mesmo laboratório15.
Nos animais com implantação de cânula no ventrículo lateral, a avaliação foi feita com uma injeção intra ventrículo‑cerebral de 10 μL de uma solução de Azul de Evans a 1%, no final do estudo de EG. Nesse grupo, após o sacrifício, os cérebros foram removidos e fixados em formalina a 10%, cortes coronais foram feitos e confirmados quando o corante injetado via icv foi encontrado no quarto ventrículo.
O software SAS (Statistical Analysis System) para Windows, versão 9.2 (SAS Institute Inc., 2002-2008, Cary, NC, EUA) foi usado na análise estatística. Os resultados da CG e RG são apresentados como média ± EPM. A análise estatística foi realizada utilizando-se ANOVA, seguida pelo teste de Tukey quando necessário. Foi estabelecido o valor de α = 0,05 para ambos os testes.
Não houve diferenças significantes de CG, na comparação entre os grupos (média ± EPM do grupo INF = 0,16 ± 0,03 mL / mm Hg, N = 9; grupo SH = 0,17 ± 0,03 mL / mmHg N = 9; grupo NA = 0,16 ± 0,01 mL / mm Hg, N = 8). A porcentagem de área infartada do ventrículo esquerdo, em média ± EPM, em ratos do grupo INF foi de 47,8 ± 2,7%.
Os resultados do estudo antes da vagotomia são mostrados na Figura 1. Houve diferenças significantes entre %RG dos animais com VGS + SH vs. VGS + INF (média ± EPM = 36, 6 ± 2,0%, N = 10; e 48,0 ± 2,3%, N = 15, respectivamente), e isso indicou que o infarto resultou em atraso do EG em animais com vagotomia sham em relação aos controles. Além disso, o subgrupo VGX + INF apresentou RG% (28,7 ± 2,8%, N = 11) significativamente mais baixa do que o grupo VGS + INF e não diferiu do grupo VGX + SH (25,9 ± 1,5%, N = 10). No entanto, a vagotomia anterior também reduziu significativamente RG% no grupo SH (VGX + SH) em comparação com VGS (VGS + SH). Portanto, a redução da RG% por vagotomia no grupo INF foi 40% mais elevada. Nesse estudo, a área infartada do ventrículo esquerdo, média ± EPM, em animais VGS + INF foi de 51,7 ± 2,3% e em animais VGX + INF foi de 50,2 ± 2%.
Figura 1 Resultados de retenção gástrica (%) em grupos de ratos com infarto do miocárdio (INF) e vagotomia (Vg); * p < 0,05.
O tratamento intra ventrículo-cerebral com BAC (Figura 2) reduziu significativamente RG% no grupo controle (SH + BAC = 17,8 ± 2,6%, N = 11) em comparação com o tratamento com V (SH + V = 32,0 ± 2,9%, N = 9), bem como nos grupos INF + BAC em comparação com INF + V (26,0 ± 3,3%, N = 11 e 40,2 ± 2,1%, N = 10, respectivamente). Embora o infarto do miocárdio tenha aumentado a RG% no grupo de ratos tratados com veículo (INF + V), esse não diferiu significativamente do grupo de controle (SH + V). Além disso, verificou-se que a redução média de RG% determinada por BAC foi 25% mais elevada entre os grupos SH do que a observada entre os grupos INF. A área infartada do ventrículo esquerdo, média ± EPM, em animais INF + V foi de 51,2 ± 2,7% e em animais INF + BAC foi de 52,2 ± 3%.
Figura 2 Resultados de retenção gástrica (%) em grupos de ratos com infarto do miocárdio e inserção de sonda metálica e que receberam injeção de baclofeno (BAC) ou Solução Salina (V) no ventrículo lateral do cérebro; * p < 0,05.
A Figura 3 mostra os resultados do tratamento por via i.v. com PRA, o que reduziu significativamente RG% no grupo infarto (INF + PRA = 22,0 ± 1,5%, 10) em comparação com o tratado com veículo (INF + V = 42,1 ± 2,4%, 10). Entre os animais do grupo SH, o mesmo fenômeno ocorreu (SH + PRA = 22,3 ± 1,8%, n = 12 vs. SH + V = 30,5 ± 1,3%, n = 11); no entanto, a redução de RG% foi 77% superior no grupo INF. A área infartada do ventrículo esquerdo, em média ± EPM, em animais INF + V foi de 55,1 ± 1,2% e em animais INF + PRA foi de 55,2 ± 1,2%.
Figura 3 Resultados de retenção gástrica (%) em grupos de ratos com infarto do miocárdio e que receberam injeção de prazosina (PRA) ou Solução Salina (V); * p < 0,05.
Na Figura 4, os resultados da lesão foram vistos em um estudo prévio do núcleo paraventricular. Os ratos com lesão eletrolítica do núcleo e infartados apresentaram uma RG% significativamente menor (PVNX + INF = 25,0 ± 3,0%, N = 8) em comparação com os animais com lesão sham (PVNS) e infartados (PVNS + INF = 41,2 ± 1,7%, N = 8). A mesma lesão não reduziu RG% em animais controle (PVNX + SH = 28,5 ± 2,9%, N = 8 vs. PVNS + SH = 32,1 ± 1,9%, N = 10). A área infartada do ventrículo esquerdo, em média ± EPM, em animais PVNS + INF foi de 52,2 ± 0,4% e em animais PVNX + INF foi de 55,4 ± 0,8%. Nos resultados da análise histológica feita nos cérebros após lesão do núcleo paraventricular, apenas lesões com 100% da região paraventricular foram consideradas para esse estudo.
A diminuição do tônus gástrico determina um EG mais lento de líquidos20. Portanto, nas condições experimentais desse estudo, o infarto agudo do miocárdio não induziu alterações no tônus gástrico de ratos. No entanto, como o EG é uma ação coordenada do estômago, piloro e duodeno21, é possível que o fator determinante do retarde do EG no infarto do miocárdio não tenha agido diretamente no estômago. Camurça e cols.9 detectaram em infarto agudo do miocárdio, além de retardo no EG, que o trânsito de líquidos no intestino delgado é mais lento. Não ficou claro se os dois transtornos são dependentes de um mesmo fenômeno, ou se o efeito sobre o EG é uma consequência do que ocorre após o estômago. Uma vez que não foi observada alteração na CG, uma alternativa para explicar o retardo do EG de líquidos no infarto do miocárdio seria o aumento da resistência, de natureza desconhecida, do fluxo de alimentos para o intestino delgado.
Tratamento intra ventrículo-cerebral com Baclofen reduziu de maneira significativa a RG% no grupo controle (SH), em comparação com o controle tratado com solução salina e, similarmente, no grupo infartado (INF) (Figura 1). Em termos comparativos, foi surpreendente observar que a maior redução ocorreu nos grupos de controle. Como resultado, não foi concluído o envolvimento dos receptores GABAB no EG retardado através do INF. O Baclofen no sistema nervoso central aumenta o EG de líquidos através de sua capacidade de bloquear o complexo vagal dorsal, estímulos mecânicos inibitórios que atuam no estômago proximal, transmitidos através das fibras aferentes do nervo vago22-25.
Como resultado, há um aumento do tônus desse segmento funcional do estômago, o que leva ao EG mais rápido de uma refeição salina. O que era esperado, considerando que o infarto não alterou a complacência gástrica e pode ter resultado em um aumento do tônus com a mesma intensidade em grupos controle e infartados, superando a condição de que determinou a retardo do GE no infarto.
A secção sub-diafragmática anterior de ramos ventrais e dorsais do nervo vago, reduziu significativamente a RG em animais infartados e também em animais SH (Figura 3). O resultado observado entre os animais sham era esperado, uma vez que esse tipo de vagotomia pode aumentar o esvaziamento gástrico de líquido, aumentando o tônus do estômago proximal26. No entanto, a redução de RG% através da vagotomia em animais infartados foi mais elevada (aproximadamente 40%), quando comparada com as reduções médias de RG% entre os dois grupos.
A vagotomia modifica a atividade motora do estômago através do bloqueio da chegada de estímulos aferentes inibitórios para o trato solitário e abole os estímulos eferentes, que se originam no núcleo dorsal vagal1,27,28. As fibras aferentes do nervo vago transmitem informações sensoriais de outras regiões do trato gastrointestinal e as vias eferentes inervam do fundo gástrico até o cólon descendente29,30.
Assim, no processo utilizado nesse estudo, não se sabe se estamos bloqueando estímulos aferentes ou eferentes e em que parte do trato gastrointestinal. No entanto, os resultados sugerem a participação, pelo menos parcialmente, do nervo vago no retardo do EG induzido por infarto do miocárdio.
O papel dos alfa1-adrenoceptores como receptores estimuladores envolve particularmente a contração do músculo liso, especialmente a contração das fibras musculares lisas vasculares, determinando vasoconstrição local e atuando sobre o controle da pressão arterial31. A prazosina é um antagonista periférico que se liga a esses receptores nos vasos32,33 e não tem influência significativa sobre o tônus gástrico e contrações fásicas no estômago34.
O tratamento intravenoso com Prazosin reduziu significativamente o efeito do infarto do miocárdio no EG (Figura 3). Esse fato está relacionado com o proposto por Camurça e cols.9, que o retardo do EG no infarto do miocárdio resultaria do aumento da atividade simpática, como foi observado no presente estudo, com o possível envolvimento do sistema vascular.
Além disso, verificou-se também que houve uma redução significativa de RG no grupo SH, embora a razão para esse efeito ainda seja desconhecida. Em um estudo anterior feito no mesmo laboratório sobre o efeito de infarto do miocárdio no EG10, verificou-se que os animais sham mostravam um aumento não significativo de RG, em comparação com o grupo sem tratamento. Esse fato foi atribuído ao efeito combinado de anestesia + cirurgia; esses procedimentos foram realizados 24 horas antes do grupo sham ter sido criado. Esse efeito combinado, se confirmado nesse estudo, pode ser menos intenso a nível vascular no grupo SH do que no grupo INF e também pode explicar os resultados do tratamento com prazosin. De qualquer forma, a redução da RG induzida por Prazosin foi 77% maior nos animais infartados, sugerindo o envolvimento de alfa 1-adrenoceptores nessa condição.
O núcleo paraventricular (NPV) é uma grande região integrativa de hipotálamo, que atua para manter a homeostase. Praticamente, o núcleo paraventricular está envolvido na ingestão de alimentos, resposta ao stress e também modula a taxa metabólica e termorregulação e participa na regulação da função cardiovascular e do sistema nervoso autônomo35. Essa estrutura hipotalâmica participa na regulação autonômica cardiovascular36,37. A insuficiência cardíaca tem sido associada a alterações em áreas específicas do cérebro, bem como a ativação de neurônios no NPV, que estão relacionadas a anormalidades na produção de vasopressina, a regulação do volume sanguíneo e estimulação simpática (excitação)38.
Nesse estudo, os animais infartados com lesão eletrolítica do NPV mostraram RG significativamente menor em relação aos animais infartados com lesão simulada.
Esse tipo de lesão não reduziu a RG% em animais do grupo controle (Figura 4). Esses resultados indicam que a lesão no NPV aboliu o efeito de infarto do miocárdio recente no EG em ratos. Essa descoberta é uma evidência da participação importante do NPV no EG retardado no infarto. É possível que os resultados parciais obtidos com vagotomia e bloqueio dos receptores adrenérgicos alfa-1 tenham ocorrido por que cada um desses procedimentos afetou apenas uma parte do conjunto de mudanças causadas pelo NPV, determinando retardo do EG no infarto do miocárdio.
Os resultados desse estudo sugerem o envolvimento do nervo vago, dos receptores adrenérgicos alfa-1 e do NPV no EG retardado induzido por infarto do miocárdio recente em ratos.