Compartilhar

Métodos usados para avaliar o en dehors ou turnout de dançarinos e bailarinos clássicos: revisão da literatura

Métodos usados para avaliar o en dehors ou turnout de dançarinos e bailarinos clássicos: revisão da literatura

Autores:

Kaanda Nabilla Souza Gontijo,
Maiane Almeida do Amaral,
Gabriela Cristina dos Santos,
Claudia Tarragô Candotti

ARTIGO ORIGINAL

Fisioterapia e Pesquisa

versão On-line ISSN 2316-9117

Fisioter. Pesqui. vol.24 no.4 São Paulo out./dez. 2017

http://dx.doi.org/10.1590/1809-2950/17100124042017

RESUMEN

La técnica del ballet clásico exige la realización máxima del en dehors o turnout, caracterizado por la rotación externa de miembros inferiores. Considerando su importancia, varios protocolos para su evaluación y medición han sido propuestos. El objetivo de esta revisión ha sido investigar sistemáticamente los métodos utilizados para evaluar el turnout de bailarines clásicos y/o practicantes de ballet clásico existentes actualmente. Se hizo la búsqueda en las bases de datos Scopus, Science Direct y PubMed, en el mes de febrero de 2016, y los artículos encontrados deberían: estar redactados en la lengua inglesa, evaluar bailarines clásicos o bailarines que practicaran ballet clásico y medir el en dehors o turnout. Se encontraron 593 artículos, de los cuales se preseleccionaron 25 para esta revisión, presentándose 15 diferentes métodos e instrumentos de medición del turnout: cinemetría; inclinómetro; turnout protactor o transferidor para medir el turnout; goniómetro; Dupuis Tropometer; transferidor original; fotos de los sujetos; discos rotacionales; prueba de flexibilidad de Nicholas; flexímetro; diseño clínico de los pies; sujeto sobre un pedazo de papel o suelo o cuadro blanco; resonancia magnética; filmación del sujeto ejecutando secuencia de pasos; Daco Pro Angle Finder. Esta revisión presenta una fuerte evidencia para afirmar que no hay, hasta el momento, un método o instrumento estándar-oro para la medición del turnout de bailarines, de modo que ésta suele ser adaptada y elegida de acuerdo con el objetivo de cada estudio.

Palabras clave Danza; Estudios de Evaluación; Evaluación

INTRODUÇÃO

A técnica do ballet clássico exige a realização máxima do en dehors ou turnout1, sendo que o turnout ideal deve ser executado exclusivamente pelos quadris2)-(4, mediante uma rotação externa de 90° das articulações coxofemorais, bilateralmente, enquanto os pés formam um ângulo de 180° entre eles1. Não obstante, tem sido descrita uma influência substancial das rotações compensatórias de joelhos, tíbias e pés para se atingir este ângulo de 180°, caracterizando-se como a realização de um turnout falso, visto que não é realizado exclusivamente pelos quadris5)-(7.

Nesse contexto, também tem sido descrito que essa ação “falsa” (ou compensatória) caracteriza-se por uma falha técnica causadora de lesões agudas e crônicas nos bailarinos, pois faz com que os ossos, músculos, tendões, ligamentos e nervos fiquem sob constante tensão em uma posição anatômica extrema1), ( 8)- ( 13). Estudos epidemiológicos relatam que 90% dos bailarinos apresentam lesões, com aproximadamente 75% destas ocorrendo nos membros inferiores, das quais 40% acometem pés, tornozelos e tíbias10)- ( 12), ( 14)- ( 19). Isso ocorre porque a falta de uma boa rotação externa natural de quadris acarreta rotações externas de joelhos, tíbias, tornozelos e pés para atingirem a angulação de 180° sobre o solo como forma de compensação. E, os movimentos compensatórios lesivos mais comuns são a pronação ou queda do arco longitudinal dos pés e a torção dos joelhos, e até mesmo aumento ou retificação da lordose lombar1), ( 8)- ( 13).

Considerando a importância do turnout para o ballet clássico, têm sido propostos diversos protocolos para a sua avaliação e mensuração. Enquanto alguns recomendam a utilização de protocolos de medição que incorporem todo o membro inferior para avaliar a taxa de participação individual de cada segmento e articulação20)- ( 22), outros defendem o uso de medidas que simulam movimentos funcionais na dança, com base no pressuposto de que tais medidas serão mais úteis para médicos, professores e os próprios bailarinos1), ( 23)- ( 25). Essa discordância sugere que não há um consenso sobre qual protocolo seguir na avaliação do turnout. O objetivo desta revisão sistemática foi responder ao seguinte questionamento: quais os métodos utilizados para avaliar o turnout de bailarinos clássicos e ou praticantes de ballet clássico existentes atualmente?

METODOLOGIA

Foi realizada uma busca sistemática nas bases de dados Scopus, Science Direct e PubMed, no mês de fevereiro de 2016. As palavras-chave utilizadas foram: “Dancing” OR “Ballet Dancers” OR “Ballet Dancer” OR “Dancer” OR “Dancers” OR “Ballet” OR “Classic ballet” OR “Classical Dance” OR “Dance” OR “Classical Ballet” AND “Ballet Positions” OR “Foot Position” OR “Feet Position” OR “Turnout” OR “Hip Rotation” OR “Hip External Rotation” OR “External Rotation” OR “Outward Rotation” OR “Lower Extremity Rotation” OR “Lower Extremity” OR “Lower Limb” OR “Turnout Angle” OR “Leg Rotation” OR “Tibial Torsion”.

Para compor essa revisão, os artigos encontrados deveriam preencher os seguintes critérios de inclusão: (a) estar redigido na língua inglesa; (b) avaliar bailarinos clássicos ou dançarinos que praticassem ballet clássico; e (c) avaliar e mensurar o en dehors ou turnout. O critério de exclusão foi o estudo não descrever o método utilizado para avaliar o en dehors ou turnout.

Todos os procedimentos de busca, seleção, avaliação da qualidade, leitura e extração dos dados dos artigos foram realizados por dois avaliadores independentes. Nos casos de divergência de opiniões entre eles, um terceiro avaliador foi convidado para realizar a análise do artigo.

Inicialmente, os estudos foram selecionados a partir da leitura dos títulos e resumos, sendo que os artigos que apresentavam potencial para serem incluídos na pesquisa foram lidos e analisados na íntegra. Em seguida, foram finalmente incluídos aqueles que cumpriram com todos os critérios de inclusão. As referências bibliográficas de cada artigo incluído foram, ainda, averiguadas com o objetivo de encontrar artigos não localizados na busca eletrônica.

Foi utilizada a escala STROBE para avaliar a qualidade dos estudos, a qual consiste em um checklist de 22 itens que devem estar contidos em artigos observacionais para que esses sejam considerados de boa qualidade. Esses itens estão relacionados a título e resumo, métodos, resultados, discussão e outras informações26). No entanto, a escala STROBE foi utilizada de forma modificada, ou seja, os itens 1 (b), 4, 9, 15, 16 (a) (b) (c), 17 e 21 foram excluídos, levando em consideração que não se aplicavam a este estudo. Procedimento semelhante foi também realizado em outras revisões sistemáticas27)- ( 31). Para inserção do artigo nesta revisão, foi intencionalmente estipulado como critério um mínimo de cinco pontos na escala STROBE modificada, cujo escore máximo é 17 pontos.

A força da evidência científica dessa revisão foi analisada por meio da Melhor Síntese de Evidência (Best Evidence Synthesis - BES), uma alternativa à meta-análise que propõe uma análise qualitativa dos estudos, na qual a força de evidência é determinada pelo número e qualidade dos estudos e pela consistência dos seus resultados32. Os critérios usados para classificar a força da evidência foram: evidência forte, obtida por meio de vários estudos de elevada qualidade; evidência moderada, obtida por meio de um estudo de elevada qualidade e um ou mais estudos de baixa qualidade; evidência limitada, obtida por meio de um estudo de elevada qualidade ou vários estudos de baixa qualidade; e sem evidência, obtida por meio de um estudo de baixa qualidade ou de resultados contraditórios33).

Este estudo está registrado no PROSPERO sob o número CRD42016027856.

RESULTADOS

Inicialmente, foram encontrados 593 artigos a partir da busca de dados, dos quais 39 foram incluídos. Ao avaliá-los quanto à elegibilidade, treze foram excluídos ou por não mensurarem o turnout ou por não apresentarem os valores das medições do turnout. Sendo assim, 25 artigos foram pré-selecionados para compor esta revisão sistemática (Figura 1).

Figura 1 Fluxograma da seleção dos artigos 

Os estudos pré-selecionados foram avaliados quanto a sua qualidade metodológica utilizando os critérios da STROBE modificada (Tabela 1), e dos 25 estudos apenas três apresentaram pontuação inferior a 10.

Tabela 1 Resultados da avaliação da qualidade metodológica dos estudos, por meio do checklist STROBE modificado 

Estudos 1º autor (ano) Critérios Checklist STROBE Total(n° de ✓)
1 2 3 5 6 7 8 10 11 12 13 14 18 19 20 21
Barnes et al.34 × × 14
Bennell et al.35 × 15
Bennell et al.36 × 15
Bronner et al.37 × × 14
Champion et al.38 ? ? ? ? ? ? 10
Cimelli et al.13 × × × 13
Coplan et al.21 × × 14
Filipa et al.39 × × × 13
Gilbert et al.40 × × 14
Girón et al.41 × × × × × × × × 8
Grossman et al.42 × × 14
Hamilton et al.43 × × × × 12
Iunes et al.44 × × × × × × × 9
Khan et al.22 × × × 13
Khan et al.45 × × 14
Khoo Summers et al.46 × 15
Kushner et al.16 × × 14
Lin et al.47 × × × × × × 10
Merkensteijn et al.48 × × × × × × × 9
Negus et al.1 × × 14
Pata et al.49 × × × 13
Sherman et al.50 × × × 13
Shippen et al.52 × × 14
Sutton-Traina et al.51 × × × × 12
Welsh et al.20 × × × 13

Na Tabela 2 são apresentados os 25 estudos incluídos, discriminados pelo primeiro autor, ano, tamanho da amostra, média e ou variação da idade, gênero e pelos instrumentos utilizados na avaliação do turnout.

Tabela 2 Características dos estudos incluídos 

Estudo Tamanho da amostra Intervalo de idade (Média) Gênero F/M Métodos usados para avaliar o turnout dos bailarinos
Barnes et al.34 14 17-34 14/- Cinemetria: 3D technology and analyses.
Bennell et al.35 77 bailarinos; 63 não bailarinos 8-11 140/- Inclinômetro; turnout protactor (transferidor para medir o turnout).
Bennell et al.36 53 ; 40 não bailarinos 8-11 93/- Inclinômetro; turnout protactor (transferidor para medir o turnout).
Bronner et al.37 17 18-27 10/7 Cinemetria: 5-camera Motion Capture System
Champion et al. 38 Artigo de revisão: 24 artigos publicados que reportaram métodos originais de mensuração do turnout em bailarinos Goniômetro padrão; goniômetro modificado com um nível; inclinômetro; Dupuis Tropometer; transferidor original; fotos dos sujeitos em pé em pedais livres de fricção para os pés; teste de flexibilidade: Nicholas lower extremity torquet; flexímetro.
Cimelli et al.13 12 21-36 5/7 Traçado/desenho clínico dos pés.
Coplan et al.21 30 16-50 27/3 Goniômetro; sujeito em pé sobre um pedaço de papel em 1ª posição de pés do ballet.
Filipa et al.39 10 5-9 10/- Sujeito em pé sobre um pedaço de papel.
Gilbert et al.40 20 11-14 20/- Goniômetro universal.
Girón et al.41 3 Média: 19,7 3/- Cinemetria: 8-camera three-dimensional optical motion capture system.
Grossman et al.42 14 Idade: 10 14/- Discos rotacionais; ressonância magnética; goniômetro.
Hamilton et al.43 64 14-25 64/- Inclinômetro eletrônico digital; sujeito em pé sobre um pedaço de papel.
Iunes et al.44 52 bailarinos; 59 não bailarinos 7-24 111/- Fotos.
Khan et al.22 66 bailarinos; 47 não bailarinos F - média: 16,9; M - média: 18 Bailarinos: 36/30; não bailarinos: 31/16 Goniômetro; turnout protactor (transferidor para medir o turnout).
Khan et al.45 48 16-18 28/20 Goniômetro; turnout protactor (transferidor para medir o turnout).
Khoo-Summers et al.46 23 18-21 23/- Goniômetro universal; sujeito em pé sobre um pedaço de papel na 1ª posição de pés do ballet.
Kushner et al.16 22 F - média: 19,4; M - média: 24 14/8 Goniômetro.
Lin et al.47 22 bailarinos; 11 não bailarinos Bailarinos lesionados - média: 19,7; bailarinos sem lesão - média: 18,8; não bailarinos - média: 20 33/- Goniômetro; sujeito em pé sobre um pedaço de papel na 1ª e na 5ª posição de pés do ballet.
Merkensteijn et al.48 22 19-23 20/2 Goniômetro; sujeito em pé sobre um pedaço de papel na 1ª posição de pés do ballet.
Negus et al.1 29 15-22 24/5 Goniômetro; sujeito em pé sobre um pedaço de papel.
Pata et al.49 6 Não informado 6/- Discos rotacionais; filmagem do sujeito executando individualmente uma sequência pelo lado direito e pelo lado esquerdo.
Sherman et al.50 16 13-17 16/- Goniômetro articulado; Dasco Pro Angle Finder; sujeito em pé sobre um pedaço de papel na 1ª posição de pés do ballet; discos rotacionais.
Shippen52 10 18-28 10/- Cinemetria: 12-cameras 3-dimensional optical tracking system MX40.
Sutton-Traina et al.51 23 bailarinos; 13 não bailarinos 18-30 36/- Discos rotacianais; goniômetro.
Welsh et al.20 17 18-32 Não informado Sujeito em pé sobre um quadro branco; discos rotacionais.

Com base na avaliação da qualidade metodológica e do risco de viés por meio da escala STROBE modificada, levando-se em consideração a pontuação obtida e o tipo de estudos incluídos (Tabelas 1 e 2), esta revisão sistemática apresenta forte evidência, pois doze estudos apresentaram pontuação elevada, superior a 13 pontos.

DISCUSSÃO

Ao revisar sistematicamente os estudos que foram incluídos nesta pesquisa, observou-se que não existe um consenso na literatura acerca de um procedimento padrão para a mensuração do turnout em bailarinos, havendo assim uma série de procedimentos e protocolos disponíveis. Foram encontrados quinze métodos/instrumentos diferentes de mensuração do turnout: cinemetria (4 estudos); inclinômetro (4 estudos); turnout protactor ou transferidor para medir o turnout (4 estudos); goniômetro (13 estudos); Dupuis Tropometer (1 estudo); transferidor original (1 estudo); fotos dos sujeitos (2 estudos); discos rotacionais (6 estudos); teste de flexibilidade de Nicholas (1 estudo); flexímetro (1 estudo); desenho clínico dos pés (1 estudo); sujeito sobre um pedaço de papel, ou solo, ou quadro branco (9 estudos); ressonância magnética (1 estudo); filmagem do sujeito executando sequência de passos (1 estudo); Dasco Pro Angle Finder (1 estudo). Desses quinze, seis métodos/instrumentos foram utilizados por quatro ou mais estudos: cinemetria, inclinômetro, turnout protactor, ou transferidor para medir o turnout, goniômetro, discos rotacionais e sujeito sobre um pedaço de papel ou solo ou quadro branco. Dentre estes seis, três métodos/instrumentos se destacaram pela quantidade de estudos encontrados que os utilizaram, sendo eles: goniômetro (13 estudos), sujeito sobre um pedaço de papel, ou solo, ou quadro branco (9 estudos) e discos rotacionais (6 estudos).

Os estudos que utilizaram os goniômetros para avaliar o turnout de bailarinos focaram suas mensurações em amplitudes de movimento articular isoladas de quadris, tíbias e pés. Porém, Gilbert et al.40) sugerem que a avaliação da amplitude de movimento de rotação externa do quadril, por exemplo, não seja a melhor alternativa para predizer o ângulo de turnout dos bailarinos, visto que são medidas consideradas como referentes a um turnout passivo porque suas mensurações são feitas com os sujeitos em diferentes decúbitos e não em ortostase. Reforçando essa não predição, Welsh et al. (20) encontraram em seu estudo uma tendência de que muitos bailarinos utilizam menos turnout ativo do que são capazes de forma passiva, demonstrando que os bailarinos apresentam maiores valores de turnout nas mensurações passivas do que nas mensurações ativas (em ortostase e sobre discos rotacionais sem fricção). Ainda sobre a falta de correlação das mensurações passivas com os reais valores de turnout quando os bailarinos se encontram em ortostase, Negus et al. (1) não encontraram em seu estudo correlação entre a amplitude de movimento de rotação externa do quadril (turnout passivo medido pela goniometria) e o turnout funcional (mensurado por eles com o sujeito sobre um pedaço de papel).

A mensuração do turnout de bailarinos com o sujeito sobre um pedaço de papel, ou solo, ou quadro branco, utilizado por nove dos 25 estudos encontrados por esta revisão sistemática1), (20), (21), (39), (43), (46)- (48), (50), caracteriza-se como uma avaliação estática e conta com a presença da fricção dos pés dos bailarinos com o solo, o que pode interferir nos valores encontrados de turnout. Logo, no intuito de avaliar dinamicamente o turnout e de eliminar as influências desta fricção sobre seus valores, seis estudos utilizaram os discos rotacionais sem fricção para medi-lo20), (38), (42), (49)-51). Destacamos o estudo de Pata et al. (49), que sugerem que os discos rotacionais (sem fricção) são melhores estratégias para a predição dos reais ângulos de turnout, pois estes permitem a visualização do turnout mais real, ativo ou dinâmico e completo de cada bailarino.

A cinemetria, utilizada por quatro dos 25 estudos encontrados nesta revisão34), (37), (41), (52), tem sido utilizada para avaliar o turnout também de forma mais dinâmica. Tendo em vista que os métodos estáticos não têm se mostrado muito eficientes nem se apresentado com concordância de resultados (não sendo também completamente suficientes para a análise do turnout completo de bailarinos), esta alternativa ganha destaque dentre as demais encontradas.

Sobre os tipos de turnouts, foram encontradas diversas denominações para os ângulos mensurados nos estudos de acordo com o tipo de método ou instrumento utilizado. Dentre essas denominações e tipos podemos citar: turnout passivo, turnout ativo, turnout funcional, falso turnout e turnout total, por exemplo. Dentre os 25 estudos que compuseram esta revisão, destacamos o de Sherman et al. (50), por apresentar definições claras sobre cada tipo de turnout de acordo com o método escolhido para cada tipo. Em seu estudo, eles apresentaram quatro métodos considerados práticos e de fácil utilização na clínica, sendo eles: (1) mensuração do turnout passivo: o avaliador mobiliza os membros do avaliado, que pode estar na posição de decúbito dorsal, ventral ou sentado, no sentido de obter uma rotação externa de quadril com o joelho fletido a 90° e faz a mensuração com um goniômetro; (2) mensuração estática do turnout ativo: o avaliado deve atingir, sobre uma folha de papel, o seu máximo turnout em primeira posição de pés, mantendo os calcanhares unidos para que, ao serem marcados sobre o papel, o centro da região posterior do calcâneo e o segundo metatarso de cada pé, seja possível calcular o ângulo formado pelas duas retas obtidas da união desses dois pontos (uma para cada pé), obtendo assim o ângulo de turnout ativo estático sobre o chão com a utilização de um goniômetro; (3) mensuração dinâmica do turnout ativo: o avaliado deve subir em um conjunto de discos rotacionais que possui um mecanismo de rolamento entre a superfície do disco e a do chão, eliminando a fricção com este último e, logo em seguida, alinhar o segundo metatarso e o centro do calcanhar de cada pé com a linha traçada no centro de cada um dos dois discos. Ambos os discos devem estar posicionados sobre grandes folhas de papel para ser possível demarcar sobre elas, as posições finais (máxima primeira posição de pés do ballet clássico) de cada pé, sobre os discos, após a solicitação do avaliador. Os pontos demarcados nas folhas de papel, referentes às posições finais do centro do calcâneo e do segundo metatarso sobre o disco, devem ser unidos por retas de modo que possam ser mensurados os ângulos de interseção entre elas, obtendo assim o ângulo de turnout ativo de forma dinâmica sobre os discos com a utilização de um goniômetro; (4) mensuração da rotação externa passiva de tíbia: o avaliado deve ser posicionado de decúbito ventral e com joelhos e tornozelos a 90° de flexão sobre uma mesa, para que, ao realizar uma rotação externa de tíbia com o goniômetro sobre o centro calcâneo, seja possível mensurar o ângulo entre a coxa e o pé, visto que um dos braços do goniômetro deve apontar para o segundo metatarso e o outro para a tuberosidade isquiática.

Todavia, mesmo descrevendo claramente esses métodos, Sherman et al. (50) levantam problemas de mensuração dos graus de turnout, também identificados nesta revisão sistemática, os quais são, primeiramente, a falta de um padrão-ouro para medidas confiáveis e válidas de turnout ativo e passivo devido, principalmente, à complexidade de se estudar um movimento que envolve os membros inferiores como um todo, que sofre com alterações estáticas e dinâmicas38). Além disso, outro problema identificado é a ausência de um padrão normativo para as medidas dos segmentos que compõem o membro inferior e para o somatório das medidas que comporiam o turnout total50).

A própria International Association for Dance Medicine & Science, desde 2008, reconheceu a necessidade de padronização dessas mensurações e o registro de dados normativos, e incentivou o uso dos estudos de Champion e Chatfield38), Grossman et al. (42) e Welsh et al. (20) como referências para futuros estudos. Em suma, esses três estudos mostram que mensurar apenas a rotação externa de quadris não prediz o turnout de bailarinos, pois não foram encontradas correlações entre essas medidas e aquelas relativas aos ângulos de turnout funcional ou total. Essa mensuração, segundo Champion e Chatfield38), ainda possui pelo menos oito questões que podem afetar seus resultados: (1) o tipo de procedimento, ativo ou passivo; (2) a posição de execução da medida (em prono, supino, sentado ou em pé); (3) a posição pélvica (graus de inclinação pélvica estabilizada e corrigida); (4) a posição do quadril (graus de flexão e extensão coxofemorais); (5) a posição do membro contralateral (neutro ou abduzido); (6) a presença de flexão ou extensão de joelho; (7) o aquecimento prévio da amostra previamente à coleta; e (8) a presença de fricção, que aumenta em contato com o solo quando o avaliado encontra-se em ortostase.

De modo similar, Negus et al. (1) também acreditam que as medidas angulares de um turnout funcional são mais relevantes para compreender o bailarino em si e suas lesões associadas, visto que as lesões que acometem os bailarinos clássicos estão associadas à ação “falsa” (ou compensatória) de realização do turnout total (máximo de 180° entre os bordos mediais dos pés quando em primeira posição de pés). Logo, se não é apenas o quadril o responsável pela angulação final obtida entre os bordos mediais dos pés em um turnout total, movimentos compensatórios de rotação externa de joelhos, tíbias, tornozelos e/ou pés acabam ocorrendo. Grossman et al. (42) mensuraram as angulações de rotação externa de quadris, tíbias e pés e demonstraram que, especificamente, a torção tibial, mensurada via ressonância magnética, caracteriza-se como a contribuição primária fora do quadril para o ângulo de turnout total, correspondendo a mais de 20% deste valor quando não é induzida a tensão no joelho via estresse rotacional. Sendo assim, entende-se que a torção tibial é um fator de potencial influência no turnout total dos bailarinos e que buscar a sua relação com a rotação externa de quadril e de tornozelos e pés apresenta-se como uma tendência mais coerente no estudo das angulações do turnout, direcionando suas medidas para uma padronização que, até o presente momento, não foi estabelecida.

Por fim, apenas um estudo foi encontrado utilizando uma filmagem dinâmica de passos de ballet com uma única câmera49. Neste, cada bailarino executava uma sequência específica de passos (adagio) para ambos os lados enquanto era filmado para posterior verificação acerca das diferenças entre o antes e o depois da intervenção proposta pelos autores. Dada a existência de apenas esse estudo na avaliação ativa do turnout, sugere-se que futuros estudos deem prioridade a este tipo de abordagem mensurativa. Acredita-se que dessa forma as pesquisas possam se aproximar ainda mais da realidade prática dos estúdios e escolas de dança, permitindo que mais profissionais envolvidos com o público de bailarinos utilizem os métodos e instrumentos desenvolvidos e utilizados no meio científico. Como limitação desta revisão, cita-se o fato de que o checklist STROBE, mesmo sendo utilizado em outros estudos de revisão sistemática, não é uma escala adequada para avaliar a qualidade metodológica dos estudos incluídos, uma vez que seu principal objetivo é fornecer para autores evidencias sobre seus próprios procedimentos metodológicos.

CONCLUSÃO

Esta revisão de literatura apresenta forte evidência para afirmar que não há, até o presente momento, um método ou instrumento padrão-ouro para mensuração do turnout de bailarinos, de modo que esta costuma ser adaptada e escolhida de acordo com o objetivo de cada estudo. Os métodos e instrumentos encontrados para avaliação do turnout foram: cinemetria; inclinômetro; turnout protactor ou transferidor para medir o turnout; goniômetro; Dupuis Tropometer; transferidor original; fotos dos sujeitos; discos rotacionais; teste de flexibilidade de Nicholas; flexímetro; desenho clínico dos pés; sujeito sobre um pedaço de papel, ou solo, ou quadro branco; ressonância magnética; filmagem do sujeito executando sequência de passos; Dasco Pro Angle Finder.

REFERÊNCIAS

1. Negus V, Hopper D, Briffa NK. Associations between turnout and lower extremity injuries in classical ballet dancers. J Orthop Sports Phys Ther. 2005;35(5):307-18. doi:10.2519/jospt.2005.35.5.307
2. Clippinger K. Biomechanical considerations in turnout. In: Solomon R, Solomon J, Minton, SC, editors. Preventing dance injuries. 2nd ed. Champaign: Human Kinetics; 2005. p. 135-50.
3. Kravitz SR, Murgia CJ, Huber S, Saltrick K. Biomechanical implications of dance injuries. In: Shell C, editor. Dancer as athlete. Champaign: Human Kinetics; 1984. p. 43-51.
4. LiGreci-Mangini LA. Comparison of hip range of motion between professional ballerinas and age-/sex-matched non-dancers. Kinesiol Med Dance. 1993-1994;16:19-30.
5. Grossman G, Waninger KN, Voloshin A, Reinus WR, Ross R, Stoltzfus J, et al. Reliability and validity of goniometric turnout measurements compared with MRI and retro-reflective markers. In: Solomon R, Solomon J, editors. Proceedings of the 16th Annual meeting of the International Association for J Dance Medicine & Science; 2006 Oct 19-21; West Palm Beach Marriot, West Palm Beach. West Palm Beach: Int Assoc J Dance Med Sci. 2008;12(4):142-52.
6. Hamilton W, Hamilton L, Marshall P, Molnar M. A profile of the musculoskeletal characteristics of elite professional ballet dancers. Am J Sports Med. 1992;20(3):267-73. doi:10.1177/036354659202000306
7. Grossman G. Measuring dancer’s active and passive turnout. J Dance Med Sci. 2003;7:49-55.
8. Stephens RE. The etiology of ijuries in ballet. In: Ryan AJ, Stephens RE, editors. Dance Medicine: a comprehensive guide. Chicago: Pluribus Press; 1987. p. 16-50.
9. Gupta A, Fernihough B, Bailey G, Bombeck P, Clarke A, Hopper D. An evaluation of differences in hip external rotation strength and range of motion between female dancers and non-dancers. Br J Sports Med. 2004;38(6):778-83. doi: 10.1136/bjsm.2003.010827
10. Shah S, Weiss D. Survey of injuries among professional modern dancers: prevalence, risk factors and management. Clin J Sports Med. 2006;16(5):437-49.
12. Schon LC, Weinfield SB. Lower extremity musculoskeletal problems in dance. Curr Opin Rheumatol. 1996;8(2):130-42.
13. Cimelli SN, Curran SA. Influence of turnout on foot posture and its relationship to overuse musculoskeletal injury in professional contemporary dancers: a preliminary investigation. J Am Podiatr Med Assoc. 2012;102(1):25-33. doi: 10.7547/1020025
14. Weiss DS, Shah S, Burchette RJ. A profile of the demographics and training characteristics of professional modern dancers. J Dance Med Sci. 2008;12(2):41-6.
15. Stretanski MF, Weber GJ. Medical and rehabilitation issues in classical ballet. Am J Phys Med Rehabil. 2002;81(5):383-91. doi: 10.1097/00002060-200205000-00013
16. Kushner S, Saboe L, Reid D, Penrose T, Grace M. Relationship of turnout to hip abduction in professional ballet dancers. Am J Sports Med. 1990;18(3):286-91. doi: 10.1177/036354659001800312
17. Thomas H, Tarr J. Dancer’s perceptions of pain and injury: positive and negative effects. J Dance Med Sci. 2009;13(2):51-9.
18. Macintyre J, Joy E. Foot and ankle injuries in dance. Clin Sports Med. 2000;19(2):351-68. doi: 10.1016/j.pmr.2006.06.006
19. Ahonen J. Biomechanics of the foot in dance: a literature review. J Dance Med Sci. 2008;12(3):99-108.
20. Welsh RTM, Rodriguez M, Beare LW, Barton B, Judge T. Assessing turnout in university dancers. J Dance Med Sci. 2008;12(4):136-41.
21. Coplan JA. Ballet dancer’s turnout and its relationship to self-reported injury. J Orthop Sports Phys Ther. 2002;32(11):579-84. doi: 10.2519/jospt.2002.32.11.579
22. Khan K, Roberts P, Nattrass C, Bennell K, Mayes S, Way S, et al. Hip and ankle range of motion in elite classical ballet dancers and controls. Clin J Sport Med. 1997;7(3):174-9. doi: 10.1097/00042752-199707000-00004
23. Liederbach M, Welsh T, Hagins M. Analysis of dancer screening forms used in the dance medicine community. In: Solomon R, Solomon J, editors. Proceedings of the 16th Annual Meeting of the International Association for Dance Medicine & Science; 2006 Oct 19-21; West Palm Beach Marriot, West Palm Beach. West Palm Beach: IADMS; 2006. p. 146-50.
24. Molnar M. Dynamic evaluation of the student dancer: enhancement of healthy functioning and movement quality. Impulse. 1995;3(4):287-95.
25. Watkins A, Woodhull-McNeal AP, Clarkson PM, Ebbeling C. Lower extremity alignment and injury in young, preprofessional, college and professional ballet dancers: part I. Turnout and knee-foot alignment. Med Probl Perform Art. 1989;4(4):148-53.
26. von Elm E, Altman D, Egger M, Pocock SJ, Gotzsche PC, Vanderbroucke JP, et al. Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE) statement: guidelines for reporting observational studies. BMJ. 2007;335(7624):806-8. doi: 10.1016/j.jclinepi.2007.11.008
27. Fortin M, Stewart M, Poitras M-E, Almirall J, Maddocks H. A systematic review of prevalence studies on multimorbidity: toward a more uniform methodology. Ann Fam Med. 2012;10(2):142-51. doi: 10.1370/afm.1337
28. Ayres ARG, Silva GA. Prevalência de infecção do colo do útero pelo HPV no Brasil: revisão sistemática. Rev Saúde Pública. 2010;44(5):963-74. doi: 10.1590/S0034-89102010000500023
29. Padilha PC, Rocha HF, Alves N, Peres WAF. Prevalência de doença hepática não-alcoólica em crianças e adolescentes obesos: uma revisão sistemática. Rev Paul Pediatr. 2010;28(4):387-93.
30. Castaneda L, Bergmann A, Bahia L. A Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde: uma revisão sistemática de estudos observacionais. Rev Bras Epidemiol. 2014;17(2):437-51. doi: 10.1590/1809-4503201400020012ENG
31. Mendes KG, Theodoro H, Rodrigues AD, Olinto MTA. Prevalência de síndrome metabólica e seus componentes na transição menopáusica: uma revisão sistemática. Cad Saúde Pública. 2012;28(8):1423-37. doi: 10.1590/S0102-311X2012000800002
32. Trinh K. Summaries and recommendations of the global impression method. J Acupunc Tuina Sci. 2009;7(5):296-302. doi: 10.1007/s11726-009-0296-0
33. Van Tulder MW, Koes BW, Bouter LM. Conservative treatment of acute and chronic nonspecific low back pain: a systematic review of randomized controlled trials of the most common interventions. Spine. 1997;22(18):2128-56. doi: 10.1097/00007632-199709150-00012
34. Barnes MA, Krasnow D, Tupling SJ, Thomas M. Knee rotation in classical dancers during the Grand Plié. Med Probl Perform Art. 2000;15(4):140-7.
35. Bennell K, Khan KM, Matthews B, et al. Hip and ankle range of motion and hip muscle strength in young novice female ballet dancers and controls. Br J Sport Med. 1999;33(5):340-6.
36. Bennell KL, Khan KM, Matthews BL, Singleton C. Changes in hip and ankle range of motion and hip muscle strength in 8-11 year old novice female ballet dancers and controls: a 12 month follow up study. Br J Sport Med. 2001;35(1):54-9. doi: 10.1136/bjsm.35.1.54
37. Bronner S, Ojofeitimi S. Pelvis and hip three-dimensional kinematics in grand battement movements. J Dance Med Sci. 2011;15(1):23-30.
38. Champion L, Chatfield S. Measurement of turnout in dance research: a critical review. J Dance Med Sci. 2008;12(4):121-35.
39. Filipa AR, Smith TR, Paterno MV, Ford KR, Hewett TE. Performance on the Star Excursion Balance Test predicts functional turnout angle in pre-pubescent female dancers. J Dance Med Sci. 2013;17(4):165-9. doi:10.12678/1089-313X.17.4.165
40. Gilbert CB, Gross MT, Klug KB. Relationship between hip external rotation and turnout angle for the five classical ballet positions. J Ortho Sports Phys Ther. 1998;27(5):339-47. doi: 10.2519/jospt.1998.27.5.339
41. Girón EC, McIssac T, Nilsen D. Effects of kinesthetic versus visual imagery practice on two technical dance movements: a pilot study. J Dance Med Sci. 2012;16(1);36-8.
42. Grossman G, Waninger KN, Voloshin A, Reinus WR, Ross R, Stoltzfuz J, et al. Reliability and validity of goniometric turnout measurements compared with MRI and retro-reflective markers. J Dance Med Sci. 2008;12(4):142-52.
43. Hamilton D, Aronsen P, Løken J, Berg IM, Skotheim R, Hopper D, et al. Dance training intensity at 11-14 years in associated with femoral torsion in classical ballet dancers. Br J Sports Med. 2006;40(4):299-303. doi: 10.1136/bjsm.2005.020941
44. Iunes DH, Elias IF, Carvalho LC, Dionísio VC. Postural adjustments in young ballet dancers compared to age matched controls. Phys Ther Sport. 2016;17:51-7. doi: 10.1016/j.ptsp.2015.04.004
45. Khan KM, Bennell K, Ng S, Matthews B, Roberts P, Nuttrass C, Way S, et al. Can 16-18-year-old elite ballet dancers improve their hip and ankle range of motion over a 12-month period? Clin J Sport Med. 2000;10(2):98-103.doi: 10.1097/00042752-200004000-00003
46. Khoo-Summers LC, Prather H, Hunt DM, Van Dillen. Predictors of first position turnout in collegiate dancers: the role of tibiofemoral esternal rotation and hip external rotation. Am J Phys Med Rehabil. 2013;92(2):136-42. doi: 10.1097/PHM.0b013e3182465dff
47. Lin CF, Lee IJ, Liao JH, Wu HW, Su FC. Comparison of postural stability between injured and uninjured ballet dancers. Am J Sports Med. 2011;39(6):1324-31. doi: 10.1177/0363546510393943
48. van Merkensteijn GG, Quin E. Assessment of compensated turnout characteristics and their relationship to injuries in university level modern dancers. J Dance Med Sci. 2015;19(2):57-62. doi: 10.12678/1089-313X.19.2.57
49. Pata D, Welsh T, Bailey J, Range V. Improving turnout in university dancers. J Dance Med Sci. 2014;18(4):169-77. doi: 10.12678/1089-313X.18.4.169
50. Sherman A, Mayall E, Tasker S. Can a prescribed turnout conditioning program reduce the differential between passive and active turnout in preprofessional dancers? J Dance Med Sci. 2014;18(4):159-68. doi: 10.12678/1089-313X.18.4.159.
51. Sutton-Traina K, Smith JA, Jarvis DN, Lee SP, Kulig K. Exploring active and passive contributors to turnout in dancers and non-dancers. Med Probl Perform Art. 2015;30(2):78-83.
52. Shippen J. Turnout is an Euler angle. Arts Biomechanics. 2011;1(1):33-43.