versão On-line ISSN 2317-1782
CoDAS vol.31 no.4 São Paulo 2019 Epub 02-Set-2019
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20182018093
O ruído é considerado fator de risco para o bem-estar e saúde da população, além de tornar os ambientes desagradáveis(1,2). Considerando que grande parte das Universidades são construídas em locais que possuem vias para facilitar o acesso, e de grande concentração populacional, são ambientes que, inevitavelmente, sofrem interferência de ruídos externos na vizinhança (grandes avenidas, tráfego intenso, buzinas, entre outros). Além de tais fontes geradoras de poluição sonora, a própria atividade de ensino-aprendizagem também está relacionada à produção de ruídos(3). A presença do ruído em salas de aula se configura como importante distrator(3,4) e pode interferir negativamente nas atividades acadêmicas, que demandam grande concentração e escuta atenta à fala do professor(1,2,4,5).
Se de um lado os estudantes precisam estar atentos ao professor, este precisa fazer-se ouvir por seus alunos(5,6). Estudos afirmam que muitas vezes os professores têm que elevar a intensidade de sua voz 10 dB acima do ruído para que sua fala seja inteligível(6,7). Portanto os males que este esforço vocal pode provocar são inúmeros promovendo, inclusive, um processo comunicativo extremamente deficitário, gerando impactos negativos no processo de ensino-aprendizagem(8-16).
Além dos impactos supramencionados, a exposição ao ruído pode provocar alterações biológicas não auditivas como cefaleia, nervosismo, ansiedade, problemas estomacais, dificuldade de concentração e comunicação, agressividade e baixo rendimento(1,3,6,8-12). Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a exposição ao ruído pode promover doenças cardiovasculares, comprometimento cognitivo e distúrbios do sono(13). Fatores, estes, que contribuem igualmente para o baixo aproveitamento tanto dos alunos quanto dos professores(6,14-16).
No Brasil, existem normas regulamentadoras das condições mínimas necessárias para a segurança e conforto acústico em salas de aula, estabelecendo em 40 dB(A) o conforto acústico e 50 dB(A) o nível sonoro aceitável para atividades em salas de aula(17). Entretanto, níveis de pressão sonora acima dos preconizados, muitas vezes, não são percebidos pelas pessoas expostas a eles, provavelmente pelo fato de a exposição diária promover a habituação e uma postura de passividade frente ao problema(6).
A questão tanto estrutural quanto acústica das salas de aula é fundamental para que todos os discentes e docentes possam ter uma experiência de ensino-aprendizagem agradável sem comprometimento de sua saúde física e mental(1,5).
Há vários artigos publicados sobre o tema em questão. Entretanto, em sua maioria, foram realizados em escolas e não em Universidades, contando com a participação de alunos ou professores, havendo poucos estudos nos quais é verificada a percepção de ambos os atores no processo ensino-aprendizagem, em ambiente universitário, sobre os efeitos do ruído nas atividades acadêmicas.
Diante do exposto, o presente estudo tem como objetivo mensurar os níveis de pressão sonora em salas de aula de uma Universidade, bem como verificar a autopercepção do ruído e sua influência nas atividades desempenhadas por alunos e professores universitários.
Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais sob o parecer número 948.301.
Trata-se de estudo do tipo transversal, realizado em dez salas de aula do Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde (ICBS), localizado no prédio 25 da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, campus Coração Eucarístico.
Participaram do estudo 279 alunos e 20 professores do ICBS que foram convidados a participar e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O convite aos participantes aconteceu da seguinte forma: antes do início de cada aula, os pesquisadores explicaram o objetivo do estudo e perguntaram se o professor desejava participar. Os professores que aceitaram, permitiram que o estudo fosse explicado para os alunos, cabendo a cada aluno a decisão de participar ou não.
Os participantes responderam a um questionário elaborado pelos autores para utilização no presente estudo, destinado ao levantamento de informações sobre a autopercepção do ruído nas salas de aula, presença de sintomas não auditivos associados à exposição ao ruído, interferência do ruído nas atividades acadêmicas e condições acústicas e de localização das salas de aula. A primeira pergunta do questionário era destinada a investigar se o participante notava a presença de ruído na sala de aula. Em caso de resposta afirmativa, o participante respondeu às questões subsequentes. Pelo fato de alunos e professores desempenharem atividades distintas em sala de aula, os questionários aplicados foram diferentes (Anexos A e B). Tanto o questionário dos alunos quanto o dos professores verificou a autopercepção da acústica e localização da sala de aula, e a concentração durante as atividades acadêmicas. Para que avaliassem tais aspectos, foi solicitado que atribuíssem a eles uma nota de 0 a 4. Para fins da análise estatística, as respostas foram agrupadas, sendo consideradas como “ruim”, as notas 0, 1 e 2 e “bom” as notas 3 e 4.
Foi realizada também medição dos níveis de pressão sonora nas salas de aula. Foram selecionadas duas salas no primeiro andar – salas 106 e 107; quatro salas no segundo andar – salas 208, 209, 211 e 212; e quatro salas no terceiro andar – salas 301, 302, 304 e 305. As salas do primeiro andar possuem quatro janelas de correr voltadas para a área do estacionamento e quatro janelas basculantes voltadas para o corredor interno de circulação do prédio. As salas do segundo e terceiro andares possuem quatro janelas de correr voltadas para a área do pátio interno da Universidade, no qual se encontram os diretórios acadêmicos e uma cantina, e quatro janelas basculantes voltadas para o corredor interno de circulação do prédio. As salas de aula do ICBS possuem 75,41m2 (Figura 1), são equipadas com, aproximadamente, 50 carteiras universitárias de madeira compensada e espuma injetada e uma lousa em placa de fibra de média densidade (MDF), revestida na face frontal em laminado melamínico de alta pressão. Contam também com uma mesa e cadeira para o professor e dois ventiladores de teto. No momento da medição dos níveis de pressão sonora, os ventiladores foram desligados, as janelas estavam abertas e o professor estava ministrando aulas.
Fonte: Pró-Reitoria de Logística e Infraestrutura – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
Figura 1 Planta e metragem das salas de aula ICBS
Os pontos para medição foram selecionados de acordo com o indicado na literatura(6) e conforme preconizado pela norma 10151 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT)(18), sendo nas condições de utilização normal do ambiente e em três pontos distintos selecionados na sala de aula, com o mínimo de distância de 0,5m, totalizando nove medições em cada sala: um ponto próximo ao quadro, outro ponto próximo às janelas e o último ponto próximo à porta da sala. Para cada ponto, foram registradas intensidades mínimas e máximas. A função “hold” do equipamento foi utilizada para gravação da intensidade máxima registrada durante o período de mensuração, que foi de cinco minutos(9). O microfone do medidor de nível de pressão sonora foi posicionado voltado para o centro da sala, a um metro do chão. Para mensuração, foi utilizado um medidor de níveis de pressão sonora da marca Impac, modelo IP-410, contendo luxímetro, higrômetro, termômetro e decibelímetro. Os níveis de pressão sonora foram lidos no modo de compensação A, escala de 35 a 100 dB(A).
As medições foram realizadas em cinco horários distintos: a) pela manhã enquanto aconteciam as aulas; b) pela manhã, no horário do intervalo; c) entre as 13 horas e 14 horas; d) no horário da tarde, durante as aulas; e) no horário da tarde, durante o intervalo. Não foi possível estabelecer um horário fixo para medição nas salas de aula durante o período da manhã e da tarde, pois os horários de início das aulas e dos intervalos eram diversificados. Entretanto as medições ocorreram com pouca variação de horários.
Os dados foram tabulados e submetidos à análise estatística. Foi realizada uma análise descritiva dos dados, separando professores e alunos, na qual foram calculadas frequências e proporções para as variáveis categóricas. Para as varáveis contínuas, foram calculadas médias, medianas e desvio padrão. Foi realizada a média dos valores medidos para o nível de pressão sonora em cada um dos locais de medição. Para comparar se houve diferença nas médias dos valores registrados para os níveis de pressão sonora de acordo com andar, turno e local de medição, foram utilizados os testes t de Student, ANOVA e teste exato de Fisher. Para comparações múltiplas, utilizou-se o teste de Bonferroni. Para comparar se existe diferença entre as respostas de alunos e professores e se existe diferença entre a avaliação de alunos e professores por andar, utilizou-se o teste Quiquadrado. As análises foram realizadas no software STATA (Stata Corporation, College Station, Texas) versão 12.0, considerando um nível de 5% de significância.
Participaram deste estudo 279 alunos, de ambos os sexos, com média de idade de 22 anos, sendo 83,2% do sexo feminino. As turmas das salas de aula, em que foi permitida a realização do estudo, possuem em média 35 alunos. Dessa forma, obtivemos aproximadamente a participação de 80,0% dos alunos. Com relação aos 20 professores participantes, a média de idade foi de 49 anos, sendo 75,0% do sexo feminino. O curso que obteve maior número de alunos participantes foi o curso de Fonoaudiologia, com 94 alunos (33,6%), seguido pelo curso de Ciências Biológicas, com 82 alunos (29,3%). O curso de Enfermagem apresentou o menor número de alunos participantes, compondo apenas 10,4% da amostra. O turno da manhã apresentou maior número de alunos participantes (56,1%).
Fazendo a comparação entre níveis de pressão sonora em relação às variáveis do ambiente, percebemos que existe diferença entre turnos, sendo que o turno da manhã apresentou maiores níveis de pressão sonora (NPS), com média dos valores registrados de 63,8 dB(A). O horário de almoço difere dos turnos da manhã e da tarde, apresentando a menor média de valores registrados (49,9 dB(A)). Pelo fato de no horário de almoço não estarem sendo desempenhadas atividades ensino-aprendizagem, seus registros foram removidos da análise estatística final. Ao removê-los do modelo de análise, observou-se que o primeiro andar passa a apresentar maior média de valores registrados (67,3 dB(A)) (Tabela 1).
Tabela 1 Medidas dos níveis de pressão sonora em relação ao local da sala, turno das aulas e andar
Média | DP | Mínimo | Mediana | Máximo | Valor p | ||
---|---|---|---|---|---|---|---|
Local | 62,9 | 8,2 | 44,7 | 62,7 | 77,7 | 0,727 | |
Porta | 62,6 | 8,3 | 44,3 | 62,2 | 82,0 | ||
Quadro | 61,5 | 9,2 | 39,7 | 60,2 | 83,0 | ||
Janela | |||||||
Turno | |||||||
Manhã | 63,8 | 7,6 | 44,7 | 64,7 | 77,7 | 0,069 | |
Tarde | 60,9 | 9,2 | 39,7 | 60,2 | 83,0 | ||
Período | |||||||
Aula | 62,7 | 7,6 | 44,3 | 61,7 | 83,0 | 0,642 | |
Intervalo | 62,0 | 9,4 | 39,7 | 62,7 | 82,0 | ||
Andar | |||||||
1º andar | 67,3 | 9,3 | 50,3 | 67,8 | 83,0 | 0,003* | |
2º andar | 60,0 | 8,4 | 39,7 | 59,0 | 77,7 | ||
3º andar | 62,2 | 7,3 | 44,3 | 62,3 | 73,7 |
*Teste Anova significativo a 5%. Post Hoc Bonferroni diferença entre 1º andar e restante;
significativo p≤0,05
Legenda: DP = desvio padrão
A presença de ruído é percebida por 100,0% dos professores e 88,9% dos alunos. Para 74,6% dos alunos e 80,0% dos professores, o ruído interfere na concentração dentro de sala de aula, sendo que 80,0% dos professores referem que seu desempenho é afetado pela presença do ruído (p=0,020). Para 85,0% dos professores, é necessário falar mais alto que o habitual devido à presença do ruído (p=0,007) (Tabela 2).
Tabela 2 Comparação das respostas dos questionários de alunos e professores
Questões | Professores | Alunos | p | |||
---|---|---|---|---|---|---|
n | % | n | % | |||
Presença de ruídos em sala de aula | Sim | 20 | 100,0 | 249 | 88,9 | 0,243 |
Não | 0 | 0,0 | 31 | 11,1 | ||
Ruído interfere na concentração | Sim | 16 | 80,0 | 209 | 74,6 | 0,593 |
Não | 4 | 20,0 | 71 | 25,4 | ||
Desempenho é afetado pelo ruído | Sim | 16 | 80,0 | 149 | 53,2 | 0,020* |
Não | 4 | 20,0 | 131 | 46,8 | ||
Fala mais alto que o habitual por causa do ruído | Sim | 17 | 85,0 | 151 | 53,9 | 0,007* |
Não | 3 | 15,0 | 129 | 46,1 | ||
Entendimento da aula é comprometido pelo ruído | Sim | 16 | 80,0 | 190 | 67,9 | 0,258 |
Não | 4 | 20,0 | 90 | 32,1 | ||
Cefaleia | Sim | 5 | 25,0 | 123 | 43,9 | 0,098 |
Não | 15 | 75,0 | 157 | 56,1 | ||
Cansaço excessivo | Sim | 15 | 75,0 | 150 | 53,6 | 0,065 |
Não | 5 | 25,0 | 129 | 46,1 | ||
Zumbido | Sim | 2 | 10,0 | 23 | 8,2 | 0,677 |
Não | 18 | 90,0 | 257 | 91,8 | ||
Plenitude aural | Sim | 4 | 20,0 | 19 | 6,8 | 0,056 |
Não | 16 | 80,0 | 261 | 93,2 | ||
Dificuldade de compreensão | Sim | 2 | 10,0 | 61 | 21,8 | 0,267 |
Não | 18 | 90,0 | 219 | 78,2 | ||
Acústica da sala | Ruim | 6 | 30,0 | 56 | 20,0 | 0,268 |
Boa | 14 | 70,0 | 223 | 79,6 | ||
Localização da sala | Ruim | 1 | 5,0 | 31 | 11,1 | 0,707 |
Boa | 19 | 95,0 | 248 | 88,6 | ||
Concentração durante as aulas | Ruim | 1 | 5,0 | 21 | 7,5 | 0,999 |
Boa | 19 | 95,0 | 257 | 91,8 |
*Teste de Quiquadrado significativo a 5%;
significativo p≤0,05
Legenda: n = número
As respostas dos questionários de alunos e professores, cujas salas de aula situam-se no primeiro andar, ao serem comparadas com as respostas dos alunos e professores, cujas salas de aula situam-se no segundo e terceiro andares, evidenciaram que, no primeiro andar, o desempenho é mais afetado (p=0,045), o professor fala mais alto que o habitual (p=0,036), a acústica da sala é considerada ruim (p=0,001) e a localização da sala de aula é considerada ruim (p<0,001).
A exposição prolongada ao ruído acarreta uma série de efeitos nocivos à saúde(1-3,6,8-12) e, quando presente no ambiente de trabalho, interfere negativamente nas atividades laborais. Diante disto, Normas Regulamentadoras (NR) foram criadas a fim de garantir o conforto e segurança acústicos no ambiente laboral, regulamentando os limites de tolerância para exposição ao ruído contínuo ou intermitente(19) e os níveis de ruído adequados a ambientes em que há realização de atividades que exijam solicitação intelectual(20).
No presente estudo, foram analisados níveis de pressão sonora em salas de aula, local no qual há grande demanda de atenção e exigência intelectual. Dessa forma, os limites aceitáveis de ruído deveriam estar de acordo com as normas NR-17 e NBR-10152, que preconizam níveis de ruído para conforto acústico em ambientes diversos, dentre eles a sala de aula, em 40-50 dB(A)(17,20).
Os valores dos níveis de pressão sonora, encontrados em cada ponto em que foi realizada a medição dentro das salas de aula, não apresentaram diferenças estatisticamente significantes. No entanto podemos observar que a média dos valores registrados encontra-se acima dos níveis de conforto preconizados pela legislação. Em relação aos turnos, foram encontradas diferenças estatisticamente significantes, sendo as salas do turno da manhã as mais ruidosas, o que pode ser justificado pelo maior número de cursos que são ofertados no ICBS neste turno. As medições durante o horário do almoço – salas de aula vazias - foram realizadas a fim de verificar o ruído gerado pela própria sala de aula, pois este é um fator notório bastante relatado por professores e interfere fortemente nas atividades acadêmicas(4). A média dos valores de NPS registrados foi de 49,9 dB(A) e podemos observar que este valor está inadequado, tendo em vista que a legislação internacional preconiza um nível de ruído de 35 dB(A)(21). Após a retirada do horário do almoço, percebemos que a diferença do nível de pressão sonora – nas salas de aula - entre os andares, passa a apresentar valores estatisticamente significantes, tendo o primeiro andar apresentado maiores médias de valores registrados, podendo ser classificado como o andar que possui as salas de aula mais ruidosas. Este fator se dá, principalmente, devido à localização de duas entradas neste andar, um estacionamento e corredores laterais externos com grande fluxo de pessoas. Todos os valores encontrados estão em desacordo com a legislação, que preconiza valores de 40 dB(A), para conforto acústico, e de 50 dB(A), o nível sonoro aceitável para atividades em salas de aula(17).
A diferença de valores apresentados em relação ao número de alunos participantes de cada curso se deve à maior aceitação dos professores e alunos do curso de Fonoaudiologia em participar da pesquisa. E o número de alunos participantes entre os turnos está relacionado ao número de cursos que possuem a maior parte da grade curricular nestes turnos (matutinos e vespertinos). No ICBS, no turno da manhã, acontecem aulas dos cursos de Fonoaudiologia, Fisioterapia, Odontologia e Enfermagem. E, no período da tarde, apenas Ciências Biológicas, Educação Física e Odontologia.
Por meio dos valores de níveis de pressão sonora registrados, e observações realizadas pelas pesquisadoras, concluiu-se que existem diversas fontes sonoras de ruído que interferem nas salas de aula, como conversas entre os alunos, ventiladores, o trânsito de pessoas nos corredores e dentro das próprias salas, sons de carros e alarmes do estacionamento. Todos estes fatores são contribuintes para um ambiente de sala de aula ruidoso e desconfortável, colocando os alunos e professores expostos a estímulos além daqueles advindos da atividade de ensino-aprendizagem(7).
A presença do ruído nas salas de aula é percebida tanto por professores quanto pelos alunos, sendo apontada como um dos fatores que interferem na concentração dentro da sala de aula, no desempenho acadêmico e na inteligibilidade das aulas. Estudos realizados confirmam que o ruído é um fator contribuinte para que o processo comunicativo não ocorra de forma eficaz, interferindo também nas habilidades auditivas, dificultando a transmissão e recepção de informações e interferindo diretamente no ensino-aprendizagem(1-7,14-16,22).
Outro importante fator ligado à presença de níveis de pressão sonora elevados dentro das salas de aula é o impacto na voz do professor. Os dados obtidos nos questionários apontam que 85,0% dos professores entrevistados relatam falar mais alto que o habitual devido à presença do ruído nas salas de aula e 75,0% referem sentir cansaço vocal após as aulas. Estes achados encontram correspondência na literatura, que demonstra associação entre o ruído interno das salas de aula e o esforço realizado para falar, acarretando a manifestação de alterações vocais(9-11,16,23). Estas alterações, principalmente em professores, interferem negativamente em seu desempenho profissional, gerando impacto desfavorável na qualidade de vida dos docentes(9,10,16). Considerando que o nível habitual de fala é de 60 dB e, para salas de aula, 65 dB(5,10,24), o ideal é que a fala esteja 10 dB acima do nível do ruído, um ambiente saudável seria uma sala de aula que apresentasse um nível de pressão sonora de, no máximo, 55dB(A).
Os sintomas não auditivos mais referidos, tanto por professores quanto pelos alunos, foi o cansaço excessivo e dor de cabeça. Estes achados corroboram os da literatura(11,23,25) que os apresenta como sintomas mencionados pelos participantes de outros estudos, entretanto não sendo os mais frequentes. Não é possível afirmar que existe relação direta entre a ocorrência dos sintomas e o nível de pressão sonora nas salas de aula apenas, uma vez que não foram investigados outros hábitos auditivos na população do presente estudo. No entanto já são conhecidos os inúmeros efeitos não auditivos ocasionados pelo ruído(1,3,6,8-12) e podemos, então, inferir que existe a contribuição deste somado a outros fatores ambientais, psicológicos e físicos(9,11-13). O ruído está entre os agentes responsáveis pelo estresse, cefaleia, dificuldade de concentração e baixo rendimento(1,3,6,8-12), condições comprometedoras da saúde física e mental.
Docentes e discentes têm percepções diferentes sobre o ambiente da sala de aula e este fato pode ser explicado devido a: posição que ocupam dentro da sala, estando o professor na maioria das vezes à frente da turma, próximo ao quadro; número, sendo apenas um professor frente a uma classe de vários alunos – (sendo os alunos os principais responsáveis pelo ruído advindo das conversas); atividades desempenhadas. Neste estudo, a grande maioria dos professores afirmou que seu desempenho é afetado pela presença do ruído na sala de aula em contrapartida à apenas um pouco mais da metade dos alunos. Estas diferenças nas respostas de alunos e professores nos levam a concluir que os alunos não percebem o ruído que eles produzem, concordando com a literatura que afirma que é possível que nos habituemos aos ruídos cotidianos e, neste caso, aos ruídos que nós mesmos produzimos(6).
O primeiro andar, como citado anteriormente, é o andar que possui as salas de aula mais ruidosas, e os resultados referentes às respostas dos questionários de alunos e professores e sua relação com os andares, nos mostram que as salas de aula do primeiro andar apresentaram o maior número de respostas afirmativas, indicando que os participantes referem que seu desempenho acadêmico é afetado pelo ruído. Este resultado se relaciona com os achados da questão oito do questionário, referente à avaliação da acústica das salas de aula, sendo menor o número de avaliações positivas atribuídas ao primeiro andar. O segundo andar foi o mais bem avaliado em relação à sua localização e acústica, tendo sido considerado como adequado pela quase totalidade dos participantes.
O ruído presente nas salas de aula é um fator preocupante e que produz efeitos indesejáveis tanto em professores quanto em alunos(1-7,14-16,23-25). Sendo a Universidade o local para o preparo para o ingresso no mercado de trabalho, deve-se estar atento a este fator para que o processo de ensino-aprendizagem não seja prejudicado. Esta é uma ação de corresponsabilidade entre alunos, professores, funcionários e corpo técnico-administrativo. Deve-se optar por um bom projeto arquitetônico acústico para que os coeficientes de refração e absorção dos materiais utilizados na construção sejam bem observados e contribuam para um ambiente acusticamente confortável e adequado.
Além das ações de modificações estruturais, o investimento em medidas de promoção à saúde no ambiente educacional é um importante catalizador de mudanças significativas e eficazes.
Uma das limitações do presente estudo é a ausência de medidas relacionadas à dose equivalente de exposição ao ruído dos participantes, visto que os níveis de pressão sonora podem apresentar valores variáveis ao longo do período das aulas. A inclusão de dosimetria poderia permitir uma melhor investigação dos efeitos do ruído na população estudada. Entretanto, é importante salientar que o presente estudo, não teve como objetivo investigar a dose equivalente de exposição ao ruído de professores e alunos ao longo de suas atividades acadêmicas, mas sim correlacionar a autopercepção do ruído com as medidas de níveis de pressão sonora nas salas de aula que participaram do estudo, no momento da aplicação dos questionários.
A partir dos resultados do presente estudo, podemos concluir que os níveis de pressão sonora mensurados nas salas de aula avaliadas ultrapassam os níveis preconizados pela legislação nacional, tendo sido relatado por alunos e professores como um fator que interfere negativamente nas atividades realizadas nas salas de aula.
A melhoria das condições acústicas das salas de aula, associada a ações de conscientização sobre os efeitos do ruído para a saúde e promoção de saúde auditiva, pode contribuir significativamente com a redução dos níveis de pressão sonora no ambiente educacional.