Print version ISSN 0103-2100On-line version ISSN 1982-0194
Acta paul. enferm. vol.32 no.2 São Paulo Mar./Apr. 2019 Epub June 10, 2019
http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201900017
O Curso de Enfermagem da Escola de Enfermeiras do Hospital São Paulo (EEHSP), hoje Escola Paulista de Enfermagem (EPE), foi criado em 1939 pela colaboração entre a Escola Paulista de Medicina (EPM) e a Arquidiocese de São Paulo, com a vinda das religiosas enfermeiras diplomadas francesas do Instituto das Franciscanas Missionarias de Maria.(1) Sua história se confunde com a própria história da profissão no Brasil, pois embora o modelo Nightingaleano ou Enfermagem Moderna já se fizesse presente, na esteira do movimento de Reforma Sanitária, suas origens remontam a uma época em que o ensino profissional da Enfermagem era incipiente e ainda fortemente influenciado pelo modelo de formação religiosa das Santas Casas de Misericórdia.(1)
Em que pese esse forte cunho religioso, expresso pelo lema “Non vivere nisi ad serviendum” - que permaneceu até 2007,(2) o curso foi criado para viabilizar e garantir a qualidade da assistência no recém-fundado Hospital São Paulo, campo de formação da EPM e desde sua concepção, teve por objetivo formar profissionais nos moldes da Escola de Enfermagem Anna Nery (EEAN).(2–4) Seu Regimento foi elaborado em conformidade com o Decreto n° 20.109, de 15 de junho de 1931,(1,5) que fixava as condições para fins de equiparação e reconhecimento dos diplomas das escolas de enfermagem no Brasil, e tinha como requisitos ser dirigida por enfermeira diplomada, ensino de conteúdos de enfermagem e supervisão das atividades práticas exercidos por enfermeiras, além de critérios admissionais e de organização programática da EEAN.(5)
Primeiro curso de enfermagem de São Paulo e, à época, um dos dez existentes no país(1,3,4) o curso da EEHSP teve o currículo respaldado no modelo Nightingaleano, focado no âmbito hospitalar e curativo da prática médica, acompanhando a expansão da rede hospitalar, além de moldado no curriculo da EEAN que, por sua vez, se espelhou no “Standard Curriculum for Nursing School” norte americano, sem que fossem feitas adaptações à realidade nacional.(1)
Com carga horária total de 4.200h, cerca de 12h de atividades diárias de aulas teóricas e teórico-práticas realizadas nas instalações do curso médico e atividades práticas cumpridas no HSP, onde assumiam todas a ações assistenciais nas 24h, com a supervisão das enfermeiras religiosas, o curso com duração de 3 anos possuía corpo docente formado pelos professores das áreas clínicas e de ciências básicas da EPM e pelas religiosas enfermeiras.(2,3)
As aulas se iniciaram em 15 de março de 1939 e no final desse mesmo ano a diretora da EEAN, indicada pelo Ministro da Educação, realiza a primeira inspeção para emissão do parecer de reconhecimento do curso e aponta a necessidade das religiosas Marie Domineuc, Maria Hermana José e Maria de Fontenelle, diplomadas pela Escola de Enfermagem de Paris, realizarem a revalidação de seus diplomas sendo aprovadas nos exames realizados. Em 1941, após 2 anos de funcionamento do curso, foi solicitada nova visita de inspeção para obtenção da equiparação definitiva, realizada em janeiro de 1942 e obtida em 01/04 1942 com a publicação do Decreto 9.101 de 24/03/1942.(2,3)
A direção da EEHSP ficou a cargo de Madre Maria das Dores, diplomada pela Escola Anna Nery, no período de 1939 a 1944, sendo sucedida por outras enfermeiras religiosas até 1976, quando a primeira diretora laica, enfermeira Esmeralda Augusto, assumiu a direção da escola. No HSP a direção de Enfermagem é exercida pela Madre Marie Domineuc entre 1937 e 1947,(2,3) e as Irmãs Franciscanas Missionárias de Maria permaneceram na chefia do Serviço de Enfermagem do HSP até 1970, quando a direção passa a ser laica e é assumida por uma egressa do curso.(2,3) Em seu tempo essas lideranças se dedicaram intensamente, não apenas na construção do curso, mas também da profissão de Enfermagem no Brasil, por meio de suas participações ativas na fundação e organização de associações de classe, nacionais e internacionais, nos eventos e reuniões de Escolas de Enfermagem no Brasil, além dos colegiados da EEHSP.
Em 1949 com a Lei n° 775 de 6/8/49 o currículo do curso sofre modificações fortalecendo o modelo clínico e a assistência hospitalar, com a exclusão de conteúdos de Enfermagem em Saúde Pública e Ciências Sociais que passam a ser optativas. Em 1962 o curso é reconhecido como curso superior, de acordo com o Parecer 271/62 do Conselho Federal de Ensino. Em 1968 a EEHSP torna-se Escola Paulista de Enfermagem (EPE) e em 1977 é federalizada e incorporada como Departamento da Escola Paulista de Medicina.(1,4)
Em 1968 com a reforma e expansão do ensino superior a EPE se organizou em departamentos e em 1972, pelo Parecer CFE n° 163/72 e Resolução n° 4/72, o curso sofre nova modificação do currículo mínimo. Desenvolvido em três componentes, pré-profissional, um eixo comum profissional e as habilitações, permanecendo o enfoque curativo e hospitalar.(1)
Na década de 80, face a nova Constituição, a criação do Sistema Único de Saúde (SUS) e a Lei Orgânica da Saúde as escolas de enfermagem empreenderam esforços para modificar o currículo vigente. Estudos sobre perfil epidemiológico demandas da população, perfil e competências desejadas para egressos foram realizados e se propôs que os cursos se desenvolvessem em 4 anos, com carga horária de 4.540h, sendo aprovado pelo Parecer n° 388 de 1983.(1)
Nos anos 90 o avanço das pesquisas e discussões, em diversos espaços nacionais e internacionais, sobre nomenclatura e diagnósticos de enfermagem, bem como sobre quais eixos constituir os cursos, resultam em nova mudança curricular com a definição de carga horária mínima de 3.500h e prazos mínimo de 4 e máximo de 6 anos para a conclusão do curso.(1)
Em 2001, o Ministério da Educação inicia o processo de discussão para proposição das Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs), por meio das quais postula o conjunto de competências e os eixos temáticos para construção dos Projetos Pedagógicos de Curso (PPCs) que devem ser adequados às necessidades da população em que se inserem os cursos e em atendimento ao previsto na Constituição Federal no que diz respeito ao SUS como norteador da formação dos recursos humanos em saúde.(1) Nesta ocasião o curso de graduação da EPE promove e participa de uma ampla discussão, em seus colegiados e entre seus pares no âmbito nacional, sobre os requisitos contido na DCN e os objetivos para os cursos de enfermagem, considerando seu entorno e adequações necessárias para transformação de seu currículo.(1)
No decorrer desses anos o Curso de Enfermagem e a EPE evoluíram da transmissão para a produção e difusão do conhecimento científico, por meio do periódico Acta Paulista de Enfermagem e do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem - nível Mestrado e Doutorado acadêmicos, ambos com mais de trinta anos de existência.(6) O sucesso no acompanhamento das transformações profissionais, sociais e políticas do cenário nacional, deve-se à forte participação de suas lideranças nas reformas curriculares e no contínuo esforço para o desenvolvimento da Enfermagem, sempre sustentado pela filosofia do curso - “pautada no valor do cuidado ao ser humano, sua dignidade e integralidade; no conhecimento científico, competências e habilidades do profissional; respaldada pela ética que requer o preparo para a reflexão, a crítica construtiva, a inovação e a busca da autodeterminação profissional”.
Hoje, após 80 anos da sua criação e já tendo graduado mais de 3.000 estudantes, o curso se destaca como um centro formador de profissionais de excelência no ensino de Enfermagem, na pesquisa e na assistência, sendo reconhecido pela produção de conhecimento, o pensamento crítico e o compromisso com a saúde dos indivíduos e comunidades. E como atesta sua história, continuará atuando para promoção da profissão e para o enfrentamento dos novos desafios da assistência, do ensino e da pesquisa.