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O cuidado ao idoso do ponto de vista fonoaudiológico na rede assistencial em saúde de Florianópolis: uma ação de vigilância em saúde

O cuidado ao idoso do ponto de vista fonoaudiológico na rede assistencial em saúde de Florianópolis: uma ação de vigilância em saúde

Autores:

Gabriela Maciel Mafra,
Karina Mary de Paiva Vianna

ARTIGO ORIGINAL

CoDAS

versão On-line ISSN 2317-1782

CoDAS vol.29 no.5 São Paulo 2017 Epub 06-Nov-2017

http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20172016226

INTRODUÇÃO

O envelhecimento populacional é uma realidade no Brasil e no mundo decorrente da transição demográfica em função da diminuição das taxas de fecundidade e mortalidade e pelo aumento da expectativa de vida(1,2). Aliada a esta transição, observam-se mudanças no processo saúde doença, com aumento da prevalência de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT), como doenças cardiovasculares, Diabetes Mellitus, doenças respiratórias crônicas e neoplasias.

Essas mudanças impactam o planejamento das ações em saúde, já que as DCNT necessitam de controle e monitoramento como forma de prevenir complicações que podem gerar impacto no estado de saúde e na capacidade funcional dos idosos, comprometendo sua autonomia e qualidade de vida, além de representar um desafio para o sistema de saúde, em função do aumento de gastos em saúde direcionados para o tratamento e recuperação destes agravos(3).

O modelo assistencial orientador das ações na atenção básica em Florianópolis é a Estratégia de Saúde da Família (ESF), implementada em 2005. Em 2011, Sisson e colaboradores(4) descreveram que a cobertura populacional das famílias cadastradas na ESF do município era de 77,6% com 87 ESF implantadas. Atualmente, existem aproximadamente 140 equipes de Saúde da Família e 100% de cobertura ESF. Apesar disso, ainda existem dificuldades relacionadas à tecnologia operacional que define o Centro de Saúde como porta de entrada preferencial, em função do uso de serviços de pronto atendimento como fonte de cuidado regular. Como forma de organizar o modelo e a assistência à atenção básica, foram definidas ações prioritárias para idosos, implantação do Programa Saúde do Idoso, denominado Capital Idoso e tentativa de criação e/ou manutenção de atividades de grupos de promoção da saúde como prática de atividade física (Floripa Ativa), antitabagismo e grupos de portadores de agravos específicos como hipertensos e diabéticos.

A produção do cuidado visa à integralidade da atenção ao envelhecimento saudável garantido vínculo na assistência. A prática do cuidar deve se configurar em um modo de agir que incorpora as vivências e a fragilidade social da população no território de modo contínuo. O cuidado à saúde do idoso deve incorporar ações de promoção da saúde que permitam autocuidado e automonitoramento, além da busca ativa desta população visando minimizar indicadores que refletem em gastos em saúde(5).

Os grupos operacionais na atenção primária são planejados com base nos marcadores de saúde de cada território, já que a convivência com DCNT representa risco de complicações em saúde. As ações desenvolvidas nestes grupos visam alertar para a importância do controle e tratamento medicamentoso, assim como de adoção de um estilo de vida saudável. Aliado a isto, vale ressaltar que o envelhecimento natural do organismo humano pode afetar órgãos e funções comprometendo a funcionalidade e tornando o idoso mais vulnerável(6). A presença de declínio funcional pode ser destacada como o principal determinante de fragilidade nessa população, que pode ser entendida como preditora do risco de incapacidade, hospitalização, institucionalização e morte. Assim, o reconhecimento de idosos frágeis representa um importante indicador no planejamento em saúde.

Este estudo teve por objetivo verificar aspectos relacionados ao cuidado na atenção à saúde do idoso, como forma de efetivar ações de vigilância em saúde.

MÉTODO

Trata-se de um estudo observacional transversal descritivo com idosos (indivíduos com 60 anos e mais) que possuem Hipertensão Arterial (HA) e/ou Diabetes Mellitus (DM), participantes de grupos de promoção da saúde propostos em Centros de Saúde: João Paulo, Lagoa da Conceição, Córrego Grande e Ponta das Canas no período de junho a setembro de 2015.

A rede de atenção à saúde do município de Florianópolis é dividida em cinco distritos sanitários (DS): centro, continente, norte, leste e sul. Esses distritos são compostos por Centros de Saúde (CS) e, alguns deles, por Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e Unidades de Pronto Atendimento (UPA). Foi realizado um levantamento com os coordenadores de centros de saúde para verificar os grupos operantes no município e foram identificados grupos de promoção da atividade física e grupos de convivência para idosos. Foi realizado o contato com os responsáveis pela condução dos grupos, explicado a respeito dos objetivos da pesquisa e agendada a coleta de dados. A amostra foi de conveniência por reunir idosos que participavam do grupo nos dias da coleta. Foram estabelecidos dois dias de coleta em cada grupo visitado.

Para a coleta de dados, foi usado um questionário com informações referentes à participação em grupo de idosos do município, ao cadastro na ESF, consultas nos CS, diagnóstico, controle e percepção quanto aos riscos e complicações da convivência com HA e/ou DM. Os questionários foram aplicados pela pesquisadora antes do início dos grupos ou ao seu término. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Os dados coletados foram armazenados no software Microsoft Excel®. Foi realizada uma análise estatística descritiva referente às características sociodemográficas e ao conhecimento e percepção de questões relacionadas à HA e ao DM. Foram realizadas análises de associação entre participar dos grupos propostos pelo município e aspectos sociodemográficos e questões relacionadas ao cuidado com a HA e DM. O teste de associação aplicado foi o Quiquadrado, o nível de significância adotado foi de 5%, as análises foram conduzidas no Programa STATA 11.0.

Este estudo fez parte de um projeto de pesquisa intitulado Fonoaudiologia e SUS: Contribuições Fonoaudiológicas na Vigilância de Agravos Não Transmissíveis, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa para Seres Humanos (CEPSH) da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC), segundo o Parecer 1.018.426.

RESULTADOS

Foram entrevistados 58 idosos participantes de grupos de promoção da saúde de quatro centros de saúde do município de Florianópolis. Foi encontrada maior porcentagem de participantes do sexo feminino (91,38%), a média de idade foi 73,03 (dp=7,53) anos, com faixa etária variando entre 61 e 87 anos. No que se refere ao estado civil, 29 (50%) dos idosos relataram ser viúvos e 18 (31%) casados. A maioria referiu ser da raça branca (94,83%), com nível de escolaridade ensino fundamental (56,90%), e, com relação à religião, a católica foi a mais relatada (84,48%) (Tabela 1).

Tabela 1 Distribuição das características sociodemográficas dos idosos, segundo participação ou não no grupo de convivência. Florianópolis, SC, 2015 

Características sociodemográficas Participa dos grupos do Programa Floripa Ativa População total P
Não Sim
n % n % n %
Idade 0.056*
<73 anos 16 53,3 6 28,6 30 51,7
74 anos e mais 14 46,7 20 71,4 28 48,3
Sexo 0.948
Feminino 22 91,38 31 91,2 5 8,6
Masculino 2 8,62 3 8,8 53 91,4
Escolaridade 0.034*
Não alfabetizado - - 3 8,8 3 5,2
Ensino Fundamental 10 41,7 23 67,6 33 56,9
Ensino Médio 5 20,8 4 11,8 9 15,5
Ensino superior ou mais 9 37,5 4 11,8 13 22.4
Estado Civil 0.268
Solteiro 1 4,2 4 11,8 5 8,7
Casado 10 41,6 8 23,5 18 31,0
Separado 1 4,2 5 14,7 6 10,3
Viúvo 12 50,0 17 50,0 29 50,0
Raça 0.771
Branca 23 95,8 32 94,1 55 94.8
Outras 1 4,2 2 5,9 3 5,2
Religião 0.016*
Católica 17 70,8 32 94,1 49 84,5
Outras 7 29,2 2 5,9 9 15,5
Profissão 0.317
Aposentado 6 25,0 12 35,3 18 31,0
Do lar 5 20,8 11 32,3 16 27,6
Área da educação 7 29,2 4 11,8 11 18,9
Outras 6 25,0 7 20,6 13 22,5

A maioria dos participantes (84,48%) relatou ser cadastrada na Estratégia Saúde da Família (ESF) e 41,38% (24) participam do Programa Floripa Ativa. Quanto às DCNT, 55 (94,83%) idosos relataram possuir Hipertensão Arterial (HA), 26 (44,83%), Diabetes Mellitus (DM), e 23 (39,66%) possuem diagnóstico de ambas as comorbidades (Tabela 2).

Tabela 2 Distribuição quanto aos centros de saúde pesquisados, participação no Floripa Ativa e comorbidades relatadas pelos idosos. Florianópolis, SC, 2015 

Variáveis n %
Centro de Saúde
João Paulo 10 17,24
Lagoa da Conceição 24 41,38
Córrego Grande 14 24,14
Ponta das Canas 10 17,24
Floripa Ativa
Participantes 24 41,39
Não participantes 34 58,62
Comorbidade
Hipertensão Arterial 55 94,83
Diabetes Mellitus 26 44,83
Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus 23 38,65

Com relação às características inerentes à HA, 93,10% dos idosos relataram que o diagnóstico foi realizado pelo médico, com uma média de tempo igual 5,12 anos. Quanto à frequência de visitas ao Centro de Saúde (CS) como forma de controle da HA, a maioria (60%) relatou fazer acompanhamento de rotina, seguida por 34,55%, que disseram só frequentar em caso de problemas de saúde.

Com relação às atividades promovidas pelos CS relacionadas à HA, apenas 36,36% dos idosos relataram já ter tido conhecimento dessas atividades. Quando questionados quanto à participação nestas atividades, a maioria (64,45%) nunca participou, seguida de 35,55%, que participaram ao menos uma vez.

No que se refere às complicações, 30,91% já precisou ser internado por conta dessa DCNT e com relação aos riscos da falta de controle da doença, 76,36% afirmaram possuir conhecimento, sendo o Acidente Vascular Cerebral (AVC) o mais relatado (66,67%) (Tabela 3).

Tabela 3 Distribuição das características referidas quanto à Hipertensão Arterial (HA), Florianópolis, SC, 2015. (n=55) 

Características da HÁ n %
Tempo de diagnóstico (média) 5,12 anos -
Diagnóstico
Médico 54 98,18
Enfermeiro 1 1,82
Visita aos CS
Exames de rotina 33 60,00
Problema de saúde 19 34,55
Nunca 3 5,45
Conhecimento de atividades sobre HA
Sim 20 36,36
Não 35 63,64
Participação em atividades sobre HA
Ao menos 1 vez 19 35,55
Nunca 36 64,45
Internação
Sim 17 30,91
Não 38 69,09
Conhecimento quanto aos riscos
Sim 42 76,36
Não 13 23,64

Com relação às características inerentes ao DM, todos os idosos relataram que o diagnóstico foi realizado pelo médico, com tempo médio de diagnóstico de 4,88 anos.

Quanto às visitas ao CS para controle do DM, pouco mais da metade (57,69%) relatou fazer acompanhamento de rotina, seguido de 30,77% que só frequenta em caso de problemas de saúde.

No que se refere ao conhecimento de atividades promovidas pelo CS relacionadas à DM, apenas 42,31% relatou já ter tido conhecimento. Com relação à participação nestas atividades, a maioria (69,23%) nunca participou, seguida de 30,77%, que já participaram ao menos uma vez.

Quanto às complicações, 23,08% já precisaram ser internados por conta dessa DCNT e com relação aos riscos da falta de controle da doença, 57,69% afirmam possuir conhecimento. Dentre os riscos relatados pelos idosos, estão a cegueira (26,67%), problemas renais (13,33%) e perda dos membros (13,33%) (Tabela 4).

Tabela 4 Distribuição das características referidas quanto ao Diabetes Mellitus (DM), Florianópolis, SC, 2015. (n=26) 

Características do DM n %
Tempo de diagnóstico (média) 4,84 anos -
Diagnóstico
Médico 26 100
Visita aos CS
Exames de rotina 15 57,69
Problema de saúde 8 30,77
Nunca 3 11,54
Conhecimento de atividades sobre DM
Sim 11 42,31
Não 15 57,69
Participação em atividades sobre DM
Ao menos 1 vez 8 30,77
Nunca 18 69,23
Internação
Sim 6 23,08
Não 20 76,92
Conhecimento quanto aos riscos
Sim 15 57,69
Não 11 42,31

Foram observadas associações entre ser participante do Programa Floripa Ativa e ser mais idoso, ou seja, pertencer à faixa etária: maior que 76 anos (p=0.056); possuir maior nível de escolaridade (p=0.026) e participar mais de atividades referentes ao Diabetes Mellitus (p=0.059).

DISCUSSÃO

Os resultados mostraram que os idosos possuem conhecimento quanto aos riscos da falta de controle das DCNT pesquisadas (HA e DM), porém este conhecimento não envolveu agravos fonoaudiológicos decorrentes de complicações e/ou tratamento das DCNT. Além disso, pouco mais da metade dos idosos relatou frequentar o CS para exames de rotina e menos da metade dos participantes possui conhecimento quanto às ações promovidas pelos CS voltadas a estas DCNT e, como consequência, observou-se baixa adesão a estas ações.

A Estratégia Saúde da Família no município de Florianópolis possui como prática rotineira a realização de atividades em diversos grupos, entre eles, grupos com usuários portadores de agravos específicos, bem como de educação em saúde e atividades para idosos(4). A ESF é determinante para a operacionalização da Vigilância em Saúde, uma vez que esta planeja as ações de saúde com base em dois princípios básicos da ESF: a corresponsabilidade sanitária e a participação social(7).

O avanço da idade é um fator importante no aumento da prevalência de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT), principalmente quando associado a hábitos pouco saudáveis e restrita informação a respeito do cuidado em saúde. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus são consideradas como DCNT que se caracterizam como doenças de extensa duração, por isso estão entre as que mais necessitam de ações e estratégias de saúde(6,8,9). Sendo assim, é necessário priorizar a promoção da saúde, a prevenção de complicações, a acessibilidade ao cuidado primário e longitudinal(3).

Dentre os participantes da pesquisa, observou-se predominância do sexo feminino, viúvas, com escolaridade até o ensino fundamental e renda mensal de um a três salários mínimos. Esse dado corrobora um estudo realizado, também no município de Florianópolis, cujo objetivo foi verificar a associação entre condições de saúde e nível de atividade física em idosos participantes e não participantes de grupos de convivência do munícipio. Tal pesquisa identificou maior participação de mulheres viúvas com baixa escolaridade e renda nestes grupos(10). Esse achado pode estar relacionado com a resistência de idosos viúvos do sexo masculino em realizar atividades após a aposentadoria. Além disso, a adesão do sexo feminino à atividade de autocuidado é relatada em outros estudos, em função da maior preocupação com a saúde e com a prevenção de doenças(10,11).

Nos últimos anos, houve um aumento de incentivos governamentais e não governamentais em estratégias que favoreçam atenção à saúde do idoso no Brasil. Entre elas, estão os grupos de convivência para idosos, cujos benefícios envolvem interação social, aumento de autoestima, suporte social e estilo de vida mais ativo e saudável. A prática de exercícios físicos contribui para a prevenção e o controle dos agravos de diversas doenças crônicas(10,12,13). O município de Florianópolis possui um programa de atividade física, denominado Floripa Ativa, que ocorre nos centros de saúde da cidade desde 2006, cujos objetivos principais são reabilitação, promoção e prevenção de saúde da população idosa(14). No presente estudo, a grande maioria dos idosos relatou ser cadastrada na Estratégia Saúde da Família e apresentou ao menos uma DCNT, embora esse número seja significativo, o percentual de participantes do Programa Floripa Ativa não chega a atingir metade dessa população.

Um estudo realizado em 2009(15) analisou os fatores e índices motivacionais para a adesão de idosos participantes do Floripa Ativa. O referido estudo concluiu que os principais fatores da adesão ao programa foram saúde, prazer e sociabilidade. Dessa forma, entendeu-se que há grandes possibilidades de os idosos permanecerem realizando as atividades propostas, visto que há fatores motivacionais significativos. No entanto, o estudo afirma que a inserção ao programa ocorre a partir de uma oportunidade, ou seja, para que haja efetiva adesão é necessário e fundamental que tais oportunidades sejam oferecidas e indicadas aos idosos. Diante dos resultados encontrados que indicaram baixa participação dos idosos neste programa, sugere-se que a inserção dos idosos que frequentam os grupos de convivência ao Floripa Ativa requer ações motivacionais e de divulgação do grupo.

A vigilância em saúde abrange a prevenção e o controle de fatores de risco tanto em doenças transmissíveis, quanto em doenças não transmissíveis. Sendo assim, é indispensável que essa ação ocorra de forma integrada entre todas as áreas e em todos os níveis do Sistema Único de Saúde(6,16). A HA e o DM se configuram em DCNT que requerem controle e monitoramento para prevenção de agravos. Sob a ótica da Fonoaudiologia, tendo em vista que uma das principais complicações da HA é o AVC e que este pode levar a um distúrbio de linguagem que pode comprometer severamente a vida social do idoso, ações de educação em saúde junto aos grupos voltados a estes agravos específicos contribui na efetivação do cuidado integral e representa uma ação de vigilância em saúde. No que tange ao DM, uma das consequências pode ser a perda auditiva que se torna um fator potencializador, pois o envelhecimento natural já pode ser considerado um fator de risco para a perda auditiva.

A longitudinalidade do cuidado vista como uma relação de longa duração entre equipe de saúde, paciente e família apresenta benefícios para todos, pois contribui para a melhor percepção das necessidades dos indivíduos, diagnóstico mais conciso, ações de promoção e prevenção de saúde mais elaboradas e maior satisfação dos pacientes(17). Os aspectos fonoaudiológicos como a perda da audição e até mesmo a afasia tendem a compor um papel natural, como aspecto componente do processo do envelhecimento ou de um quadro resultante do AVC. Assim, o idoso pode apresentar comportamentos de isolamento social e depressão, que muitas vezes não são associados a estes agravos. Dessa forma, percebe-se a importância da realização de grupos de promoção e prevenção de agravos específicos e de convivência para idosos, e principalmente a necessidade de conhecimento da ESF para detectar situações de vulnerabilidade em função do próprio processo do envelhecimento e de agravos, como forma de aumentar a adesão desta população a estas ações.

A maioria dos participantes possui diagnóstico de HA, relatou frequentar o centro de saúde para acompanhamento de rotina e possuir algum conhecimento quanto ao risco da falta de controle da HA. A principal consequência da falta de controle da HA citada pelos idosos entrevistados foi o Acidente Vascular Encefálico (AVE). Um estudo realizado em Salvador em 2012 buscou identificar as concepções dos hipertensos sobre os fatores de risco para a doença e identificou como as consequências mais relatadas pelos participantes o AVE e o Infarto do miocárdio(18).

Os idosos participantes desta pesquisa que possuem diagnóstico de DM apontaram, em sua maioria, diferentes riscos quanto à falta de controle da doença. Os mais citados foram cegueira, problemas renais e perda dos membros. Foi possível perceber que, embora demonstrem conhecer a necessidade de realizar o controle da comorbidade, muitos se mostraram inseguros ao afirmar um risco para a falta deste controle.

Uma expressiva porcentagem dos idosos participantes possui diagnóstico de Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus. Um estudo realizado em 2013(19) buscou conhecer a relação entre zumbido e as comorbidades acima citadas. De acordo com o estudo, a DM pode ocasionar o descontrole da pressão, dessa forma, pessoas com esse diagnóstico estão mais propensas a desenvolver a HA. Do mesmo modo, a HA está associada a um maior grau de resistência à insulina, e medicamentos para o controle da HA podem piorar essa resistência, o que contribui para o aparecimento da DM. Quanto ao zumbido, o estudo concluiu que as comorbidades associadas em um indivíduo caracterizam fator de risco independente para seu surgimento.

A presente pesquisa envolveu idosos com HA, DM ou ambos. Nesse contexto, a participação do fonoaudiólogo é indispensável e seus conhecimentos devem ser incorporados nas ESF, com ações de educação em saúde, como forma de efetivar a integralidade em saúde e promover cuidado integral.

A Portaria nº. 665(20), que dispõe sobre o atendimento e a linha de cuidado aos pacientes com Acidente Vascular Cerebral (AVC), prevê o atendimento fonoaudiológico integrado às demais áreas da saúde, para a realização da prática da Linha de cuidados em AVC. No entanto, essa portaria não prevê nada a respeito da Afasia, a sequela mais comum do AVC. A afasia é uma alteração no processo de produção e/ou compreensão da linguagem, gerada por uma lesão cerebral desencadeada por acidentes vasculares cerebrais, traumatismos cranianos ou tumores, e a fonoaudiologia pode contribuir diretamente no cuidado aos pacientes acometidos por essas lesões(20,21).

Cabe, ainda, ao fonoaudiólogo, garantir, no que diz respeito à sua área de atuação, o cuidado integral ao usuário no âmbito da saúde auditiva, como dispõe a Portaria nº 2,073/GM de 28 de setembro de 2004(22) que institui a política nacional de atenção à saúde auditiva. Estudos apontam associações entre a DM e a perda auditiva, uma vez que distúrbios metabólicos podem atingir tecidos nervosos e vasculares, que afetam os órgãos responsáveis pela audição. Dessa forma, a saúde auditiva da população acometida por essa comorbidade deve ser acompanhada por profissionais da área(22-25).

Os participantes da presente pesquisa relataram o AVC como um dos riscos para a falta de controle da HA e, dentre os idosos com diagnóstico de DM, somente um relatou a perda de audição como consequência do não controle desse agravo.

Esses dados reforçam a importância dos agravos Fonoaudiológicos estarem inseridos nas ações realizadas pela vigilância em saúde, principalmente nas propostas educativas, de promoção e prevenção de saúde. O acesso à informação permite que o indivíduo com essas ou demais comorbidades busquem acompanhamento especializado e/ou reabilitação.

Uma das principais limitações encontradas na condução deste estudo se refere à dificuldade na adesão dos idosos à pesquisa, em função de estarem envolvidos nas atividades propostas nos grupos de convivência e não se interessarem em parar para responder ao questionário.

CONCLUSÃO

Os dados obtidos neste estudo sugerem que os idosos relatam ações relacionadas ao monitoramento das doenças crônicas, relatam conhecer os riscos da falta de controle delas, porém não têm conhecimentos de ações voltadas a estes agravos realizadas na atenção primária e, como consequência, observou-se baixa adesão a estas ações.

A integralidade do cuidado é essencial em ações de vigilância em saúde, como forma de garantir qualidade de vida à população idosa. Os grupos de promoção da saúde visitados integram idosos portadores de DCNT que requerem longitudinalidade do cuidado, como forma de evitar complicações que possam comprometer a autonomia e a capacidade funcional desta parcela da população.

A inserção do saber fonoaudiológico nas equipes de saúde da rede assistencial de Florianópolis, com propostas educativas incorporando ações de promoção e prevenção da saúde, representa um avanço para a efetivação do cuidado integral ao idoso, contribuindo para as ações de vigilância em saúde.

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