versão impressa ISSN 1806-3713versão On-line ISSN 1806-3756
J. bras. pneumol. vol.41 no.6 São Paulo nov./dez. 2015
http://dx.doi.org/10.1590/s1806-37562015000000299
O expressivo aumento do número de casos de tuberculose multirresistente (TB-MDR, do inglês multidrug-resistant ) e de tuberculose extensivamente resistente (TB-XDR, do inglês extensively drug-resistant ) torna essas formas da doença um grave problema de saúde pública mundial. Dados recentes mostram que o número de casos de TB-MDR triplicou entre 2009 e 2013.1 Em 2013, 3,5% dos casos novos de tuberculose e 20,5% dos casos previamente tratados foram de TB-MDR. A TB-XDR respondeu por 9% dos casos de TB-MDR notificados em 100 países.1 A TB-MDR é causada pelo Mycobacterium tuberculosis resistente à rifampicina e à isoniazida, enquanto, na TB-XDR, o bacilo apresenta resistência adicional a qualquer fluoroquinolona e a pelo menos um dos três medicamentos injetáveis de segunda linha (amicacina, canamicina ou capreomicina).1-3 O crescente reconhecimento de TB-MDR/XDR provocou o desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas utilizando novas e antigas drogas tuberculostáticas. As drogas de primeira linha (mais efetivas), de segunda linha (menos efetivas, mais tóxicas, menos eficazes e que demandam um período mais prolongado de tratamento), e as consideradas de reforço (dependendo de sua eficácia e tolerabilidade) foram agrupadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em cinco categorias. 1,4,5 A distribuição dessas drogas em categorias, assim como a recomendação da OMS para sua utilização, está demonstrada na Tabela 1.
Tabela 1 Grupos de drogas antituberculosas propostos pela Organização Mundial de Saúde e a recomendação passo a passo para compor um regime de tratamento para pacientes com tuberculose multirresistente ou extensivamente resistente.
Grupos | Drogas | Passos | Ação | Drogas a considerar | Notas |
---|---|---|---|---|---|
1 | Drogas de primeira linha v.o. • Isoniazida • Rifampicina • Etambutol • Pirazinamida • Rifabutina • Rifapentina | 1 | Escolher uma droga injetável (grupo 2) com base no teste de sensibilidade ou na história minuciosa dos tratamentos prévios. | Amicacina, capreomicina, canamicina | A estreptomicina geralmente não é utilizada pelo alto grau de resistência em pacientes portadores de TB-MDR. |
2 | Drogas i.v. • Estreptomicina • Canamicina • Amicacina • Capreomicina | 2 | Escolher uma fluoroquinolona de última geração (grupo 3). | Levofloxacina, moxifloxacina | Se houver resistência a levofloxacina, utilizar moxifloxacina. Evitar o uso de moxifloxacina, se possível, se utilizar bedaquilina. |
3 | Fluoroquinolonas • Levofloxacina • Moxifloxacina • Gatifloxacina | 3 | Adicionar duas ou mais drogas do grupo 4. | Cicloserina, terizidona, ácido para-aminossalicílico, etionamida, protionamida | Etionamida/protionamida são consideradas as drogas mais efetivas do grupo 4. Considerar a história dos tratamentos anteriores, os efeitos colaterais e o custo. O teste de sensibilidade geralmente não é realizado para este grupo de drogas. |
4 | Drogas de segunda linha v.o. • Etionamida • Protionamida • Cicloserina • Terizidona • Ácido para-aminossalicilico • Para-aminossalicilato de sódio | 4 | Adicionar drogas do grupo 1. | Pirazinamida, etambutol | A pirazinamida é comumente utilizada na maioria dos regimes. O etambutol é utilizado dependendo do teste de sensibilidade. |
5 | Fármacos de reforço • Linezolida • Ertapenem • Imipenem/cilastatina • Meropenem • Claritromicina • Tioacetazona • Amoxicilina/clavulanato • Clofazimina • Isoniazida em altas doses (ação modesta) • Bedaquilina • Delamanid | 5 | Considerar a adição das drogas do grupo 5 caso não seja possível utilizar 4 drogas efetivas dos grupos 2-3-4. | Bedaquilina, linezolida, clofazimina, amoxicilina/clavulanato, ertapenem, imipenem/cilastatina com clavulanato, meropenem com clavulanato, isoniazida em altas doses, claritromicina, tioacetazona | Caso haja necessidade de drogas deste grupo, é possível utilizar 2 ou mais drogas considerando que não haja testes de sensibilidade padronizados para este grupo de medicamentos. |
Adaptado da Organização Mundial de Saúde(1) e de Zumla et al.(8) TB-MDR: tuberculose multirresistente.
O tratamento para a TB-MDR pode ser padronizado ou individualizado. Regimes padronizados são sugeridos pelos órgãos oficiais com base nos dados de saúde (por exemplo, padrão de resistência) de determinada região. 2,3,6 No Brasil, o tratamento da TB-MDR é padronizado pelo Ministério da Saúde.7 A OMS1 recomenda o tratamento da TB-MDR em duas fases: intensiva e de manutenção. A fase intensiva, com duração de 8 meses, deve incluir no mínimo quatro drogas potencialmente efetivas: uma droga injetável (grupo 2), uma fluoroquinolona (grupo 3), uma droga oral (grupo 4) e um fármaco de reforço (grupo 5). Na fase de manutenção, retira-se a droga injetável, e as outras drogas devem ser mantidas por 12 meses após a negativação da cultura do escarro. 1,8,9 Entretanto, alguns autores sugerem o tratamento pelo período mínimo de 20 meses. Estudos recentes mostraram que a fase de manutenção pelo período de 18 meses após a negativação da cultura previne a falência, a recidiva e a mortalidade.8-11
Em relação à TB-XDR, o tratamento deve ser sempre individualmente delineado com base em uma minuciosa história do tratamento antibacilar e nos padrões de resistência às drogas de primeira e segunda linha.1,6,8 Para estes casos, a OMS1 propõe cuidados especiais, entre os quais a utilização de pirazinamida e/ou algum outro fármaco do grupo 1; a utilização de quinolonas de última geração (moxifloxacina ou gatifloxacina) mesmo se o teste de sensibilidade mostrar resistência a levofloxacina e/ou ofloxacina; o uso do agente injetável (aminoglicosídeo ou capreomicina) para qual a amostra bacteriológica é sensível, sempre que possível, e sua extensão de uso por 12 meses ou mesmo por todo o tratamento; a utilização de dois ou mais agentes do grupo 5; e a utilização de todos os agentes do grupo 4 que não foram prescritos extensivamente nos regimes prévios ou ainda aqueles que forem considerados efetivos.
O presente estudo teve como objetivo mostrar a evolução no período de 1 ano de três pacientes com TB-XDR internados no Hospital Nestor Goulart Reis (HNGR), localizado no município de Américo Brasiliense (SP), que é um hospital de referência da Secretária de Estado da Saúde do Estado de São Paulo para o tratamento de TB-MDR/XDR que necessitam internação.
Relatamos abaixo os casos de três pacientes que foram internados e tratados na nossa instituição. Os tratamentos e os testes de sensibilidade anteriores à internação desses três pacientes (identificados como pacientes 1, 2 e 3) são descritos na Tabela 2, enquanto tratamentos, testes de sensibilidade, evolução do peso corporal e resultados de baciloscopia, cultura para bacilo de Koch, VHS e proteína C reativa após a internação estão descritos na Tabela 3.
Tabela 2 Local e regime de tratamento, teste de sensibilidade, drogas utilizadas e desfechos anteriores à internação no Hospital Nestor Goulart Reis dos três casos relatados.
Tipo de regime | Teste de sensibilidade | Período (mês/ano) | Regime adotado | Desfecho | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
R | H | Z | E | S | Et | O | T | C | A | L |
Paciente 1 | ||||||||||
Amb | Res (R,H,E,S) | 05/2001-11/2001 | x | x | x | Falência | ||||
Amb | Res (R,H,E,Z,S) | 01/2003-07/2003 | x | x | x | x | x | Abandono | ||
Amb | Res (R,H,Z) | 09/2005-09/2007 | x | x | x | x | x | Abandono | ||
Amb | Res (R,H,Z); Sen (E,S) | 11/2007-07/2008 | x | x | x | x | Abandono | |||
Amb | Res (R,H,E,Z) | 08/2008-09/2010 | x | x | x | x | x | Abandono | ||
Amb | Res (R,H,E,Z,S) | 06/2011-10/2011 | x | x | x | Encaminhado para internação (Sanatorinhos, Campos do Jordão) | ||||
Hosp | Res (A,C,K,S,E,H,O,Z,R) | 10/2011-03/2013 | x | x | x | x | x | Alta disciplinar | ||
Hosp (HNGR) | Res (A,C,S,H,O,Z,R); Sen (E) | 03/2013-08/2013 | x | x | x | x | Falência | |||
Paciente 2 | ||||||||||
Amb | 03/2011-10/2011 | x | x | x | x | Falência | ||||
Amb | Res (R,H,Z,O); Sen (A,K,Cp,S,E) | 03/2012-10/2013 | x | x | x | x | Falência | |||
Paciente 3 | ||||||||||
Amb | 01/2006-05/2006 | x | x | x | Abandono | |||||
Amb | Res (R,H); Sen (Z,E,S,Et) | 06/2006-06/2007 | x | x | x | x | Abandono | |||
Amb | Res (R,H); Sen (Z,E,S,Et) | 08/2007-07/2009 | x | x | x | x | Cura | |||
Amb | Res (R,H); Sen (Z,E,S) | 09/2009-04/2010 | x | x | x | x | Falência | |||
Hosp (Sanatorinhos, Campos do Jordão) ou Amb | Res (R,H,S); Sen (Z,E) | 04/2010-03/2012 | x | x | x | x | Falência | |||
Amb | Res (R,H,S); Sen (Z,E) | 02/2013-02/2014 | x | x | x | x | x | Falência |
R: rifampicina; H: isoniazida; Z: pirazinamida; E: etambutol; S: estreptomicina; Et: etionamida; O: ofloxacina; T: terizidona; C: clofazimina; A: amicacina; L: levofloxacina; K: canamicina; Cp: capreomicina; Amb: ambulatorial; Res: resistente; Sen: sensível; Hosp: hospitalar; e HNGR: Hospital Nestor Goulart Reis.
Tabela 3 Resultados de teste de sensibilidade, tratamento realizado, evolução do peso, VHS, proteína C reativa, baciloscopia e cultura para bacilo de Koch em um ano de tratamento dos três pacientes estudados.
Paciente | Teste de sensibilidade | Tratamento | Duração | Mês | Peso, kg | VHS, mm/h | PCR, mg/l | Cultura | Baciloscopia |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
1 | Res (A,Cp,K, S,E,H,O,Z,R) | A (2-6 f) +M+E+T+Et+ Lz+I+Clr+Clv | 09/2013-09/2014 | Inicial | 55,00 | 27 | 31,6 | positiva | negativa |
1 | 54,15 | 22 | 6,7 | positiva | negativa | ||||
2 | 54,30 | 24 | < 6,0 | negativa | negativa | ||||
4 | 54,85 | 12 | < 6,0 | negativa | negativa | ||||
5 | 55,60 | 18 | < 6,0 | negativa | negativa | ||||
6 | 56,00 | 13 | < 6,0 | negativa | negativa | ||||
8 | 58,55 | 15 | < 6,0 | negativa | negativa | ||||
10 | 57,45 | 12 | < 6,0 | negativa | Negativa | ||||
12 | 58,25 | 8 | < 6,0 | negativa | negativa | ||||
2 | Res (A,Cp,K,S,H, O,Z,R); Sen (E) | S (2-6 f) +M+E+T+Et+ Lz+I+Clr+Clv | 11/2013-11/2014 | Inicial | 59,40 | 66 | 36,4 | positiva | negativa |
2 | 58,30 | 7 | < 6,0 | positiva | negativa | ||||
4 | 60,90 | 9 | < 6,0 | positiva | negativa | ||||
6 | 61,95 | 24 | 6,2 | negativa | negativa | ||||
8 | 62,55 | 13 | < 6,0 | negativa | negativa | ||||
10 | 64,15 | 10 | < 6,0 | negativa | negativa | ||||
12 | 64,90 | 6 | < 6,0 | negativa | negativa | ||||
3 | Res (A,Cp,K,S,H, O,R); Sen (E,Z) | Cp (2-6 f) +M+E+T+Et+ Lz+I+Clr+Clv+Z | 03/2014-03/2015 | Inicial | 36,30 | 89 | 91,0 | positiva | positiva |
2 | 40,75 | 10 | 59,1 | positiva | negativa | ||||
4 | 45,60 | 15 | 17,4 | negativa | negativa | ||||
6 | 46,10 | 20 | 15,7 | negativa | negativa | ||||
8 | 47,80 | 15 | 16,1 | negativa | negativa | ||||
10 | 46,90 | 34 | 9,2 | negativa | negativa | ||||
12 | 46,70 | 11 | 36,0 | negativa | negativa |
PCR: proteína C reativa; Res: resistente; Sen: sensível; A: amicacina; Cp: capreomicina; Clr: claritromicina; Clv: clavulanato/amoxicilina; S: estreptomicina; E: etambutol; Et: etionamida; I: imipenem; H: isoniazida; K: canamicina; Lz: linezolida; M: moxifloxacina; O: ofloxacina; Z: pirazinamida; R: rifampicina; T: terizidona; e 2-6 f: medicação tomada pelo paciente de segunda à sexta-feira.
As radiografias de tórax (Figuras 1, 2 e 3 em relação aos pacientes 1, 2 e 3, respectivamente) e os resultados de outros exames laboratoriais na admissão e após 1 ano de tratamento estão disponíveis no suplemento on-line no site do JBP (http://www.jornaldepneumologia.com.br/detalhe_anexo.asp?id=43).
1806-3713-jbpneu-41-06-00554-suppl2.pdf
Homem de 43 anos, tabagista (20 anos-maço), alcoolismo social e usuário de cocaína até 2011. Lavador de veículos, sem registro. Referia não adesão ao tratamento por não receber auxílio-doença e ser obrigado a trabalhar durante os diversos tratamentos prévios para tuberculose. Tinha renda familiar de R$ 800,00 (US$ 363,00). Residia em domicilio com dois quartos, onde morava com a mãe. Foi internado em 18/03/2013. O início do tratamento para TB-XDR ocorreu em 06/09/2013.
Homem de 41 anos, tabagista (20 anos-maço), dependente de álcool até 2008, negava uso de drogas ilícitas e era assistente de manutenção. Esteve em licença médica recebendo auxílio-doença durante os tratamentos ambulatoriais prévios. Sua renda familiar era de R$ 1.400,00 (US$ 437,00). Residia em domicilio com cômodo único, onde morava com a esposa, uma criança de 1 ano de idade e dois filhos adolescentes. Foi internado em 24/10/2013. O início do tratamento para TB-XDR ocorreu em 01/11/2013.
Mulher de 25 anos, tabagista (5 anos-maço), etilista social, negava uso de drogas ilícitas e era balconista em uma padaria. Seu salário era de R$ 725,00 (US$ 327,00), sem registro. Declarava apresentar má adesão ao tratamento por não ter auxílio-doença e ser obrigada a trabalhar durante os diversos tratamentos anteriores. Residia em domicilio de três quartos com mais três pessoas (uma filha de 5 anos, um irmão e sua mãe) e dormia sozinha em um dos quartos. Utilizara oxigênio domiciliar entre dezembro de 2013 e a internação no HNGR. Foi internada em 10/02/2014. O início do tratamento para TB-XDR ocorreu em 10/03/2014.
No presente estudo, relatamos três casos graves de TB-XDR, com diversos tratamentos prévios, demonstrando que a utilização de um regime de drogas baseado nas diretrizes da OMS e com uma nova proposta de associação de drogas antituberculose (linezolida e imipenem) levou a cura clínica e bacteriológica e importante melhora radiológica dos pacientes. À luz do nosso conhecimento, este é o primeiro relato de casos na América Latina e o segundo em termos globais sobre a utilização do imipenem para o tratamento de pacientes portadores de TB-XDR, assim como o primeiro relato a nível mundial sobre a cura de pacientes TB-XDR com a associação imipenem e linezolida.
No HNGR, o tratamento é iniciado após um minucioso levantamento da história clínica e medicamentosa. A baciloscopia é realizada no próprio hospital. As culturas para bacilo de Koch e os testes de sensibilidade são realizados no Instituto Adolfo Lutz e repetidos bimestralmente. Os exames laboratoriais são realizados na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade Estadual Paulista e repetidos trimestralmente. À internação, são realizadas radiografias e TCs de tórax, sendo as primeiras repetidas bimestralmente. A proposta inicial ao paciente é de tratamento hospitalar por 24 meses, dependendo da resposta clínica, bacteriológica e laboratorial.
A TB-MDR/XDR é multifatorial, podendo ocorrer por um ou mais dos seguintes fatores: administração de tuberculostáticos feita pelos serviços de saúde com esquemas ou doses inadequadas ou com esquemas por períodos demasiadamente curtos; má gestão na oferta e na qualidade das drogas; laboratórios com capacidade de resolutividade precária; adição de uma ou mais drogas a um esquema já falido; pacientes que interrompem e/ou utilizam os medicamentos de forma irregular; e pacientes que adquirem a doença através de uma cepa primariamente multirresistente.1
O fato de os pacientes 1 e 3 terem sido submetidos a diversos tratamentos prévios de forma irregular e, consequentemente, não efetivos, pode ter contribuído para as graves sequelas pulmonares observadas nas radiografias de tórax à internação. O paciente 2 fez tratamento com um esquema básico, de forma supervisionada, e o desfecho foi falência, o que poderia ser explicado por uma cepa de TB-MDR primária.
Utilizamos nove drogas diferentes para o tratamento dos pacientes 1 e 2 e dez drogas para o paciente 3, em acordo com a orientação da OMS para o tratamento de TB-MDR (Tabela 1) e as orientações especiais da mesma para a TB-XDR,1 além de fármacos aos quais as cepas encontradas se mostraram sensíveis no teste de sensibilidade. Os pacientes utilizaram, previamente à internação e de forma alternada e/ou inconsistente, drogas dos grupos 1 a 4 (Tabela 2). Somente o paciente 1 utilizou uma droga do grupo 5 (clofazimina; Tabela 2). Quando tratamos pacientes portadores de TB-XDR, há poucas alternativas medicamentosas para construir um regime de tratamento aceitável e eficiente.3 Utilizamos para os três pacientes uma droga injetável (grupo 2) e uma fluoroquinolona de ultima geração (moxifloxacina). Apesar da contraindicação relativa da OMS, optou-se pelo uso da estreptomicina no paciente 2, considerando que o mesmo já havia utilizado a amicacina sob supervisão por aproximadamente 20 meses antes da internação e que não havia disponibilidade de capreomicina na época. Todos receberam as drogas dos grupos 4 (terizidona e etionamida) e 5 (imipenem e linezolida). Um estudo caso-controle prévio mostrou a efetividade e a tolerabilidade da associação meropenem+clavulanato/linezolida no tratamento de pacientes com TB-MDR/XDR.12 Um estudo recente mostrou a efetividade do ertapenem como alternativa para esse tratamento mesmo ambulatoriamente.13 Associamos o clavulanato como um agente adjuvante ao imipenem/cilastatina1 e sempre associado à amoxicilina, considerando que o mesmo não é disponibilizado isoladamente. A claritromicina, apesar de sua atividade incerta sobre o M. tuberculosis , foi utilizada em todos os pacientes pelo seu efeito sinérgico à efetividade da linezolida.1,14 Utilizamos o etambutol em todos os pacientes, inclusive no paciente 1, apesar de a OMS1 não considerar essa droga como um fármaco-chave nos regimes terapêuticos para TB-MDR, mesmo quando existe sensibilidade à droga (pacientes 2 e 3). Optamos pelo uso da pirazinamida somente para o paciente 3, em acordo com o teste de sensibilidade.
A proposta de seguimento após o primeiro ano foi para manter as medicações injetáveis por 18 meses e as orais por 24 meses (Tabelas 1 e 3). Até o momento, os pacientes 1 e 2 tiveram alta por cura, e o paciente 3 mantém melhora clínica, radiológica e bacteriológica. Cabe ressaltar que nenhum paciente apresentou quaisquer efeitos adversos às medicações utilizadas.
O custo da terapêutica medicamentosa para pacientes com TB-XDR traz um grande impacto financeiro. O valor anual despendido pelo poder público somente com medicamentos para cada paciente incluído no presente estudo foi de, aproximadamente, R$ 76.000,00 (US$ 30.000). Um estudo realizado na África do Sul mostrou que o tratamento de um paciente portador de TB-XDR tem um custo de US$ 26.392, quatro vezes maior que o do tratamento de um paciente portador de TB-MDR (US$ 6.772) e 103 vezes maior que o de um paciente portador de tuberculose sensível ao esquema básico (US$ 257).4 Além disso, temos de considerar a grande destruição do parênquima pulmonar, que não somente impacta a qualidade de vida do paciente, mas torna extremamente difícil o cálculo dos custos posteriores à alta hospitalar, tanto para o paciente como para o poder público.
Em conclusão, são necessários todos os esforços do poder público no sentido de evitar a TB-MDR/XDR. Em casos extremos como os apresentados no presente estudo, é necessário considerar a internação para garantir um tratamento efetivo por um período de tempo adequado.