versão impressa ISSN 1808-8694versão On-line ISSN 1808-8686
Braz. j. otorhinolaryngol. vol.86 no.2 São Paulo mar./abr. 2020 Epub 11-Maio-2020
http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2019.10.001
A surdez súbita (SS) é uma emergência otorrinolaringológica definida como uma perda auditiva de pelo menos 30 dB, em três frequências audiométricas consecutivas, de instalação súbita em até 72 horas.1 Na maioria dos casos, manifesta-se de forma unilateral em indivíduos na quarta década de vida,1 sem predileção por sexo.2 Estima-se que sua incidência em países desenvolvidos seja de 5 a 20 casos por 100.000 habitantes/ano.1
A fisiopatologia da SS ainda não está completamente estabelecida. Algumas associações com infecções virais, distúrbios vasculares e doenças autoimunes já foram relatadas na literatura.3 Contudo, na maioria dos casos a etiologia ainda é considerada idiopática.1
Além dos danos à função auditiva, a SS pode gerar alterações na função vestibular.4 Acredita-se que isso possa ser explicado pela hipótese da extensão da doença devido à proximidade anatômica.5 Alguns estudos mostram que a recuperação auditiva parece melhor em pacientes com resultados normais na prova calórica e no potencial evocado miogênico vestibular (VEMP).4,6 No entanto, a relação entre nível de audição e disfunção vestibular em pacientes com SS permanece inconclusiva.4
Diversas medicações têm sido investigadas para o tratamento da SS. Todavia, os corticosteroides sistêmicos têm sido recomendados como droga de escolha.7 Uma alternativa ao tratamento sistêmico é a terapia intratimpânica, que apresenta menor risco de efeitos colaterais sistêmicos, permite que a medicação penetre diretamente na cóclea e alcance uma alta concentração mesmo quando utilizada em baixas doses. A terapia intratimpânica é considerada uma terapia de segunda linha, sendo recomendada para os casos em que não há recuperação da audição após o tratamento com os corticosteroides orais.8
Alguns fatores relacionados ao prognóstico já foram descritos: idade, presença de vertigem, gravidade e padrão audiométrico da perda auditiva, VEMP, potenciais evocados auditivos de tronco cerebral (PEATE) e emissões otoacústicas (EOA).9 Estudos observaram que a hiporreflexia na prova calórica, a ausência de onda V no PEATE, a ausência de resposta no VEMP e a ausência de EOA estão relacionadas a um pior prognóstico da SS.5,10,11 Contudo, ainda há controvérsia entre os resultados desses estudos.
O VEMP é um potencial evocado de curta latência que permite a avaliação não invasiva da função do sistema otolítico e das vias vestíbulo-espinhal e vestíbulo-ocular.3 Ele pode ser dividido em potencial evocado miogênico vestibular cervical (cVEMP) e potencial evocado miogênico vestibular ocular (oVEMP). O cVEMP avalia o sáculo, o nervo vestibular inferior, o núcleo vestibular lateral, o trato vestíbulo-espinhal e o músculo esternocleidomastoideo. Já o oVEMP reflete principalmente a função do utrículo e do nervo vestibular superior.
Em alguns estudos, verificou-se que um maior número de pacientes com perda auditiva profunda apresentou resultado anormal no VEMP.4 Porém, em alguns casos não foi observada associação entre as alterações do VEMP e o nível de audição.4 Portanto, os achados do papel do VEMP na predição do prognóstico auditivo dos pacientes com SS ainda são controversos.12
Por fim, esta revisão pretende avaliar a importância do VEMP na SS e resumir os dados disponíveis sobre as alterações desse exame no prognóstico de pacientes com essa doença.
Uma revisão sistemática do VEMP na SS foi realizada utilizando descritores cadastrados no MeSH nos bancos de dados PubMed, Cochrane, BVS e Lilacs para estudos publicados até dezembro de 2018. Depois de combinar palavras-chave específicas (sudden deafness, sudden hearing loss, sudden sensorineural hearing loss, VEMP, vestibular evoked myogenic potential, vestibular evoked myogenic potentials), manuscritos escritos em inglês, português e espanhol foram selecionados manualmente. Pesquisa bibliográfica adicional foi realizada com o objetivo de fornecer informações específicas a respeito do VEMP e da SS.
Foram adotados os seguintes critérios de elegibilidade para inclusão dos trabalhos na análise desta revisão: avaliação retrospectiva ou prospectiva com o VEMP cervical ou ocular em pacientes com surdez súbita e informações sobre os sintomas vestibulares associados. Relatos de caso, capítulo de livro, revisão sistemática e estudos que não forneceram informações suficientes para análise neste projeto foram excluídos.
As informações e os dados necessários foram extraídos dos estudos selecionados e quantificados de maneira padronizada. Avaliaram-se as características de cada estudo, como ano de publicação, desenho da pesquisa, idade, gênero, quantidade de pacientes examinados, lateralidade, presença de vertigem e/ou tontura, momento da realização do VEMP, alteração nos exames cVEMP ou oVEMP (foram considerados alterados: resposta ausente ou assimétrica e alteração de latência), recuperação auditiva e momento da avaliação audiométrica final. Adotou-se como critério de recuperação auditiva qualquer melhoria a partir de 10 decibels na média de pelo menos quatro frequências da audiometria tonal inicial, independentemente da classificação (total, parcial ou leve) usada nos estudos.
A avaliação de qualidade e do risco de viés dos estudos analisados foi realizada por meio da lista de verificação da Agency for Health Care Research and Quality (AHRQ).13 Essa lista possui 11 critérios de avaliação, incluindo fonte de informação, critérios de inclusão e exclusão, período de tempo, pacientes consecutivos, mascaramento, garantia de qualidade, explicação de exclusões, controle de fatores de confusão, retirada de dados incompletos, coleta de dados completo e seguimento. Um item é pontuado como 1, se incluído no artigo, e 0, se não. Uma pontuação de 8 ou mais é indicativa de um estudo de alta qualidade (tabela 1).
Artigos | Qualidade do artigo de acordo com AHRQ | |||||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
A | B | C | D | E | F | G | H | I | J | K | Pontos | |
Liu et al. | 1 | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 0 | 8 |
Chen, YH, Young, YH | 1 | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 1 | 1 | 0 | 0 | 1 | 8 |
Pogson et al. | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 1 | 10 |
Niu et al. | 1 | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 0 | 8 |
Lee et al. | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 0 | 1 | 0 | 8 |
Fujimoto et al. | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 1 | 0 | 1 | 0 | 1 | 0 | 7 |
Nagai et al. | 1 | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 0 | 1 | 0 | 1 | 1 | 8 |
You et al. | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 0 | 9 |
Oiticica et al. | 1 | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 1 | 9 |
Ogawa et al. | 1 | 1 | 0 | 1 | 0 | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 1 | 8 |
Korres et al. | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 11 |
Stamatiou et al. | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 0 | 9 |
Hong et al. | 1 | 1 | 1 | 0 | 0 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 1 | 9 |
Chen, YH, Young, YH | 1 | 1 | 1 | 0 | 0 | 0 | 0 | 1 | 0 | 1 | 1 | 6 |
Iwasaki et al. | 1 | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 1 | 1 | 0 | 1 | 1 | 9 |
Wu, Young | 1 | 1 | 1 | 1 | 0 | 0 | 0 | 1 | 0 | 1 | 1 | 8 |
A, fonte de informação; B, critérios de inclusão e exclusão; C: período de tempo; D, pacientes consecutivos; E, mascaramento; F, garantia de qualidade; G, explicação de exclusões; H, controle de fatores de confusão; I, retirada de dados incompletos; J, integridade dos dados; K, seguimento; 1, presente; 0, não presente ou não claro.
De acordo com os critérios acima, foram selecionados inicialmente 62 artigos. Desses, 25 foram excluídos pelo resumo, 2 por serem revisões sistemáticas, um por ser capítulo de livro e 8 por estarem escritos em chinês. Dos 26 artigos que restaram, 10 foram excluídos após a leitura do artigo completo, uma vez que não forneciam informações suficientes para verificação da qualidade metodológica necessária para inclusão neste estudo. Por fim, 16 artigos preencheram os critérios necessários para a revisão final (fig. 1).
Os dados clínicos e dos exames complementares dos 16 artigos selecionados estão listados na tabela 2, em ordem decrescente da data de publicação, e os parâmetros utilizados para realização do VEMP (cervical e ocular) foram listados na tabela 3. Oito estudos foram prospectivos,1,12,14-19 seis foram retrospectivos,3-6,20,21 um continha parte dos dados oriunda de uma análise retrospectiva e a outra parte de uma análise prospectiva (considerado como retrospectivo/prospectivo)22 e um foi transversal.23 Foram avaliados 872 pacientes, 50,22% do gênero masculino e 49,77% do feminino, com média de 51,26 anos. Do total de pacientes, 426 (50,35%) apresentavam vertigem e/ou tontura associada à SS. O cVEMP foi feito em todos os estudos, porém o oVEMP apenas em sete.1,3,4,6,15,21,22 De 846 orelhas em que foi realizado o cVEMP, 327 apresentaram alteração (38,65%). Já o oVEMP estava alterado em 181 orelhas (47,88%), das 378 avaliadas. A taxa de recuperação auditiva foi analisada por apenas oito artigos.1,5,6,12,14,15,18,20 Das 410 orelhas avaliadas, 260 (63,4%) apresentaram recuperação auditiva.
Autores | Ano | Estudo | Pacientes (H/M) | Lateralidade | Idade | Vertigem e/ou tontura | Realização dos exames | cVEMP alteradoa | oVEMP alteradob | Recuperação auditiva - tempoc |
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Liu et al. | 2017 | R | 35 (9/26) | U | 41,9 | 21 | - | 17 (48,5%)/35 | 22 (62,8%)/35 | - |
Chen, YH, Young, YH | 2016 | P | 5 (4/1) | B | 45,6 | - | D | 2 (100%)/2 | 4 (100%)/4 | 5 (50%) - 3 |
Pogson et al. | 2016 | R/Pd | 27 (17/10) | U | 57,3 | 27 | De | 9 (33,3%)/27 | 19 (70,3%)/27 | - |
Niu et al. | 2015 | R | 149 (72/77) | U | 44,28 | 87 | - | 73 (48,9%)/149 | 84 (56,3%)/149 | - |
Lee et al. | 2014 | R | 92 (55/37) | U | 51,21 | 52 | D | 29 (31,5%)/92 | - | 64 (69,5%) - 2 |
Fujimoto et al. | 2014 | R | 25 (15/10) | U | 63,6 | 25 | - | 16 (64%)/25 | 10 (43%)/23 | - |
Nagai et al. | 2014 | P | 65 (35/30) | U | 48,9 | 25 | D | 27 (41,5%)/65 | 6 (9,2%)/65 | 52 (80%) - 1 |
You et al. | 2014 | R | 75 (42/33) | U | 54 | 48 | D | 35 (47%)/75 | 36 (48%)/75 | 45 (60%) - 3 |
Oiticica et al. | 2013 | T | 21 (8/13) | U | 52,5 | - | - | 5 (35,7%)/14 | - | - |
Ogawa et al. | 2012 | P | 80 (43/37) | U | 56,4 | 36 | - | 24 (42,1%)/57 | - | 47 (58,7%) - 1 |
Korres et al. | 2011 | P | 104 (48/56) | U | 52,5 | 36 | D | 30 (28.8%)/104 | - | - |
Stamatiou et al. | 2009 | P | 86 (39/47) | U | 51 | 31 | D | 26 (30.2%)/86 | - | - |
Hong et al. | 2008 | P | 52 (22/30) | U | 55,1 | 0 | D | 14 (26,9%)/52 | - | 34 (65,3%) - 1 |
Chen, CN, Young, YH | 2006 | P | 14 (7/7) | U | 48 | 5 | D | 3 (21%)/21 | - | 5 (35,7%) - 3 |
Iwasaki et al. | 2005 | R | 22 (14/8) | U | 54 | 22 | D | 17 (77%)/22 | - | 8 (36,3%) - f |
Wu, Young | 2002 | P | 20 (8/12) | U | 44 | 11 | - | 0 (0%)/20 | - | - |
B, bilateral; D, realização dos exames no diagnóstico ou em até 15 dias; H, homem; M, mulher; P, prospectivo; R, retrospectivo; T, transversal; U, unilateral; cVEMP, potencial evocado miogênico vestibular cervical; oVEMP, potencial evocado miogênico vestibular ocular.
aNúmero de orelhas com cVEMP alterado (%)/total de orelhas testados.
bNúmero de orelhas com oVEMP alterado (%)/total de orelhas testados.
cOrelhas que recuperaram a audição em relação a orelhas acometidas - momento (em meses) da avaliação audiométrica final.
dAté 2011 o estudo usou dados de análise retrospectiva, quando passou a ser prospectivo.
e2 pacientes realizaram os exames entre 31-49 dias após o diagnóstico e não no dia do diagnóstico.
fRealizado após várias semanas (não especificado).
Autores | Ano | cVEMP | oVEMP | ||
---|---|---|---|---|---|
Estímulo utilizado | Critérios de alteração | Estímulo utilizado | Critérios de alteração | ||
Liu et al. | 2017 | Via aérea tone burst (500 Hz 100 dB nHL) | IA > 36%; amplitude reduzida ou ausente; resposta atrasada | Via aérea tone burst (500 Hz 100 dB nHL) |
IA > 40%; resposta ausente |
Chen, YH, Young, YH | 2016 | Via óssea (500 Hz 144 dB force level) | - | Via óssea (500 Hz 144 dB force level) | - |
Pogson et al. | 2016 | Via aérea clique (105 dB nHL 140 dB SPL) | IA > 39,6% | Via óssea (147 dB force level) | IA > 39,9% |
Niu et al. | 2015 | Via aérea tone burst (500 Hz 131 dB SPL) | Resposta ausente | Via aérea tone burst (500 Hz 131 dB SPL) | Resposta ausente |
Lee et al. | 2014 | Via aérea clique | Diferença de amplitude > 20% entre as orelhas; resposta ausente | - | - |
Fujimoto et al. | 2014 | Via aérea tone burst (500 Hz 95 dB nHL 135 SPL) | IA > 34%; resposta ausente | Via óssea tone burst (500 Hz 128 dB force level) | IA > 27,3%; resposta ausente |
Nagai et al. | 2014 | Via aérea clique (105 dB nHL) | Razão < 0,5 | Via óssea (500 Hz 115 dB force level) | IA > 49,7%; resposta ausente |
You et al. | 2014 | Via óssea (500 Hz 128 dB force level) | IA > 33%; resposta atrasada | Via óssea (500 Hz 128 dB force level) | IA > 40%; resposta ausente |
Oiticica et al. | 2013 | Via aérea tone burst (500 Hz 95 dB HL) | IA > 40%; resposta ausente | - | - |
Ogawa et al. | 2012 | Via aérea clique (105 dB nHL) | Razão < 0,5 | - | - |
Korres et al. | 2011 | Via aérea tone burst (500 Hz 95 dB HL) | Resposta ausente | - | - |
Stamatiou et al. | 2009 | Via aérea tone burst (500 Hz 95 dB HL) | Resposta ausente | - | - |
Hong et al. | 2008 | Via aérea clique (95 dB nHL) | Resposta atrasada, assimétrica ou ausente | - | - |
Chen, CN, Young, YH | 2006 | Via aérea tone burst (500 Hz 95 dB HL) | - | - | - |
Iwasaki et al. | 2005 | Via aérea clique (95 dB nHL) | - | - | - |
Wu, Young | 2002 | Via aérea tone burst (500 Hz 95 dB HL) | Razão > 0,33 | - | - |
-, não informado; dB, decibel; HL: nível de audição, do inglês Hearing Level; Hz, Hertz; IA, Índice de assimetria; nHL, Nível de audição normal, do inglês Normal Hearing Level; Razão, razão entre a amplitude do potencial bifásico do lado afetado e a do lado sadio; SPL, nível de pressão sonora, do inglês Sound Pressure Level.
A surdez súbita é uma doença relativamente comum na otorrinolaringologia, tendo sido bastante estudada desde sua primeira descrição na literatura.24 Entretanto, até os dias de hoje sua fisiopatologia e os fatores prognósticos envolvidos ainda não estão completamente elucidados.5,25 Além dos sintomas cocleares, a SS também pode afetar o sistema vestibular. Contudo, é importante ressaltar que a presença de tontura não é obrigatória mesmo com o envolvimento vestibular. Vários estudos demonstraram que a idade, a presença de vertigem, o tipo da perda auditiva na audiometria, o tempo entre o diagnóstico e o tratamento, a prova calórica e o VEMP podem ser fatores prognósticos dessa doença. Porém, muitas dessas correlações ainda não estão completamente estabelecidas.6
Os achados sobre o prognóstico e o acometimento vestibular na SS são incertos, o que motivou esta revisão. O VEMP é um exame complementar que serve para avaliar a função dos órgãos otolíticos. O cVEMP avalia principalmente o sáculo e o nervo vestibular inferior, enquanto o oVEMP avalia o utrículo e o nervo vestibular superior. Assim, decidiu-se analisar a importância do VEMP na avaliação prognóstica dos pacientes com SS com base nos artigos publicados em literatura.
O exame do VEMP pode ser feito com estímulos sonoros tipo clique ou tone burst em dB SPL (decibel nível de pressão sonora, do inglês sound pressure level) ou dB HL (decibel nível de audição, do inglês hearing level).26 Como é necessário um som de elevada intensidade para estimulação auditiva, existe uma preocupação em relação à exposição aos estímulos sonoros do VEMP.26 As intensidades sonoras devem ser limitadas a níveis seguros e a energia total fornecida à orelha deve estar dentro de limites aceitáveis.26 Um clique de 0,1 ms de 139 dB SPL dado 5/segundo apresentado em cada orelha por até 4,8 minutos, por exemplo, encontra-se dentro dos limites considerados seguros para exposição sonora.27 Portanto, da forma como o exame é feito, não implica dano à audição.26,27 Vale ressaltar também que não houve pioria auditiva nos pacientes após a realização do VEMP em todos os trabalhos analisados nesta revisão.
Dos sete artigos que avaliaram concomitantemente os dois exames (cVEMP e oVEMP), quatro apresentaram maior número de pacientes com alteração no oVEMP em relação ao cVEMP,3,4,6,22 um artigo apresentou quantidade semelhante de alteração em ambos os exames1 e dois apresentaram maior número de pacientes com alteração no cVEMP em relação ao oVEMP.15,21 Tendo em vista um maior número de pacientes com SS e cVEMP alterado em seus estudos, Fujimoto et al. e Nagai et al. sugeriram que o sáculo poderia ser mais facilmente danificado do que o utrículo.15,21 Isso poderia estar relacionado com o achado dos estudos microscópicos dos ossos temporais, que mostraram que a perda de células ciliadas vestibulares em pacientes com SS foi mais frequentemente observada no sáculo e menos no utrículo e canais semicirculares.21 Já os artigos que evidenciaram uma maior prevalência de pacientes com SS e oVEMP alterado sugeriram que o utrículo poderia ser mais propenso a danos do que o sáculo.3,4,6,22 Os autores argumentam que tal achado pode estar relacionado ao fato do canal ósseo ser muito estreito, fazendo com que o nervo vestibular superior seja mais suscetível a alterações labirínticas isquêmicas ou outras complicações quando comparado ao nervo vestibular inferior.28 Dessa forma, ainda é incerto qual órgão otolítico é mais acometido e, portanto, ainda não há dados suficientes para afirmar qual VEMP (ocular ou cervical) é mais específico na determinação do prognóstico.
A recuperação auditiva dos pacientes com SS e os fatores associados também foram analisados nesta revisão. Dentre os artigos revisados, seis demonstraram que o VEMP alterado nos pacientes com SS estava associado a uma recuperação auditiva desfavorável.1,5,6,15,20,21 Hong et al. não observaram a relação do cVEMP alterado com o pior prognóstico auditivo dos pacientes.12 Em contrapartida com os artigos descritos, Wu e Young não mostraram alteração no cVEMP dos pacientes com SS analisados.19 Stamatiou et al. observaram que a gravidade da lesão vestibular em casos de SS parece aumentar com a idade, fato atribuído à degeneração das estruturas vestibulares que já ocorrem em indivíduos mais velhos.17 Korres et al. sugeriram que a perda auditiva mais grave e a idade avançada atuaram como fatores preditivos negativos independentes para recuperação auditiva, mesmo com presença ou não de lesão labiríntica, avaliada por meio do cVEMP.16 O VEMP (cervical e ocular) estava alterado em 41,5% das orelhas examinadas pelos estudos analisados nesta revisão. Contudo, apenas oito estudos analisaram a taxa de recuperação auditiva, sendo qeu em 6 deles a presença do VEMP alterado foi um fator de pior prognóstico. Portanto, o VEMP deve ser considerado como um recurso na avaliação dos pacientes com SS.
Algumas limitações dos artigos analisados são: não serem multicêntricos, tamanho amostral, não serem estudos de caso-controle ou coorte, sem mascaramento de dados e sem um tempo prolongado de seguimento. A investigação da surdez súbita com diversos exames, incluindo potencial evocado miogênico vestibular (cervical e ocular), Video Head Impulse (vHIT) e videonistagmografia, poderia ajudar a esclarecer melhor a fisiopatologia e a extensão (as estruturas acometidas na orelha interna) da doença, além de poder ser útil como ferramenta de avaliação prognóstica de recuperação auditiva dos pacientes com SS.
Os estudos demonstram que a avaliação do sistema vestibular com o uso do VEMP parece ter importância no prognóstico da surdez súbita. Para melhor acompanhamento do paciente com surdez súbita a ênfase não deve se restringir à cóclea, mas também no diagnóstico e tratamento de alterações vestibulares, independentemente da presença de vertigem.