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Ocorrência de eventos adversos após o uso da vacina adsorvida difteria, tétano e pertussis (acelular) – dTpa –, São Paulo, SP, 2015-2016

Ocorrência de eventos adversos após o uso da vacina adsorvida difteria, tétano e pertussis (acelular) – dTpa –, São Paulo, SP, 2015-2016

Autores:

Vera Lúcia Gattás,
Expedito José Albuquerque Luna,
Ana Paula Sayuri Sato,
Eder Gatti Fernandes,
Lourdes R.A. Vaz-de-Lima,
Helena Keiko Sato,
Euclides A. de Castilho

ARTIGO ORIGINAL

Epidemiologia e Serviços de Saúde

versão impressa ISSN 1679-4974versão On-line ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde vol.29 no.2 Brasília 2020 Epub 11-Maio-2020

http://dx.doi.org/10.5123/s1679-49742020000200027

Resumen

Objetivo

describir el aparecimiento de eventos adversos posvacunación (EAPV) con la vacuna dTpa durante el embarazo.

Métodos

estudio descriptivo con datos de relatos de las participantes del estudio de efectividad e inmunogenicidad realizado en dos hospitales de São Paulo, SP, Brasil, entre 2015 y 2106.

Resultados

de las 201 madres del estudio, 48 (23,9%) tuvieron al menos un EAPV; se identificaron 60 síntomas relacionados al uso de dTpa – dolor (22.4%), hinchazón (2.5%), fiebre (1.5%), somnolencia (1.0%), enrojecimiento (0.5%), vómitos (0.5 %), dolor de cabeza (0.5%), reacción local (0.5%) y cansancio (0.5%) –; no se informaron eventos adversos raros, muy raros o extremadamente raros; todos los eventos se consideraron esperados y se describen en el prospecto; todos tuvieron resultados curativos sin secuelas.

Conclusión

el estudio mostró que la vacuna dTpa utilizada por el Programa Nacional de Inmunización (PNI) es segura y no se identificaron eventos adversos inesperados entre las mujeres embarazadas vacunadas.

Palabras-clave: Vacunas contra Difteria, Tétanos y Tos Ferina Acelular; Efectos Colaterales y Reacciones Adversas Relacionados con Medicamentos; Seguridad; Vigilancia

Introdução

A coqueluche é uma doença bacteriana aguda das vias respiratórias, caracterizada por tosse paroxística. Os lactentes e as crianças menores de 2 anos constituem o grupo de maior risco para a doença, como também para suas complicações e letalidade. 1

O incremento das coberturas de vacinas dotadas do componente pertussis levou a uma grande redução da incidência de coqueluche em nível mundial. Contudo, sua transmissão nunca foi interrompida. 3

Da mesma forma no Brasil, o aumento das coberturas da vacina adsorvida difteria, tétano e coqueluche (DTP), a partir da década de 1990, fez-se acompanhar de uma grande redução na incidência de coqueluche. O esquema vacinal utilizado no país consiste de três doses no primeiro ano de vida – aos 2, 4 e 6 meses de vida – e dois reforços – aos 15 meses e aos 4 anos de idade. 4

A partir de 2010, entretanto, observou-se um aumento na ocorrência de pertussis em vários países, como nos Estados Unidos, na Austrália e na Argentina; e no Brasil, apesar da manutenção de altas coberturas vacinais. 1

No Brasil, o aumento da incidência foi marcante entre os anos de 2011 e 2014. Uma importante proporção dos casos foi de crianças menores de 1 ano, com maior concentração entre os menores de 2 meses, idade anterior à primeira dose da vacina DTP ( Figura 1 ). 5

Fontes:

Coordenação-Geral de Doenças Transmissíveis, Secretaria de Vigilância em Saúde, Ministério da Saúde (CGDT/SVS/MS), 2018.

Grupo de Trabalho GT-Meningite.

Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), atualizado em 22/03/2019.

Figura 1 – Taxa de incidência por coqueluche e cobertura vacinal com DTP e DTP+HIB, Brasil, 1990-2018Notas:Incidência por 100 mil habitantes, exceto para o tétano neonatal – calculada por 100 mil menores de 1 de idade.A população geral a partir de 2016 foi estimada pela Rede Interagencial de Informações para a Saúde (RIPSA) e pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), sobre dados de 2015. 

Diante da reemergência da coqueluche, com a concentração de casos em crianças antes da idade indicada para a aplicação da vacina, vários países adotaram novas estratégias, entre as quais se destaca a vacinação de mulheres grávidas com vacinas contendo o componente pertussis acelular: vacina adsorvida difteria, tétano e pertussis (acelular), conhecida pela sigla dTpa. 7

A vacinação de gestantes possibilita a transferência transplacentária de anticorpos a suas crianças antes do nascimento, protegendo-as nesse período de maior cuidado e acompanhamento, até atingirem a idade vacinal. Em 2014, o Programa Nacional de Imunizações (PNI) brasileiro passou a oferecer a vacina acelular (dTpa) às grávidas com 27 a 36 semanas de gestação. Em 2017, a recomendação foi ampliada, incorporando as grávidas a partir da 20ª semana de gestação. 1

Considerando-se a quase inexistência de dados nacionais sobre a vacinação de gestantes com dTpa, o Programa Estadual de Imunizações de São Paulo decidiu realizar estudos que permitissem a avaliação da efetividade e segurança desse procedimento. Entre esses estudos, inclui-se a avaliação da imunogenicidade e segurança da vacinação. 10

Sobre a segurança da vacina dTpa, quando foi considerada a possibilidade de sua aplicação em gestantes, os conhecimentos eram limitados. Por isso, o Advisor Comittee for Imunization Practice (ACIP, ou Comitê Consultivo em Práticas de Imunização), vinculado aos Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC/EUA), revisou os dados disponíveis no Vaccine Adverse Events Reporting System (VAERS/CDC/EUA), os registros de gravidez estabelecidos pelos produtores de vacina dTpa e resultados de estudos de menor porte. O ACIP concluiu, de sua revisão desses estudos, que não se encontrou risco elevado ou padrões incomuns de eventos adversos em gestantes que receberam dTpa ou em seus recém-nascidos; os poucos eventos adversos graves relatados foram considerados como improváveis de terem sido causados pela vacina. 8 O mesmo pode ser afirmado para as doses de reforço em gestantes que apresentaram boa tolerância ao produto, em que o evento com mais registros de ocorrência foi dor no local da injeção. Além disso, dos poucos eventos adversos graves relatados, nenhum foi atribuído à vacina. Estes achados se encontram na bula do produtor da vacina adsorvida difteria, tétano e pertussis (acelular) – dTpa –, a mesma utilizada pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI).

O objetivo deste estudo foi descrever a ocorrência de eventos adversos pós-vacinação (EAPV) com dTpa durante a gestação.

Métodos

Trata-se de um estudo descritivo, sobre ocorrência de EAPV em gestantes vacinadas com dTpa, participantes do estudo de coorte de avaliação de imunogenicidade. 11

O município de São Paulo, SP, é o mais populoso do Brasil, com 11.253.503 habitantes em 2010, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 12 É um dos municípios que concentram a atividade econômica do Brasil e apresenta um índice de desenvolvimento humano (IDH) elevado (0,805 em 2010), embora caracterizado por grande desigualdade socioeconômica. 13

O estudo foi realizado em dois hospitais públicos estaduais, localizados em regiões periféricas do município paulistano, Hospital e Maternidade Leonor Mendes de Barros e Hospital e Maternidade Interlagos, cada um deles responsável pela realização de cerca de 400 partos ao mês. Este estudo integra uma pesquisa maior, denominada ‘Imunização de gestantes com a vacina acelular do adulto (dTpa): avaliação da redução de ocorrência de coqueluche em lactantes e da resposta imunológica das crianças’. A redução da ocorrência de coqueluche foi avaliada por meio de um estudo de caso-controle. 10 A resposta imunológica foi analisada em estudo de coorte de gestantes e suas crianças nascidas em dois hospitais públicos estaduais localizados no munícipio de São Paulo. 11

As gestantes foram captadas na ocasião da internação para o parto. Foram coletados seus dados socioeconômicos e demográficos, obstétricos e sobre a vacinação com a dTpa no pré-natal, além de amostras de sangue para o estudo dos títulos de anticorpos contra a coqueluche. Suas crianças foram seguidas aos 2 e aos 7 meses de idade. Delas, também foram coletadas amostras de sangue: do cordão umbilical; antes da primeira dose da vacina com componente pertussis na infância (2 meses de idade); e um mês após a terceira dose da vacina. No presente estudo, foram analisados os dados referentes aos EAPV da dTpa aplicada no acompanhamento pré-natal das participantes do estudo de coorte.

Foram consideradas elegíveis para o estudo as parturientes maiores de 18 anos de idade atendidas nos hospitais citados, entre julho de 2015 e agosto de 2016. Por sua vez, foram consideradas inelegíveis (i) as parturientes que receberam transfusão de sangue ou hemoderivados nos três meses anteriores ao parto, (ii) as que receberam a vacina dTpa dentro dos últimos 14 dias de gestação, (iii) as que tiveram diagnóstico ou suspeita de coqueluche durante a gestação, (iv) as que se encontravam na idade gestacional <37 semanas, (v) aquelas sem informação sobre a data de vacinação com dTpa ou dados epidemiológicos e (vi) as mães de crianças nascidas com peso inferior a 2.500 gramas.

O tamanho mínimo amostral foi calculado pela seguinte fórmula:

n = (z2α x p x q) / e2

Onde:

n = tamanho amostral mínimo

z = coeficiente de confiança, cujo valor foi de 1,96 para um alfa de 0,05

p = frequência do desfecho; adotou-se p=15% de ocorrência de EAPV

q = complemento dessa proporção (q=1-p)

e = erro máximo em valor absoluto – adotou-se 0,05

Assim, obteve-se:

Os dados foram coletados mediante entrevista guiada por questionário semiestruturado, aplicado durante a internação para o parto. O questionário continha variáveis sociodemográficas e clínico-epidemiológicas, relacionadas à gestante:

a) sociodemográficas

  • - faixa etária (em anos: <20; 20 a 34; ≥35);

  • - escolaridade (em anos de estudo: menos de 8; mais de 8; ignorados);

  • - raça/cor da pele (branca; preta; amarela; parda; indígena);

  • - renda familiar mensal (menos de R$ 1.576,00; R$ 1.576,00 a R$ 3.151,00; mais de R$ 3.152,00);

b) clínico-epidemiológicas

  • - idade gestacional no momento da vacinação (em semanas: 17 a 26; 27 a 29; 30 a 33; 34 a 40; ignorada);

  • - número de consultas no pré-natal (<7; ≥7; ignorado); e

  • - ocorrência de eventos adversos e sua duração (em horas após a vacinação: até 24h; até 48h; até 72h; até 96h; ignorada).

O índice de massa corporal (IMC) foi examinado como variável contínua, calculado a partir da informação autorreferida de peso pré-gestacional e altura materna.

As entrevistas foram realizadas no período entre julho de 2015 e agosto de 2016.

A vacina utilizada foi o Boostrix (GSK Biologicals, Rixensart, Bélgica), licenciada no Brasil como Refortrix. O produto contém 20 Unidades Internacionais (UI) de toxoide tetânico, 2 UI de toxoide difteria, 8 lg de toxoide pertussis inativado, 8 lg de filamentos hemaglutinina (FHA) e 2,5 lg de pertactina. 11

A ocorrência de EAPV foi investigada com base em uma lista de reações adversas relacionadas ao uso da vacina dTpa, assim classificadas: muito comuns (>10% dos pacientes vacinados); comuns (1 a 10% dos pacientes vacinados); incomuns (0,1 a 1,0% dos pacientes vacinados); raras (0,1 a 0,01%); e muito raras (menos de 0,01% dos pacientes vacinados). Esta classificação considerou a data de início e a duração de cada reação. Os critérios de classificação dos eventos adversos adotados são os mesmos encontrados na bula da vacina. 13 A Figura 2 apresenta a lista dos EAPV classificados em cada categoria, aplicados pelos pesquisadores a partir de uma adaptação entre as informações constantes da bula e as do Manual de Eventos Adversos Pós-Vacinação, publicado pelo Ministério da Saúde. 14

Figura 2 – Lista de eventos adversos à vacina adsorvida difteria, tétano e pertussis (acelular) – dTpaNota:Lista adaptada do Manual de Vigilância Epidemiológica de Eventos Adversos Pós-Vacinação e da bula da vacina. 

A frequência dos eventos adversos foi calculada dividindo-se o número de EAPV pelo número de pessoas vacinadas incluídas no estudo (n=201):

F = EA/201 x 1009

De forma exploratória, a razão de prevalência (RP) foi estimada diretamente, calculada pelo produto da prevalência de EAPV entre as parturientes expostas a cada um dos fatores e a prevalência correspondente entre as não expostas. Foi utilizado o teste do qui-quadrado de Pearson para verificar associação entre a ocorrência de EAPV e as seguintes variáveis: idade materna; idade gestacional de aplicação da vacina; ser primigesta; escolaridade; raça/cor da pele; renda familiar mensal; e IMC.

O projeto do estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto Adolfo Lutz mediante Certificado de Apresentação para Apreciação Ética: CAAE n o 37581114.0.0000.0059, emitido em 23/03/2017. Todas as entrevistadas foram informadas sobre o objetivo da pesquisa e sua participação esteve condicionada à concordância e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Resultados

Do total de 218 parturientes identificadas, 201 foram incluídas. Dezessete foram excluídas da análise pelas seguintes razões: intervalo para vacinação <15 dias do parto (2 parturientes: 11,8%); idade gestacional <37 semanas (4 parturientes: 23,5%); sem registro de data da vacinação (5 parturientes: 9,4%); peso ao nascer menor que 2.500 gramas (3 parturientes: 1,4%); e sem ficha epidemiológica (3 parturientes: 17,6%).

Das 201 mulheres incluídas, 75,1% tinham entre 20 e 34 anos de idade, 53,7% contavam oito ou mais anos de escolaridade, 44,8% eram de raça/cor da pele parda, 40,3% se encontravam com 30 a 33 semanas gestacionais, quando da vacinação, e 84,1% tinham registradas menos de sete consultas de pré-natal ( Tabela 1 ).

Tabela 1 – Distribuição das mulheres que receberam dTpa a na gestação e apresentaram evento adverso após vacinação (n=201) segundo características sociodemográficas, e dados sobre a gestação, São Paulo, SP, 2015-2016 

Características Evento adverso

Sim Não Ignorado Total

n=48 n=151 n=2 n=201

n % n % n n %
Faixa etária da mãe (em anos)
<20 2 4,2 12 7,9 14 7,0
20-34 35 72,9 114 75,5 2 151 75,1
≥35 11 22,9 25 16,6 36 17,9
Escolaridade da mãe (em anos de estudo)
<8 24 50,0 60 39,7 1 85 42,3
≥8 22 45,8 85 56,3 1 108 53,7
Ignorada 2 4,2 6 4,0 8 4,0
Raça/cor de pele
Branca 13 27,1 55 36,4 2 70 34,8
Preta 14 29,2 25 16,6 39 19,4
Amarela 1 0,7 1 0,5
Parda 20 41,7 70 46,4 90 44,8
Indígena 1 2,1 1 0,5
Idade gestacional no momento da vacinação (em semanas)
17-26 3 6,3 16 10,6 19 9,5
27-29 14 29,2 57 37,7 71 35,3
30-33 19 39,6 61 40,4 1 81 40,3
34-40 12 25,0 16 10,6 1 29 14,4
Ignorada 1 0,7 1 0,5
Consultas de pré-natal
<7 40 83,3 127 84,1 2 169 84,1
≥7 8 16,7 23 15,2 31 15,4
Ignorado 1 0,7 1 0,5

a) dTpa: vacina absorvida difteria, tétano e pertussis (acelular).

Não foram verificadas diferenças significativas entre as mulheres que apresentaram eventos adversos à vacina, em relação às características sociodemográficas ou gestacionais ( Tabela 1 ). Tampouco foi observada associação da ocorrência de EAPV com as seguintes variáveis: idade materna; idade gestacional de aplicação da vacina; ser primigesta; escolaridade; raça/cor da pele; e renda familiar mensal. Todavia, observou-se associação estaticamente significativa da ocorrência de EAPV com IMC pré-gestacional mais alto (RP=2,25 – IC 95%: 1,06;4,80).

Das 201 mães investigadas, 48 (23,9%) apresentaram pelo menos um EAPV com dTpa. No total, foram identificados 60 EAPV com dTpa relacionados a nove sinais e sintomas. Entre os EAPV classificados como ‘muito comuns’, as seguintes frequências foram observadas: dor (22,4%), inchaço (2,5%), febre (1,5%), sono (1,0%) e vermelhidão (0,5%). Entre os EAPV classificados na categoria ‘comuns’, foi registrado vômito em uma participante (0,5%); e entre os classificados na categoria ‘incomuns’, uma participante apresentou dor de cabeça (0,5%), e outra, reação local (0,5%) e cansaço (0,5%) ( Tabela 2 ).

Tabela 2 – Distribuição das manifestações clínicas dos eventos adversosa após exposição à vacina dTpab segundo tempo de duração dos eventos adversos, São Paulo, SP, 2015-2016 

Evento adverso ≤24 horas ≤48 horas ≤72 horas ≤96 horas Ignorado Total Taxa de incidência: Evento adverso vezes 100/201

n % n % n % n % n % n % % (IC 95% ) c
Dor 14 31,1 14 31,1 8 17,8 2 4,4 7 15,6 45 75,0 22,4 (17,0;28,5)
Sono 2 100,0 2 3,3 1,0 (0,2;3,2)
Vermelhidão 1 100,0 1 1,7 0,5 (0,2;2,4)
Inchaço 1 20,0 1 20,0 1 20,0 2 40,0 5 8,3 2,5 (0,9;5,4)
Febre 3 100,0 3 5,0 1,5 (0,4;4,0)
Vômito 1 100,0 1 1,7 0,5 (0,2;2,4)
Reação local 1 100,0 1 1,7 0,5 (0,2;2,4)
Cansaço 1 100,0 1 1,7 0,5 (0,2;2,4)
Dor de cabeça 1 100,0 1 1,7 0,5 (0,2;2,4)

Total 22 36,7 17 28,3 9 15,0 2 3,3 10 16,7 60 100,0 29,9 (23,8;36,5)

a) Os demais eventos adversos pesquisados não foram relatados pelas mulheres entrevistadas.

b) dTpa: vacina absorvida difteria, tétano e pertussis (acelular).

c) IC95%: intervalo de confiança de 95%.

Não foram registrados eventos adversos raros, muito raros ou extremamente raros. Todos os 64 eventos foram classificados como esperados, descritos em bula. Nenhuma ocorrência foi classificada como grave e todas tiveram desfecho para cura sem sequelas.

Um terço dos eventos (36,7%) ocorreu em até 24 horas; os demais ocorreram dentro das 48 horas (28,3%), 72 horas (15,0%) e 96 horas (3,3%) pós-vacinação ( Tabela 2 ).

Discussão

O estudo encontrou que a vacina dTpa é segura, tendo em vista que apenas 24,5% das mulheres vacinadas apresentaram algum evento adverso. Além disso, foi possível observar que a maior parte dos eventos adversos se classificava na categoria de EAPV muito comum. Não foram observados eventos adversos inesperados após a vacinação das gestantes. Os eventos adversos identificados constavam da bula do produto aplicado. Vale ressaltar que não foram observados eventos adversos graves.

Trata-se de achados semelhantes àqueles identificados em outros estudos. 16 Muñoz et al. realizaram um ensaio duplo-cego randomizado, com gestantes saudáveis nas idades entre 18 e 45 anos e com baixo risco de complicações obstétricas, recrutadas em clínicas obstétricas acadêmicas e privadas de três cidades norte-americanas (Houston, Durham e Seattle). Seus resultados mostram que não ocorreu nenhum evento adverso grave associado à vacina dTpa nas mulheres ou bebês observados; foram, sim, relatadas reações locais em 26 gestantes (78,8% [IC 95% 61,1;91,0]) e 12 puérperas (80,0% [IC 95%: 51,9;95,7]); também foram relatados sintomas sistêmicos em 12 gestantes (36,4% [IC 95%: 20,4;54,9]) e 11 puérperas (73,3% [IC 95%: 44,9;92,2]) (p=0,03). O crescimento e o desenvolvimento das crianças mostraram-se semelhantes, em ambos os grupos de mães. Nenhum caso de coqueluche foi registrado. 16

Moro et al. relataram uma pesquisa sobre dados do sistema nacional de vigilância de segurança de vacinas dos EUA (VAERS), criado em 1990 e administrado, conjuntamente, pelos Centers for Disease Control and Prevention (CDC) e Food and Drug Administration (FDA) daquele país, com o objetivo de identificar relatos de EAPV em gestantes que receberam dTpa após a recomendação dessa vacina na rotina dos serviços. Seus resultados revelam que, no período de 45 meses (de outubro de 2011 a junho de 2015), não foi identificado qualquer sinal de alerta novo ou inesperado quanto à segurança da vacina entre gestantes que receberam dTpa e seus bebês. 17

Maertens et al., em estudo de coorte prospectiva controlada, acompanharam, de 2012 a 2014, gestantes e seus bebês, todos saudáveis, em cinco hospitais na província de Antuérpia, Bélgica. O objetivo de sua investigação era medir (i) a influência do reforço na vacinação com dTpa e (ii) a duração dos anticorpos dos bebês. Embora não constituísse um objetivo inicial do estudo, todas as gestantes foram monitoradas por médicos quanto à ocorrência de reações sistêmicas por 30 minutos após a aplicação da vacina. Os possíveis eventos adversos da vacina foram monitorados pelos 30 dias seguintes à vacinação, especialmente a ocorrência de dor no local da injeção, inchaço, eritema e sintomas gerais, como mialgia e febre, entre outros. Seus autores concluíram que os eventos adversos identificados não diferiam dos descritos na bula do produto, e que a maioria dos sintomas verificados como eventos adversos eram leves e autolimitados, tendo evoluído para cura dentro de 72 horas após a vacinação. 18

Fortner et al. conduziram estudo observacional de coorte prospectiva, em duas cidades norte-americanas, com 599 mulheres de 18 a 45 anos que receberam a vacina dTpa: 374 gestantes entre 20 e 33 semanas de gestação; e 225 mulheres não grávidas vacinadas. Seus resultados mostraram que as reações locais ou sistêmicas graves ou de febre foram raras (≤3% para ambos os grupos); e a dor no local de administração, classificada como moderada a intensa, significativamente maior em mulheres grávidas (17,9%) quando comparadas às não grávidas (11,1%). Outras reações classificadas como moderadas a graves ou graves não apresentaram frequências significativamente maiores em mulheres grávidas, na comparação com mulheres não grávidas. O mesmo estudo concluiu que a vacina dTpa foi bem tolerada em mulheres grávidas e não grávidas: as mulheres grávidas relataram dor moderada a intensa no local da aplicação, em frequência maior que entre as não grávidas, porém não necessitaram de assistência médica. 19

No Brasil, logo após a implantação da vacina dTpa para gestantes no âmbito do PNI, Sancovski et al. realizaram um estudo descritivo, observacional, retrospectivo, no único centro de São Bernardo do Campo, SP, onde os autores comparam (i) os dados dos prontuários médicos de 1.203 mulheres grávidas que receberam dTpa como parte do programa de imunização materna e de seus bebês, entre maio de 2015 e fevereiro de 2017 (coorte exposta), com (ii) os dados de 1.259 mulheres não vacinadas que deram à luz entre setembro de 2012 e agosto de 2014 (coorte não exposta). Seus achados não apontam a ocorrência de risco aumentado de eventos adversos relacionados à gravidez, tampouco eventos adversos neonatais de interesse, após a vacinação materna com dTpa. No entanto, os mesmos autores salientam que os resultados de seu estudo devem ser interpretados com cautela, consideradas as limitações – viés de memória, dificuldades na coleta e registro de dados – inerentes a estudos observacionais retrospectivos. 20

Outra limitação a destacar, sobre este trabalho com gestantes paulistanas, foi o tamanho da amostra, estimada para avaliar a eficácia da vacina dTpa em mães vacinadas e nascidos vivos, que reduz o poder de alcance do estudo para extrapolações.

O Brasil apresentou um aumento na taxa de incidência de coqueluche, seguido de uma queda que coincide, temporalmente, com a introdução da vacinação de dTpa em gestantes. Para a manutenção de taxas de incidência de coqueluche baixas, é importante assegurar a confiança na segurança da vacina, tanto da parte dos profissionais de saúde como das usuárias dos serviços. De acordo com Furuta et al., uma das principais razões para coberturas baixas da vacina dTpa é a preocupação – também dos médicos e das gestantes – com a segurança da vacina quando utilizada durante a gravidez. Algumas medidas são necessárias, a exemplo da divulgação de informação sobre a segurança das vacinas e o treinamento de profissionais para detecção, notificação e investigação de eventos adversos, no sentido de melhorar o monitoramento de EAPV. 21

Tais medidas podem ter impacto direto na diminuição de subnotificação de eventos adversos pós-vacinação, um grande desafio para o PNI. Os resultados deste estudo confirmam a segurança no uso da vacina adsorvida difteria, tétano e pertussis (acelular) – dTpa – em gestantes, aumentam sua aceitação e fortalecem a confiança do Sistema Único de Saúde (SUS) e de seus usuários nas atividades de vacinação do Programa Nacional de Imunizações brasileiro.

REFERÊNCIAS

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2. Switzer C , D’Heilly C , Macina D . Immunological and clinical benefits of maternal immunization against pertussis: a systematic review . Infect Dis Ther [ Internet ]. 2019 Dec [ cited 2020 Apr 6 ]; 8 ( 4 ): 499 - 541 . Available from:
3. World Health Organization . Pertussis vaccines: WHO position paper – August 2015 . Wkly Epidemiol Rec [ Internet ]. 2015 Aug [ cited 2018 Dec 12 ]; 90 ( 34 ): 433 - 58 . Available from:
4. Ministério da Saúde (BR) . Calendário nacional de saúde [ Internet ]. Brasília : Ministério da Saúde ; 2019 [ citado 2019 dez 10 ]. Disponível em:
5. Ministério da Saúde (BR) . Secretaria de Vigilância em Saúde . Departamento de Vigilância das Doenças Transmissíveis . Coqueluche no Brasil: análise da situação epidemiológica de 2010 a 2014 . Bol Epidemiol [ Internet ]. 2015 [ citado 2019 abr 12 ]; 46 ( 39 ): 1 - 8 . Disponível em:
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