versão impressa ISSN 0101-2800
J. Bras. Nefrol. vol.36 no.4 São Paulo out./dez. 2014
http://dx.doi.org/10.5935/0101-2800.20140061
A nefrolitíase acomete cerca de 10% das pessoas que vivem em países desenvolvidos e sua incidência tem aumentado juntamente com outros problemas relacionados às mudanças nos padrões alimentares da população como obesidade, hipertensão e diabetes mellitus.1
Apesar de ser influenciada por outros fatores, a composição da urina é grandemente determinada pela composição da dieta do indivíduo.2 Vários estudos evidenciaram que a dieta típica dos países industrializados, rica em sódio, em proteínas de origem animal e bebidas adoçadas com açúcar e frutose, tem como consequência uma elevada excreção de cálcio, ácido úrico, oxalato e fósforo e uma diminuição do citrato e pH urinários, favorecendo, assim, a formação dos cálculos.3-5 Por outro lado, um consumo adequado de frutas, legumes e verduras parece ser um fator protetor para a formação dos cálculos, por estar diretamente relacionado à ingestão de fatores antilitogênicos como potássio, magnésio, citrato e fitato.3,6
Desta forma, um aconselhamento nutricional para a prevenção da ocorrência e também da recorrência dos cálculos é uma estratégia conveniente tanto para profissionais como para os pacientes por ser economicamente acessível e segura. Importante observar que, para a obtenção de melhores resultados, preconiza-se que as recomendações dietéticas devem ser estabelecidas de acordo com o tipo de cálculo e as características da análise de urina de 24h.2 Por exemplo, as orientações dietéticas para os formadores de cálculos de oxalato de cálcio não são exatamente as mesmas empregadas para indivíduos que apresentam cálculos de ácido úrico. E, para aqueles cujos cálculos são de origem infecciosa (estruvita), nenhuma influência da composição da dieta foi evidenciada.2 De qualquer forma, um hábito que deve ser aconselhado a todos os indivíduos com nefrolitíase é o aumento da ingestão hídrica, para a diminuição da concentração urinária dos componentes litiásicos. Embora a quantidade exata não tenha sido ainda estabelecida, o consumo mínimo de 30 ml/kg de peso por dia deve ser encorajado.2
No âmbito populacional, visando à prevenção deste problema, o incentivo à alimentação equilibrada parece ser a estratégia mais adequada. Uma publicação recente que avaliou a associação entre hábito alimentar e o risco de nefrolitíase em mais de 50 mil pessoas concluiu que os principais fatores protetores foram o alto consumo de magnésio, de frutas frescas e de fibras provenientes dos cereais integrais. Além disso, quando comparados aos participantes que apresentavam um consumo elevado de carnes (> 100 g/dia), os que tinham um consumo moderado (50-99 g/dia) ou baixo (< 50 g/dia) tiveram 20% e 48% menor chance de ocorrência de litíase, respectivamente.7
Esta edição do JBN inclui a publicação do trabalho no qual Gordiano et al. analisaram as principais características dietéticas e metabólicas de 31 pacientes com nefrolitíase acompanhados em um ambulatório de Nefrologia e compararam os resultados com os obtidos em um grupo controle.8 Embora um pequeno número de pacientes tenha sido incluído, o perfil nutricional encontrado (88% tiveram diagnóstico de sobrepeso ou obesidade de acordo com o IMC) e a alta prevalência de indivíduos hipertensos (64%) evidenciaram a relação estreita entre estes distúrbios metabólicos e a ocorrência de nefrolitíase.
Com relação à investigação da dieta, apesar das limitações inerentes às metodologias empregadas para avaliação do consumo alimentar, os autores observaram consumo elevado de proteínas e sódio e ingestão abaixo do recomendado de cálcio, potássio e líquidos em ambos os grupos, comportamentos alimentares que, como bem explorado pelos autores, favorecem a recorrência da nefrolitíase. Estes achados reforçam a importância do aconselhamento e acompanhamento nutricionais dos indivíduos acometidos por este problema que, além de poder comprometer a qualidade de vida, pode ter como consequência a perda irreversível da função renal.