versão impressa ISSN 1808-8694versão On-line ISSN 1808-8686
Braz. j. otorhinolaryngol. vol.85 no.3 São Paulo maio/jun. 2019 Epub 10-Jul-2019
http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2016.03.004
Osteoma é uma lesão osteogênica benigna, caracterizada pela proliferação de osso compacto ou esponjoso. Pode ser central, periférico ou extraesquelético.1 Os osteomas periféricos são definidos pelo crescimento centrífugo do periósteo, enquanto os centrais surgem centripetamente do endósteo.1,2
A patogênese do osteoma periférico ainda não foi definida.1 Contudo, uma via comum subjacente ao processo de desenvolvimento dos osteomas foi reconhecida: supõe-se que uma combinação de trauma e atividade muscular pode iniciar uma reação osteogênica.3 No decurso de seu crescimento lento mas constante em tamanho, os osteomas dos ossos maxilofaciais permanecem assintomáticos até atingir proporções suficientes para causar desfiguração e/ou interferência direta na função normal de sua localização anatômica.4
Relatamos o caso de um osteoma periférico que simula um tumor de glândula parótida devido a sua localização e tamanho e a presença de manifestações clínicas raras.
Uma paciente do sexo feminino, 67 anos, foi encaminhada ao nosso hospital devido a um tumor de aparência benigna localizado na região da parótida esquerda e que, segundo a paciente, estava presente havia um ano. A lesão não tinha aumentado ou diminuído de tamanho desde que ela percebera sua presença. A paciente não apresentava disfagia ou trismo e não tinha história de trauma cervicofacial.
O exame físico revelou uma lesão tumoral firme e bem circunscrita na região da glândula parótida esquerda, revestida por pele normal, sem ulceração ou alterações de cor. A função do nervo facial estava normal e a paciente sentia apenas uma sensação de aumento do volume na região, sem dor.
Uma biópsia aspirativa com agulha fina (BAAF) foi solicitada, mas não foi possível extrair material para estudo. Decidimos então pelo uso de técnicas de imagem. O estudo de uma radiografia panorâmica revelou uma lesão radiopaca localizada no centro do ramo ascendente da mandíbula esquerda (fig. 1). Imagiologia tridimensional mostrou que a lesão era perfeitamente delimitada no interior da camada externa do osso cortical (fig. 2). A tomografia computadorizada axial mostrou que a lesão estendia-se para as superfícies interna e externa do ramo ascendente da mandíbula, sem causar reabsorção óssea ou destruição (fig. 3).
Figura 1 Vista da radiografia panorâmica que mostra uma lesão radiopaca localizada no centro do ramo ascendente da mandíbula esquerda.
Figura 2 Imagem tridimensional que mostra uma lesão perfeitamente delimitada de aparência exofítica benigna na camada cortical externa do ramo ascendente da mandíbula.
Figura 3 Tomografia computadorizada axial que mostra a lesão estendida para as superfícies interna e externa do ramo ascendente da mandíbula, sem causar reabsorção ou destruição óssea.
A paciente recusou a cirurgia. O tratamento conservador foi decidido, com monitoramento clínico e radiográfico periódico.
A primeira impressão de diagnóstico foi a de um tumor de parótida, diante da localização do osteoma periférico na face externa do ramo ascendente da mandíbula, que causava protrusão da glândula parótida e dos tecidos moles adjacentes.
O osteoma periférico é uma neoplasia rara da região maxilofacial e envolve mais frequentemente a mandíbula, o côndilo é o sítio preferido.5 O osteoma solitário pode ser classificado como periférico (parosteal, periosteal ou exofítico) quando proveniente do periósteo (como em nossa paciente), central (endosteal) quando proveniente do endósteo ou extraesquelético (denominado coristoma ósseo) quando proveniente de tecidos moles.6 Os osteomas devem ser bem identificados e diferenciados de outras lesões sólidas.3 Radiograficamente, são caracterizados pela forma oval, radiopacidade, massa bem circunscrita presa por uma base larga ou pedículo ao córtex ósseo.1,2
O tratamento de osteomas assintomáticos incidentalmente descobertos é controverso.7 O crescimento lento dos osteomas permite uma abordagem conservadora em relação às lesões assintomáticas e o tratamento cirúrgico não é recomendado nesses casos.8 A decisão pela remoção cirúrgica da lesão deve ser baseada em avaliação adequada dos riscos da cirurgia, inclusive possíveis danos a estruturas anatômicas importantes.
Burke et al.9 concluíram que o ultrassom é uma opção de exame de imagem preciso, acessível e de baixo custo, que não envolve radiação ionizante e pode distinguir entre lesões benignas e malignas em até 90% dos casos, bem como entre sialólitos e lesões císticas.
No caso de um tumor da glândula parótida aparente, uma avaliação por radiografia panorâmica ou ultrassonografia pode ser indicada antes de se decidir pela BAAF, pois esses exames de imagem são simples, não invasivos, de baixo custo e podem identificar uma possível doença óssea, evitam assim procedimentos diagnósticos desnecessários, como a BAAF.
O osteoma mandibular periférico pode ser incluído no diagnóstico diferencial de tumores da glândula parótida. Em tais situações, uma avaliação inicial por radiografia panorâmica pode ser indicada, com o objetivo de evitar procedimentos possivelmente desnecessários, como a BAAF.