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Parricídio e esquizofrenia – Relato de caso Comments about letter to the editor

Parricídio e esquizofrenia – Relato de caso Comments about letter to the editor

Autores:

Gustavo Bonini Castellana

ARTIGO ORIGINAL

Archives of Clinical Psychiatry (São Paulo)

versão impressa ISSN 0101-6083

Arch. Clin. Psychiatry vol.41 no.6 São Paulo 2014

https://doi.org/10.1590/0101-60830000000036

O crime de parricídio, assim como outros atos violentos, nem sempre está associado a transtornos mentais. Quando existe essa correlação, esta se dá principalmente com os transtornos psicóticos.

Entre as grandes síndromes psicóticas, a esquizofrenia é considerada a mais importante, tanto pela prevalência quanto pela cronicidade dos sintomas. Outros quadros psicóticos, como os transtornos delirantes persistentes e os transtornos psicóticos agudos, têm menor associação com crimes violentos, ainda que suas prevalências sejam relevantes na população comum.

As classificações psiquiátricas mais recentes tendem a agrupar os diagnósticos em grandes categorias. Tais agrupamentos têm como objetivo aumentar a confiabilidade entre os psiquiatras, perdendo, no entanto, a especificidade do diagnóstico. A atual possibilidade do diagnóstico dimensional presente no DSM-V1 não deixa de ser um reconhecimento da dificuldade de agrupar síndromes que cursam com fenômenos psicopatológicos singulares em cada caso isolado.

No caso relatado, o diagnóstico de esquizofrenia paranoide apresenta algumas particularidades, já que a violência contra animais e contra pessoas – apresentada pelo paciente antes do surgimento dos sintomas psicóticos – não é característica da síndrome esquizofrênica e está normalmente associada a transtornos de personalidade antissocial ou psicopatia.

No entanto, Kahlbaum descreveu, em 18852, sintomas pré-esquizofrênicos caracterizados por comportamento de oposição à família e à sociedade, com possíveis episódios de violência, semelhantes aos apresentados por psicopatas. A hebefrenia, conforme intitulou o autor, mimetiza a psicopatia, mas diferentemente do que ocorre nos transtornos da personalidade, tem evolução compatível com o diagnóstico de esquizofrenia, com sintomas positivos e negativos presentes.

O reconhecimento dessa descrição psicopatológica tem importância não só na atuação de psiquiatras forenses, mas também na clínica psiquiátrica cotidiana. A negligência com a psicopatologia clássica nos ambulatórios de psiquiatria pode levar os psiquiatras a se restringir ao uso de escalas padronizadas e análises superficiais de comportamento, deixando de observar essas nuances psicopatológicas.

O caso descrito3, sendo típico para quem atua como psiquiatra forense, é profícuo para a reflexão da relação complexa entre doença mental e violência. Além disso, seu relato é um testemunho singular da riqueza psicopatológica que contrasta com a pobreza biográfica que ainda se encontra, infelizmente, na população internada dos hospitais de custódia e tratamento no Brasil.

REFERÊNCIAS

Moscatello R. Patricide and schizophrenia – A case report. Arch Clin Psychiatry. 2014;41(6):159.
Teplin LA, McClelland GM, Abram KM, Weiner DA. Crime victimization in adults with severe mental illness: comparison with the National Crime Victimization Survey. Arch Gen Psychiat. 2005;62(8):911-2.
Van Dorn R, Volavka J, Johnson N. Mental disorder and violence: is there a relationship beyond substance use? Soc Psychiatry Psychiatr Epidemiol. 2012;47(3):487-503.
Newhill CE. Parricide. J Fam Violence. 1991;6(4):375-94.
Weisman AM, Sharma KK. Forensic analysis and psycholegal implications of parricide and attempted parricide. J Forensic Sci. 1997;42(6):1107-13.