Print version ISSN 0103-2100On-line version ISSN 1982-0194
Acta paul. enferm. vol.29 no.1 São Paulo Jan./Feb. 2016
http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201600002
Na última década a segurança do paciente tornou-se uma preocupação constante para o setor da saúde em todas as suas dimensões. Esse tema é, atualmente, debatido intensamente devido as evidências do impacto dos erros e dos eventos adversos nos sistemas de saúde.
Entre os desafios impostos no setor de saúde, no intuito de prestar uma assistência de qualidade e segura, destaca-se, o ambiente cirúrgico. Nesse cenário, as atividades desenvolvidas são complexas, interdisciplinares e com forte dependência da atuação individual, em um ambiente de alto risco para a ocorrência de eventos adversos.(1,2)
Assim, monitorar e avaliar a cultura de segurança nas organizações de saúde permite identificar e gerenciar a segurança do paciente no ambiente cirúrgico; essa avaliação pode ser usada para fins de aferição e de análise de tendências. Cabe acrescentar, que poderá fornecer bases para o diagnóstico situacional, programas de educação continuada, implementação de protocolos assistenciais e monitoramento dos eventos adversos.
A literatura ressalta a distinção entre cultura e clima de segurança e enfatiza que a cultura de segurança vem sendo avaliada por meio de questionários psicométricos, que mensuram o clima de segurança das atitudes e da percepção dos profissionais de saúde acerca da segurança do paciente nas organizações hospitalares.(3) Nessa visão, a cultura de segurança representa os valores e ações da organização relacionadas com a segurança e o clima de segurança concentra-se em percepções dos profissionais sobre a gestão da segurança na instituição.(4)
Nesse sentido, os instrumentos de pesquisa necessitam de tradução e adaptação entre as culturas e países, no intuito de manter o conteúdo, as características psicométricas e sua validade ao ser empregado em populações distintas.(5) Destaca-se que a vantagem do processo de adaptação de um instrumento existente é permitir a comparação de dados de diferentes populações e contextos com maior equidade, e ainda, possibilita compreender as semelhanças, diferenças e características em comum. Outras vantagens incluem o anonimato, o custo menor e a economia de tempo na construção de instrumentos que avaliam o mesmo constructo.(5)
A literatura referente a tradução e a adaptação de instrumentos psicométricos recomenda o emprego de seis etapas, assim definidas: tradução, síntese das traduções, retrotradução, avaliação por comitê de juízes, pré-teste, submissão e avaliação dos relatórios pelos autores do instrumento.(6)
Entre os questionários disponíveis para mensurar clima de segurança encontra-se o Safety Attitudes Questionnaire (SAQ).(4) Esse questionário foi traduzido e validado para diversos países como Alemanha, Dinamarca, Grécia, China, Suécia, Turquia, Nova Zelândia.(7-13) Diferentes versões do SAQ foram idealizadas para o emprego em diversos cenários como unidades de terapia intensiva, clínicas médicas e cirúrgicas, centro cirúrgico, serviços de emergência, unidades ambulatoriais e atenção primária, dentre outros.(14,15)
Considerando o ambiente cirúrgico e a inexistência de instrumentos passíveis de auferir, na percepção dos profissionais de saúde, o clima de segurança em centros cirúrgicos, no contexto brasileiro, optamos em traduzir e adaptar a versão do Safety Attitudes Questionnaire/Operating Room Version.
O Safety Attitudes Questionnaire/Operating Room (SAQ/OR) é a versão modificada do Safety Attitudes Questionnaire (SAQ) desenvolvida por pesquisadores da Universidade do Texas, nos Estados Unidos da América (EUA), e mantém as mesmas propriedades do SAQ versão genérica, em relação ao constructo de segurança do paciente adaptado para o ambiente cirúrgico e a escala de respostas.(15) Cabe destacar que o SAQ/OR foi traduzido e adaptado para Suécia e Japão, mantendo suas propriedades psicométricas.(2,16,17)
Outros desdobramentos do instrumento vêm sendo desenvolvidos por meio de pesquisas que relacionam os resultados do SAQ/OR com a segurança do paciente em ambiente cirúrgico. Neste sentido, um estudo avaliou o impacto da implementação do checklist nas atitudes de segurança dos profissionais de saúde em um centro cirúrgico no Japão.(17) Outro estudo, conduzido nos EUA, utilizou o SAQ/OR para identificar as diferenças da comunicação e colaboração entre enfermeiros e cirurgiões.(18)
Do ponto de vista estrutural, o questionário é dividido em três partes: a primeira é referente à qualidade da comunicação e colaboração entre os profissionais que atuam no ambiente cirúrgico, onde o sujeito deve responder sobre a relação com cada uma das categorias profissionais. A segunda parte é composta por 58 itens com assertivas destinadas a mensurar a percepção do profissional frente à segurança e uma questão para verificar se o sujeito preencheu o instrumento anteriormente. E, por fim, a terceira parte, composta pelas informações sociodemográficas (gênero, grupo étnico, categoria profissional, tempo de atuação, turno de atuação, entre outros) e há um espaço destinado a três possíveis recomendações para a melhoria da segurança do paciente em centro cirúrgico. As assertivas são respondidas por meio de uma escala tipo Likert com cinco graus de valoração e um item “não se aplica”.(15)
Acreditamos que a tradução e validação transcultural do SAQ/OR permitirá mensurar, por meio da percepção dos profissionais, o clima de segurança no cenário de centro cirúrgico, na realidade brasileira, contribuindo para uma assistência segura e de qualidade no âmbito hospitalar. Assim, o presente tem por objetivo descrever o processo de tradução e adaptação transcultural do SAQ/OR para o contexto brasileiro.
Trata-se de um estudo de cunho metodológico de tradução e adaptação transcultural do SAQ/OR, empregado para mensurar o clima de segurança dos profissionais de saúde atuantes em centro cirúrgico para a realidade brasileira.
Tendo em vista os diversos os métodos descritos na literatura para a tradução e adaptação transcultural de instrumentos de medidas, neste estudo optou-se pelo modelo proposto por Beaton.(5)
As recomendações desse modelo compreendem seis estágios, a saber: tradução, síntese das traduções, retrotradução, avaliação por comitê de juízes, pré-teste, submissão e avaliação dos relatórios pelos autores do instrumento.(5)
Esta primeira etapa do processo de adaptação transcultural ocorreu mediante a tradução do instrumento por duas tradutoras independentes, com fluência na língua inglesa e que possuíam como língua nativa o português. Cabe esclarecer que apenas uma das tradutoras conhecia os objetivos do estudo, bem como os conceitos do questionário.
A seguir, as versões foram analisadas e comparadas pelas pesquisadoras e as inconsistências ou dúvidas foram esclarecidas junto às tradutoras. Nesse momento, foi realizada uma síntese das traduções.
Nessa etapa procederam-se duas retrotraduções, a versão síntese, em português, retornou ao idioma inglês, contando com a participação de dois tradutores independentes, cujo idioma nativo era o inglês e que desconheciam o instrumento original. Novamente, ocorreu a síntese dessas retrotraduções pelas autoras, culminando nas duas versões. Ao término dessa fase da pesquisa produziu-se a versão final e todos os relatórios gerados foram inseridos numa planilha para avaliação das equivalências pelos juízes.
A versão final em português foi submetida ao comitê de juízes no intuito de proceder às equivalências: semântica, idiomática, conceitual, experiencial e de conteúdo.
Assim, conforme o modelo adotado(5) a equivalência semântica considera a adaptação das palavras de acordo com a gramática e vocabulário da língua para a qual ocorre a adaptação; a equivalência idiomática refere-se às expressões coloquiais, informais ou gírias utilizadas no país de origem, as quais apresentam dificuldades de tradução. Nesse momento, o comitê de especialista poderá sugerir expressões similares para a versão final. A equivalência conceitual consiste em verificar se as palavras que têm conotação conceitual estão adequadas ao contexto de serviços de saúde brasileiro; a equivalência experiencial refere-se a identificar se a versão adaptada expressa a experiência tal como vivenciada no cotidiano dos serviços no contexto cultural brasileiro; e por fim, na equivalência de conteúdo avaliam-se os itens do instrumento em relação à compreensão, clareza e redundâncias.
Os juízes convidados receberam uma carta convite e orientação para o preenchimento das equivalências utilizando uma planilha eletrônica. O total de itens avaliados correspondeu a 137. Foi estabelecido o índice de validade de ≥ 80% de consenso entre os juízes para cada item avaliado.
A planilha eletrônica, nominada de formulário, (Figura 1) continha: os itens do instrumento original (língua inglesa), as duas traduções (T1 e T2) para o português falado no Brasil, a síntese das traduções realizadas, as duas retrotraduções (RT1 e RT2) e síntese das duas retrotraduções realizadas pela pesquisadora e pela orientadora.
Na figura 1 observa-se a planilha com os itens e as equivalências, assim ao clicar na célula da equivalência correspondente, surgiam os espaços para os juízes pontuarem seu julgamento. Esta planilha propiciou a visualização de todas as traduções, retrotraduções e sínteses e a avaliação das cinco equivalências dos 137 itens do instrumento.
Finalmente, cada juiz verificou se a versão traduzida era, inteiramente, compreensível, considerando seus conceitos e seus significados para a cultura brasileira, comparando o instrumento original e ao traduzido.
O comitê de juízes foi constituído por 12 profissionais que apresentassem ao menos um dos três critérios, a saber: possuir domínio da língua inglesa; possuir experiência na área de segurança do paciente; possuir experiência na tradução e validação de instrumentos de pesquisa.
Os itens que não obtiveram esse consenso foram discutidos numa reunião presencial/virtual com os juízes, com a participação presencial de cinco juízes e participação por videoconferência de três juízes, de diversas regiões do Brasil, a pesquisadora, a orientadora, duas pessoas para suporte de registro e uma para suporte técnico da reunião on line, com a duração de cinco horas.
Em seguida foi realizado o pré-teste com 30 profissionais de saúde, atuantes em um centro-cirúrgico, em um hospital privado da região sul do Brasil, aplicando-se a versão em português do SAQ/OR. O relatório de todas as etapas percorridas foi encaminhado e aprovado pelos autores norte-americanos.
O estudo foi registrado na Plataforma Brasil sob o número do Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAEE) 19332613.4.0000.5392.
O processo de adaptação transcultural do SAQ/OR foi realizado em todas as etapas satisfatoriamente.
Os 12 juízes que integraram o comitê deste estudo, 9 (75%) eram enfermeiros, 2 (16,7%) médicos e 1 (8,3%) tradutor. A idade variou entre 33 e 72 anos, sendo a média de 51,5 anos (dp±10,85). Quanto ao tempo de formado a média correspondeu a 28,1 (dp ± 10,91). No que tange à natureza jurídica da instituição de trabalho dos participantes 9 (75%) pertenciam à pública e 3 (25%) à privada. Em relação à última titulação 50% dos especialistas possuíam o título de doutor, 25% de livre docente, 8% mestre em Ciências Políticas e 8% mestre em Enfermagem e 9% especialista em Centro Cirúrgico, Central de Material Esterilizado e Recuperação Pós-Anestésica, em Enfermagem, evidenciando a experiência dos participantes com a docência e a pesquisa.
Em relação ao processo de validação das equivalencias realizado pelos juízes, o consenso geral do instrumento obteve 84,1% de equivalência, 9,3% de não equivalência e 6,6% de indecisos.
No que tange à equivalência semântica, essa correspondeu a 85,2% de equivalência, 8,4% de não equivalência e 6,4% de indecisos. A equivalência idiomática obteve 85,5% de equivalência, 7,6% de não equivalência e 6,9% de indecisos. Referente à validação da equivalência conceitual os dados apontam que houve 85% de equivalência, 8,5% de não equivalência e 6,5% de indecisos. A equivalência experencial obteve 82,3% de equivalência, 11,8% de não equivalência e 5,9% de indecisos. E por fim, a equivalência de conteúdo apresentou 82,8% de equivalência, 10% de não equivalência e 7,2% de indecisos.
Ressalta-se que a validade experiencial obteve 12% de não equivalência e a validade de conteúdo obteve 10% de não equivalência e o instrumento obteve um total 84% de consenso entre os juízes.
Entretanto, 41 itens não obtiveram consenso ≥ 80% em ao menos uma das equivalências. Desses 12 (8,7%) itens referiram-se às assertivas sobre segurança do paciente, 10 (7,2%) às profissões de saúde, na primeira parte do questionário, 8 (5,8%) às profissões de saúde da terceira parte do questionário, como estes itens referiam-se as mesmas profissões foram agrupados. E por fim, 11 (8,0%) itens referentes aos dados sociodemográficos.
O quadro 1 descreve os itens relacionados às profissões que não obtiveram consenso e que foram discutidos na reunião realizada com os juízes, as quais compuseram versão final do instrumento. Sendo que o item que apresentou maior discordância entre os juízes dizia respeito ao Enfermeiro Anestesista.
Quadro 1 Consenso final sobre as profissões de saúde
SAQ/OR* | Síntese para avaliação | Versão final |
---|---|---|
Staff Surgeons/Surgical Attendings | Cirurgião da Equipe do Hospital/Outro Cirurgião | Cirurgião/Cirurgião Assistente |
Surgical Residents&Fellows | Residente ou Estagiário de Cirurgia | Residente de Cirurgia e Interno |
Surgical Technicians (scrub techs)&PAs | Cirurgião Auxiliar | Instrumentador e Circulante de Sala |
Anesthesiologists/Anes- thesia Attendings | Médico Anestesiologista/Preceptor de anestesia | Anestesiologista/Aneste- siologista Assistente |
Anesthesia Residents&Fellows | Residente ou Estagiário de Anestesia | Residente de Anestesia e Interno |
CRNAs** | Enfermeira anestesista | Enfermeiros Anestesistas |
Anesthesia Tecnicians (techs) | Técnicos de Anestesia | Auxiliar do Anestesiologista |
OR Nurses (scrub and circulating) | Enfermagem de Centro Cirúrgico (instrumentadores e circulantes) | Enfermeiro de Centro Cirúrgico |
Hospital Assistants (HA’s)/Nursing Assistants | Enfermeira Assistencial do Centro Cirúrgico | Enfermeiro Assistencial |
Floor/ward nurses | Enfermeiro - Chefe/Gerente do bloco operatório/Centro Cirúrgico | Enfermeiro - Chefe de Centro Cirúrgico |
*SAQ/OR - Safety Attitudes Questionnaire/Operating Room; **CRNAs - Certified Registered Nurse Anesthetists
Outras questões que suscitaram dúvidas relacionaram-se aos itens residente ou estagiário de cirurgia e residente ou estagiário de anestesia, sendo optado por residente de cirurgia e interno e residente de anestesia e interno. Nessa mesma linha, outra palavra debatida referiu-se ao preceptor de cirurgia e de anestesia, que foram definidas como cirurgião/cirurgião assistente e anestesiologista/anestesiologista assistente.
Das questões relacionadas com a segurança do paciente o item “26. Recebo informações adequadas e oportunas sobre os eventos do hospital, que podem afetar meu trabalho” obteve o maior percentual de discordância, e foi discutido, especialmente, quanto à palavra evento, que foi substituída por ocorrências.
As demais alterações relacionaram-se à ordem da composição das assertivas, pontuação e gramática (Quadro 2).
Quadro 2 Consenso final sobre os itens que avaliam a segurança do paciente
Item | SAQ/OR | Síntese para avaliação | Versão Final |
---|---|---|---|
07 | All the necessary information is available before the start of a procedure. | Toda informação necessária está disponível para mim, antes do início de um procedimento. | Toda informação necessária está disponível, antes do início de um procedimento. |
12 | In the OR, it is difficult to discuss errors. | Neste Centro Cirúrgico é difícil discutir sobre erros. | Na Sala de Cirurgia é difícil discutir os erros. |
17 | Hospital management does not knowingly compromise the safety of patients. | A administração do hospital não se compromete conscientemente com a segurança dos pacientes. | A administração do hospital não compromete, conscientemente, a segurança dos pacientes |
19 | Decision making in the ORs utilizes input from relevant personnel. | A tomada de decisão no Centro Cirúrgico utiliza informações relevantes dos profissionais. | A tomada de decisão no Centro Cirúrgico utiliza informações dos profissionais envolvidos. |
22 | This hospital deals constructively with problem phisicians and employees. | O hospital trabalha de maneira construtiva os profissionais considerados problemáticos. | O hospital lida de maneira construtiva com os profissionais problemáticos. |
26 | I am provided with adequate, timely information about events in the hospital that might affect my work. | Recebo informações adequadas e oportunas sobre os eventos do hospital que podem afetar o meu trabalho. | Recebo informações adequadas e oportunas sobre ocorrências no hospital, que podem afetar o meu trabalho. |
39 | I am frequently unable to espress disagreement with staff/attending physicians | Eu, frequentemente, não consigo expressar desacordo com a equipe dos profissionais que trabalham aqui. | Frequentemente, não consigo expressar desacordo com a equipe médica. |
40 | Truly Professional personnel can leave personal problems behind when working | Pessoas, realmente, profissionais conseguem deixar os problemas pessoais para trás quando estão trabalhando. | Profissionais conseguem deixar os problemas pessoais para trás, quando estão trabalhando. |
42 | Trainees in my discipline are adequately supervised. | Estagiários da minha profissão são, adequadamente, supervisionados. | Estagiários da minha área são supervisionados adequadamente. |
44 | I have made errors that had the potential to harm patients. | Cometi erros os quais tiveram potencial para prejudicar os pacientes. | Cometi erros que poderiam prejudicar os pacientes. |
45 | Staff/Attending physicians in the ORs here are doing a good job. | A equipe de profissionais ou trabalhadores deste Centro Cirúrgico estão fazendo um bom trabalho. | A equipe médica deste Centro Cirúrgico faz um bom trabalho. |
57 | The staff surgeon/attending surgeon should be formally in charge of the OR staff during the surgical procedure. | O cirurgião da equipe ou o cirurgião assistente deveria estar na coordenação da equipe médica durante o procedimento cirúrgico. | O cirurgião ou o cirurgião assistente deveria estar formalmente na coordenação da equipe da Sala Cirúrgica, durante o procedimento cirúrgico. |
*SAQ/OR - Safety Attitudes Questionnaire/Operating Room
Os demais 11 itens que não obtiveram consenso referiram-se aos dados sociodemográficos, da terceira parte do questionário. Cabe ressaltar que na reunião presencial/virtual foi definida a utilização da tabela do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para a classificação das etnias brasileiras que compõe o instrumento.
Na reunião presencial/virtual os 41 itens atingiram 100% de consenso e as sugestões foram acatadas e incorporadas na versão final do instrumento, resultando na versão do questionário em português, a qual foi submetida a um pré-teste com 30 profissionais de centro cirúrgico de um hospital privado brasileiro.
Os profissionais que responderam o questionário foram 10 cirurgiões, 10 anestesiologistas, cinco enfermeiros e cinco instrumentadores/circulantes.
O objetivo do pré-teste consiste em avaliar a compreensão dos itens e o tempo de preenchimento do questionário, assim cada respondente foi entrevistado pela pesquisadora sobre o entendimento de cada item e o tempo de preenchimento foi cronometrado. Neste estudo, o tempo de preenchimento médio do questionário foi de 16,5 minutos.
Os participantes não relataram dificuldades na compreensão dos itens do questionário. Entretanto, quatro respondentes apontaram que o tamanho da fonte dificultava a leitura dos itens, e ainda identificaram dificuldade com o layout do instrumento para relacionar a assertiva com a resposta na mesma linha, isso foi solucionado acentuando-se as cores entre as linhas.
Tanto o instrumento original quanto a versão brasileira contém duas páginas, apenas um sujeito no pré-teste manifestou que o questionário era extenso e outro sujeito apontou que havia perguntas parecidas. Porém, como a média do tempo de preenchimento está de acordo com as orientações dos autores do questionário original, optamos por manter a formatação e todos os itens do instrumento.
Todos os relatórios produzidos, a versão final do questionário e os resultados do pré-teste foram encaminhados aos autores do questionário na Universidade do Texas, nos EUA, que aprovaram a versão em português do SAQ/OR e autorizaram a validação do questionário.
Essa versão do instrumento foi denominada como: Questionário de Atitudes de Segurança (Versão Centro Cirúrgico). Entretanto, a literatura internacional e os questionários originais adotam a nomenclatura SAQ para os instrumentos traduzidos e adaptados, assim, adotamos a abreviatura de SAQ/VCC para o instrumento brasileiro.
Tendo em vista que a realização de uma tradução não pode ser efetuada devido às diferenças culturais e de linguagem, e, portanto, ao adaptar um instrumento de pesquisa devem-se considerar os aspectos técnicos, linguísticos e semânticos.(5) Nesta investigação foi realizado um rigoroso processo de adaptação transcultural e as etapas foram cumpridas conforme o modelo proposto.(6)
O processo de adaptação transcultural do SAQ/OR para a língua portuguesa e o contexto dos centros cirúrgicos brasileiros foi concluído de forma apropriada, atendendo todos os propósitos em todas as etapas descritas no método adotado.
Os estudos que realizaram a adaptação transcultural do SAQ na versão genérica e nas versões do SAQ/OR, adaptadas para a Suíça e Japão,(2,17) também, seguiram as recomendações internacionais dos processos de adaptação.(7-16)
Devido à complexidade do instrumento e das equivalências avaliadas o emprego da planilha eletrônica proporcionou a visualização de todas as etapas do processo de tradução, ofereceu aos participantes agilidade na avaliação dos itens e suas observações e, ainda, favoreceu a análise quantitativa das respostas.
A validação de conteúdo realizada pelo grupo de especialista multidisciplinar e a participação de uma tradutora envolvida no processo, conforme recomenda a literatura,(6) enriqueceu a discussão dos termos e sua tradução para o português.
Nesse contexto, a análise pelo grupo de especialista da avaliação das equivalências envolveu procedimentos qualitativos e quantitativos. Entre os itens que não obtiveram consenso e que envolveram questões complexas destacamos os itens relacionados às profissões de saúde que atuam no centro cirúrgico. Ressaltamos que no contexto original do instrumento as profissões e a legislação que regem as profissões de saúde são diferentes do Brasil, especialmente no ambiente cirúrgico, cabe exemplificar com função do enfermeiro anestesista que no Brasil é exercida pelo anestesiologista, um profissional médico.
A compreensão dos itens foi identificada no pré-teste, não havendo a exclusão, apenas alterações de layout foram necessárias em relação ao instrumento original. Assim, foram mantidas as três dimensões do instrumento original, a primeira parte referente à comunicação e colaboração entre os profissionais de saúde, as 58 assertivas que avaliam o clima de segurança e as informações pessoais, a questão acerca do preenchimento anterior do instrumento e a pergunta aberta referente às três recomendações para aprimorar a segurança do paciente no centro cirúrgico.
As pesquisas que versam sobre adaptação transcultural do SAQ/OR na língua japonesa e na língua sueca indicaram pequenas alterações devido as diferenças culturais.(16,18) Entretanto, a adaptação para o contexto sueco indicou a exclusão de um item sobre a segurança do paciente.
Outra questão apontada no pré-teste foi o tamanho da fonte. Entretanto, como o questionário possui duas páginas, o aumento do tamanho das letras acarretaria no acréscimo de uma página, assim optamos pela preservação do formato.
Com relação às questões acerca da segurança do paciente, das 58 que compõem o questionário, somente, 12 não obtiveram consenso e foram discutidas na reunião, isso corrobora o rigor metodológico do processo de tradução e retrotradução. Ao ponderar acerca da complexidade do questionário, cabe ressaltar que foram necessárias pequenos ajustes nas questões relacionadas à segurança do paciente e que as mesmas diziam respeito às equivalências experiencial e de conteúdo.
Dessa forma, considerando a lacuna de instrumentos destinados a mensurar a percepção dos profissionais de saúde frente à segurança do paciente em ambiente cirúrgico, o SAQ/VCC pode contribuir como uma ferramenta de gestão e subsidiar estratégias, tanto para a avaliação do clima de segurança como da qualidade da comunicação e da colaboração entre a equipe de profissionais atuantes no centro cirúrgico e corroborar para a avaliação da cultura de segurança nos serviços de saúde.
Este estudo realizou a tradução e a adaptação transcultural do questionário SAQ/OR, uma ferramenta que possibilita avaliar o clima de segurança no ambiente cirúrgico. O processo empregado foi realizado de maneira rigorosa conforme recomenda a literatura atingindo os objetivos propostos e a versão originada foi aprovada pelos autores do instrumento.