Compartilhar

Percepção da fala no ruído em perda auditiva unilateral

Percepção da fala no ruído em perda auditiva unilateral

Autores:

Maria Fernanda Capoani Garcia Mondelli,
Marina de Marchi dos Santos,
Maria Renata José

ARTIGO ORIGINAL

Brazilian Journal of Otorhinolaryngology

versão impressa ISSN 1808-8694versão On-line ISSN 1808-8686

Braz. j. otorhinolaryngol. vol.82 no.4 São Paulo jul./ago. 2016

http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2015.08.019

Introdução

Indivíduos com perda auditiva unilateral (PAUn) apresentam limitações de atividades de comunicação, principalmente em ambientes ruidosos,1 além de possíveis déficits no processamento auditivo e, consequentemente, no desenvolvimento da linguagem e da comunicação.2

A audição binaural proporciona localização sonora, somação binaural, efeito sombra da cabeça e liberação do mascaramento. A interação desses fatores favorece o reconhecimento da fala no ruído, devido à capacidade de realizar figura-fundo.3

A PAUn pode causar dificuldades na comunicação como um todo,4 e pode ser minimizada com o uso do aparelho de amplificação sonora individual (AASI), o qual permite resgatar a percepção dos sons da fala e também dos sons ambientais, contribuindo para melhorar a habilidade de conversação.5

A amplificação sonora é uma opção para os indivíduos com perdas auditivas, mas, isoladamente, este dispositivo pode apresentar eficiência limitada para auxiliar no entendimento da fala em ambientes ruidosos ou com reverberação. O indivíduo com PAUn apresenta dificuldades na habilidade de discriminação dos sinais incomuns que é realizada de maneira automática em sujeitos com audição normal,6 sendo, dessa forma, mais um componente que requer especial atenção por parte do fonoaudiólogo no processo de seleção e verificação do AASI.

Os testes de percepção de fala que utilizam ruído competidor, no Brasil, ainda não fazem parte do protocolo de avaliação audiológica convencional, e a comparação do desempenho no silêncio e no ruídonão é frequentemente realizada com base em protocolos.7

A utilização de sentenças em testes de percepção de fala, com e sem a presença de ruído competidor, tem sido desenvolvida ao longo do tempo, por melhor representar a situação de escuta cotidiana.7,8

Os testes de percepção de fala que medem o limiar de reconhecimento do sinal de fala no silêncio, quando atingem 50% de inteligibilidade, indicam diferenças pequenas entre indivíduos com audição normal e com perdas auditivas. Diferentemente de quando são expostos a ruído e mudanças na inteligibilidade, acontecem de maneira mais efetiva.9

O Hearing In Noise Test (HINT) foi desenvolvido em 1994,10 com a finalidade de avaliar a dificuldade individual em reconhecer a fala e compará-la com o desempenho de pessoas com audição normal, tanto no silêncio quanto no ruído. A metodologia proposta pelo HINT possibilita utilizar limiares na busca da relação sinal/ruído (S/R), para avaliar o reconhecimento da fala no ruído, e não mais por porcentagem de acertos.7

Muitos são os fatores que interferem de maneira negativa na habilidade de compreensão da fala no momento da realização de avaliações, como também as características do indivíduo avaliado, somando as suas experiências de linguagem e audição, o tipo e o nível de apresentação do material e sua resposta.11 Dessa forma, fica evidente a importância da pesquisa da percepção da fala em testes que simulem a percepção do sinal de fala na presença de ruído competidor.

Assim sendo, este estudo teve por objetivo avaliar a percepção da fala de indivíduos com perda auditiva unilateral nas condições com e sem ruído competidor, com e sem o uso do AASI.

Método

O trabalho teve aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa do local onde o estudo foi desenvolvido, protocolado sob o nº 095/2010.

Para participação na pesquisa, foram seguidos os seguintes critérios de inclusão: adultos com idade entre 18 a 50 anos; diagnóstico de perda auditiva sensorioneural de graus moderado a severo em uma orelha; e audição contralateral dentro dos padrões de normalidade, sem uso prévio de AASI.

A classificação da perda auditiva foi baseada na média dos limiares audiométricos das frequências de 500. 1.000, 2.000 e 4.000 Hz, caracterizando como deficiência auditiva de grau leve (média de 26 a 40 dBNA), moderado (média de 41 a 60 dBNA), severo (média 61 a 80 dBNA) e profundo (média acima de 81 dBNA), segundo a WH.12

Participaram deste estudo 30 indivíduos com média de idade de 41,9 anos. Do grupo, 46,7% apresentaram perda auditiva de grau moderado, e 53,3% grau severo. Na tabela 1 encontra-se a caracterização dos participantes da pesquisa quanto ao sexo, orelha acometida pela privação sensorial e grau da perda auditiva.

Tabela 1 Distribuição da amostra relacionada a sexo, orelha acometida pela privação sensorial e grau da perda auditiva 

Grau da perda auditiva % (n)
F % (n) M % (n) % (n) Moderada % (n) Severa % (n)
OE 36,84% (7) 63,64% (7) 46,7% (14) 42,86% (6) 57,14% (8) 46,7% (14)
OD 63,16% (12) 36,36% (4) 53,3% (16) 50% (8) 50% (8) 53,3% (16)
Total 63,3% (19) 36,7% (11) 100% (30) 46,7% (14) 53,3% (16) 100% (30)

OD, orelha direita; OE, orelha esquerda; F, feminino; M, masculino.

Para a seleção do tipo e modelo do AASI, foram analisadas as características audiológicas e as comunicativas dos participantes. De acordo com essa análise, foram selecionados AASI Phonak Una(r) M AZ e Una(r) SP AZ indicados para perdas auditivas moderadas e severas, respectivamente.

Após a programação dos AASI, foi realizado o procedimento de verificação de medidas com microfone sonda. Os valores da REAR foram comparados aos targets da regra NAL-NL1 para sons fracos, médios e fortes. Eram consideradas respostas equiparadas quando a diferença entre o target para REAR e o valor obtido em orelha real não ultrapassasse 10 Db.13 Para todos os indivíduos, as resposta foram equiparadas aos targets.

Os participantes da pesquisa realizaram a avaliação da percepção da fala sem AASI no dia da adaptação do dispositivo, e com AASI três meses após uso efetivo do AASI. Foi considerado como uso efetivo um período igual ou superior a 8 horas/dia, confirmadas por meio do datalogging, e durante três meses, considerando a aclimatização.14 O datalogging foi ativado em todos os AASI adaptados para todos os pacientes e analisado no retorno, para verificar o número de horas diárias de uso da amplificação.

HINT

O teste consiste em listas de sentenças, ruído competidor e um microprocessador que gerencia a aplicação do teste. O estímulo utilizado neste teste de percepção de fala no ruído é o sinal de fala. Para apresentar o estímulo, foi determinado o limiar de reconhecimento de fala necessário para o sujeito identificar 50% dos estímulos na relação sinal/ruído estabelecida.

Este valor é determinado pelo protocolo do HINT e apresenta duas fases: a primeira é composta pelas quatro primeiras sentenças e as intensidades variam de 4 em 4 dB; a segunda inicia-se a partir da quinta sentença e a intensidade varia de 2 em 2 dB, o que possibilita a determinação do limiar com maior precisão.15

O estímulo de fala foi apresentado frontalmente e sem ruído competidor. Na sequência, o estímulo foi apresentado com sinal de fala e ruído frontal, com ruído do lado direito e com ruído do lado esquerdo, respectivamente, com o sinal de fala posicionado frontalmente. O mesmo foi realizado com e sem o uso do AASI. A intensidade do ruído permaneceu fixa em 65 dB NA, e a intensidade do estímulo foi modificada para mais ou para menos, conforme as respostas encontradas.

O equipamento HINT detém uma nomenclatura padronizada das quatro condições do teste. Quando uma resposta correta é obtida, a relação sinal/ruído é diminuída por um valor equivalente. Quando a resposta for incorreta, a relação sinal/ruído (S/R) é aumentada pelo mesmo valor equivalente.

O sinal é apresentado pelas listas de sentenças, e o ruído utilizado é do próprio material de sentenças. A relação S/R negativa indica maior dificuldade no teste. Assim, quanto mais negativa estiver a relação S/R, melhor será o desempenho do indivíduo em situações com ruído competidor.15

O teste foi realizado em campo livre e o limiar de recepção de fala foi obtido por meio da aplicação de 20 sentenças gravadas, que simulam as situações cotidianas. As quatro situações realizadas estão descritas abaixo:

Fala sem ruído (S): o sinal sai à frente do sujeito, em uma condição de teste sem ruído (0º azimute).

Fala com ruído frontal (RF): o sinal e o ruído são colocados diretamente à frente do indivíduo, em uma condição de ruído em 0º azimute.

Fala com ruído à direita (RD): o sinal é posicionado à frente do sujeito, e o ruído é emitido a 90º à direita do mesmo (condição ruído à direita - ruído em 90º azimute).

Fala com ruído à esquerda (RE): o sinal é posicionado à frente do sujeito, e o ruído é emitido a 90º à esquerda do mesmo (condição ruído à esquerda - ruído a 90º azimute).

Independentemente da forma de aplicação do HINT, o próprio software elabora, para a situação em campo livre ou com fones de ouvido, o chamado ruído composto (RC), que é constituído por uma média ponderada das quatro condições, da seguinte maneira: RC = (2* RF+RD+RE)/4.

Os resultados do HINT são expressos pelos valores do limiar de reconhecimento de sentenças (LRS), e são comparados com as médias obtidas em sujeitos com audição periférica normal.

Para análise estatística, foram utilizados o Teste Exato de Fisher e o Teste t de Student, considerando diferença estatisticamente significante quando p ≤ 0,05.

Resultados

A amostra deste trabalho foi composta por 30 indivíduos, não havendo diferença entre os sexos. Todos apresentavam PAUn sensorioneural de grau moderado (46,7%) ou severo (53,3%), e com acometimento semelhante das orelhas - 46,7% à esquerda e 53,3% à direita (tabela 1).

A tabela 2 apresenta a comparação entre as orelhas direita e esquerda acometidas pela PAUn nas quatro situações propostas pelo HINT (S, RF, RD e RE), sem e com AASI. Os indivíduos com PAUn à direita apresentaram resultados sutilmente melhores. porém, os resultados com significância foram observados para as respostas da orelha esquerda nas situações com ruído à esquerda (p ≤ 0,02).

Tabela 2 Comparação entre as orelhas com PAUn em cada situação proposta pelo HINT, sem e com AASI 

Situação HINT OE OD Dif. entre OD e OE p
n Total Média DP n Total Média DP
S1 14 40,18 4,82 16 41,01 4,97 0,64
S2 14 39,36 4,45 16 39,14 4,36 0,89
S_1_2 14 −0,82 3,51 16 −1,86 4,25 0,47
RF1 14 −1,50 1,39 16 −0,70 1,39 0,13
RF2 14 −1,62 1,33 16 −0,99 1,84 0,29
RF_1_2 14 −0,12 1,29 16 −0,28 1,09 0,71
RD1 14 −2,38 2,31 16 −3,24 2,42 0,33
RD2 14 −2,87 2,41 16 −3,87 1,96 0,21
RD_1_2 14 −0,48 2,11 16 −0,63 1,52 0,82
RE1 14 −3,54 2,01 16 0,36 1,70 0,00a
RE2 14 −3,63 1,79 16 −1,35 2,08 0,00a
RE_1_2 14 −0,09 1,57 16 −1,71 2,18 0,02a

S, silêncio; RF, ruído frontal; RD, ruído à direita; RE, ruído à esquerda; 1, situação sem AASI; 2, situação com AASI; n, número; DP, desvio padrão; OD, orelha direita; OE, orelha esquerda.

a Diferença estatisticamente significante.

A tabela 3 apresenta a comparação entre o grau da PAUn - moderada ou severa - nas quatro situações propostas pelo HINT (S, RF, RD e RE), sem e com o uso do AASI, sendo possível observar que os indivíduos com perda moderada apresentaram melhores respostas nas situações propostas.

Tabela 3 Comparação entre o grau da PAUn nas situações propostas pelo HINT, sem e com o uso do AASI 

Situação HINT PA moderada PA severa Dif. entre PAM e PAS p
n Total Média DP n Total Média DP
S1 14 40,36 4,55 16 40,85 5,20 0,78
S2 14 37,96 2,50 16 40,36 5,29 0,13
S_1_2 14 −2,4 3,76 16 −0,48 3,90 0,18
RF1 14 −0,97 1,54 16 −1,16 1,36 0,73
RF2 14 −1,76 1,55 16 −0,87 1,63 0,13
RF_1_2 14 −0,78 1,15 16 0,28 0,97 0,00a
RD1 14 −3,77 1,77 16 −2,02 2,57 0,04a
RD2 14 −4,09 2,49 16 −2,80 1,78 0,11
RD_1_2 14 −0,31 1,62 16 −0,78 1,94 0,48
RE1 14 −1,72 2,90 16 −1,22 2,56 0,62
RE2 14 −2,55 2,13 16 −2,30 2,40 0,76
RE_1_2 14 −0,82 2,71 16 −1,07 1,34 0,75

S, silêncio; RF, ruído frontal; RD, ruído à direita; RE, ruído à esquerda; 1, situação sem AASI; 2, situação com AASI; n, número; DP, desvio padrão; PAM, perda auditiva moderada; PAS, perda auditiva severa.

a Diferença estatisticamente significante.

A tabela 4 apresenta a comparação entre o desempenho do sexo masculino e o do feminino com PAUn nas quatro situações propostas pelo HINT (S, RF, RD e RE), sem e com o uso do AASI, com resultados significativos no sexo feminino nas situação silêncio (p ≤ 0,02) e na situação com ruído à direita (p ≤ 0,03).

Tabela 4 Distribuição dos sujeitos quanto ao sexo em relação às situações testadas pelo HINT, sem e com o uso do AASI 

Situação HINT Masculino Feminino Dif. entre M e F
n Total Média DP n Total Média DP Valor de p
S1 11 37,49 3,16 19 42,44 4,76 0,00a
S2 11 38,19 5,40 19 39,85 3,59 0,31
S_1_2 11 0,70 3,97 19 −2,58 3,39 0,02a
RF1 11 −1,57 1,16 19 −0,78 1,51 0,15
RF2 11 −1,52 1,09 19 −1,15 1,88 0,55
RF_1_2 11 0,04 1,17 19 −0,36 1,18 0,36
RD1 11 −3,50 2,47 19 −2,46 2,29 0,25
RD2 11 −3,15 2,53 19 −3,55 2,04 0,64
RD_1_2 11 0,34 1,62 19 −1,08 1,70 0,03a
RE1 11 −1,72 2,50 19 −1,30 2,85 0,68
RE2 11 −2,90 2,61 19 −2,13 2,01 0,37
RE_1_2 11 −1,17 2,04 19 −0,83 2,11 0,67

S, silêncio; RF, ruído frontal; RD, ruído à direita; RE, ruído à esquerda; 1, situação sem AASI; 2, situação com AASI; n, número; DP, desvio padrão; M, sexo masculino; F, sexo feminino.

a Diferença estatisticamente significante.

A tabela 5 demonstra o desempenho do grupo de 30 indivíduos com PAUn nas quatro situações propostas pelo HINT (S, RF, RD e RE), com melhores resultados à esquerda, independentemente da orelha acometida.

Tabela 5 Desempenho de sujeitos com perda unilateral no HINT − Brasil 

Situações do HINT Limiar DP p
S 1 40,62 3,89 0,06
S 2 39,24
RF 1 −1,07 1,17 0,32
RF2 −1,29
RD 1 −2,84 1,79 0,09
RD 2 −3,40
RE 1 −1,45 2,06 0,01a
RE 2 −2,41

S, silêncio; RF, ruído frontal; RD, ruído à direita; RE, ruído à esquerda; 1, situação sem AASI; 2, situação com AASI; n, número; DP, desvio padrão.

a Diferença estatisticamente significante.

Discussão

A PAUn evoca diversos questionamentos em relação às consequências decorrentes deste tipo de perda, sua etiologia e características predominantes dos indivíduos que a possuem. A adaptação ao AASI, nesta população, ainda gera alguns questionamentos quanto aos benefícios proporcionados ao paciente.

Pesquisadores investigaram o benefício e a satisfação de usuários de AASI com diagnóstico de PAUn mista ou sensorioneural, de graus moderado, severo ou profundo, sendo constatado que, mesmo não sendo atingido o ganho necessário para suprir as dificuldades impostas pela privação auditiva, os sujeitos relataram satisfação com o uso da amplificação, relacionando-a com melhora da qualidade de vida.16

Indivíduos com PAUn apresentam mais dificuldades do que os normo-ouvintes para compreender a fala, quando o estímulo é apresentado juntamente com um ruído competidor, mesmo quando a orelha com melhores limiares auditivos está posicionada em direção à fala.14 Dessa forma, testes que avaliem a inteligibilidade da fala na presença de ruído competidor podem fornecer informações relevantes sobre os contextos comunicativos que se aproximam das situações vivenciadas no cotidiano.

Pode-se observar, na tabela 2, que somente na situação em que o ruído foi posicionado em direção da orelha esquerda (OE) dos indivíduos com acometimento auditivo nessa orelha (OE), os participantes do estudo demonstraram melhor relação sinal/ruído (S/R), diferentemente de quando o ruído foi apresentado no lado da OE dos participantes com restrição auditiva na orelha direita (OD). Um estudo com indivíduos com PAUn verificou que a reorganização cortical induzida por uma dificuldade auditiva unilateral ocorre, principalmente, em indivíduos com perda auditiva do lado esquerdo.

Tal fato sugere que as modificações anatômicas e funcionais relacionadas à plasticidade cerebral são mais propensas a ocorrer no hemisfério direito do que no esquerdo.17

Em indivíduos que apresentam limiares auditivos normais, a audição é o único sentido em que cada orelha possui representação em ambos os hemisférios cerebrais, pois as vias auditivas realizam seu trajeto tanto ipsilateral quanto contralateralmente.18

Para indivíduos com PAUn, podem ocorrer déficits no processamento auditivo e, consequentemente, no desenvolvimento da linguagem e da comunicação.19

Pesquisa18 demonstrou que indivíduos com perda auditiva na OD apresentam mais quantidade de queixas relacionadas ao desenvolvimento da fala e da linguagem, bem como no desempenho escolar. Isso provavelmente demonstra que a perda auditiva do lado direito desencadeia uma imaturidade neurológica das vias auditivas do sistema nervoso central que decorrem da estimulação proveniente da OD, isto é, da informação que será enviada ao hemisfério esquerdo, o que pode, também, estar relacionado com uma menor habilidade de inibição de ruídos competitivos.

O grau da perda auditiva foi um fator que demonstrou relação na situação de ruído à direita sem AASI, bem como a diferença com e sem AASI com ruído e estímulo apresentados frontalmente.

Um ambiente ruidoso apresenta-se como agente desafiador para inteligibilidade de fala, principalmente para indivíduos que apresentam perda auditiva, visto que a quantidade de pistas fica reduzida, levando-os a utilizar somente as pistas disponíveis na situação.

Nessa amostra, foi possível verificar que sujeitos com PAUn severa demonstraram maior dificuldade de percepção de fala em relação aos indivíduos com PAUn moderada, o que pode ser justificado pela redução das pistas auditivas binaurais em decorrência da perda auditiva, pois, espera-se que a audição periférica normal em ambas as orelhas auxilie na detecção e na organização da fala no ruído,20,21 sendo que o grau da perda de audição pode ter desempenhado um fator agravante no desempenho do teste (tabela 3). Os resultados indicaram significância em duas situações, porém, é possível observar respostas melhores dos indivíduos com perda auditiva moderada em relação aos indivíduos com perda auditiva severa, no que diz respeito à relação S/R.

Quanto ao sexo, nessa amostra, as mulheres demonstraram melhor desempenho em três situações do HINT - Brasil em relação aos homens (tabela 4). Pesquisadores22 relatam que homens e mulheres processam de forma diferente os estímulos sonoros, o que pode ser justificado pela ativação conjunta do córtex auditivo primário com o córtex pré-frontal, o qual é ativado em maior intensidade nas mulheres, até mesmo na presença de um estímulo insignificante. O córtex pré-frontal participa de diversos processos cognitivos, com a função moduladora na ativação das demais regiões corticais. Por esse motivo, o melhor desempenho de mulheres em relação aos homens em tarefas com presença de ruído competitivo pode ser decorrente da superioridade da manutenção da atenção aos estímulos sonoros, mesmo para estímulos sem significado, como, por exemplo, o ruído. Assim, as diferentes formas de ativação cerebral em homens e mulheres podem justificar o melhor desempenho do sexo feminino neste estudo.

Quando verificado o desempenho dos indivíduos nas situações com o uso do AASI (tabela 5), foi observado que, em todas as situações do teste, houve tendência à melhora da relação S/R, com maior evidência na situação em que o ruído foi direcionado à esquerda. Este dado demonstra a importância de se considerar os benefícios relacionados à adaptação de AASI em pacientes com PAUn, quanto ao benefício que a amplificação pode fornecer para minimizar as dificuldades impostas por esse tipo de privação sensorial.

Dessa forma, observa-se a necessidade de estudos adicionais que possam compreender melhor as características e as peculiaridades da adaptação de AASI em indivíduos com a PAUn, para melhor atender às demandas exigidas para esses pacientes durante o processo de seleção e verificação do AASI.

Conclusão

No teste HINT - Brasil, indivíduos com PAUn demonstraram melhor desempenho na percepção da fala, tanto em silêncio quanto nas situações com ruído competidor, com uso do AASI.

REFERÊNCIAS

1. Vieira MR, Nishihata R, Chiari BM, Pereira LD. Percepção de limitações de atividades comunicativas, resolução temporal e figura-fundo em perda auditiva unilateral. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2011;16:445-53.
2. Tharpe AM. Unilateral and mild bilateral hearing loss in children: past and current perspectives. Trends Amplif. 2008;12:7-15.
3. Bess F, Mckingley A, Murphy JD. Children with unilateral sensorineural hearing loss. Paediatr Audiol Med. 2002;3:249-313.
4. Ruscetta MN, Arjmand EM, Pratt SR. Speech recognition abilities in noise for children with severe-to-profound unilateral hearing impairment. Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2005;69:771-9.
5. Magni C, Freiberger F, Tonn K. Avaliação do grau de satisfação entre os usuários de amplificação de tecnologia analógica e digital. Braz J Otorhinolaryngol. 2005;71:650-7.
6. Trainor L, Sonnadara R, Wiklund K, Bondy J, Gupta S, Becker S, et al. Development of a flexible, realistic hearing in noise test environment (R-HINT-E). Signal Process. 2004;84:299-309.
7. Arieta AM, Couto CM, Costa EA. Teste de percepção da fala HINT Brasil em grupos de sujeitos expostos e não expostos a ruído ocupacional. Rev CEFAC. 2013;15:786-95.
8. Costa MJ. Lista de Sentenc¸as em Português: apresentação e estratégias de aplicação na audiologia. Santa Maria: Pallotti; 1998. p. 26-36.
9. Wagener K, Josvassen JL, Ardenkjaer R. Design, optimization and evaluation of a Danish sentence test in noise. Int J Audiol. 2003;42:10-7.
10. Nilsson M, Soli SD, Sullivan JA. Development of the hearing in noise test for the measurement of speech reception thresholds in quiet and in noise. J Acoust Soc Am. 1994;95:1085-99.
11. Jacob RTS, Monteiro NFG, Bevilacqua MC, Lauris JRP, Moret ALM. Percepção da fala em crianc¸as em situação de ruído. Arq Int Otorrinolaringol. 2011;15:163-7.
12. WHO. Grades of Hearing impairment. World Health Organization; 2009.
13. Dillon H. Hearing aids. 2nd ed. New York: Thieme; 2001.
14. Almeida K, Santos TMM. Seleção e adaptação de próteses auditivas em crianc¸as. In: Almeida K, Iório MCM, editors. Próteses auditivas: fundamentos teóricos e aplicações clínicas. São Paulo: Lovise; 2003. p. 357-80.
15. HINT Pro Hearing in Noise Test User's and Service Manual. Mudelen, IL: Bio-logic Systems Corp. Biologic System Corp. House Ear Institute; 2007, 157 p. [Operating instructions HINT Pro 7.2 Audiometric system: Los Angeles].
16. José MR, Campos PD, Mondelli MFCG. Perda auditiva unilateral: benefício e satisfação com o uso do AASI. Braz J Otorhinolaryngol. 2011;77:221-8.
17. Hanss J, Veuillet E, Adjout K, Besle J, Collet L, Thai - Van H. The effect of long-term unilateral deafness on the activation pattern in the auditory cortices of French-native speakers: influence of deafness side. BMC Neurosci. 2009;10:23.
18. Nishihata R, Vieira MR, Pereira LD, Chiari BM. Processamento temporal, localização e fechamento auditivo em portadores de perda auditiva unilateral. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2012;17:266-73.
19. Feniman MR, Keith RW, Cunninghom RF. Assessment of auditory processing in children with attention deficit hyperactivity disorder and language-based learing impairments. Disturb Commun. 1999;11:9-27.
20. Jerger J, Brown D, Smith S. Effect of peripheral hearing loss on the masking level difference. Arch Otolaryngol. 1984;110:290-6.
21. Hall JW, Tyler RS, Fernandes MA. Factors influencing the masking level difference in cochler hearing impaired and normal hearing listeners. J Speech Hear Res. 1984;27:145-54.
22. Ruytjens L, Georgiadis JR, Holstege G, Wit HP, Albers FWJ, Willemsen ATM. Functional sex differences in human primary auditory cortex. Eur J Nucl Med Mol Imaging. 2007;34:2073-8.