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Percepção de monitores do PET-Saúde sobre sua formação e trabalho em equipe interdisciplinar

Percepção de monitores do PET-Saúde sobre sua formação e trabalho em equipe interdisciplinar

Autores:

Simone Cardoso Lisboa Pereira,
Vanessa de Oliveira Martins Reis,
Célia Regina Moreira Lanza,
Ivana Montandon Soares Aleixo,
Monica Maria de Almeida Vasconcelos

ARTIGO ORIGINAL

Interface - Comunicação, Saúde, Educação

versão impressa ISSN 1414-3283versão On-line ISSN 1807-5762

Interface (Botucatu) vol.19 supl.1 Botucatu 2015

http://dx.doi.org/10.1590/1807-57622014.0840

ABSTRACT

This study aimed to identify and analyze social representations of PET-Health monitors at the Minas Gerais Federal University (UFMG), Brazil, which participate in the School Healthcare research area, with respect to the influence of this experience on their professional education and their outlook toward interdisciplinary teamwork. The methodology sought to delineate their social representations. Their responses were assessed, entered into a database, and imported to the NVivo.10 software. The data were categorized and evaluated using collective subject discourse analysis. Data from 33 monitors of PET-Saúde were gathered, and these formed 16 representational components: nine related to the monitors’ education and seven related to interdisciplinary teamwork. The experience made a relevant difference to the education of professionals, with favorable perceptions toward interdisciplinary teamwork focusing on the social demands of the Brazilian Health System (SUS).

Key words: Healthcare education; Teamwork; Interdisciplinarity; Social representations; School healthcare

RESUMEN

El objetivo fue delinear las representaciones sociales de los monitores del PET-Salud-UFMG, Brasil, que actúan en la línea de investigación Salud en la Escuela, acerca de la influencia de esa experiencia en su formación y con respecto al trabajo en equipo interdisciplinario. El trayecto metodológico buscó delinear las representaciones sociales de los monitores. Fueron depuradas las respuestas en los informes de los monitores, digitalizadas e importadas para el programa NVivo.10. Posteriormente, fueron categorizadas y analizadas vía discurso del sujeto colectivo. Se pesquisaron datos de 33 monitores del PET-Salud en la Escuela, constituyendo 16 representaciones sociales, siendo nueve relacionadas a su formación y siete al trabajo en equipo interdisciplinario. La experiencia en el proyecto ayudó a promover diferencias para la formación de futuros profesionales de salud, con percepciones favorables para el trabajo en equipo interdisciplinario, dirigidas a las demandas sociales del Sistema Brasileño de Salud (SUS).

Palabras-clave: Formación en salud; Trabajo en equipo; Interdisciplinariedad; Representaciones sociales; Salud en la Escuela

Introdução

Está posto que formar profissionais de saúde com perfil adequado às necessidades sociais é um dos maiores desafios do Ensino Superior que ganha dimensão particular e significativa pela natureza do trabalho nesse âmbito. Focadas na aproximação da teoria com a prática, as instituições formadoras têm despendido esforços importantes na busca de alternativas às suas ações educativas, sejam nos planos de ensino, na produção do conhecimento, bem como nas atividades de extensão interdisciplinares1. Ações essas que visam construir, com os graduandos, competências e habilidades concernentes: ao trabalho em equipe; ao processo de comunicação e proposição; ao procedimento de trabalho crítico-reflexivo; e à capacidade de aprender a aprender2.

Em face desse cenário de formação para a saúde, cabem se destacar as Novas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), que enfatizam a prática de orientação ao Sistema Único de Saúde (SUS), valorizando a interdisciplinaridade e os aspectos humanísticos, além da efetivação de serviços de saúde resolutivos, voltados para as necessidades de saúde da população3,4.

Nesse sentido, apreende-se que o SUS é o construto que oferta um espaço rico de aprendizado permanente na formação do graduando em Ciências da Saúde, por meio de vivências cotidianas em diferentes cenários, bem como possibilita a construção de oportunidades para seu futuro profissional5. Ademais, com a publicação do Decreto n° 7.508 de 28/06/2011, que dispõe sobre a organização do SUS e o planejamento e assistência à saúde, abriram-se perspectivas para o enfrentamento dos problemas nesta área, dos limites na capacitação profissional e na construção do cuidado integral aos sujeitos6.

Nessa perspectiva, se insere o Programa de Educação pelo Trabalho para a Saúde (PET - Saúde) como um instrumento estratégico voltado às instituições de Ensino Superior para viabilizar as DCN e promover o perfil de profissionais de saúde voltados às demandas sociais. Articulando, assim, a interação entre graduandos de diferentes cursos de Ciências da Saúde, com profissionais do sistema e a população assistida pelo SUS, por meio da experimentação cotidiana em diferentes cenários, promovendo a interdisciplinaridade7,8.

A interdisciplinaridade é conceituada por diversos autores pelo grau de integração entre as disciplinas, são ações conjuntas, integradas e inter-relacionadas, de profissionais de diferentes procedências quanto à área básica do conhecimento. O que se busca é a superação da fragmentação desse saber, reconhecendo e respeitando as especificidades de cada área profissional para comparar, julgar e incorporar esses elementos. Trata-se de uma maneira compartilhada e interativa, que facilita os enfrentamentos profissionais e a assistência humanizada que contribui para melhorar a compreensão na maneira de atuar9-11.

Na Universidade Federal de Minas Gerais-UFMG, o PET-Saúde UFMG/Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte conta com 11 grupos tutoriais, envolvendo os 14 cursos de graduação em saúde (Biomedicina, Educação Física, Enfermagem, Farmácia, Fisioterapia, Fonoaudiologia, Gestão em Saúde, Medicina, Medicina Veterinária, Nutrição, Odontologia, Psicologia e Terapia Ocupacional), distribuídos nas redes de atenção à saúde do município e desenvolvendo projetos de pesquisa, extensão e ensino em temas relevantes para o SUS municipal.

Dentre as linhas temáticas do PET Saúde/UFMG, está a Saúde na Escola (PET-Saúde III na Escola), conduzido por três grupos tutoriais, com seus respectivos distritos sanitários de abrangência, como um único projeto. Para este estudo, será abordada a pesquisa desenvolvida no âmbito das ações de avaliação das condições de saúde dos escolares, tendo como base o Programa Saúde na Escola (PSE) em Belo Horizonte, nas referidas áreas de abrangência da pesquisa, incorporando a expertise de professores e alunos de diversos cursos de graduação da UFMG (Educação Física, Enfermagem, Farmácia, Fonoaudiologia, Medicina, Medicina Veterinária, Nutrição, Odontologia e Psicologia), juntamente com profissionais de diferentes áreas (Enfermagem, Medicina, Odontologia, Psicologia, e Terapia Ocupacional) das redes públicas de saúde e educação, dentro de uma perspectiva interdisciplinar.

A concepção da pesquisa PET-SAÚDE III na Escola foi orientada pelo conceito de educação de John Dewey, interligada a uma proposta interdisciplinar. Para esse autor, a educação é um processo de reconstrução de experiências. Não se trata de qualquer experiência, mas a que promove o alargamento e o crescimento do aprendizado anterior dos indivíduos, ao articular elementos internos do sujeito, subjetivos, e aspectos objetivos, do ambiente exterior. Ao se oportunizar a vivência dessas práticas, no processo, permite-se que o novo conteúdo fixe-se, intrinsecamente, no sujeito, passando a fazer parte dele, levando-o a uma nova realidade, a uma nova forma de pensar e de se comportar12.

Ademais, um projeto interdisciplinar é uma ferramenta de ensino, que reúne diversas áreas do conhecimento, dentro de um assunto específico, onde tudo está interligado, é um sistema que engloba experiências em várias disciplinas, em busca de metas a atingir, dentro de um programa específico. A interdisciplinaridade, entendida como uma competência que resulta de um conjunto de saberes, habilidades e atitudes à possibilidade de trabalho conjunto, que respeita as bases disciplinares específicas, mas busca soluções compartilhadas para os problemas das pessoas e das instituições13.

O processo de elaboração do projeto interdisciplinar PET-SAÚDE III na Escola ocorreu entre janeiro de 2012 e abril de 2013, envolvendo cinco etapas: 1) estudo da temática e desenho do projeto interdisciplinar; 2) construção das propostas dos protocolos de pesquisa; 3) compartilhamento e estudo do projeto e propostas dos protocolos; 4) elaboração do manual de aplicação dos protocolos de pesquisa; e treinamento para aplicação do manual elaborado. Na primeira etapa, houve a participação dos professores tutores e colaboradores dos cursos envolvidos; na segunda etapa, os preceptores dos cenários de prática foram inseridos no grupo; e, a partir da terceira etapa, houve, então, a participação dos bolsistas selecionados. Por conseguinte, a coleta de dados, considerando todas as linhas de base (escolares, pais, profissionais de saúde e profissionais da educação), ocorreu no período de maio de 2013 a julho de 2014. A etapa atual é de finalização da tabulação e análise dos dados.

Por fim, para entender conhecimentos que orientam condutas e práticas no cotidiano, uma proposta seria o levantamento das representações sociais. Trata-se de produção subjetiva que influencia, sobremaneira, as práticas e os comportamentos, os quais têm por objetivo abstrair sentido do mundo e introduzir nele ordens e percepções14. Ademais, como forma particularizada desses conhecimentos norteadores, as representações sociais são formas de saberes elaborados e compartilhados socialmente que contribuem para a construção de uma realidade comum, possibilitando a compreensão e a comunicação da pessoa no mundo15.

Diante do exposto e tendo como base o provável impacto da proposta interdisciplinar da pesquisa supramencionada, o objetivo deste estudo foi identificar e analisar a percepção dos monitores do PET-SAÚDE da UFMG, que atuaram e atuam na linha de pesquisa Saúde na Escola, concernente à influência desta vivência na sua formação e no seu olhar quanto ao trabalho em equipe interdisciplinar.

Metodologia

Trata-se de um estudo retrospectivo quantiqualitativo, com dados secundários obtidos do processo de elaboração do projeto interdisciplinar do PET-Saúde III na Escola e dos relatórios finais dos monitores participantes do referido projeto.

O trajeto metodológico deste estudo buscou delinear a percepção dos monitores PET a respeito de sua formação e do trabalho interdisciplinar e em equipe, após experienciarem o projeto.

Avaliação da percepção (representações sociais) dos monitores bolsistas

sobre sua vivência no projeto PET-SAÚDE III na Escola

Os critérios de seleção dos dados dos monitores foram: ter vivenciado a pesquisa PET-SAÚDE III na Escola, por, pelo menos, seis meses, e ter respondido a pelo menos duas das questões: (1) “Qual a contribuição do projeto PET-SAÚDE III na Escola na sua formação?”; (2) “Essa vivência com o projeto PET-SAÚDE III na Escola interferiu na sua visão quanto às outras profissões?”; (3) “É possível o trabalho em equipe multiprofissional?”.

Para o delineamento das representações sociais, as respostas apuradas nos relatórios foram digitalizadas e constituíram o discurso. Posteriormente, os dados foram importados para o programa NVivo versão 10.0, categorizados e analisados segundo similitude de conteúdos, e trabalhados em frequência. Ademais, empregou-se, na avaliação, a técnica do Discurso do Sujeito Coletivo-DSC16, que é uma proposta de organização e tabulação de dados qualitativos, obtidos de depoimentos.

Tendo como fundamento a teoria da Representação Social e seus pressupostos sociológicos, a proposta consiste, basicamente, em analisar os depoimentos coletados. O DSC é uma modalidade de apresentação de resultados de pesquisas qualitativas, que tem relatos como matéria-prima, sob a forma de um ou vários discursos-síntese escritos na primeira pessoa do singular – expediente que visa expressar o pensamento de uma coletividade. Esta técnica consiste em selecionar, de cada fala individual a uma questão, as expressões-chave, que são trechos mais significativos dessas respostas. A essas expressões-chave correspondem ideias centrais que são a síntese do conteúdo discursivo. Com todo esse material, constroem-se discursos-síntese, na primeira pessoa do singular, que são os DSC, onde o pensamento de um grupo ou coletividade aparece como se fosse um discurso individual.

Resultados

Foram apurados dados para o delineamento das representações sociais de 33 monitores do PET-Saúde III na Escola, acadêmicos dos cursos de: Educação Física (n=5; 15,2%), Enfermagem (n=1; 3,0%), Farmácia (n=1; 3,0%), Fonoaudiologia (n=6; 18,2%), Medicina (n=7; 21,2%), Medicina Veterinária (n=1, 3,0%), Nutrição (n=6; 18,2%), Odontologia (n=2; 6,1%) e Psicologia (n=4; 12,1%).

As ideias centrais (IC) e as sínteses dos discursos do sujeito coletivo (DSC) foram apresentadas a partir de cada resposta às questões de interesse contidas nos relatórios finais dos monitores do PET-Saúde III na Escola, com o auxílio do software NVivo. Devido às conexões e similaridades das abordagens das respostas concernentes às duas primeiras perguntas, essas estão apresentadas conjuntamente (Quadro 1).

Quadro 1 Ideias centrais e os discursos do sujeito coletivo síntese apurados nos relatórios finais dos monitores PET-Saúde na Escola. Belo Horizonte, 2013-2014 

Ideias centrais Discurso síntese do sujeito coletivo
Pergunta 1 - "Qual a contribuição do projeto PET-SAÚDE III na Escola na sua formação?"; "Essa vivência com o projeto interferiu na sua visão quanto às outras profissões?"
1IC-1 - Percepção do trabalho em equipe multiprofissional DSC-1: Por meio das atividades do projeto constatei a importância do trabalho em equipe interdisciplinar, que enriqueceu o trabalho final, pelos diferentes pontos de vista e conhecimento dos profissionais e alunos envolvidos.
1IC-2 - Reconhecimento de outras áreas da saúde DSC-2: Hoje, ao final da participação no projeto, vejo que por meio do PET tive contato com alunos de outros diversos cursos da área da saúde o qual possibilitou um entendimento maior sobre as funções, atividades, particularidades e importância dos diferentes profissionais no contexto da saúde pública.
1IC-3 - Iniciação à pesquisa DSC-3: Por meio do PET tive oportunidade de participar de pesquisas e elaborar trabalhos científicos que são enriquecedores para a nossa vida acadêmica e profissional; bem como para a sociedade. Essas atividades também me proporcionou participar de eventos científicos e divulgar os trabalhos do PET.
1IC-4 - Articulação teoria e prática DSC-4: O PET foi de grande importância para a construção de conhecimento relacionado à saúde pública local, articulando teoria e prática, sendo essa uma realidade diferente da vivenciada dentro de sala de aula.
1IC-5 - Contribuição para a formação profissional DSC-5: O PET foi decisivo na minha formação profissional
1IC-6 - Intersetorialidade saúde e educação DSC-6: Outro aspecto que contribuiu para a minha formação foi a compreensão do funcionamento do PSE, que relaciona a saúde com a educação.
1IC-7 - Formação humanizada DSC-7: A minha participação no projeto contribuiu para que eu tenha uma formação mais humana e realista das necessidades sociais de saúde.
1IC-8 - Despertou interesse pela saúde pública DSC-8: Antes de trabalhar no PET não estava nos meus planos trabalhar no sistema público, hoje já considero essa possibilidade.
1IC-9 - Mudança na percepção da atenção primária à saúde DSC-9: Mudei completamente a visão que eu tinha do sistema público de saúde do Brasil. É mais organizado e estruturado do que eu pensava. Há acesso aos serviços básicos de qualidade, mas tem demandas de melhoria quanto ao acesso de cuidados por especialistas.
1IC-10 - Oportunidade de experimentação no ambiente escolar público DSC-10: Tive contato com profissionais, alunos e o funcionamento de uma escola municipal, onde me deparei com problemas que eu não vivenciei, pois sempre estudei em escolas particulares.
1IC-11 - Vivência no âmbito do SUS, relativa à atenção primária DSC-11: O PSE contribuiu na minha formação por facilitar minha compreensão e proporcionar vivência na saúde pública. Pude entender como funciona a atenção primária e reconhecer sua importância.
Pergunta 2 - "É possível o trabalho em equipe multiprofissional?"
2IC-1 - Trabalho em equipe necessário às demandas sociais de saúde. DSC-1: É possível e necessário. Uma equipe de saúde precisa ser multiprofissional para que todas as demandas da comunidade sejam atendidas.
2IC-2 - Trabalho em equipe é viável desde que haja uma liderança para coordenar os trabalhos DSC-2: É totalmente possível desde que haja alguém como referência, para organizar e comandar o grupo. Pois caso contrário, por mais unida e estimulada que seja essa equipe, começa a ocorrer perda de foco e falhas de comunicação que prejudicam muito a execução das atividades.
2IC-3 - Trabalho em equipe demanda entendimento da contribuição de cada um dos diferentes profissionais na equipe DSC-3: Trabalhar em equipe multiprofissional exige entender as capacidades do outro e como este pode contribuir para uma atividade. É uma forma enriquecedora de trabalho e, sobretudo de experiência de vida, mas que requer um esforço significativo.
2IC-4 - Trabalho em equipe requer flexibilidade com responsabilidade DSC-4: Cada indivíduo tem suas excepcionalidades e suas dificuldades e o grupo permite que se reúnam as facilidades individuais a fim de aperfeiçoar o trabalho.
2IC-5 - Trabalho em equipe depende de sua valorização na formação acadêmica DSC-5: Acredito que o trabalho multiprofissional apresenta suas dificuldades, especialmente pelo fato de alguns profissionais não reconhecerem sua importância já na graduação, impondo resistência em seus campos de atuação, mas é viável.

Com base nas análises dos DSC, as representações sociais dos monitores podem ser dispostas em dois grupos (Tabela 1), em função da sua natureza e do tipo de abordagem realizada em função do objetivo deste estudo: levantamento e análise da percepção sobre o impacto do projeto na sua formação (Grupo 1) e sobre a viabilidade do trabalho em equipe multiprofissional e sua relação com a interdisciplinaridade (Grupo 2).

Tabela 1 Grupos das representações sociais dos monitores concernentes à experimentação no projeto PET-Saúde na Escola. Belo Horizonte - MG, 2014. 

Ideias Centrais Categorias f %
  Grupo 1- Formação acadêmica    
1IC-3 Iniciação à pesquisa 11 33,3
1IC-4 Articulação teoria e prática 16 48,5
1IC-5 Contribuição na formação 17 51,5
1IC-7 Formação humanizada 2 6,1
1IC-8 Interesse pela saúde pública 4 12,1
1IC-9 Mudança na percepção da atenção primária à saúde 3 9,1
1IC-10 Oportunidade de experimentação no ambiente escolar público 11 33,3
1IC-11 Vivência no âmbito do SUS, relativa à atenção primária 17 51,5
2IC-5 Trabalho em equipe depende de sua valorização na formação acadêmica Grupo 2- Equipe multiprofissional e interdisciplinaridade 3 10,36
1IC-1 Percepção do trabalho em equipe multiprofissional 22 66,7
1IC-2 Reconhecimento de outras áreas da saúde. 32 97
1IC-6 Intersetorialidade: saúde e educação 5 15,2
2IC-1 Trabalho em equipe necessário às demandas sociais de saúde 29 100
2IC-2 Trabalho em equipe é viável desde que haja uma liderança para coordenar os trabalhos 5 17,2
2IC-3 Trabalho em equipe demanda entendimento da contribuição de cada um dos diferentes profissionais na equipe 8 27,6
2IC-4 Trabalho em equipe requer flexibilidade com responsabilidade 3 10,3

Nota: As duas primeiras perguntas foram respondidas por 33 sujeitos, enquanto a terceira pergunta foi respondida por 29.

Avaliando as representações sociais do Grupo 1, respectivas à percepção dos monitores quanto à sua formação, após a experimentação no projeto PET-SAÚDE III (Tabela 1), nove categorias de representações sociais foram identificadas, destacando aspectos relevantes, como: vivência no âmbito do SUS relativa à atenção básica e sua contribuição na formação (n=17, 51,5%); articulação teoria e prática (n=16, 48,5%); iniciação à pesquisa e oportunidade de experimentação no ambiente escolar público (n=11, 33,3%); e interesse pela saúde pública (n=4, 12,1%).

Quanto ao Grupo 2, concernente ao trabalho em equipe multiprofissional/interdisciplinar, contemplando sete abordagens da temática nas representações sociais apuradas (Tabela 1), boa parte dos monitores reconheceram: a importância de outras áreas da saúde (n=32, 97%); que o trabalho em equipe estava presente na proposta do projeto (n=22, 66,7%), e que esta forma de trabalho é fundamental para atender às demandas sociais de saúde (n=29, 100%). Ademais, nota-se o reconhecimento da contribuição de cada profissão na equipe (n=8, 27,7%); e da intersetorialidade entre a saúde e educação no campo de atuação do projeto vivenciado (n=5, 15,2%).

Discussão

Os resultados apurados neste estudo apontam o entendimento dos monitores concernente à influência da sua experimentação no projeto PET-SAÚDE III na Escola sob sua formação e perspectiva de trabalho em equipe multiprofissional/interdisciplinar. Nesse sentido, a estratégia adotada, de análise da representação social, pareceu apropriada para possibilitar a identificação e análise dessas percepções.

Cabe salientar que as representações sociais incluem as dimensões: cognitiva, afetiva, simbólica e imagética. As representações, nesse sentido, possuem, ao lado e de modo inseparável do cognitivo, simbólico e do emocional, um sentido subjetivo e uma configuração subjetiva17,18. Reconhecendo que essas representações constituem uma produção subjetiva que assegura a estabilidade do “mundo” no qual as pessoas acreditam, garantindo a identidade e a segurança dos indivíduos, propõe-se uma análise que verifique, nos sujeitos, o (re) conhecimento da realidade profissional, que, neste estudo, foram abordadas de acordo com a divisão dos grupos, 1 e 2.

Analisando as representações sociais do grupo 1, apreende-se que os monitores reconhecem a influência positiva (“decisiva”) da experimentação no projeto PET-SAÚDE III na Escola em sua formação.

Essas constatações endossam a assertiva de que a extensão universitária tem possibilidade de se concretizar como uma prática acadêmica essencial, que, neste estudo, foi viabilizada pela estratégia de ensino do PET-Saúde. Isto, pois, coloca a extensão como um espaço estratégico, para promover práticas integradas entre várias áreas do conhecimento19, que, neste caso, foi o projeto de pesquisa PET-SAÚDE III na escola. O desafio que se impõe é o de procurar, por meio da atividade do aprimoramento acadêmico, ser um elemento articulador da comunicação entre teoria-prática, universidade-sociedade, visando à integração do pensar e fazer praticados no cotidiano universitário.

Como uma proposta norteadora, o manual da extensão20 enfatiza que os princípios da integração ensino-pesquisa, teoria e prática que embasam essa concepção de aprimoramento, são como uma função acadêmica da universidade que revela um novo pensar e fazer, que se consolida em uma postura de organização e intervenção na realidade, em que o aluno deixa de ser passivo no recebimento das informações/conhecimentos transmitidos pela universidade, e passa a ser participativo, crítico e construtor dos possíveis modos de atuação na sua futura prática profissional.

Nesse sentido, a interação ensino-pesquisa-extensão é o pilar que alicerça a formação humana/profissional.

Ressalta-se ainda que a percepção dos monitores sobre a iniciação à pesquisa científica na sua formação pode ser revestida de um caráter pedagógico, na medida em que confere uma dinâmica à graduação e amplia o conceito de formação, que não se limita só à vida acadêmica, mas se estende à formação de profissionais mais críticos, capacitados a responderem aos desafios sociais e dotados de autonomia e iniciativa21. Ademais, essa iniciação prepara o aluno, permitindo uma interação entre o trabalho da pesquisa e as práticas de sua profissão nos projetos de extensão, em um processo de crescimento, mudança e aprendizado na graduação. Os benefícios oriundos da iniciação à pesquisa contribuem não somente para consolidar essa experiência como um processo que deve ser iniciado na graduação, mas, também, como uma ferramenta integradora de pessoas e de momentos de produção, pois, a articulação entre os diferentes níveis de formação/ensino e a integração entre graduandos são uma oportunidade para alavancar o potencial dos alunos e favorecer uma visão sistêmica do trabalho cooperativo e interdisciplinar para além das fronteiras dos projetos de pesquisa22.

Quanto ao grupo 2, referente à percepção dos monitores sobre o trabalho em equipe multiprofissional/interdisciplinar, após experienciarem o projeto em estudo, visualizou-se que a quase totalidade dos monitores (re) conheceu a importância das particularidades de cada profissão, com a perspectiva, para muitos, de um trabalho em equipe/interdisciplinar voltado às demandas sociais de saúde.

Esses achados fortalecem o caminhar da proposta de trabalho do PET-Saúde da UFMG, que vem se alicerçando no trabalho em equipe multidisciplinar, com intenso incentivo para que o trabalho seja interdisciplinar. A proposta é a de que o graduando em Ciências da Saúde não replique, no projeto PET-Saúde, as ações que ele desenvolve rotineiramente nos estágios previstos no curso de graduação, a formação, necessariamente, deve ser complementar. Para Batista23, a interdisciplinaridade representa um caminho para a transformação do ensino em saúde, procurando configurar espaços de aprendizagem coadunados com as necessidades e demandas sociais, respondendo aos desafios da ética, da integralidade, do cuidado e da intersetorialidade.

Desta forma, verifica-se que os monitores perceberam a ação interdisciplinar apontando para a importância das ações coletivas, apreciando e valorizando o saber do outro. Autores sustentam que, nas Diretrizes Curriculares Nacionais, a saúde é considerada uma área interdisciplinar, que o conhecimento é um processo de construção compartilhado, e que se apresentam como desafios no Ensino em Saúde23-25. A interdisciplinaridade é um dos caminhos que possibilita aproximações para a construção de um novo saber.

Considerações finais

Os resultados deste estudo nos permitem enfatizar que o PET-Saúde III na Escola proporcionou a vivência de alunos de diversos cursos da área de saúde da UFMG em unidades de saúde e escolas públicas de alta vulnerabilidade social, contribuindo não só para minimizar limitações do ensino fragmentado, mas, também, para a prática da interdisciplinaridade. A realização de uma pesquisa aplicada com construção de um manual de coleta de dados e a participação de um grupo heterogêneo, com professores e estudantes de várias áreas afins e profissionais da rede de serviço local, também foram facilitadores desse processo.

Com esta dinâmica do projeto em análise, verificou-se que a interação ensino-serviço, numa perspectiva de pesquisa interdisciplinar, configurou-se como um componente estratégico no processo de formação desses graduandos, possibilitando a reflexão sobre suas práticas por meio da construção de conhecimentos segundo as necessidades do SUS. Nessa perspectiva, espera-se que o aluno torne-se capaz de transformar o conhecimento científico em condutas profissionais e pessoais, relativas aos problemas e necessidades da sociedade.

No entanto, lembra-se que o processo de formação profissional numa concepção ampliada em saúde permanece como um grande desafio para as instituições de Ensino Superior. Ensino, pesquisa e extensão precisam caminhar juntos para possibilitarem, ao aluno, uma formação como cidadão e profissional, capacitando-o para agir conscientemente em face das questões da sociedade. A extensão universitária cada vez mais se situa como espaço privilegiado de aprendizagem, possibilitando, a universitários e professores, a saída dos muros acadêmicos para a aprendizagem e ensino no real e complexo trabalho interdisciplinar em saúde.

Percebe-se, portanto, que a participação nas atividades propostas pelo projeto possibilitou, aos discentes, a interação direta entre o ensino teórico-prático, à pesquisa, e ao exercício da cidadania, aliada a uma formação mais humana e reflexiva, na qual os sujeitos estão conscientes de suas responsabilidades sociais no ambiente onde estão inseridos. Apreende-se que o desafio é o trabalho em ato, no cotidiano das relações e experimentações, conforme a teoria de Dewey. O desafio está posto, ou seja, fazer com que inovações na formação e na prática dos serviços sejam implementadas para uma maior qualificação dos profissionais para atuação no SUS.

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