versão On-line ISSN 2317-6431
Audiol., Commun. Res. vol.19 no.2 São Paulo abr./jun. 2014
http://dx.doi.org/10.1590/S2317-64312014000200007
O ruído em níveis elevados de pressão sonora tem sido indicado como um grande fator de risco para a saúde do ser humano. Entretanto, grande parte da população, de modo especial os adolescentes e jovens, têm hábitos pessoais e sociais que os expõem a esse risco e nem sempre conhecem seus malefícios(1,2).
Algumas investigações têm se preocupado em mostrar que o excesso de ruído compromete o processo ensino-aprendizagem, pois facilita a distração, restringe o nível de atenção e a cognição e dificulta a audibilidade e compreensão da voz do professor pelos alunos(3-9).
Uma revisão de literatura que teve como objetivo identificar a relação entre ruído nas escolas e as atividades educacionais(10), constatou que o barulho tem efeitos negativos diretos no aprendizado dos alunos, em razão da distração e da irritabilidade. As fontes desses ruídos variam desde aquelas localizadas no ambiente externo da própria escola até o ruído de fundo, proveniente das salas de aula e aquele gerado pelos alunos, durante a realização de atividade. Os autores concluíram que o ruído é parte das causas dos problemas de aprendizagem, que são necessários métodos distintos para solucionar esse problema nas escolas e que a solução apropriada guarda relação com a natureza do ruído.
As pesquisas, cada uma ao seu modo, têm por mérito mostrar que os altos níveis de ruído presentes nas escolas excedem os limites propostos pela legislação brasileira e internacional.
No Brasil, existem diversas leis ou normas que visam regulamentar as condições mínimas e necessárias para a segurança e conforto dos trabalhadores, estabelecendo em 40 a 50 dB o nível de ruído para conforto acústico em salas de aula e laboratórios, quando se trata de instituições de ensino(11). Para ambientes em que são requeridas atividades cognitivas, como atenção, concentração, memória, dentre outras, o nível de ruído aceitável é de até 65 dB(A)(12).
Grande parte dos estudos que se preocupam em mensurar e avaliar as consequências do ruído nas escolas tem seu maior foco no ensino fundamental, possivelmente pelo fato das crianças estarem em processo de alfabetização, apresentarem menor controle de sua própria atenção e concentração, devido à idade, e também pela pouca autonomia para estudarem sozinhas, fatores que dificultam a aquisição da comunicação escrita(1,7).
Nesse cenário, constata-se que, ao abordar o ruído na escola, as metodologias incluem questionários e entrevistas com professores, além da mensuração do ruído. Contudo, são raros os trabalhos que têm ouvido os estudantes a esse respeito. O aluno, como elemento da díade e envolvido no processo ensino-aprendizagem, tem seu papel e função na apropriação do conhecimento e deve ser elemento ativo em sala de aula, tanto para questionar, quanto para avaliar e sugerir mudanças.
Um estudo teve como objetivo traçar um paralelo entre os valores de mensuração de ruído, suas causas e efeitos sobre os estudantes e sobre o processo ensino-aprendizagem. Para tanto, avaliou os níveis sonoros de áreas com muitos estudantes, mapeou os níveis sonoros contínuos equivalentes (Leq), registrou os espectros de frequência em alguns locais e também utilizou um questionário para os sujeitos da pesquisa. Os resultados mostraram que o excesso de ruído, em especial aquele proveniente das conversas, é um dos elementos que mais perturbam as atividades, para 52% dos respondentes. Esse excesso gera ambiente agitado, mas não prejudica a comunicação, nem o rendimento escolar. O valor médio do nível sonoro foi de 71,7 dB (40,4 a 108,6). Com relação aos espectros de frequência, os maiores níveis de ruído estavam nas frequências de 500 e 1000 Hz, atribuídos às vozes dos alunos. Os autores concluíram que os níveis de ruído encontrados estavam além daqueles estipulados pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), principalmente em relação ao Leq (40 a 50 dB). Além disso, concluíram que a mudança na atitude dos alunos em relação às conversas resultaria em grandes alterações nos níveis de ruído e que um tratamento acústico do ambiente também traria benefícios(13).
Em relação ao ambiente universitário, a avaliação do nível de ruído em dois principais ambientes de estudo, o Bitolódromo (corredor com mesas para estudo) e o Instituto de Computação 3 (IC-3), pequeno prédio com salas repletas de computadores utilizados por alunos de Engenharia e Ciências da Computação, no campus na UNICAMP, teve como intuito verificar se há influência no desempenho acadêmico dos discentes(14). Foram entrevistados 80 estudantes, a fim de averiguar o quanto eram afetados pelo ruído e foi disponibilizada uma enquete on-line, para fazer a coleta de dados. Os resultados obtidos foram que 56% dos alunos não gostavam de utilizar o Bitolódromo e 61%, o IC-3; 82% consideraram o Bitolódromo barulhento e 42% mencionaram o mesmo em relação ao IC-3. Dentre os participantes da pesquisa, 61% dos usuários do Bitolódromo e 50% dos usuários do IC-3 informaram acreditar que seu rendimento é prejudicado pelo ruído no ambiente.
Diante disso, questiona-se se o ruído que perturba o professor, exigindo que fale mais alto para ser ouvido e lhe gerando tantos sintomas negativos, em especial aqueles ligados à produção vocal, também se constitui em um problema para o aluno.
Não é possível criar um ambiente favorável ao ensino e à aprendizagem sem ouvir as partes envolvidas. A avaliação do professor sobre o ruído em sala de aula é recorrente na literatura, fazendo-se necessário ouvir o outro – o estudante.
Nessa perspectiva, o objetivo deste estudo foi identificar a percepção de alunos universitários sobre o ruído em sala de aula e suas consequências para o processo ensino-aprendizagem.
Participaram desta pesquisa 100 estudantes da área da saúde da Pontíficia Universidade de Campinas (PUC-Campinas).
De um contingente de 21 professores que responderam ao questionário Condições de Produção Vocal – Professor (CPV-P)(15) e queixaram-se de ruído na universidade, dez foram sorteados e contatados pelas pesquisadoras, solicitando-lhes que indicassem uma sala de aula que julgassem ruidosa. De cada classe, foram escolhidos, aleatoriamente, dez alunos para responder ao instrumento de pesquisa.
Foi aplicado um questionário composto por cinco questões fechadas, retiradas do questionário anteriormente respondido pelos professores. Essas questões abordavam a presença, a fonte e a intensidade do ruído, sua valoração (fraco, médio, forte), acústica da sala e presença de eco.
Outras questões, fechadas e discursivas, referentes à interferência do ruído no comportamento dos alunos, no desenvolvimento da aula, na voz do professor e estratégias que poderiam minimizar esse problema, foram elaboradas pelas pesquisadoras (Anexo 1).
Inicialmente, realizou-se um estudo piloto com dez alunos da área da saúde, para verificar se havia problemas de compreensão das questões. Contudo, a análise das respostas dos discentes não identificou dificuldades desse tipo, considerando-se, portanto, que o instrumento poderia ser aplicado na pesquisa. Os alunos participantes do estudo piloto não participaram da etapa seguinte.
Após a identificação dos professores e indicação das classes consideradas ruidosas, as pesquisadoras fizeram contato com os alunos dessas classes, nas próprias salas de aula, em horário adequado, de modo a não interferir nas atividades acadêmicas.
Nessa ocasião, foram apresentados os objetivos da pesquisa e os alunos foram convidados a participar. Dentre aqueles que aceitaram, dez foram escolhidos aleatoriamente e assinaram, em duas vias, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, antes de responderem ao questionário. As pesquisadoras aguardaram, na própria sala de aula, a devolução do instrumento devidamente preenchido e esclareceram as dúvidas dos participantes.
Os dados obtidos foram digitalizados e cada curso foi identificado pela letra C seguida de um número (C1, C2, até C10). As respostas fechadas foram analisadas descritivamente e, em seguida, compararam-se as respostas entre os cursos e entre os alunos e professores, utilizando os testes Exato de Fisher e t de Student, estabelecendo-se em 5% o valor de significância.
As questões abertas tiveram tratamento qualitativo-quantitativo, porém serão abordadas em outro artigo, devido ao volume de informações obtidas(16).
Este estudo deriva de outro maior, intitulado “Saúde e Trabalho na Universidade: estratégias para promover a voz do professor”, que foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, em 12/11/2009, sob parecer nº. 885/09.
As características sociodemográficas dos participantes da pesquisa mostraram que se trata de um público jovem, com predomínio do gênero feminino, solteiros e cursando os dois primeiros anos dos cursos. Houve diferença de idade entre os discentes dos diversos cursos, o que os distinguiu nesta variável (Tabela 1).
Curso | Média de idade ± DP | Valor de p | Gênero |
Valor de p | Estado civil |
Valor de p | Período cursado | Valor de p | ||||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Feminino | Masculino | Solteiro | Casado | Separado | Viúvo | |||||||||||||
|
|
|||||||||||||||||
n | % | n | % | n | % | n | % | n | % | n | % | |||||||
C1 | 19,0 ± 0,9 | 0,031* | 8 | 80 | 2 | 20 | 0,052 | 10 | 100 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0,001* | 2 | <0,001* |
C2 | 25,6 ± 6,3 | 10 | 100 | 0 | 0 | 7 | 70 | 3 | 30 | 0 | 0 | 0 | 0 | 4 | ||||
C3 | 19,4 ± 1,5 | 8 | 80 | 2 | 20 | 10 | 100 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 2 | ||||
C4 | 20,2 ± 1,7 | 7 | 70 | 3 | 30 | 10 | 100 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 4 | ||||
C5 | 22,6 v 4,5 | 10 | 100 | 0 | 0 | 6 | 60 | 4 | 40 | 0 | 0 | 0 | 0 | 4 | ||||
C6 | 22,7 ± 2,7 | 5 | 50 | 5 | 50 | 10 | 100 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 6 | ||||
C7 | 19,2 ± 0,9 | 9 | 90 | 1 | 10 | 10 | 100 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 2 | ||||
C8 | 20,6 ± 1,8 | 9 | 90 | 1 | 10 | 10 | 100 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 4 | ||||
C9 | 20,9 ± 1,0 | 9 | 90 | 1 | 10 | 10 | 100 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 0 | 6 | ||||
C10 | 23,4 ± 11,2 | 10 | 100 | 0 | 0 | 8 | 80 | 1 | 10 | 0 | 0 | 1 | 10 | 2 |
*Valores significativos (p≤0,05) – Teste t de Student
As respostas dos alunos diferiram por curso, em relação à presença/ausência de ruído e às altas frequências por eles assinaladas. Contudo, a grande maioria queixou-se de sua presença (Figura 1).
Quanto à localização do aluno em sala de aula, 43 (43%) deles sentavam-se no meio da classe, 34 (34%), na frente e 23 (23%), no fundo. Não houve diferença estatística nas comparações entre eles, em relação às variáveis abordadas pelo estudo.
As causas de ruído autorreferidas pelos alunos foram variadas e relacionaram-se ao interior da sala de aula e da universidade. Chama a atenção o fato de os participantes atribuírem a eles próprios a maior causa do ruído em sala de aula (Figura 2).
Os acadêmicos destacaram a frequência assistemática do ruído, sua intensidade média e o valorizaram como desagradável, sendo essas características muito similares entre os alunos dos diferentes cursos (Tabela 2).
Curso | Frequência |
Valor de p | Intensidade |
Valor de p | Ser desagradável |
Valor de p | |||||||||||||||
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Nunca | Raramente | Às vezes | Sempre | Forte | Médio | Fraco | Não | Sim | |||||||||||||
|
|
|
|||||||||||||||||||
n | % | n | % | n | % | n | % | n | % | n | % | n | % | n | % | n | % | ||||
C1 | 0 | 0 | 1 | 10 | 5 | 50 | 4 | 40 | 0,8443 | 1 | 10 | 7 | 70 | 2 | 20 | 0,2211 | 4 | 40 | 6 | 60 | 0,0632 |
C2 | 0 | 0 | 0 | 0 | 6 | 60 | 4 | 40 | 1 | 10 | 9 | 90 | 0 | 0 | 9 | 10 | 9 | 90 | |||
C3 | 0 | 0 | 1 | 10 | 6 | 60 | 2 | 20 | 0 | 0 | 9 | 90 | 1 | 10 | 9 | 10 | 9 | 90 | |||
C4 | 0 | 0 | 1 | 10 | 5 | 50 | 4 | 40 | 0 | 0 | 9 | 90 | 1 | 10 | 8 | 20 | 8 | 80 | |||
C5 | 0 | 0 | 1 | 10 | 3 | 30 | 6 | 60 | 1 | 10 | 9 | 90 | 0 | 2 | 10 | 0 | 10 | 100 | |||
C6 | 0 | 0 | 0 | 0 | 5 | 50 | 5 | 50 | 2 | 20 | 8 | 80 | 0 | 2 | 10 | 0 | 10 | 100 | |||
C7 | 0 | 0 | 2 | 20 | 4 | 40 | 4 | 40 | 1 | 10 | 9 | 90 | 0 | 2 | 10 | 0 | 10 | 100 | |||
C8 | 0 | 0 | 1 | 10 | 6 | 60 | 3 | 30 | 2 | 20 | 5 | 50 | 3 | 30 | 7 | 30 | 7 | 70 | |||
C9 | 0 | 0 | 0 | 0 | 3 | 30 | 7 | 70 | 0 | 0 | 10 | 100 | 0 | 2 | 10 | 0 | 10 | 100 | |||
C10 | 0 | 0 | 0 | 0 | 5 | 50 | 5 | 50 | 2 | 20 | 6 | 60 | 2 | 20 | 1 | 10 | 9 | 90 | |||
| |||||||||||||||||||||
Total | 0 | 0 | 7 | 7 | 48 | 48 | 44 | 44 | 10 | 10 | 81 | 81 | 9 | 9 | 12 | 12 | 88 | 88 |
Teste Exato de Fisher (p≤0,05)
Houve avaliação positiva dos alunos sobre suas salas de aula nos quesitos acústica e eco, o que indica serem elas locais adequados para o aprendizado (Tabela 3).
Curso | Ter acústica satisfatória
|
Valor de p | Ter eco |
Valor de p | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Não | Sim | Não | Sim | |||||||
|
|
|||||||||
n | % | n | % | n | % | n | % | |||
C1 | 1 | 12 | 7 | 87 | 0,789 | 8 | 88 | 1 | 11 | 0,0777 |
C2 | 1 | 10 | 9 | 90 | 10 | 100 | 0 | 0 | ||
C3 | 3 | 30 | 7 | 70 | 6 | 66 | 3 | 33 | ||
C4 | 1 | 12 | 7 | 87 | 8 | 80 | 2 | 20 | ||
C5 | 2 | 25 | 6 | 75 | 8 | 80 | 2 | 20 | ||
C6 | 7 | 70 | 3 | 30 | 5 | 55 | 4 | 44 | ||
C7 | 4 | 50 | 4 | 50 | 5 | 55 | 4 | 44 | ||
C8 | 6 | 60 | 4 | 40 | 5 | 55 | 4 | 44 | ||
C9 | 4 | 40 | 6 | 60 | 5 | 55 | 4 | 44 | ||
C10 | 3 | 37 | 5 | 62 | 8 | 100 | 0 | 0 | ||
| ||||||||||
Total | 32 | 32 | 58 | 58 | 68 | 68 | 24 | 24 |
Teste Exato de Fisher (p≤0,05)
As reações dos alunos diante do ruído em sala de aula foram negativas. Referiram que o ruído traz desconforto, exteriorizado pela irritação e falta de concentração, além das implicações para a aprendizagem (Figura 3).
Especificamente em relação à avaliação dos alunos sobre a interferência do ruído no processo ensino-aprendizagem, houve explicitação de dificuldades, como não compreender a voz do professor e prejuízos no aprendizado e nas notas (Tabela 4).
Curso | Interferir na compreensão
do professor |
Valor de p | Prejuízo no aprendizado
ou nas notas |
Valor de p | Ouvir bem a voz do
docente |
Valor de p | |||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Não | Sim | Não | Sim | Não | Sim | ||||||||||
|
|
|
|||||||||||||
n | % | n | % | n | % | n | % | n | % | n | % | ||||
C1 | 0 | 0 | 10 | 100 | 0,1616 | 7 | 70 | 3 | 30 | 0,1045 | 0 | 0 | 10 | 100 | 0,4645 |
C2 | 0 | 0 | 10 | 100 | 1 | 10 | 9 | 90 | 0 | 0 | 10 | 100 | |||
C3 | 1 | 10 | 9 | 90 | 4 | 40 | 6 | 60 | 0 | 0 | 10 | 100 | |||
C4 | 1 | 10 | 9 | 90 | 3 | 30 | 7 | 70 | 0 | 0 | 10 | 100 | |||
C5 | 3 | 30 | 7 | 70 | 3 | 30 | 7 | 70 | 0 | 0 | 10 | 100 | |||
C6 | 2 | 20 | 8 | 80 | 4 | 40 | 6 | 60 | 0 | 0 | 10 | 100 | |||
C7 | 0 | 0 | 10 | 100 | 3 | 30 | 7 | 70 | 2 | 20 | 8 | 80 | |||
C8 | 2 | 20 | 8 | 80 | 4 | 40 | 6 | 60 | 1 | 10 | 9 | 90 | |||
C9 | 0 | 0 | 10 | 100 | 0 | 0 | 8 | 100 | 1 | 10 | 9 | 90 | |||
C10 | 3 | 30 | 7 | 70 | 5 | 50 | 5 | 50 | 0 | 0 | 10 | 100 | |||
| |||||||||||||||
Total | 12 | 12 | 88 | 88 | 34 | 34 | 64 | 64 | 4 | 4 | 96 | 96 |
Teste Exato de Fisher (p≤0,05)
OBS: algumas colunas não somam 100%, pois as respostas “não sei” não foram incluídas na tabela
As altas porcentagens assinaladas pelos discentes para a presença de ruído na sala de aula reiteram dados de outros estudos, que mostram que as instituições de ensino superior, assim como aquelas do primeiro e segundo graus, apresentam níveis de ruído acima do esperado para um local em que se trabalha com o ensino e a aprendizagem(16,17) (Figura 1).
A comparação entre os alunos dos diversos cursos avaliados mostrou que o C8 apresentou menor porcentagem de queixa de ruído em sala de aula, o que pode ser explicado pelo fato de suas classes, diferentemente daquelas de outros cursos, situarem-se em local mais afastado dos outros prédios do campus. Chama a atenção a frequência com que os discentes mencionaram o ruído em sala de aula, o que perturba o discurso e a voz do professor e compromete a sua audibilidade para os alunos(6,7,18). Cabe ressaltar que a irrequietude dos alunos atuais possivelmente não seja compatível com aulas do tipo expositivas, estratégia comum utilizada pelos docentes, fato que requer a criação de novos recursos pedagógicos para o ensino(19).
Quando solicitados a indicar a fonte do ruído, a própria sala de aula foi citada com a maior frequência, seguida pelo pátio da universidade e pela voz das pessoas, reforçando outras pesquisas, que indicam que os alunos têm conhecimento de que eles próprios geram ruído, dificultando o andamento da aula, a concentração dos colegas e a audibilidade da voz dos professores(10,13,20) (Figura 2). Possivelmente, o emprego de metodologias ativas de aprendizagem, nas quais os alunos estejam envolvidos e se sintam coconstrutores do conhecimento, possa resultar em aprendizagem mais efetiva e na conservação da saúde vocal do professor(19,21). A relação entre tipo de aula e ruído provocado pelos alunos em salas de aula carece de mais estudos e aprofundamento, de modo a ampliar a compreensão dessa questão.
Os resultados referentes à frequência do ruído - classificada pelos alunos como às vezes presente, de intensidade média e desagradável (Tabela 2) - e às características da sala de aula - qualificada com acústica satisfatória e sem eco (Tabela 3) -, mostraram-se positivos e diferem de outros estudos, nos quais a sala de aula é comumente avaliada por professores como apresentando acústica pobre(5,22).
Os discentes foram questionados sobre a sua reação quando a sala de aula mostrava-se ruidosa e suas respostas revelaram a dificuldade de ouvir o professor, de permanecer concentrado e irritação, condições inadequadas para o processamento da informação e, consequentemente, para a aprendizagem(10) (Figura 3). É oportuno ressaltar que a alternativa apresentada pelos discentes foi de desistir de prestar atenção, atitude bastante preocupante ao se tratar de ensino universitário, em que o aluno já está sendo preparado para ingressar no mercado de trabalho.
Quando os alunos avaliaram as interferências do ruído no processo ensino-aprendizagem, a grande maioria afirmou que ouvia bem a voz do professor, porém não a compreendia e uma alta porcentagem deles indicou prejuízo no aprendizado ou nas notas(23). O ruído, pela sua frequência e intensidade, não permite que o discurso do professor seja ouvido de forma plena, e, consequentemente, o aluno tem que se esforçar e se concentrar para destacar a voz do docente do ruído de fundo e apreender seu significado(8,9,14).
Ressalta-se que é esperado que os alunos que ocupam as cadeiras mais próximas ao professor relatem menos queixas em relação a ouvi-lo e compreendê-lo, do que aqueles que sentam-se no fundo da sala(3). Contudo, isso não se confirmou no presente estudo, pois, quando comparado o local habitual em que os alunos se sentavam (frente, meio, fundo) não se obteve diferença entre eles, nas variáveis “interferência da compreensão do professor”, “prejuízo no aprendizado ou nas notas” e “ouvir bem a voz do professor”.
Poucas investigações buscaram estudar a perspectiva dos estudantes diante do ruído em sala de aula, inviabilizando, parcialmente, a comparação dos resultados da presente pesquisa com aqueles da literatura da área. Mais do que um obstáculo, esta deve ser uma oportunidade para a realização de novas pesquisas que elejam os alunos como sujeitos e os considerem como parte integrante e indispensável do processo ensino-aprendizagem. É importante, também, que seja considerada a disposição dos alunos em gerar mudanças, de modo que as instituições de ensino, em especial as universidades, sejam locais de fomento à mudanças visando o ensino de excelência e a qualidade de vida.
Os alunos classificam a universidade como ruidosa e eles próprios se consideram a maior fonte deste ruído, que é valorado como de média intensidade e desagradável e considerado fator comprometedor do processo ensino-aprendizagem. Percebem seu papel nesse contexto e mostram-se proativos na criação de um ambiente favorável ao aprendizado.
Novas pesquisas, nesta perspectiva, poderiam trazer mais dados sobre o efeito do ruído das escolas, em especial no terceiro grau.