versão impressa ISSN 1413-8123
Ciênc. saúde coletiva vol.19 no.7 Rio de Janeiro jul. 2014
http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232014197.20692013
This study examined factors related to birth weight in a maternity hospital in the city of Rio de Janeiro. It is a descriptive, sectional study conducted in the Herculano Pinheiro Maternity Hospital (HMHP) in Rio de Janeiro between December 2008 and February 2009, with postpartum mothers between 20 and 34 years of age. The chi-square test, the Student's t test and the logistical regression model were applied. 14.6% of the infants had low birth weight (less than 2500g). There was a negative correlation between birth weight and smoking habits of the mother. The pre-pregnancy weight, maternal pre-pregnancy body mass index and number of pre-natal visit variables were positively associated with birth weight. Multiple regression analysis indicated maternal age as being a risk factor for low birth weight. The conclusion reached is that the marital status situation, where this was perceived as an important variable, as well as the number of prenatal visits, which in group analysis showed no statistical significance, deserve further investigation together with other studies.
Key words: Low birth weight; Maternal and child health; Public health; Postpartum mothers
O peso ao nascer constitui um importante indicador da saúde da população por refletir as condições sociais, econômicas e ambientais às quais a mulher se encontra durante o período de gestação1,2, tendo no baixo peso ao nascer (BPN) ou peso insuficiente, o fator de risco principal para a sobrevivência do recém nascido e preditor da qualidade de vida do indivíduo3-5.
O BPN é definido como peso ao nascer abaixo de 2500g, e considerado um indicador da qualidade da assistência à saúde reprodutiva da mulher6. A prevalência mundial é de 15,5%, mas sua distribuição é desigual entre as regiões do mundo, sendo maior em regiões subdesenvolvidas e menor nas desenvolvidas. No Brasil, em 2009, sua prevalência foi de 8,4, sendo elevada nas regiões Sul, com 9,2% e Sudeste, com 9,1%7 e tendência ao aumento em outras regiões2,8.
Os principais fatores de risco relacionados ao BPN são a prematuridade9, a idade materna9-11, gestações de risco (como hipertensão arterial e diabetes)11, gestações múltiplas11, número de filhos nascidos vivos12, sexo do feto9,13, acesso às consultas de pré-natal10,14, o peso materno prévio à gestação10, o tabagismo10,12 e o consumo de álcool na gestação13, além do parto induzido15, e da exposição à agrotóxicos16. Sobre este ponto, é preciso ressaltar que no Brasil17, a taxa específica de fecundidade cujas mães estavam na faixa etária de 15 a 19 anos aumentou 14%, enquanto que em todas as demais houve redução de aproximadamente 50%.
Entre as principais consequências do BPN estão o retardo no desenvolvimento infantil, doenças infecciosas e mortalidade infantil6. A importância da avaliação do peso ao nascer, portanto, dá-se por ser um processo complexo, resultante de uma série de fatores de origem biológica, social e ambiental e que coloca em evidência fatores relacionados às condições de vida da população18.
Nesta perspectiva, o presente estudo objetivou analisar os principais fatores socioeconômicos, assistência pré-natal e nutricional relacionados ao peso ao nascer em um hospital maternida de de referência do município do Rio de Janeiro.
Trata-se de estudo epidemiológico transversal conduzido em puérperas no Hospital Maternidade Herculano Pinheiro (HMHP), Rio de Janeiro, no período entre dezembro de 2008 e fevereiro de 2009.
A Unidade Integrada de Saúde Herculano Pinheiro, atualmente denominada Hospital Maternidade Herculano Pinheiro, localizada no bairro de Madureira, zona norte do município do Rio de Janeiro, é a mais antiga das maternidades do município, sendo gerenciada pela Secretaria Municipal de Saúde. A Unidade atende a população residente na Área Programática 3.3, na qual está inserida: em 1999 recebeu o título de "Hospital Amigo da Criança", e, em 2003, recebeu o título de Hospital Multiplicador de Ações Humanizadas do Programa de Humanização de Assistência Hospitalar, do Ministério da Saúde.
O tamanho amostral foi calculado tendo em vista uma população finita de 5000 partos por ano, com estimativa da prevalência de baixo peso ao nascer de 10%, margem de erro de 5% e intervalo de confiança de 95%, estimando-se uma amostra de 137 puérperas. Considerando-se a possibilidade de perdas, o total amostral foi adicionado em 10%.
A coleta de dados se deu de forma sistemática, por duas bolsistas de iniciação científica, previamente treinadas para aplicação do questionário, que entrevistaram todas as puérperas internadas a partir de junho de 2008, na maternidade do HMHP, até que o número amostral fosse alcançado.
As puérperas participantes do estudo estavam dentro dos seguintes critérios de inclusão: idade entre 20 e 34 anos, e que devidamente informadas dos objetivos e procedimentos da pesquisa, concordaram em participar do estudo. Não houve recusa das puérperas selecionados em participar da entrevista.
Antes da entrevista, a puérpera era convidada a participar da pesquisa e recebia um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, conforme estabelecido na resolução N° 196/9619 (CNS/MS), tendo total liberdade de aceitar ou não. O projeto foi encaminhado e aprovado pelo comitê de ética em pesquisa do Centro Universitário Augusto Motta.
O instrumento utilizado para a coleta de dados foi um formulário estruturado contendo informações sobre a puérpera e seu recém-nascido, tais como: dados demográficos, dados socioeconômicos, dados nutricionais, informações do período de gravidez e dados do recém-nascido.
As informações coletadas foram confrontadas com aquelas descritas nos prontuários das puérperas, bem como as variáveis relacionadas ao recém-nascido, como o peso ao nascer e idade gestacional. O peso materno no momento da admissão também foi obtido a partir do prontuário.
As variáveis analisadas foram: dados demográficos - idade materna, cor da pele (branca, preta e parda); dados socioeconômicos - estado civil [vive com companheiro, tem companheiro (não mora na mesma casa), não tem companheiro], escolaridade (anos de estudo) e renda familiar (R$), etilismo, tabagismo; antropométricas - estatura (m), peso pré-gestacional (Kg), índice de massa corporal pré-gestacional (Kg/m²), peso ao nascer em gramas do recém-nascido; outras variáveis - idade gestacional (em semanas) na primeira consulta, classificação nutricional pré-gestacional, classificação do peso ao nascer, data de nascimento do recém-nascido e frequência ao pré-natal (número de consultas).
O estado nutricional pré-gestacional foi determinado pelo índice de massa corporal (IMC), obtido pela relação peso (Kg)/Estatura (m)². Para esta classificação foram utilizados os pontos de corte do National Academy of Sciences do Institute of Medicine, 199220.
Para classificação do peso ao nascer foi utilizado o critério da Organização Mundial da Saúde (Tabela 1).
Tabela 1 Classificação do peso ao nascer.
Classificação | Ponto de corte | ||
---|---|---|---|
Baixo peso | < 2500g | ||
Peso insuficiente | 2500 | a 2999g | |
Peso adequado | 3000 | a | 3999g |
Excesso de peso | ≥ | 4000g |
Fonte: Puffer e Serrano
A medida da idade gestacional foi baseada na data da última menstruação, se possível, corroborada pelo exame de ultrassonografia.
Os dados foram digitados e consolidados utilizando-se os softwares Excel for Windows 2007 e o SPSS/PC, versão 19.0. Na análise estatística foram utilizadas, inicialmente, tabelas de frequências para caracterização da amostra. O teste do qui-quadrado e o t-student foram aplicados para comparação de frequências entre variáveis categóricas e contínuas, respectivamente. O nível de significância de 5% foi adotado em todas as análises.
Para a análise multivariada foram utilizados procedimentos de regressão logística binária, cuja variável dependente foi categorizada pela classificação de baixo peso ao nascer (1 - baixo peso, 0 - não baixo peso), sendo a categoria de não baixo peso ao nascer considerada como referência. Dentre o conjunto de variáveis consideradas neste estudo, foram incluídas no modelo estatístico: cor da pele, idade, estado civil, escolaridade, renda familiar, etilismo, tabagismo, estatura, peso pré-gestacional, índice de massa corporal pré-gestacional (IMCPPG), classificação do peso gestacional (CNPG), idade gestacional pré-gestacional (IGPC) e o número de consultas pré-natal. Foram estimadas as razões de produtos cruzados odds ratio (OR) ajustadas, respectivos intervalos de 95% de confiança e p-valores para as variáveis consideradas no modelo estatístico.
Foram avaliadas 137 puérperas atendidas na maternidade do HMHP, Rio de Janeiro, cujas principais características são apresentadas na Tabela 2.
Tabela 2 Valores médios, desvio padrão, mínimo e máximo de variáveis selecionadas de puérperas atendidas no Hospital Maternidade Herculano Pinheiro, dezembro de 2008 a fevereiro de 2009, RJ.
Variáveis | Média ± DP | Mínimo | Máximo | |
---|---|---|---|---|
Idade (anos) | 24,99 ± 4,4 | 20 | 34 | |
Renda familiar (R$) | 927,5 ± 580,78 | 100 | 3100 | |
Peso Pré-gestacional (Kg) | 59,16 ± 12,33 | 36,0 | 105,0 | |
Estatura (m) | 1,61 ± 0,06 | 1,45 | 1,80 | |
IMC Pré-gestacional (Kg.m2) | 22,97 | ± 4,94 | 15,2 | 45,2 |
Idade Gestacional (semanas) na 1° Consulta | 13,32 | ± 7,49 | 3 | 32 |
Peso ao Nascer do RN (g) | 3110,35 ± 576,6 | 1145 | 4475 | |
Número de consultas | 6,5 ± 2,3 | 0 | 12 |
De acordo com as variáveis demográficas, detectaram-se puérperas com média de idade (média ± DP) de 24,99 ± 4,4 anos (Tabela 2) e, segundo cor da pele, quase a metade da amostra (47,4%) tinha cor parda (Tabela 3).
Tabela 3 Frequência absoluta, relativa e resultados de testes qui-quadrado das variáveis socioeconômicas e classificação nutricional do peso ao nascer de recém-nascidos de puérperas atendidas no Hospital Maternidade Herculano Pinheiro, dezembro de 2008 a fevereiro de 2009, RJ. (N = 137).
Variáveis | n | % |
---|---|---|
Cor da Pele | ||
Branca | 34 | 24,8 |
Preta | 38 | 27,7 |
Parda | 65 | 47,4 |
Estado Civil | ||
Vive com companheiro | 103 | 75,2 |
Tem companheiro (não mora na mesma casa) | 14 | 10,2 |
Não tem companheiro | 20 | 14,6 |
Escolaridade (anos) | ||
1 – 3 | 9 | 6,6 |
4 – 7 | 50 | 36,5 |
8 – 11 | 68 | 49,6 |
11 – 14 | 10 | 7,3 |
Etilismo | ||
Sim | 40 | 29,2 |
Não | 97 | 70,8 |
Tabagismo | ||
Sim | 26 | 19,0 |
Não | 111 | 81,0 |
Classificação do Peso ao Nascer | ||
Baixo Peso ao Nascer | 20 | 14,6 |
Peso insuficiente | 28 | 20,4 |
Peso Adequado | 84 | 61,3 |
Peso Excessivo | 5 | 3,6 |
Em relação às variáveis socioeconômicas, detectou-se que três quartos das puérperas viviam com companheiro; quase a metade tinha de 8 a 11 anos de estudo; mais de dois terços não consumiram bebida alcóolica e não fumavam. Em todas as categorias das variáveis consideradas, foram encontradas diferenças significativas a 5% (Tabela 3).
Segundo a classificação nutricional do peso ao nascer de recém-nascidos das puérperas, pouco menos de três quintos nasceram com peso adequado; um quinto com peso insuficiente; e menos de um quinto com baixo peso ao nascer (valor de p < 0,001) (Tabela 3).
A Tabela 4 mostra os coeficientes significativos de correlação de Spearman referentes aos pesos ao nascer do recém-nascido com o hábito de fumar da mãe, com o peso pré-gestacional, com o índice de massa corporal pré-gestacional e com o número de consultas no Pré-Natal. Esses dados mostram correlação positiva significativa com todas as variáveis, exceto para o hábito de fumar da mãe (r = - 0,206), que indica que mães que fumam tendem a ter recém-nascidos com pesos menores quando comparados aos de mães que não apresentaram o hábito de fumar.
Tabela 4 Correlações significativas pelo Coeficiente de correlação de Spearman, entre Peso ao Nascer do Recém Nascido (PNRN) e as variáveis dependentes analisadas, de puérperas atendidas no Hospital Maternidade Herculano Pinheiro, dezembro de 2008 a fevereiro de 2009, RJ. (N = 137).
PNRN | ||
---|---|---|
Coeficiente de | ||
Variáveis dependentes | Correlação de | valor |
Spearman | de p | |
Hábito de fumar da mãe | -0,206 | 0,016 |
Peso Pré-gestacional | 0,236 | 0,005 |
Índice de Massa Corporal | 0,209 | 0,014 |
pré-gestacional | ||
Número de consultas | 0,204 | 0,017 |
no pré-natal |
A Tabela 5 expõe os resultados da análise de regressão logística binária. Do conjunto de variáveis independentes, apenas o coeficiente da variável idade apresentou diferenças estatisticamente significativas, mostrando que a idade materna apresenta-se como um fator de risco para o baixo peso ao nascer. Com base nesse resultado, observa-se que a cada ano de idade materna, há um aumento no risco de baixo peso ao nascer de 12,3% (OR = 1,123). O hábito de fumar, embora tenha se mostrado como fator de risco para o baixo peso ao nascer numa abordagem univariada (p-valor < 0,001), perdeu importância (p-valor = 0,139) quando se realizou uma análise múltipla dos possíveis fatores de risco para esse desfecho.
Tabela 5 Análise ajustada por regressão logística das associações das variáveis independentes analisadas com o desfecho baixo peso ao nascer (< 2.500g) de puérperas atendidas no Hospital Maternidade Herculano Pinheiro, dezembro de 2008 a fevereiro de 2009, RJ. (N = 137).
Variável | p-valor | OR | IC OR |
---|---|---|---|
Cor da pele | 0,760 | ||
Branca | 1.000 | - | |
Preta | 0,707 | 0,195-2,567 | |
Parda | 0,655 | 0,207-2,071 | |
Idade | 0,036 | 1.123 | 1,007-1,252 |
Estado Civil | 0,865 | ||
Vive com companheiro | 1.000 | - | |
Tem companheiro sem morar junto | 0,978 | 0,199-4,814 | |
Não tem companheiro | 0,652 | 0,137-3,102 | |
Escolaridade | 0,849 | ||
De 1 a 3 anos | 1.000 | 0,167-13,920 | |
De 4 a 7 anos | 1.524 | 0,117-9,683 | |
De 8 a 11 anos | 1.067 | 0,150-26,734 | |
12 e mais anos | 2.000 | 1,000-1,001 | |
Renda Familiar | 0,409 | 1.000 | - |
Etilista | 0,766 | ||
Não | 1.000 | 0,283-2,531 | |
Sim | 0,847 | - | |
Fumante | 0,139 | ||
Não | 1.000 | 0,768-6,661 | |
Sim | 2.262 | 0,000-419,46 | |
Estatura | 0,698 | 0,225 | 0,944-1,029 |
Peso Pré Gestacional | 0,505 | 0,986 | 0,859-1,070 |
IMCPPG* | 0,453 | 0,959 | - |
A | 1.000 | 0,332-3,217 | |
CNPG** | 0,805 | ||
BP | 1.034 | 0,055-3,917 | |
O | 0,465 | 0,055-3,917 | |
S | 0,465 | ||
IGPC*** | 0,139 | 0,947 | 0,880-1,018 |
Número de consultas | 0,291 | 0,896 | 0,732-1,098 |
* Índice de Massa Corporal Pré-Gestacional; **Classificação Nutricional Pré-Gestacional; ***Idade Gestacional na Primeira Consulta.
Recém-nascidos com BPN apresentam maior predisposição para mortalidade nas primeiras semanas de vida, risco de atraso no crescimento e desenvolvimento21; e, na vida adulta, apresentarão problemas mentais, orgânicos e neurológicos mais graves do que nas crianças nascidas com peso adequado22.
Segundo dados do Brasil23 sobre as condições dos nascimentos no município do Rio de Janeiro entre 1994 e 2002, detectou-se que os nascidos com baixo peso representam cerca de 10% dos nascimentos, tanto nos partos cesáreos quanto nos normais.
O presente estudo revelou que 14,6% dos recém-nascidos apresentaram baixo peso ao nascer, sendo que a idade materna foi a variável mais fortemente associada com o desfecho. O peso ao nascer é o fator singular que mais exerce influência sobre o estado de saúde e as chances de sobrevivência das crianças; sendo este um forte fator preditivo da mortalidade e morbidade neonatal24. Costa e Gotlieb9 e Benício et al.10 também observaram que mães mais velhas apresentaram maiores chances de terem bebês com BPN.
O baixo nível socioeconômico tem se mostrado um importante fator de risco para o aparecimento do BPN, estando associado ao estado nutricional e a outros fatores determinantes da velocidade de crescimento intrauterino25, contudo o presente estudo não encontrou associação entre os fatores socioeconômicos e o desfecho neste grupo.
O estudo detectou uma correlação linear inversa entre o hábito de fumar da gestante com o peso ao nascer, quando mensurado em sua escala original. Isto é, quanto maior a prevalência de gestantes fumantes, menores os valores de peso ao nascer do recém-nascido, efeito esse que desaparece quando as outras variáveis são incluídas no modelo estatístico múltiplo. Este resultado é corroborado por Kramer et al.13 e Benício et al.10, que identificaram relação entre um maior número de fumantes com maiores prevalências de BPN.
Apesar da falta de associação estatística entre escolaridade materna e o baixo peso ao nascer, um estudo conduzido por Nascimento25 identificou que mães com até oito anos de estudo apresentaram maiores chances de gerar crianças com BPN, possivelmente devido à desinformação e provavelmente por ter menor interesse ou maior dificuldade de acesso a serviços de saúde.
Já Haidar et al.26, correlacionando a escolaridade materna com os indicadores obstétricos por meiov de 3.843 Declarações de Nascidos Vivos em Guaratinguetá (SP), durante todo o ano de 1998, detectaram que mães com menos de oito anos de escolaridade têm uma chance 1,5 vezes maior de terem recém-nascidos com baixo peso. Isso pode ser explicado pelo fato de essas mães terem um padrão socioeconômico desfavorável, o que possivelmente acarretará em um menor ganho de peso na gestação e um início mais tardio do pré-natal.
Segundo o autor supracitado, é importante levar em consideração o fato de que mães com menor escolaridade, na maioria das vezes têm mais que três filhos quando comparadas com aquelas com maior escolaridade, tal fato pode estar associado a um menor intervalo interpartal, que pode estar predispondo estas crianças a riscos26. Um intervalo menor que dois anos é extremamente prejudicial ao organismo materno e, consequentemente ao feto, por dificultar o restabelecimento das reservas nutricionais e impedir a recuperação das condições orgânicas alteradas pela gestação.
Andrade et al.27 estudando as desigualdades socioeconômicas do baixo peso ao nascer e da mortalidade perinatal, no município do Rio de Janeiro em 2001, quanto ao grau de escolaridade através do risco atribuível populacional relativo, detectou que 51,05% dos óbitos perinatais poderiam ser evitados se todas as mães tivessem o nível superior de instrução.
O estudo de Minamisawa et al.28 objetivando analisar os fatores associados ao baixo peso ao nascer no estado de Goiás, através do Sistema de Informações de Nascidos Vivos do Estado, no ano de 2000, com uma amostra de 92.745 recém-nascidos, encontraram associação entre mães que não sabiam ler e escrever e o baixo peso ao nascer, indicando relação entre o baixo peso e as camadas sociais menos privilegiadas.
Um achado interessante em nosso estudo foi em relação ao estado civil das puérperas entrevistadas, onde cerca de 3/4 tinham companheiro, divergindo daqueles descritos na literatura. O estado civil constitui-se um fator importante associado ao baixo peso ao nascer. A falta da figura paterna em geral pode trazer menor estabilidade financeira para a família, podendo se constituir em fator de risco para o baixo peso ao nascer.
Monteiro et al.8, estudando a tendência secular do peso ao nascer na cidade de São Paulo detectaram que o risco relativo de baixo peso ao nascer aumentava para mães que viviam sem companheiro em relação às com companheiro.
Kilsztajn et al.14 concluíram após os resultados do seu estudo em São Paulo que as gestantes não casadas e as de baixa escolaridade, particularmente, deveriam receber um acompanhamento pré-natal específico capaz de amenizar as condições responsáveis por transformá-las em categorias de risco.
Minamisawa et al.29 também encontraram em seu estudo realizado em Goiás que mães não casadas apresentaram 1,23 vezes mais chance de baixo peso ao nascer que as casadas. Entretanto, recém-nascidos de baixo peso não foram associa dos a mães sem companheiro em Campinas30.
Apesar da ausência de associação no presente estudo, a renda é outro aspecto que tem sido frequentemente associada com a saúde, tanto no nível individual quanto no coletivo. Lima e Sampaio5 em um estudo descritivo sobre a influência de fatores obstétricos, socioeconômicos e nutricionais da gestante sobre o peso do recém-nascido realizado em uma maternidade de Teresina (PI), durante o período de janeiro a maio de 2003, numa amostra de 277 gestantes em trabalho de parto e seus recém-nascidos, associando a renda familiar ao baixo peso, observaram que, mães com renda abaixo de um salário mínimo per capita tinham um maior percentual de crianças com peso menor que 3.000g.
Analisando o BPN em duas coortes (1982 e 1993) de base populacional no sul do Brasil, Horta et al.2 encontraram, em 1982, a proporção de crianças com baixo peso ao nascer quase três vezes maior entre as famílias de menor renda (inferior ou igual a um salário mínimo) em comparação com as de melhor situação econômica (renda acima de dez salários mínimos). As diferenças entre os grupos de renda permaneceram marcadas em 1993, com as crianças mais pobres apresentando um risco 2,4 vezes maior de nascerem com baixo peso do que as de famílias mais ricas.
Apesar da associação entre número de consultas de pré-natal e BPN ter sido encontrada inicialmente, a mesma não permaneceu estatisticamente significativa apos a análise multivariada. Kilsztajn et al.14, em estudo sobre assistência pré-natal, analisaram os dados de estatísticas vitais da Fundação Seade, no estado de São Paulo, e observaram a redução da prevalência de baixo peso e/ou pré-termo com o aumento do número de consultas pré-natais. Os autores detectaram que o risco relativo de baixo peso e/ou pré-termo no grupo que realizou sete ou mais consultas pré-natais foi menor quando comparado com os grupos que tiveram menos de sete consultas pré-natais.
Zambonato et al.24 analisando os fatores de risco para nascimento de crianças pequenas para a idade gestacional em cinco maternidades de Pelotas (RS), durante os meses de outubro a dezembro de 1996, com uma amostra de 1.082 puérperas, encontraram que mesmo após o controle do número de consultas pré-natais ainda houve associação entre baixa qualidade do pré-natal e nascimento de crianças pequenas para a idade gestacional; sugerindo que o efeito da qualidade é independente do número de consultas. Os autores concluíram, portanto, que além de estimular o número de consultas, deve-se buscar um aumento na qualidade do pré-natal.
Diversos estudos na área de nutrição com gestantes têm mostrado uma relação entre o estado nutricional maternos com as condições do recém-nascido. No presente estudo, as variáveis peso pré-gestacional e índice de massa corporal pré-gestacional materno apresentaram associação positiva com o peso ao nascer, contudo, na análise multivariada essa variável perdeu associa ção estatisticamente significativa com o BPN.
Lima e Sampaio5 encontraram, ao classificar o estado nutricional materno antes da gestação segundo o IMC, que mais da metade das gestantes era normal, enquanto que as de baixo peso e com excesso de peso representaram respectivamente, 17,7% e 14,4% da amostra. A maioria das gestantes exibiu ganho de peso ao final da gravidez de acordo com a média recomendada pelo Ministério da Saúde (8 a 16kg). Observou-se uma associação significante ao relacionar o ganho de peso total durante a gestação com as médias de peso ao nascer dos recém-nascidos.
Franceschini et al.30, estudando os fatores de risco para o baixo peso ao nascer em 77 gestantes no último trimestre da gestação, no ano de 2001, residentes em favelas da região de Vila Mariana em São Paulo, observaram que mulheres que iniciaram a gestação com baixo peso, geraram crianças com médias de peso ao nascer apresentando diferenças de - 60g e -300g, respectivamente, em relação aos pesos obtidos entre as eutróficas e as com sobrepeso/obesidade. Observaram ainda que com o aumento de peso na gestação, houve incremento nas médias de peso ao nascer, excetuando-se o grupo cujo ganho de peso foi excessivo. Neste estudo, os autores encontraram maior incremento ponderal entre os recém-nascidos de mães que ganharam entre 7,0 e 16,0Kg na gestação.
Halpern et al.31, analisando os fatores de risco para o BPN em uma comunidade rural do sul do Brasil, encontraram que mulheres que iniciaram a gravidez com peso inferior a 50Kg apresentaram maior risco de gerarem crianças com baixo peso ao nascer.
O peso pré-gestacional tem sido utilizado para avaliar o risco inicial de um prognóstico desfavorável da gestação, para determinar o ganho de peso recomendado e direcionar intervenções nutricionais. Um peso pré-gestacional inadequado, acompanhado por ganho de peso insuficiente, aumenta o risco de baixo peso ao nascer, mortalidade perinatal, neonatal e infantil32.
Gestantes que apresentam uma reserva inadequada de nutrientes, aliada a uma ingestão dietética insuficiente, poderão ter um comprometimento do crescimento fetal e, consequentemente, do peso ao nascer33. Também o ganho de peso gestacional excessivo não é benéfico ao recém-nascido, pois às vezes esse excedente serve apenas para deteriorar o estado nutricional materno e não necessariamente é canalizado para o feto34,35.
Um ganho de peso insuficiente está relacionado a um maior risco de retardo de crescimento intrauterino e mortalidade perinatal; e um ganho de peso excessivo pode estar associado a patologias maternas, como o diabetes gestacional, macrossomia fetal, dificuldades no parto e risco para o recém-nascido no período perinatal, como hipoglicemia36.
As alterações fisiológicas pelas quais o organismo materno sofre durante a gestação tem por finalidade garantir a transferência materno-fetal de nutrientes e água, na quantidade adequada, para proporcionar crescimento e desenvolvimento fetal bons. Para tanto, é necessário que a mãe possua uma alimentação equilibrada e reservas nutricionais. A adiposidade e o peso pré-gestacio nal, além do ganho de peso gestacional, são fatores de risco para a prematuridade e BPN37. Acredita-se que se reduza o risco destes desfechos adversos da gestação, mantendo-se o peso materno adequado durante o período gestacional38
O presente estudo possui algumas limitações: a amostra foi representativa de uma população de puérperas de baixo risco gestacional atendidas pelo Sistema Único de Saúde, o que impede a generalização dos resultados para outras populações, mas que pode ser aplicado para discutir as vulnerabilidades de populações de puérperas com o mesmo perfil. Outra limitação foi a homogeneidade da população, o que pode ter diminuído as associações entre as variáveis socioeconômicas e demográficas e o desfecho.
A situação sobre o estado civil, quando este se apresentou como uma variável importante, assim como o número de consultas pré-natal, que na análise do grupo não apresentou significado estatístico, merece maior investigação com outros estudos que poderão ser comparativos ou não.
A identificação de fatores de risco para o baixo peso ao nascer da população de puérperas atendidas pelo SUS é fundamental para garantir a discussão de políticas e ações em saúde pública, voltadas para manter os esforços no cuidado e atenção à saúde no período pré-natal. Uma constatação possível com este trabalho é de que gestantes, mesmo de baixo risco gestacional, quanto mais avançada tiverem a idade, maior o risco de terem bebês com baixo peso ao nascer, trazendo à tona a necessidade de atenção diferenciada para essa população, que cresce cada vez mais em nosso país.