versão On-line ISSN 2317-1782
CoDAS vol.26 no.3 São Paulo maio/jun. 2014
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/201420140440
A deficiência auditiva é um dos problemas sensoriais mais frequentes na população. Estima-se que existam no mundo 278 milhões de pessoas com perda auditiva moderada ou profunda bilateral( 1 ). Nos Estados Unidos, aproximadamente 17% dos adultos norte-americanos (36 milhões de pessoas) relatam algum grau de deficiência auditiva( 2 ).
Já no Brasil, o levantamento do censo demográfico de 2010 identificou 9,8 milhões de portadores de deficiência auditiva, representando 5,1% da população. Dentre esses, 1,3% estaria na faixa etária de zero a 14 anos, 4,2% na de 15 a 65 anos, e 25,6% na faixa de 65 anos ou mais( 3 ).
Em 2004, o Ministério da Saúde instituiu a Política Nacional de Atenção à Saúde Auditiva - PNASA (Portaria MS nº 2.073, de 2004) para o aprimoramento das ações de saúde auditiva do Sistema Único de Saúde (SUS) e propôs a organização de uma rede hierarquizada, regionalizada e integrada entre a atenção básica, a média e a de alta Complexidade, buscando, desta maneira, garantir não só o diagnóstico e reabilitação auditiva, mas a promoção e a proteção, bem como a terapia fonoaudiológica de adultos e crianças( 4 ).
A partir desta política foram definidas as ações específicas tanto da atenção básica, quanto na média e alta complexidade, a serem organizadas e implantadas pelas Secretarias Estaduais da Saúde (Portaria SAS/MS nº 587, de 2004). Também se estabeleceram os critérios técnicos mínimos para o funcionamento dos serviços e a reorganização e classificação dos procedimentos no SUS (Portaria SAS/MS nº 589, de 2004)( 4 ).
Para aumentar a cobertura de serviços, foi definido o número mínimo de estabelecimentos de saúde para a atenção especializada à saúde auditiva, baseado na necessidade de cobertura assistencial, no nível de complexidade dos serviços e na capacidade técnica operacional deles. O parâmetro recomendado de estabelecimentos de Atenção à Saúde Auditiva em média e alta complexidade (Portaria SAS/MS nº 587, de 2004) é de um serviço para 1,5 milhão de habitantes. E para garantir a assistência às pessoas portadoras de deficiência auditiva nos estados cuja população é inferior a 1,5 milhão de habitantes, foi estipulado um serviço. Nos estados com entre 2 milhões e 3 milhões, o parâmetro seria de dois serviços.
Com base na população estimada para o Brasil em 2004, de 169.872.856 habitantes, foram previstas 116 unidades prestadoras de serviço de saúde auditiva de média e alta complexidade em todo o país, assim distribuídas: região Sul com 16, Sudeste com 47, Centro-Oeste com nove, Nordeste com 33 e Norte com 11( 4 , 5 ).
A implantação da PNASA foi um importante passo na busca da equidade no atendimento à deficiência auditiva no país. Entre 2002 e 2005 houve no Brasil crescimento de 200% na oferta de serviços de diagnóstico, dispensação e acompanhamento dos indivíduos que fazem uso de próteses auditivas pelo SUS( 5 ). Também foi registrado incremento no número de serviços da rede de saúde auditiva especializada, com aumento dos procedimentos relacionados à adaptação de prótese auditiva, no período de 2004 a 2011( 6 ).
Sabendo-se que os procedimentos diagnósticos em saúde auditiva são essenciais para o tratamento dos portadores de deficiência auditiva, minimizando as consequências sociais e de saúde da surdez, a avaliação dos serviços dessa especialidade acrescentaria melhorias a esta política a partir da otimização do financiamento público para o atendimento mais qualificado e para maior número de indivíduos com perda auditiva( 7 ).
A análise das ações em saúde podem fornecer informações relevantes no processo de tomada de decisão, planejamento e gestão das práticas de saúde e enfocar a análise de programas/políticas, serviços ou tecnologias. Estudos que objetivam verificar serviços e ações de saúde podem contribuir para reordená-los e redimensioná-los de forma a contemplar as necessidades do público, dando maior racionalidade ao uso dos recursos financeiros( 8 - 11 ).
A avaliação para gestão tem como objetivo principal a produção de informação que contribua para o aprimoramento do objeto avaliado. Não se trata da busca de fundamentos ou justificativas nem redirecionamentos, mas do melhoramento de uma condição dada. O enfoque priorizado é o da caracterização de uma condição e a sua tradução em medidas que possam ser quantificadas e replicadas( 12 , 13 ).
Estudos internacionais apontam a utilização de processos avaliativos para a (re)estruturação de políticas de saúde, o que proporciona melhor aproveitamento dos custos e distribuição dos serviços, considerando a dimensão territorial numa ótica de "justiça social e espacial", contribuindo para a integralidade e equidade dos serviços( 14 , 15 ).
Vale ressaltar que ainda são restritos os estudos voltados para a avaliação de cobertura e acessibilidade na área da saúde auditiva a partir de dados secundários (sistemas de informação), tornando-os relevantes uma vez que podem subsidiar reflexões sobre essa temática em níveis nacional e internacional( 16 , 17 ).
Tendo em vista essas considerações, o objetivo do presente estudo foi avaliar a cobertura dos serviços especializados e procedimentos diagnósticos em saúde auditiva a partir da PNASA, no Brasil.
Trata-se de um estudo avaliativo sobre o grau de implantação dos serviços de assistência à saúde auditiva no Brasil a partir da implantação da PNASA, com enfoque na cobertura de serviços especializados que oferecem procedimentos de média e alta complexidade ofertados por região e no Brasil.
A avaliação da cobertura refere-se à disponibilidade e distribuição social e espacial dos recursos, sendo um dos principais componentes da avaliação dos serviços de saúde, e pode ser definida por meio da proporção da população-alvo beneficiada por uma determinada intervenção( 18 ). Essa intervenção pode ser diferenciada em cobertura potencial, o que corresponde à capacidade e possibilidade da oferta, e à cobertura real, que busca estimar a proporção da população que de fato utilizou os serviços( 18 ). A utilidade da análise de cobertura tem sido pouco explorada na fonoaudiologia( 19 ).
Para medir o grau de implantação desses estabelecimentos, estimou-se o número de serviços de média e alta complexidade segundo critérios estabelecidos na Portaria SAS/MS nº 587, de 2004, comparando com os ofertados/cadastrados no SUS em 2010. Para tanto, estimou-se primeiramente o número de serviços/estabelecimentos de saúde auditiva necessários para o Brasil e regiões, segundo a população, utilizando-se dados do Censo 2010, e levantou-se a quantidade de estabelecimentos credenciados pelo SUS no mesmo ano para aferir a cobertura dos serviços em questão no Brasil.
Na análise da evolução do quantitativo dos procedimentos diagnósticos de saúde auditiva ofertada por região, considerou-se o ano de 2004, quando foi implantada a PNASA, como base, levando em conta os dados de 2011 (último dado disponível no Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde - DATASUS). Também foi analisado o quantitativo de procedimentos diagnósticos de saúde auditiva no período de 2008 a 2011, quando definiram-se os novos códigos de classificação dos procedimentos no SUS( 6 ).
Levantou-se ainda o quantitativo de 12 procedimentos de média complexidade e de dois de alta complexidade financiados pelo SUS no mesmo período (2008 a 2011) para o Brasil.
Foi realizada análise da evolução das coberturas por meio de avaliação da tendência histórica do número de procedimentos, além do cálculo da diferença percentual entre o primeiro e último ano da série. Também foram utilizadas na análise as diferenças percentuais entre as coberturas reais e estimadas.
Os Serviços de Média Complexidade, conforme a PNASA, têm como finalidade prestar assistência especializada às pessoas com doenças otológicas e, em especial, às com deficiência auditiva. Eles realizam triagem e monitoramento auditivo, mas excluem o diagnóstico e a protetização em crianças de até três anos de idade; pessoas com afecções neurológicas, psicológicas, síndromes genéticas e visão subnormal associadas; e portadores de perdas auditivas unilaterais.
No Quadro 1 podem ser observados os exames de média complexidade incluídos neste estudo e seus respectivos códigos.
Já os Serviços de Alta Complexidade, conforme a PNASA, são referência para o diagnóstico das perdas auditivas e sua reabilitação em crianças de até três anos de idade e em pacientes com afecções associadas (neurológicas, psicológicas, síndromes genéticas, cegueira, visão subnormal), perdas unilaterais e nos que apresentam dificuldades na realização da avaliação audiológica em serviço de menor complexidade. Neste sentido, devem contar com equipamentos para realizar o diagnóstico diferencial das perdas auditivas.
Os exames de alta complexidade incluídos no estudo e seus respectivos códigos do SUS podem ser verificados no Quadro 2.
O levantamento dos dados foi realizado a partir da plataforma DATASUS( 20 ), no ícone "Informações à saúde", restringindo a procura a "procedimento ambulatorial por local de atendimento" e tendo como abrangência geográfica o Brasil discriminado por região.
Portanto, a busca ocorreu a partir de um grupo de procedimentos em que a seleção foi direcionada a "procedimentos com finalidade diagnóstica". A forma de organização selecionada foi "diagnóstico em otorrinolaringologia/fonoaudiologia" em média e alta complexidade.
Analisaram-se os dados dos Cadernos de Informações de Saúde do Sistema de Informações em Saúde - DATASUS, constituído de um banco de informações de domínio público e disponível na web.
Os dados foram tabulados a partir do software Tabwin, disponibilizado pelo Departamento de Informática do Ministério da Saúde. Posteriormente, foram realizados os cálculos das estimativas de cobertura e evolução do número de procedimentos, segundo as cinco macrorregiões geográficas brasileiras (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul).
Algumas limitações destes bancos devem ser destacadas. Eles são alimentados por profissionais de saúde e, portanto, passíveis a erros, podendo haver duplicação de informações, ausência ou substituição delas, o que pode vir a comprometer a qualidade dos dados. Tais fatos não invalidam a pesquisa, pois estas especificidades estão presentes em estudos desse gênero.
O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa em Seres Humanos do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná em 5 de dezembro de 2011, com registro CEP 410ext043/2011-10.
Conforme referido na PNASA( 4 ), a distribuição dos serviços de saúde auditiva deve compreender um serviço para cada 1,5 milhão de habitantes. Avaliando os dados do censo 2010, à época o Brasil contava com população de 190.732.694 habitantes( 3 ), portanto o número de serviços estimados para atender a esta população seria de 127 serviços. Dados disponibilizados pelo DATASUS mostram que havia 143 serviços cadastrados pelo Ministério da Saúde àquele ano contemplando todo o território, ou seja, uma cobertura de 112,6%.
Porém, quando se analisa a distribuição dos serviços credenciados por região, observa-se que a Sul apresenta número e cobertura de serviços bastante superior ao estimado necessário (189,0%), enquanto a Norte tem metade da cobertura de serviços necessários (54,5%) para atender à população local (Tabela 1).
Tabela 1 Estimativa de cobertura de serviços de saúde auditiva pelo Sistema Único de Saúde por região. Brasil, 2010
Região | População em 2010 |
Serviços necessários estimado* (nº) |
Serviços credenciados (nº) |
Cobertura estimada de serviços (%) |
---|---|---|---|---|
Sul | 27.384.815 | 18 | 34 | 189,0 |
Sudeste | 80.353.724 | 54 | 59 | 109,3 |
Centro-Oeste | 14.050.340 | 9 | 9 | 100,0 |
Nordeste | 53.078.137 | 35 | 35 | 100,0 |
Norte | 15.865.678 | 11 | 6 | 54,5 |
Total | 190.732.694 | 127 | 143 | 112,6 |
*Um serviço para cada 1,5 milhão de habitantes
A Tabela 2 mostra a evolução de todos os procedimentos em saúde auditiva de média complexidade para o território nacional e por região entre 2008 a 2011. Observa-se que em relação ao Brasil, no geral houve aumento de 21,4% desses procedimentos, enquanto os de alta complexidade registraram incremento de apenas 1,5%.
Tabela 2 Evolução do número de procedimentos em saúde auditiva de média e alta complexidade no Sistema Único de Saúde, segundo regiões. Brasil, 2008 a 2011
Procedimentos | Sul | Sudeste | Centro-Oeste | Nordeste | Norte | Brasil |
---|---|---|---|---|---|---|
Média complexidade | ||||||
2008 | 348.888 | 1.658.499 | 421.753 | 937.753 | 221.323 | 3.588.216 |
2009 | 359.592 | 1.667.662 | 457.313 | 853.374 | 264.306 | 3.602.247 |
2010 | 508.359 | 1.864.787 | 428.831 | 917.443 | 297.163 | 4.016.583 |
2011 | 576.018 | 2.018.884 | 376.060 | 1.034.224 | 349.671 | 4.354.857 |
crescimento 2008 a 2011 (%) | 65,1 | 21,7 | -10,8 | 10,3 | 58,0 | 21,4 |
Alta complexidade | ||||||
2008 | 16.524 | 57.295 | 6.545 | 28.876 | 2.773 | 112.013 |
2009 | 14.983 | 52.263 | 7.916 | 22.235 | 3.195 | 100.592 |
2010 | 18.851 | 57.043 | 7.046 | 23.812 | 3.059 | 109.811 |
2011 | 17.093 | 55.818 | 8.193 | 28.306 | 4.257 | 113.667 |
Crescimento 2008 a 2011 (%) | 3,4 | -2,6 | 25,2 | -2,0 | 53,5 | 1,5 |
Total | 1.860.308 | 7.432.251 | 1.713.657 | 3.846.023 | 1.145.747 | 15.997.986 |
Avaliando-se separadamente por região brasileira, verifica-se que a região Sudeste concentrou a maioria dos procedimentos de média complexidade, em todos os anos estudados, seguida pela região Nordeste. No entanto, a Sul teve o maior aumento proporcional (65% no período). Na Norte, o quantitativo de procedimentos nos quatro anos foi o menor do país, porém a região apresentou o segundo maior índice de crescimento (58% no período).
Em relação aos procedimentos de alta complexidade por região, a Sudeste, seguida pela Nordeste, apresentou o maior quantitativo de procedimentos no período 2008 a 2011 em relação às demais regiões, entretanto elas apresentaram índice de crescimento negativo se considerado o ano inicial e também o ano final desse levantamento, ou seja, houve redução de 2% no número de exames. A região Norte, apesar de registrar número muito inferior de procedimentos de alta complexidade em relação às demais, apresentou crescimento de 53,5% no período, como pode ser visualizado na Tabela 2.
Buscando avaliar a evolução da implantação da PNASA, estimou-se a cobertura dos procedimentos de diagnósticos (Quadros 1 e 2) em saúde auditiva e cobertura, a partir do número de exames realizados em 2004, comparando com os dados mais atuais de 2011.
Observa-se na Tabela 3 crescimento no número e na cobertura de procedimentos (dado pela média de exames por mil habitantes) em todas as regiões entre os dois anos analisados. A região Norte apresentou índice de aumento superior às demais (78,68%). No entanto, a Sudeste realizou proporcionalmente maior número de procedimentos do que as demais (46,5% em 2011).
Tabela 3 Evolução da cobertura de procedimentos diagnósticos de média e alta complexidade em saúde auditiva por região. Brasil, 2004 e 2011
Região | Total de procedimentos de média e alta complexidade em 2004 | Total de procedimentos de média e alta complexidade em 2011 | Crescimento do número de procedimentos diagnósticos 2004–2011 (%) |
||||
---|---|---|---|---|---|---|---|
n | % por região |
Cobertura (média exames/1.000 habitantes) |
n | % por região |
Cobertura (média exames/1.000 habitantes) |
||
Sul | 221.674 | 12,6 | 8,3 | 593.111 | 13,3 | 21,5 | 62,6 |
Sudeste | 947.457 | 54,0 | 12,2 | 2.074.702 | 46,5 | 25,6 | 54,3 |
Centro-Oeste | 131.165 | 7,5 | 10,3 | 384.253 | 8,6 | 27,0 | 65,9 |
Nordeste | 380.437 | 21,7 | 7,5 | 1.062.530 | 23,8 | 19,9 | 64,2 |
Norte | 74.823 | 4,3 | 5,2 | 350.928 | 7,9 | 21,8 | 78,7 |
Total | 1.755.556 | 100,0 | 9,7 | 4.465.524 | 100,0 | 23,2 | 60,7 |
A Tabela 4 detalha a evolução de alguns procedimentos específicos de diagnósticos de média e alta complexidade de saúde auditiva entre 2008 e 2011.
Tabela 4 Evolução do número de procedimentos específicos de diagnósticos em saúde auditiva. Brasil, 2008-2011
Procedimentos | 2008 | 2009 | 2010 | 2011 | Crescimento (%) |
---|---|---|---|---|---|
Média complexidade | |||||
Audiometria de reforço visual | 39.705 | 41.174 | 36.052 | 31.641 | -20,3 |
Audiometria tonal limiar | 382.376 | 486.034 | 553.807 | 612.654 | 60,2 |
Emissões otoacústicas para triagem auditiva | 89.224 | 250.081 | 361.324 | 511.274 | 473,0 |
Avaliação para diagnóstico de deficiência auditiva | 34.381 | 38.542 | 41.294 | 37.965 | 10,4 |
Estudo de emissões otoacústicas transitórias e produto de distorção | 67.966 | 87.856 | 119.157 | 155.807 | 129,2 |
Imitanciometria | 367.458 | 425.845 | 460.623 | 506.597 | 37,9 |
Logoaudiometria | 435.766 | 484.631 | 525.424 | 562.843 | 29,2 |
Potencial evocado auditivo de tronco encefálico (PEATE) para triagem auditiva | 36.447 | 37.036 | 39.523 | 42.733 | 17,2 |
Potencial evocado auditivo de curta, média e longa latência |
31.341 | 17.234 | 17.442 | 21.223 | -32,3 |
Reavaliação do diagnóstico de deficiência auditiva em pacientes maior de três anos |
10.962 | 16.049 | 21.795 | 24.209 | 120,8 |
Seleção e verificação de beneficio do Aparelho de amplificação sonora individual (AASI) | 71.186 | 88.428 | 102.292 | 114.367 | 60,7 |
Triagem auditiva de escolares | 51.426 | 44.847 | 33.108 | 26.250 | -49,0 |
Subtotal | 1.618.238 | 2.017.757 | 2.311.841 | 2.647.563 | 8.595.399 |
Alta complexidade | |||||
Avaliação para diagnóstico diferencial de deficiência auditiva | 89.224 | 94.318 | 102.979 | 107.853 | 20,9 |
Reavaliação diagnóstica de deficiência auditiva em pacientes menores de três anos | 5.198 | 6.274 | 6.832 | 5.814 | 11,9 |
Subtotal | 94.422 | 100.592 | 109.811 | 113.667 | 418.492 |
Total | 1.712.660 | 2.118.349 | 2.421.652 | 2.761.230 | 9.013.891 |
Observa-se que ao longo dos quatro anos avaliados houve aumento da maioria dos procedimentos analisados: 473% nos exames e emissões otoacústicas para triagem; 129% nos exames de emissões otoacústicas transitórias e produto de distorção e de 121% nos exames de reavaliação diagnóstica de deficiência auditiva em pacientes maiores de três anos.
Verificou-se, por outro lado, que diminuíram os exames de audiometria de reforço visual, os de potencial evocado auditivo de curta, média e longa latência, e os exames de triagem auditiva de escolares (Tabela 4).
Este estudo buscou avaliar o grau de implantação da PNASA tomando como próxima a evolução quantitativa dos serviços e dos procedimentos diagnósticos de média e alta complexidade em saúde auditiva em todo o território nacional. Os resultados obtidos apontaram avanços de cobertura de serviços e, consequentemente, dos procedimentos diagnósticos em saúde auditiva em todo o país.
Uma pesquisa sobre programas de saúde auditiva em países da América Latina e Caribe concluiu que a perda auditiva não é priorizada nos serviços de saúde, que os investimentos em tecnologia e material humano são limitados e os serviços oferecidos são restritos( 16 ). Em vários países da América Latina, como Argentina, Chile e México, essas intervenções antes de 2000 eram incipientes e não apresentavam serviços de diagnóstico audiológico( 17 ). No Brasil, essas ações foram intensificadas a partir da implantação da PNASA em 2004.
No país, poucos estudos foram desenvolvidos referentes à avaliação quantitativa de procedimentos como recurso para melhoria de cobertura e organização de serviços e acessibilidade( 5 , 8 , 21 ). Um deles analisou o nível de satisfação do usuário em decorrência da dificuldade em acompanhar os diversos serviços de saúde auditiva( 7 ).
Sabe-se que para atingir qualidade da assistência à saúde diversos mecanismos de avaliação e controle são utilizados. A avaliação da estrutura aparece como meio fundamental de planejamento e gestão dos serviços de saúde, deixando em evidência a real situação de um determinado território, região e país, o que facilita o uso adequado de recursos, investimentos e ampliações de serviços( 22 ).
Estudos para análise da PNASA, regionais ou estaduais, ainda são restritos. Foram realizadas pesquisas pontuais nas regiões do Nordeste - Pernambuco( 5 ) - e Sudeste - Rio de Janeiro( 21 ). Em linhas gerais, em ambos os estudos foi evidenciada a necessidade de melhorias quanto à oferta de procedimentos de atenção auditiva, ao diagnóstico precoce e ao acesso às próteses auditivas e aos meios de reabilitação.
Analisando o quantitativo de serviços de média e alta complexidade por macrorregião (Tabela 1), identificou-se que as regiões Sul e Sudeste ultrapassaram o número de serviços necessários estimados, segundo parâmetros da PNASA. No entanto, na região Norte o número de serviços ainda está 50% abaixo do esperado.
No período de 2008 a 2011(Tabela 2), a região Sul apresentou aumento significativo nas intervenções de média complexidade, seguida da Norte, que se manteve em crescimento também nas ações de média e alta complexidade comparando com as demais macrorregiões.
Um estudo, a partir de dados secundários do Sistema de Informação Ambulatorial do SUS, tendo como foco os procedimentos relacionados à adaptação de Aparelho de Amplificação Sonora Individual (AASI) de 2004 a 2010, identificou que houve melhora na cobertura nacional dos serviços de saúde auditiva, com 86% de implantação da rede em todo o território nacional e que o Centro-Oeste e Norte encontraram-se abaixo do esperado em relação às outras regiões( 6 ).
Tais diferenças podem ser justificadas uma vez que o Brasil se caracteriza por sua imensa heterogeneidade demográfica e socioeconômica. A proposta do SUS de descentralização dos serviços de saúde vem contribuir com a viabilização do acesso à saúde em todo o território nacional. Porém, a equidade e integralidade à saúde tornam-se um desafio, pois os aspectos relativos à assistência surgem a partir de iniciativas locais por gestores estaduais e municipais condizentes com as particularidades financeiras e necessidades da população( 14 , 15 , 23 - 25 ).
Em relação ao Norte, dados da Pesquisa Avaliação da Gestão Plena do Sistema Municipal de 2002 revelaram maior incremento de recursos, mesmo com ela ainda permanecendo abaixo das outras regiões. Segundo o estudo, após a implantação do SUS, observaram-se avanços e incrementos nos serviços nesta localidade( 26 ).
O incremento dos procedimentos de diagnóstico em saúde auditiva em média complexidade pode ser justificado pelo avanço tecnológico associado a investimentos advindos do Ministério da Saúde, à organização da assistência em rede em diversos municípios, às políticas voltadas à promoção da equidade e à implantação da Lei do Teste da Orelhinha, colocando a obrigatoriedade da realização do exame de EOA em crianças nascidas no país( 27 , 28 ).
Referente aos procedimentos considerados de média complexidade no SIA/SUS, evidenciou-se diminuição significativa nos exames de audiometria com reforço visual (Tabela 4). Isso pode ser atribuído ao avanço tecnológico e à aquisição de equipamentos pelos serviços de saúde auditiva para a realização de exames objetivos, por sua facilidade e praticidade.
Os bancos de dados disponibilizados pelo Ministério da Saúde aparecem como uma forma de democratização da informação e ferramenta para a gestão e controle social, mas ainda são subutilizados pelos gestores de saúde em todos os níveis. Ressalte-se, no entanto, que a análise de dados de bancos disponíveis no DATASUS, entre outros, deve ser criteriosa, visto que os erros de digitação e as inconsistências podem estar presentes( 8 , 9 ).
Reforça-se a necessidade de novas pesquisas de avaliação quantitativa que detalhem a distribuição dos serviços de atenção à saúde auditiva em cada estado e região. Faz-se necessário que sejam desenvolvidos estudos que criem protocolos para a avaliação qualitativa da PNASA no Brasil, dada a expansão observada dos procedimentos demonstrados neste estudo, buscando, assim, avaliar também a sua efetividade.
Houve aumento relativo dos exames de média complexidade nos períodos pesquisados. Evidenciou-se também que a região Norte apresentou crescimento expressivo no número e cobertura de procedimentos no período analisado, apesar de ter cobertura insuficiente ainda de serviços especializados, o que demonstra a persistência de desigualdades regionais na distribuição de serviços de atenção à saúde auditiva.