versão impressa ISSN 0066-782X
Arq. Bras. Cardiol. vol.102 no.3 São Paulo mar. 2014 Epub 10-Fev-2014
https://doi.org/10.5935/abc.20140013
A Síndrome Metabólica (SM) é uma agregação de fatores de risco que aumenta a incidência de eventos cardiovasculares e Diabete Melito (DM). O envelhecimento da população vem acompanhado de maior prevalência de SM, que varia dependendo da população estudada e do critério diagnóstico utilizado.
Determinar a prevalência de SM em idosos por quatro critérios diagnósticos e a concordância entre esses.
Estudo transversal realizado em 243 indivíduos acima de 60 anos (180 mulheres) em Niterói (RJ). Foram avaliados através de exame clínico glicemia jejum, insulinemia jejum, perfil lipídico e medidas antropométricas - peso, estatura, circunferência abdominal e relação cintura/quadril. A prevalência de SM foi estimada utilizando critérios diagnósticos da Organização Mundial da Saúde (OMS) modificado, National Cholesterol Education Program - Adult Treatment Panel III (NCEP-ATPIII), International Diabetes Federation (IDF) e Joint Interim Statement (JIS).
A prevalência foi elevada pelos quatro critérios, OMS (51,9%), NCEP-ATPIII (45,2%), IDF (64,1%) e JIS (69,1%), e a concordância entre os critérios diagnósticos pelo índice kappa foi moderada em quase todas as comparações OMS vs. IDF (k = 0,47; intervalo de confiança (IC) 95%, 0,35 - 0,58); OMS vs. NCEP-ATPIII (k = 0,51; IC 95%, 0,40 - 0,61); OMS vs. JIS (k = 0,45; IC 95%, 0,33 - 0,56); IDF vs. NCEP-ATPIII (k = 0,55, IC 95%, 0,45 - 0,65) e NCEP-ATPIII vs. JIS (k = 0,53; IC 95%, 0,43 - 0,64), exceto entre IDF vs. JIS (K= 0,89; IC 95%, 0,83 - 0,95), considerada boa.
A prevalência de SM foi elevada pelos quatro critérios diagnósticos, principalmente pelo JIS. Houve uma boa concordância entre os critérios JIS e IDF e moderada entre os outros.
Palavras-Chave: Síndrome Metabólica; Prevalência; Idoso; Obesidade; Circunferência Abdominal; Fatores de Risco
Metabolic syndrome (MS) is an aggregation of risk factors that increase the incidence of cardiovascular events and diabetes mellitus (DM). Population aging is accompanied by higher prevalence of MS, which varies depending on the population studied and the diagnostic criteria used.
To determine prevalence of MS in the elderly using four diagnostic criteria and agreement between them.
Cross-sectional study on 243 patients older than 60 years (180 women) in Niterói, RJ. They were evaluated by clinical examination, fasting glucose, fasting insulin, lipid profile and anthropometric measurements - weight, height, waist circumference and waist/hip ratio. Prevalence of MS was estimated by World Health Organization (WHO) modified, National Cholesterol Education Program - Adult Treatment Panel III (NCEP-ATP III), International Diabetes Federation (IDF) and Joint Interim Statement (JIS) criteria.
Prevalence was high with the four criteria WHO (51.9%), NCEP-ATPIII (45.2%), IDF (64.1%) and JIS (69.1%), and agreement between criteria by kappa was moderate in almost all comparisons WHO vs. IDF (k = 0.47;95% confidence interval (CI), 0.35 to 0.58); WHO vs. NCEP-ATPIII (k = 0.51; 95% CI, 0.40 to 0.61); WHO vs. JIS (k = 0.45; 95% CI, 0.33 to 0.56); IDF vs. NCEP-ATPIII (k = 0.55; 95% CI, 0.45 to 0.65) and NCEP-ATPIII vs. JIS (k = 0.53; 95% CI, 0.43-0.64), except between IDF vs. JIS (K = 0.89;95% CI, 0.83 to 0.95), which was considered good.
Prevalence of MS was high with the four diagnostic criteria, mainly by JIS. There was good agreement between JIS and IDF criteria and moderate among the others.
Key words: Metabolic Syndrome; Prevalence; Aged; Obesity; Abdominal Circumference; Risk Factors
A agregação de obesidade central, disglicemia, dislipidemia e hipertensão arterial caracterizam a chamada Síndrome Metabólica (SM). Diversos estudos1 - 3 têm demonstrado que a prevalência da SM aumenta com a idade, tornando o seu diagnóstico necessário devido ao aumento de 2,5 vezes do risco de doenças cardiovasculares e de cinco vezes para o desenvolvimento de Diabete Melito (DM)4.
Em 1988, Reaven5 descreveu uma estreita relação entre anormalidades metabólicas e a resistência insulínica, denominando-a "Síndrome X". A Organização Mundial de Saúde (OMS) em 19986 definiu o primeiro critério diagnóstico cujo componente importante e indispensável era a hiperglicemia. Em 2001, o National Cholesterol Education Program Adult Treatment Panel III (NCEP-ATPIII) propôs um novo critério, em que a glicemia não era mais considerada fator imprescindível, tornando-se apenas um dos componentes. Nesse critério a presença de pelo menos três dos cinco componentes da SM - Circunferência Abdominal (CA) aumentada, glicemia de jejum aumentada, HDL- colesterol baixo, hipertrigliceridemia e pressão arterial elevada conferem o diagnóstico de SM7. A I Diretriz Brasileira de Diagnóstico e Tratamento da SM, elaborada em 2005, utilizou como base este critério para o diagnóstico da SM8.
A prevalência da obesidade vem aumentando nas últimas décadas em todas as faixas etárias, concomitante ao envelhecimento populacional. Diante das evidências da relação entre obesidade e risco cardiovascular, a International Diabetes Federation (IDF) propôs em 2005 uma nova definição de SM valorizando a obesidade abdominal, através da CA, tornando-a imprescindível ao diagnóstico9.
Em 2009 Alberti e cols.10 apresentaram um critério de consenso para o diagnóstico de SM - Joint Interim Statement (JIS) com aval de várias sociedades, que definiram pela não obrigatoriedade de qualquer componente, e sim, a presença de pelo menos três componentes alterados em cinco, e a medida da CA de acordo com as diferentes etnias.
Considerando que a SM representa um maior risco para doença cardiovascular, DM, alterações da mobilidade11, déficit cognitivo12 e depressão13 em idosos, aliado a escassez de dados no Brasil, este estudo tem como objetivo principal determinar a prevalência de SM por quatro diferentes critérios diagnósticos e a concordância entre esses numa população com mais de 60 anos de idade.
Trata-se de estudo transversal com inclusão de 243 pacientes, 180 do sexo feminino, acima de 60 anos de idade, voluntários, em amostra de conveniência, todos atendidos no ambulatório de Geriatria e Clínica Médica da Fundação Municipal de Saúde de Niterói (RJ). Os pacientes incluídos apresentavam os mais diversos diagnósticos e motivações para o atendimento. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense sob o número 0183.0.258.258.10 e todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.
Foram excluídos os obesos mórbidos, os portadores de insuficiência hepática e renal terminal, os indivíduos em uso de corticosteroides, imunossupressores e com deficiências cognitivas.
Foi procedida anamnese, coleta de dados sociais e uso de fármacos. A avaliação clínica constou de aferição da pressão arterial com esfigmomanômetro automático marca OMRON HEM 742INT(Bannockburn,Illinois 60015 USA) no membro superior esquerdo, com o paciente sentado após pelo menos cinco minutos de repouso, utilizando a média das duas últimas aferições com diferença menor de 4 mmHg entre elas14. Os dados antropométricos incluíam peso em quilogramas (kg) e estatura em centímetros (cm) com uma balança antropométrica marca FILIZOLA (São Paulo, SP, Brasil) aferida pelo INMETRO. O Índice de Massa Corporal (IMC) foi calculado a partir da divisão peso expresso em kilogramas pelo quadrado da estatura em metros.
A CA foi medida com fita métrica inelástica da marca SANNY (São Bernardo do Campo, SP, Brasil), no ponto médio entre as cristas ilíacas e as últimas costelas, com paciente em posição ortostática no final do movimento respiratório da expiração15.
As coletas de sangue foram realizadas em jejum de 12 horas e posteriormente analisadas no Laboratório Central de Saúde Pública. Foram feitas as dosagens séricas da glicose em jejum, colesterol total, HDL - colesterol e dos TG tendo sido usados kits comerciais da marca Labtest (Lagoa Santa, Belo Horizonte, Brasil). O LDL - colesterol foi calculado pela equação de Friedewald. As amostras foram analisadas por método enzimático em equipamento automatizado marca Labmax 240 (Belo Horizonte, Brasil).
As dosagens de insulina foram realizadas no equipamento ELECSYS (Roche, Japão) pelo método de eletroquimioluminescência. O Homa1- IR foi calculada multiplicando-se a glicose em jejum (mmol/L) pela insulina de jejum (μIU/mL) e dividindo-se por 22,5 e considerado positivo para resistência insulínica Homa1-IR > 2,716. O diagnóstico de SM foi estabelecido de acordo com os critérios da OMS modificado, NCEP-ATPIII, IDF e JIS, conforme descrito na tabela 1. O ponto de corte utilizado para a CA no critério da IDF e JIS foi da etnia europeia.
Tabela 1 Definições e critérios diagnósticos para Síndrome Metabólica
OMS (modificado)* | NCEP-ATPIII † | IDF ‡ | JIS § | |
---|---|---|---|---|
Pressão arterial | ≥ 140/90 mmHg ou tratamento de HAS(∕∕) | ≥ 130/85 mmHg | ≥ 130/85 mmHg ou tratamento de HAS | ≥ 130/85 mmHg ou tratamento de HAS |
Antropometria | RCQ (¶) ♂ > 0,9 e ♀ > 0,85 e/ou IMC (#) > 30 kg/m2 | CA(§§) ≥ 102 ♂ ≥ 88 ♀ | CA ≥ 94 ♂ ≥ 80 ♀ | CA ≥ 94 ♂ ≥ 80 ♀ |
Glicose | DM, ITG (**) ou Homa-1 IR (††) > 2,7 | ≥ 110 | ≥ 100 | ≥ 100 |
TG | ≥ 150 (‡‡) | ≥150 | ≥150 | ≥150 |
HDL-col | ♂ < 35 ♀ < 39 | ♂ < 40 ♀ < 50 | ♂ < 40 ♀ < 50 | ♂ < 40 ♀ < 50 |
Critério SM | DM, ITG ou Homa-1 IR > 2,7 +2 outros componentes | 3 ou mais componentes | CA mais 2 componentes | 3 ou mais componentes |
(*)OMS: Organização Mundial de Saúde;
(†) NCEP-ATPIII: Third Report of the National Cholesterol Education Program; (‡) IDF: Federação Internacional de Diabetes; (§) JIS: Joint Interim Statement; ( ∕∕) HAS: Hipertensão Arterial Sistêmica; (¶ ) RCQ: relação cintura/quadril; (#) IMC: Índice de Massa Corporal;
(**)ITG: Tolerância diminuída a glicose; (††) Homa1-IR: Homeostastic model assessment; (‡‡) Tanto os TG alterados ou HDL-c baixo constituem apenas um fator pela OMS; (§§) CA: Circunferência abdominal.
Para analisar os dados numéricos obtidos foram utilizados os testes t-Student e ANOVA de um fator. A análise estatística avaliou a concordância no diagnóstico de SM entre os critérios utilizados na pesquisa, OMS, NCEP-ATPIII, IDF e JIS utilizando o índice de Kappa. Foi estabelecido nível de significância de 0,05. Para essas análises foi usado o programa S-Plus 8.0.
Participaram do estudo 243 idosos, dos quais 180 mulheres (74%). A média de idade foi de 71 ± 7 anos quando avaliada toda a população estudada e, 71 ± 7 anos no sexo feminino e 70 ± 7 anos no sexo masculino (p > 0,05). Na tabela 2 vê-se a média dos componentes da SM avaliados por gênero.
Tabela 2 Componentes da Síndrome Metabólica de acordo com o gênero
Masculino (n = 63) | Feminino (n = 180) | p | |
---|---|---|---|
Média ± DP | Média ± DP | ||
IMC* (kg/m2) | 28,1 ± 4,4 | 29,2 ± 5,7 | > 0,05 |
Circunferência Abdominal (cm) | 99 ,9 ± 10,1 | 96 ± 12,7 | < 0,05 |
Glicemia jejum (mg/dL) | 114 ± 39 | 106 ± 27 | > 0,05 |
Colesterol total (mg/dL) | 182 ± 38 | 206 ± 43 | < 0,01 |
Triglicerídeos (mg/dL) | 145 ± 74 | 139 ± 74 | > 0,05 |
HDL - Colesterol (mg/dL) | 47 ± 12 | 57 ± 14 | < 0,05 |
LDL - Colesterol (mg/dL) | 106 ± 34 | 120 ± 40 | < 0,05 |
*IMC: Índice de Massa Corporal.
Nas mulheres os valores do IMC (p > 0,05), colesterol total (p < 0,01) e das lipoproteínas HDL-c e o LDL-c (p < 0,05) foram maiores do que nos homens, enquanto os valores da CA (p < 0,05), glicemia de jejum (p > 0,05) e triglicerídeos (p > 0,05) foram maiores nos homens (tabela 2).
Foram classificados como tendo SM pelos critérios da OMS, NCEP-ATPIII, IDF e JIS, respectivamente, 51,9%, 45,2%, 64,1% e 69,1% dos participantes (gráfico 1). A prevalência da SM de acordo com o gênero foi de 49,4%, 45,6%, 65,6% e 68,9 % pelos critérios OMS, NCEP-ATPIII, IDF e JIS, respectivamente, no sexo feminino. Em relação ao sexo masculino a prevalência de SM foi de 58,7%, 44,4%, 60,3% e 69,8% de acordo com os critérios OMS, NCEP-ATPIII, IDF e JIS, respectivamente.
No gráfico 2 pode-se observar a prevalência da SM pelos quatro critérios diagnósticos utilizados, de acordo com as faixas etárias (60-69, 70-79 e ≥ 80 anos) em ambos os gêneros.
O critério de JIS foi o que mais diagnosticou SM quando avaliados todos os participantes (69,1%), no gênero feminino (68,9%) e no masculino (69,8%). Por outro lado, o critério NCEP-ATPIII foi que menos diagnosticou SM tanto na população geral estudada (45,2%), quanto no gênero feminino (45,6%) e masculino (44,4%).
A concordância entre os critérios utilizados para a definição de SM foi analisada por meio da determinação do índice Kappa, sendo considerada moderada entre os critérios OMS vs. IDF (k=0,47; IC 95%, 0,35 - 0,58); OMS vs. NCEP-ATPIII (k = 0,51; IC 95%, 0,40 - 0,61); OMS vs. JIS (k = 0,45; IC 95%, 0,33 - 0,56); IDF vs. NCEP-ATPIII (k = 0,55; IC 95%, 0,45 - 0,65) e NCEP-ATPIII vs. JIS (k = 0,53; IC 95%, 0,43 - 0,64). A concordância foi considerada muito boa entre IDF vs. JIS (k = 0,89; IC 95%, 0,83 - 0,95).
O estudo de projeção da população brasileira realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística17 demonstra que a população idosa terá maior intensidade de crescimento a partir de 2020 passando de 28,3 milhões para 52 milhões de idosos em 2040, representando um quarto da população brasileira. Quanto a SM, essa apresenta uma prevalência mundial também em ascensão, o que provavelmente está relacionada com o aumento da obesidade, sedentarismo, modificações nos hábitos alimentares e do importante processo de envelhecimento. O resultado da maior prevalência de SM é o reconhecido aumento da morbimortalidade cardiovascular18 , 19.
Gráfico 1 Prevalência da síndrome metabólica na população estudada de acordo com os quatro critérios. *SM: Síndrome Metabólica; †OMS: Organização Mundial da Saúde; ‡NCEP- ATP III: Third Report of the National Cholesterol Education Program; § IDF: Federação Internacional de Diabetes; ∕∕JIS: Joint Interim Statement.
Gráfico 2 Prevalência da síndrome metabólica por faixa etária de acordo com os quatro critérios. *OMS: Organização Mundial da Saúde; †NCEP- ATP III: Third Report of the National Cholesterol Education Program; ‡IDF: Federação Internacional de Diabetes; §JIS: Joint Interim Statement.
Na literatura observa-se grande variabilidade quanto à prevalência de SM entre os idosos, o que depende grandemente do critério utilizado para o diagnóstico e, também, das características étnicas e regionais da população estudada.
No presente estudo avaliaram-se a prevalência e a concordância entre critérios diagnósticos da SM, de acordo com o mais recente critério, JIS, comparado com os critérios da OMS, NCEP-ATPIII e IDF em população de idosos do ambulatório de Clinica Médica e Geriatria. A prevalência da SM foi maior no critério da JIS (69,1%) seguida da IDF (64,1%), OMS (51.9%) e NCEP-ATPIII (45,2%). Essa maior prevalência pelos critérios da JIS e IDF ocorreu, provavelmente, pelo menor ponto de corte da CA e glicemia de jejum atribuído por esses20. Alkerwi e cols.20 constataram prevalência de SM de 88% em mulheres e 74% nos homens, na faixa etária entre 60 e 69 anos, utilizando o critério da JIS, com ponto de corte para a CA de 94 cm para homens e 80 cm para mulheres. Em estudo de Ford e cols.21, realizado nos Estados Unidos e utilizando o critério da JIS, com ponto de corte para CA de 102 cm para homens e 88 cm em mulheres, a prevalência de SM foi de 59,3% em homens e 55,4% nas mulheres. Segundo esses autores, os seus achados diferem dos europeus, com menor prevalência de SM, provavelmente em decorrência do maior ponto de corte da CA utilizado. Com o envelhecimento observa-se aumento da CA pelo acúmulo de gordura abdominal, como visto no presente estudo tanto em homens quanto em mulheres, o que deve ser valorizado devido à associação desse aumento com o risco de mortalidade por todas as causas22.
Em estudo realizado na cidade de Novo Hamburgo (RS), onde foram avaliados 378 idosos com mais de 60 anos, a prevalência de SM foi de 50,3% e 56,9% pelos critérios do NCEP-ATPIII e IDF, respectivamente, com maior prevalência em mulheres pelos dois critérios23. No presente estudo a prevalência pelos critérios NCEP-ATPIII e IDF em mulheres também foi maior em relação aos homens, 45,6% vs. 44,4% pelo NCEP-ATPIII e 65,6% vs. 60,3% pela IDF. Entretanto, pelos critérios JIS e OMS o resultado foi diferente, com prevalência maior no sexo masculino, 69,8% vs. 68,9% pelo JIS e 58,7% vs. 49,4% pela OMS. Estudo realizado em Macapá demonstrou prevalência de 18,8% pelo critério do NCEP-ATPIII e 38,9% pelo critério da IDF nos idosos quilombolas e 34% e 43% em idosos não quilombolas, com maior prevalência entre as mulheres24.
Na Itália2, estudo em indivíduos com mais de 65 anos encontrou-se prevalência de SM de 20% em mulheres e 33% em homens, pelo critério do NCEP-ATP III. Em outro estudo num serviço de Geriatria na Turquia25, a prevalência de SM em indivíduos acima de 65 anos foi de 24%, também pelo NCEP-ATPIII. Quando comparado com os resultados do presente estudo, considerando-se somente o NCEP-ATPIII, verificou-se uma maior prevalência de SM nessa população por esse critério: 45,6% para mulheres e 44,4% para homens, parecido com os resultados do estudo de Novo Hamburgo (RS), mas não tão elevados. Provavelmente essa diferença reflete as características étnicas e regionais que predominam na população de cada região. Isso fica mais claro quando se analisa um estudo francês em que a prevalência de SM foi de 11,3% nas mulheres e 12,5% nos homens com mais de 70 anos, pelo critério do NCEP-ATPIII26. Na Finlândia27 a prevalência de SM em idosas pelo critério da IDF foi maior do que pelo NCEP-ATPIII, semelhante ao observado em estudo brasileiro realizado em Minas Gerais28.
Na China29, onde existe uma crescente modificação no estilo de vida da sociedade com a incorporação de hábitos ocidentais e, com isso, um aumento de doenças metabólicas, um estudo em população acima de 60 anos demonstrou prevalência elevada de SM, sendo 54% em mulheres e 35% em homens, pelo critério da IDF. Quando aplicado o critério do NCEP-ATPIII nessa mesma população, a prevalência caiu para 39% e 18%, respectivamente. Na Austrália30, em indivíduos acima de 70 anos a prevalência de SM pelo critério da IDF foi de 46% nas mulheres e 36% nos homens.
A comparação entre estudos populacionais em idosos de outros países31 , 32 e mesmo em outras regiões do Brasil demonstra a importância de estudos regionais, pois os diferentes valores de prevalência para a SM encontrados nesses estudos apontam para que se valorize mais os aspectos étnicos populacionais e hábitos regionais. Os achados demonstram a dificuldade em se ter um critério diagnóstico que seja preciso, sensível e específico, e que possa ser útil para avaliar as populações em geral ultrapassando as limitações das especificidades regionais.
O diagnóstico de SM per si já identifica um maior risco cardiovascular8, porém não se sabe qual o critério diagnóstico de SM seria o melhor preditor de eventos cardiovasculares. Assmann e cols.33 compararam os critérios diagnósticos da IDF e do NCEP-ATPIII em adultos entre 18 e 65 anos, como preditores de desfechos cardiovasculares em dez anos de acompanhamento. Embora mais casos de SM tenham sido diagnosticados pelo IDF, o critério do NCEP-ATPIII teve maior valor preditivo para risco cardiovascular. Um estudo coorte chinês numa população acima de 50 anos evidenciou a prevalência de SM em 28% dos homens e 48,4% das mulheres diagnosticadas pelo JIS, e associou com o aumento do risco de mortalidade cardiovascular quando três componentes da SM ou mais estavam presentes34.
Estudo de Athyros e cols.35 demonstrou que a prevalência de doença cardiovascular aumentou na presença de SM, independentemente da definição utilizada, porém com maior evidência quando utilizado o critério NCEP-ATPIII em comparação com o critério da IDF. Segundo relato de He e cols.29, em idosos chineses a SM diagnosticada pelo IDF, mas não pelo NCEP-ATPIII, elevou as chances de doença arterial coronariana e acidente vascular cerebral.
No presente estudo a concordância entre os critérios diagnósticos para SM foi moderada entre OMS vs. IDF (k = 0,47), OMS vs. NCEP-ATPIII (k = 0,51), OMS vs. JIS (k = 0,45), IDF vs. NCEP-ATPIII (k = 0,55), NCEP-ATPIII vs. JIS (k = 0,53) e muito boa entre IDF vs. JIS (k = 0,89). Em Luxemburgo20, a concordância entre as definições NCEP ATPIII, IDF e JIS foram excelentes (k = 0,89), particularmente entre IDF vs. JIS (k = 0,93). Nos Estados Unidos36 a concordância foi de k = 0,92 entre o critério do NCEP ATPIII e IDF em mulheres na pós-menopausa. Estudo na África37 em indivíduos entre 25 e 64 anos encontrou concordância entre OMS vs. IDF de k = 0,61, entre OMS vs. NCEP-ATPIII de k = 0,59 e NCEP-ATPIII vs. IDF de k = 0,82. Provavelmente a diferença de concordância entre os critérios diagnósticos da SM nas diferentes populações se deve a características étnicas, hábitos alimentares e estilo de vida, dificultando, com isso, a utilização de um mesmo critério diagnóstico para todas as populações.
Entre as limitações deste estudo temos o tamanho da amostra e a provável especificidade regional, que impedem de certa forma a extrapolação desses dados para toda a população idosa brasileira e mundial.
Em conclusão, observou-se que a prevalência de SM na população de idosos estudada foi elevada pelos quatro critérios diagnósticos utilizados, particularmente pelo JIS, e a concordância entre os critérios diagnósticos foi considerada muito boa entre JIS e IDF, sendo apenas moderada entre os outros. Devido às características populacionais de cada região, torna-se clara a necessidade de novos estudos regionais para melhor avaliar a prevalência da SM em idosos e, com isso, se aprimorar o diagnóstico e tratamento com redução do risco cardiovascular.