versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561
Ciênc. saúde coletiva vol.25 no.3 Rio de Janeiro mar. 2020 Epub 06-Mar-2020
http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232020253.15522018
O problema crônico de coluna (PCC) apesar de não ser fatal, se constitui um importante problema de saúde pública1-3, econômico e social4,5. Também denominados de ‘dores nas costas’, o problema crônico de coluna engloba as cervicalgias, dores torácicas, ciáticas, transtornos dos discos intervertebrais, espondiloses, radiculopatias, e as dores lombares6.
No Brasil, segundo dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS, 2013)7, foram estimados aproximadamente 27,0 milhões de pessoas de 18 anos ou mais de idade (18,5%) que referiram PCC, dado similar ao observado em outros países8, sendo mais prevalente entre as mulheres e entre indivíduos com idade acima de 60 anos de idade. De acordo com Romero et al.9, a idade média de início das queixas de PCC no Brasil é aos 35 anos e chega a acometer até 28,1% da população com 60 anos9.
Considerada uma das queixas comumente relatadas pela população adulta, o PCC pode gerar incapacidade, redução da funcionalidade, e afastamentos do trabalho10. Por conseguinte, compromete a qualidade da vida, acarreta maior busca por atendimento médico3,11, e tem sido uma das principais causas de aposentadoria por invalidez12.
A literatura indica um conjunto de fatores associados aos PCC, como os sociodemográficos que incluem idade, sexo, renda e escolaridade; comportamentais que se refere ao tabagismo, sedentarismo, exposições ocorridas nas atividades cotidianas, como trabalho físico extenuante, vibração, posição viciosa, movimentos repetitivos; além de outros fatores, por exemplo a obesidade13.
Em conformidade em com os dados da PNS, diversos estudos internacionais14-17 apontam a desigualdade de gênero pelo PCC, tendo uma prevalência maior entre as mulheres, devido à constituição musculoesquelética e às atividades diárias desempenhadas por elas18. Osteoporose, menstruação, gravidez e fatores culturais também são fatores que podem estar relacionados com a maior prevalência de PCC entre as mulheres19.
É importante ressaltar que a vida da mulher é marcada por alterações anatômico-fisiológicas especificas, na puberdade, gestação e climatério20 que podem favorecer o surgimento de PCC. Além disso, a mulher durante a idade fértil geralmente tem dupla jornada de trabalho tendo que responder simultaneamente às demandas do trabalho remunerado e doméstico-familiar21, o que gera reflexos em sua saúde22, como a maior prevalência de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT), dentre elas hipertensão arterial, PCC, depressão, artrite ou reumatismo e diabetes7.
Embora o tema sobre PCC seja relevante, ainda não existem estudos representativos da população brasileira sobre a utilização de tratamentos para essa morbidade9. Segundo Frasson23, o tratamento conservador da dor lombar deve abordar, preferencialmente, tratamento medicamentoso, exercícios, terapia manual, educação, abordagem biopsicossocial e terapia cognitivo-comportamental.
Os tratamentos para o PCC geram ônus tanto para a saúde pública, uma vez que há necessidade de exames, medicamentos, fisioterapia, internações e cirurgias24,25, quanto para a economia, especificamente relacionado à Previdência Social, uma vez que há elevadas taxas de licenças de saúde devido afastamento do trabalho26 e aposentadoria por invalidez relacionada à dor na coluna no Brasil12.
Dessa forma, o PCC representa um problema de saúde pública1-3 que tem impacto na vida profissional das pessoas que tem esse diagnóstico12, sobretudo em mulheres, devido aos fatores genéticos, físicos e culturais19 que às predispõem à morbidade. Assim, tendo em vista a relevância do tema em questão, a escassez de estudos no Brasil sobre o assunto, este trabalho tem o objetivo de identificar, entre as mulheres em idade fértil, os fatores associados ao PCC.
Este é um estudo transversal realizado com dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) do módulo Estilos de Vida da PNS (2013)7. A PNS foi desenvolvida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em parceria com o Ministério da Saúde. A população de estudo foi composta por moradores de domicílios particulares do Brasil, exceto os localizados nos setores censitários especiais (quartéis, bases militares, alojamentos, acampamentos, embarcações, penitenciárias, colônias penais, presídios, cadeias, asilos, orfanatos, conventos e hospitais).
A amostragem da PNS é caracterizada por uma subamostra da amostra mestra do Sistema Integrado de Pesquisas Domiciliares - SIPD do IBGE, cuja abrangência geográfica é constituída pelos setores censitários da Base Operacional Geográfica do Censo Demográfico 2010, exceto aqueles com número muito pequeno de domicílios e os setores especiais.
A PNS teve amostra total de 60.202 pessoas maiores de 18 anos, o plano amostral empregado foi o de amostragem por conglomerado em três estágios de seleção (setores, famílias e indivíduos)27.
No primeiro estágio, a seleção das unidades primárias de análise foi obtida por amostragem aleatória simples selecionada previamente na amostra mestra. No segundo, foi selecionado - por amostragem aleatória simples - um número fixo de domicílios particulares permanentes em cada uma das unidades primárias de análises selecionada no primeiro estágio. No terceiro estágio, dentro de cada domicílio da amostra, um morador com 18 anos ou mais de idade foi selecionado - também por amostragem aleatória simples - para responder à 3a parte (individual) do questionário. Essa seleção foi feita baseando-se em uma lista de moradores elegíveis, construída no momento da entrevista27.
O questionário aplicado foi dividido em três partes, as duas primeiras destinadas a perguntas sobre características do domicílio, situação socioeconômica e de saúde dos moradores; a terceira foi individual e direcionada ao morador de 18 anos ou mais previamente selecionado, nela foram respondidas perguntas sobre morbidade e estilo de vida28.
Na PNS foram avaliadas mulheres de 18 a 101 anos. No presente estudo, foram consideradas mulheres em idade fértil na faixa etária de 18 a 49 anos, uma vez que a PNS não avaliou mulheres abaixo de 18 anos, limite superior à classificação de mulheres em idade fértil no Brasil, que é de 10 a 49 anos29. Portanto, no total, foram avaliadas 22.621 mulheres em idade fértil de todo o Brasil.
A variável dependente analisada foi a prevalência de PCC, investigada por meio da pergunta: “O(a) sr.(a) tem problema crônico de coluna, como dor crônica nas costas ou no pescoço, lombalgia, dor ciática, problemas nas vértebras ou disco?”, que tinha duas opções de resposta: sim ou não.
As variáveis independentes incluíram itens sociodemográficos, hábitos de vida, histórico reprodutivo, estado nutricional e diagnóstico de doenças, categorizadas da seguinte forma: a) Idade, em anos, 18-26, 27-32, 33-39, 40-49; b) Escolaridade: sem instrução, até o ensino fundamental completo, ensino médio incompleto e completo, ensino superior incompleto ou mais; c) Raça ou cor da pele: branca para as mulheres que se autodeclaram brancas, e preta, amarela, parda ou indígena outras para as mulheres que autodeclaram preta, amarela, parda ou indígena; d) Situação conjugal: viver ou não com cônjuge/companheiro; e) Ocupação: ter ou não um trabalho.
Sobre os hábitos de vida como fatores de risco e proteção: a) Atividade física: ter praticado ou não atividade física nos último três meses e, além disso, foi construído um escore semanal de prática de atividade física, no qual o tempo despendido nas atividades foi multiplicado pelo número de dias e o ponto de corte foi a prática ou não de 150 minutos ou mais por semana30; b) Tratamento para PCC: ter realizado ou não fisioterapia por causa do PCC e ter tomado ou não injeção/medicação para o PCC; c) Tabagismo: hábito de fumar ou não; d) Assistir televisão: menos de 2 horas e maior ou igual a 2 horas.
Em relação ao histórico reprodutivo, a) Número de partos: nenhum, até dois, e três ou mais.
Quanto aos fatores de risco metabólicos, a) classificação da massa corporal utilizando o Índice de Massa Corporal (IMC): magreza e eutrofia (≤ 24.9 kg/m²), sobrepeso (> 24,99 e ≤ 29,99 kg/m²), obesidade grau I (> 29,99 e ≤ 34,99 kg/m²), obesidade grau II e III (> 34,99 kg/m²) b) circunferência da cintura (CC)31: c) Razão cintura/estatura (C/E)32: < 0,5 risco diminuído para doenças cardiovasculares e > 0,5 risco diminuído para doenças cardiovasculares.
Sobre o diagnóstico de doenças utilizou-se como parâmetro a depressão: a) diagnóstico ou não de depressão realizado pelo médico.
Na percepção do estado de saúde, utilizou-se autoavaliação de saúde estratificada da seguinte forma: muito boa e boa para as mulheres que autoavaliaram sua saúde como muito boa e boa, e regular, ruim e muito ruim para as mulheres que autoavaliaram sua saúde como regular, ruim e muito ruim.
A PNS foi aprovada pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) do Conselho Nacional de Saúde (CNS). Todos os indivíduos entrevistados foram consultados, esclarecidos e aceitaram participar da pesquisa mediante assinatura de um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Realizou-se uma análise descritiva na qual foram estimadas frequências simples e relativas das variáveis independentes e dependente de acordo com as covariáveis do estudo. As variáveis foram descritas por meio de proporções. Foram estimadas a prevalência e razões de prevalência de apresentar problema crônico de coluna de acordo com as covariáveis por meio da regressão logística.
A análise foi realizada no módulo survey para amostras complexas do Stata versão 9.0 (StataCorp., CollegeStation, EUA).
Foram avaliadas 22.621 mulheres com idade entre 18 e 49 anos, entre as quais 3.355 (14,8%) referiram ter PCC. A maioria das mulheres se autodeclararam como preta, amarela, parda ou indígena e outra (62,7%), viviam com cônjuge ou companheiro (61%), estudaram até o ensino médio completo (40,5%) e trabalhavam no momento da avaliação (59,9%) (Tabela 1).
Tabela 1 Características sociodemográficas, hábitos de vida, histórico reprodutivo, estado nutricional, diagnóstico de depressão e auto percepção de saúde de mulheres em idade fértil que referiram Problema Crônica de Coluna. Pesquisa Nacional de Saúde, Brasil, 2013.
Variável | N | % |
---|---|---|
Problema crônico de coluna | ||
Não | 19.266 | 85,2 |
Sim | 3.355 | 14,8 |
Idade (anos) | ||
18-26 | 5.033 | 22,3 |
27-32 | 5.648 | 25,0 |
33-39 | 5.614 | 24,8 |
40 ou mais | 6.326 | 27,9 |
Raça/cor | ||
Branca | 8.443 | 37,3 |
Preta, parda e outros | 14.178 | 62,7 |
Vive com cônjuge ou companheiro | ||
Não | 8.830 | 39,0 |
Sim | 13.791 | 61,0 |
Escolaridade | ||
Sem instrução | 2.027 | 9,0 |
Até o ensino fundamental completo | 8.096 | 35,8 |
Ensino médio completo | 9.173 | 40,5 |
Ensino superior completo ou mais | 3.325 | 14,7 |
Trabalho | ||
Não | 9.074 | 40,1 |
Sim | 13.547 | 59,9 |
Atividade física nos últimos 3 meses | ||
Não | 16.738 | 74,0 |
Sim | 5.883 | 26,0 |
Prática de 150 minutos de atividade física por semana | ||
Não | 18.226 | 80,6 |
Sim | 4.395 | 19,4 |
Exercício ou fisioterapia para PCC | ||
Não | 2.792 | 83,2 |
Sim | 563 | 16,8 |
Injeção ou outra medicação para PCC | ||
Não | 2.022 | 60,3 |
Sim | 1.333 | 39,7 |
Tabagismo | ||
Não | 20.392 | 90,2 |
Sim | 2.229 | 9,8 |
Assistir TV | ||
< 2 horas | 9.418 | 41,6 |
≥ 2 horas | 13.203 | 58,4 |
Número de partos | ||
0 | 636 | 2,8 |
≤ 2 | 10.616 | 46,9 |
≥ 3 | 11.369 | 50,3 |
IMC | ||
≤ 24,99 | 10.117 | 44,7 |
> 24,99 ≤ 29,99 | 7.087 | 31,3 |
> 29,99 ≤ 34,99 | 3.086 | 13,6 |
> 34,99 | 2.331 | 10,3 |
Circunferência da cintura | ||
<80 | 7.026 | 31,1 |
80-88 | 5.734 | 25,3 |
Índice circunferência/estatura | ||
≤ 0.5 | 6.958 | 30,8 |
> 0,5 | 15.663 | 69,2 |
Diagnóstico médico de depressão | ||
Não | 20.752 | 91,7 |
Sim | 1.869 | 8,3 |
Saúde autorrereferida | ||
Muito boa, boa | 21.659 | 95,7 |
Ruim, muito ruim ou regular | 962 | 4,3 |
Em relação aos hábitos de vida, maioria não era tabagista (90,2%) e 80,6% eram sedentárias pois praticavam menos de 150 minutos de atividade física por semana (Tabela 1). Quanto ao estado nutricional, verificou-se 44,7% eram eutróficas e 31,3% estavam com sobrepeso. A maioria das mulheres (69,2%) possuíam elevado risco para doença cardiovascular de acordo a razão cintura/estatura32 (Tabela 1).
Sobre as condições de saúde como histórico reprodutivo, verificou-se que a maioria das mulheres eram multíparas (50,3%); no quesito da percepção de saúde, observou-se que a maioria das entrevistadas referiram ter saúde muito boa ou boa (95,7%); e 91,7% das entrevistadas referiram não ter diagnóstico médico de depressão (Tabela 1).
Dentre as variáveis estudadas verificou-se que faixa etária (todas as faixas etárias acima de 27 anos, sendo mais elevada na faixa dos 40 aos 49 anos); viver com cônjuge/companheiro (OR = 1,13; IC95% = 1,04 - 1,22); ser tabagista (OR = 1,63, IC95% = 1,46 - 1,81); multiparidade (OR = IC95% =); ter sobrepeso (OR = IC95% =) ou obesidade (OR = IC95% =), ter CC acima de 80cm e índice C/E acima de 0,5 (OR = 1,51, IC95% = 1,39 - 1,65); má percepção de saúde (OR = 3,58, IC95% = 3,13 - 4,11); e diagnóstico de depressão (OR = IC95% =) são fatores de risco para o PCC em mulheres na idade fértil. O único fator de proteção ao PCC foi a escolaridade (OR = 0,69; IC95% = 0,60 - 0,80) (Tabela 2).
Tabela 2 Fatores associados (OR e respectivos IC95%) em mulheres que referiram Problema Crônico de coluna, segundo variáveis selecionadas. Pesquisa Nacional de Saúde, Brasil, 2013.
Variável | OR | IC 95%* |
---|---|---|
Idade (anos) | ||
18-26 | 1 | |
27-32 | 1,39 | 1,22 - 1,57 |
33-39 | 1,78 | 1,57 - 2,00 |
40 -49 | 2,70 | 2,42 - 3,03 |
Raça/cor | ||
Branca | 1 | |
Preta, parda e outras | 0,95 | 0,88 - 1,02 |
Vive com cônjuge ou companheiro | ||
Não | 1 | |
Sim | 1,13 | 1,04 - 1,22 |
Escolaridade | ||
Sem instrução | 1 | |
Até o ensino fundamental completo | 0,84 | 0,74 - 0,95 |
Ensino médio completo | 0,65 | 0,57 - 0,74 |
Ensino superior completo ou mais | 0,69 | 0,60- 0,80 |
Trabalho | ||
Não | 1 | |
Sim | 1,08 | 1,00 - 1,16 |
Atividade física nos últimos 3 meses | ||
Não | 1 | |
Sim | 1,03 | 0,94 - 1,12 |
Prática de 150 minutos de atividade física por semana | ||
Não | 1 | |
Sim | 0,93 | 0,84 - 1,02 |
Tabagismo | ||
Não | 1 | |
Sim | 1,63 | 1,46 - 1,81 |
Hábito de assistir TV | ||
< 2 horas | 1 | |
≥ 2 horas | 0,93 | 0,86 - 1,00 |
Número de partos | ||
0 | 1 | |
Até 2 | 1,34 | 1,04 - 1,72 |
3 ou mais | 1,37 | 1, 07 - 1,75 |
IMC | ||
≤ 24,99 | 1 | |
> 24,99 ≤ 29,99 | 1,33 | 1,22 - 1,45 |
> 29,99 ≤ 34,99 | 1,53 | 1,37 - 1,70 |
> 34,99 | 1,21 | 1,07 - 1,38 |
Circunferência da cintura | ||
<80 | 1 | |
80-88 | 1,24 | 1,12 - 1,37 |
>80 | 1,46 | 1,33 - 1,59 |
Índice circunferência/altura | ||
≤ 0.5 | 1 | |
> 0,5 | 1,51 | 1,39 - 1,65 |
Autopercepção de saúde | ||
Muito boa, boa | 1 | |
Ruim, muito ruim ou regular | 3,58 | 3,13 - 4,11 |
Diagnóstico médico de depressão | ||
Não | 1 | |
Sim | 3,07 | 2,76 - 3,41 |
Legenda: IC95%: Intervalo de Confiança de 95%.
As variáveis raça/cor, trabalho, prática de atividade física nos últimos 3 meses, prática de atividade física semanal igual ou superior a 150 minutos, assistir TV por mais de duas horas não estiveram associadas com o desfecho (Tabela 2).
Por meio dos dados da PNS verificou-se que das 22.621 mulheres em idade fértil avaliadas, 3.355 (14,8%) referiram ter PCC. As características associadas à maior prevalência de algum PCC, com a regressão logística, foram: aumento da idade; viver com cônjuge ou companheiro, ser tabagista; multiparidade; ter sobrepeso e obesidade; ter CC acima de 80 cm e índice C/E acima de 0,5, ambos indicando maior risco de doença cardiovascular; saúde autorreferida como ruim, muito ruim ou regular quando comparada com avaliação muito boa e boa; e diagnóstico de depressão.
No presente trabalho, o aumento da faixa etária, sobretudo na faixa entre os 40 e os 49 anos (OR = 2,70, IC95% = 2,42 - 3,03), indicou maior chance de desenvolver PCC, o que também foi observado em estudos com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) em 2003 e em 200833,34. Esse fato pode ser devido às mudanças no organismo devido ao processo de envelhecimento, como redução da flexibilidade, problemas posturais, maior degeneração osteomuscular e, consequentemente, agravamento da dor35.
Outro fator risco para desenvolver o PCC, foi o relacionamento com cônjuge ou companheiro (OR = 1,13, IC95% = 1,04 - 1,22). Não foram encontrados estudos que abordem diretamente a relação do PCC e relacionamento com cônjuge ou companheiro. Em estudo realizado por Dutra et al.36 é sugerido que essa relação pode se devida à dupla carga de trabalho, profissional e cuidado com a família e afazeres domésticos) que a mulher é submetida, principalmente quando tem um relacionamento estável.
Quanto ao tabagismo, verificou-se que as mulheres que fumam têm maior chance (OR = 1,63) de desenvolver PCC do que as que não fumam, resultado semelhante ao encontrado por Malta et al.35 (OR = 1,59, IC95% = 1,38−1,84). Atualmente o tabagismo é um reconhecido como fator de risco para doenças cardiovasculares37 e já foi também apontado como fator associado à percepção negativa da saúde37. Além disso, existem evidências de que fumantes e ex-fumantes têm maior predisposição a desenvolver dor crônica, uma vez que a nicotina ativaria o sistema imunológico, predispondo a dor lombar e as doenças reumáticas, entre outras condições38-40.
No que diz respeito ao histórico reprodutivo, observou-se que quanto maior o número de partos, a chance de apresentar PCC aumenta em 37%. Essa associação também já foi encontrada em outros estudos que consideram a gravidez e o pós-parto como fatores explicativos de maior prevalência de dores na coluna entre mulheres25,41,42. Isso pode ser explicado pelos hormônios da gravidez, como a relaxina, estrógeno e progesterona, que são responsáveis por aumentar a flexibilidade dos ligamentos da coluna e quadril e aumento da lordose lombar, aumento das contraturas musculares devido ao aumento do peso e à postura causados pelo crescimento do feto. No puerpério, o PCC pode ser atribuído às inadequações posturais ao amamentar, ao peso da criança e a outros fatores25,41.
Quanto ao IMC, CC e relação C/E verificou-se que quanto maiores a massa corporal e adiposidade central, maior a chance de desenvolver PCC, resultado semelhante ao encontrado em outros trabalhos, uma vez que mulheres em idade reprodutiva e com obesidade apresentaram mais queixa de lombalgia quando comparada às eutróficas43. De acordo com Malta et al.35, o aumento na massa corpórea acarreta sobrecarga na musculatura, processos inflamatórios nos ossos e desgastes do disco vertebral, favorecendo o aparecimento de lombalgia e hérnia de disco, entre outras doenças na coluna que são associadas ao PCC35.
Sobre autopercepção de saúde, observou-se que as mulheres que referiram autopercepção de saúde ruim, muito ruim ou regular têm 3 vezes mais chances (OR = 3,58, IC95% = 3,13 - 4,11) de desenvolver PCC quando comparadas às mulheres que referiram sua saúde como boa e muito boa. É válido ressaltar que há escassez de estudos sobre o assunto com mulheres em idade reprodutiva, mas resultado semelhante ao encontrado neste trabalho foi apontado na literatura44, com mulheres na fase climatérica, quando verificou-se que 54% das mulheres climatéricas avaliadas no estudo que tinham PCC refeririam autopercepção de saúde negativa quando comparadas àquelas que refeririam autopercepção de saúde positiva44.
O diagnóstico de depressão foi associado a 3 vezes mais chances de ter PCC, o que pode ser explicado pelas limitações que esta disfunção pode causar. Um estudo realizado com pacientes que sofriam de problema na coluna revelou que 12% apresentavam depressão em virtude da morbidade, e que a maioria deles tinha expectativa de melhorar com o tratamento45.
A escolaridade foi considerada como um fator protetor, em que as mulheres que estudaram até o ensino fundamental completo tinham 84% de fator de proteção ao PCC, seguido das que fizeram o Ensino médio completo (65%) e Ensino superior completo ou mais (69%). Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios34 e em um estudo realizado no Sul do Brasil46 verificaram que indivíduos menos escolarizados tinham mais dor crônica. Um explicação para isso, segundo Plouvier et al.47, é que as pessoas com baixa escolaridade estão mais expostos a más condições de trabalho e por isso desenvolvem mais queixas de PCC quando comparadas às pessoas com maior escolaridade. Segundo dados do Sistema de Vigilância de Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel)48, inquérito nacional realizado em todas as capitais brasileiras e no Distrito Federal, houve expressiva redução na frequência de autoavaliação negativa da saúde com o aumento da escolaridade48.
O presente estudo apresenta algumas limitações por se tratar de um estudo transversal, uma vez que não permite que se façam inferências de causa-efeito em relação ao PCC e às variáveis estudadas. Além disso, ainda há uma relativa escassez de estudos sobre essa temática em mulheres, tanto na idade fértil quanto no climatério.
É válido ressaltar que o termo genérico de Problema Crônico de Coluna utilizado na PNS dificultou os achados para discutir os resultados encontrados neste estudo, uma vez que na literatura estrangeira a maioria dos estudos se referem à dor lombar crônica. Percepção semelhante foi observada em Romero et al.9.
Por meio do estudo pode-se concluir que o PCC acomete 14,8% das mulheres de idade fértil e está associada à autopercepção negativa de saúde, bem como o avanço da idade, relacionamento com cônjuge/companheiro, tabagismo, multiparidade, sobrepeso e obesidade e diagnóstico de depressão. Já a escolaridade foi o único fator de proteção para o PCC em mulheres na idade fértil.
Portanto, dado que os fatores associados ao PCC podem ser controlados, os resultados apresentados neste estudo podem contribuir para a prevenção do desenvolvimento do PCC reduzindo, assim, os custos com o tratamento dos pacientes no âmbito do sistema único de saúde, bem como para a previdência social, reduzindo o número de afastamentos do trabalho e aposentadoria por invalidez.