versão impressa ISSN 0066-782Xversão On-line ISSN 1678-4170
Arq. Bras. Cardiol. vol.110 no.5 São Paulo maio 2018
https://doi.org/10.5935/abc.20180072
No Brasil, são escassas as investigações de base populacional analisando a prevalência e os fatores associados à síndrome metabólica (SM), reconhecida preditora de doenças cardiovasculares (DCV), importante causa de invalidez e morte no país.
Avaliar a prevalência da SM e seus fatores associados na população brasileira.
Análise secundária da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013, inquérito transversal com representatividade nacional da população adulta brasileira (n = 59.402). A variável de desfecho foi a SM, definida a partir da harmonização dos consensos internacionais de cardiologia como carga ≥ 3 dos seguintes componentes: diabetes e hipercolesterolemia autorreferidas, pressão arterial elevada e circunferência da cintura elevada. As análises foram estratificadas por sexo e as razões de prevalência, com seus respectivos intervalos de confiança de 99% (RP[IC99%]), foram calculadas por meio de modelos regressão simples e múltiplos de Poisson.
A prevalência de SM foi 8,9%, sendo significativamente maior entre as mulheres em comparação aos homens; de modo geral, tal padrão manteve-se em relação as variáveis de exposição estudadas. Adicionalmente, menos de 25% da população não apresentou qualquer componente de SM. Nos modelos múltiplos finais, variáveis sociodemográficas, comportamentais e de comorbidades se associaram à SM, porém, enquanto a baixa escolaridade (1,46[1,23-1,74]), acidente vascular cerebral (1,36[1,00-1,86]) e outras DCV (1,29[1,03-1,62]) se associaram entre as mulheres, a insuficiência renal crônica (1,85[2,23-2,76]) se associou exclusivamente entre os homens.
Identificamos elevada prevalência de SM na população brasileira, sendo que os fatores associados a essa condição são distintos em função do sexo.
Palavras-chave: Doenças Cardiovasculares / mortalidade; Síndrome Metabólica / epidemiologia; Epidemiologia; Adulto; Vigilância em Saúde Pública; Inquéritos Epidemiológicos
In Brazil, population-based researches analyzing prevalence and factors associated with metabolic syndrome (MS), a recognized predictor of cardiovascular diseases (CVD), and an important cause of disability and death in the country are scarce.
To evaluate prevalence of MS and its associated factors in Brazilian population.
Secondary analysis of the 2013 National Health Survey, a cross-sectional survey with national representativeness of Brazilian adult population (n = 59,402). MS was the outcome variable, defined from harmonization of cardiology international consensus as load ≥ 3 of the following components: self-reported diabetes and hypercholesterolemia, high blood pressure and high waist circumference. Analysis were stratified by sex and prevalence ratios, with their respective 99% confidence intervals (PR [CI 99%]) calculated by simple and multiple Poisson regression models.
MS prevalence was 8.9%, being significantly higher among women compared to men; in general, this pattern was maintained in relation to exposure variables studied. Additionally, less than 25% of population did not present any MS component. In final multiple models, sociodemographic, behavioral and comorbidity variables were associated with MS, however, while low schooling (1.46 [1.23-1.74], cerebrovascular accident (1.36 [1], 00] (1.28 [1.03-1.62]) were associated among women, chronic renal failure (1.85 [2.23-2.76]) was associated exclusively among men.
We identified MS high prevalence in Brazilian population; on the other hand, factors associated with this condition were different depending on sex.
Keywords: Cardiovascular Diseases / mortality; Metabolic Syndrome / epidemiology; Epidemiology; Adult; Public Health Surveillance; Health Surveys
As modificações ocorridas nos padrões socioeconômicos e culturais das populações, decorrentes da rápida urbanização e do desenvolvimento econômico, resultaram em mudanças significativas nos hábitos de vida dos diferentes grupos populacionais.1 Essa nova forma de organização da sociedade, associada à transição alimentar e ao envelhecimento populacional, promoveu transformações na maneira de adoecer das pessoas aumentando a morbimortalidade por doenças crônicas não transmissíveis (DCNT).2
No que concerne especificamente às doenças cardiovasculares (DCV), a presença concomitante de fatores de risco, como hipertensão arterial, hipercolesterolemia, diabetes, resistência insulínica e deposição central de gordura está associada ao aumento de aproximadamente 2,5 vezes no risco de morbimortalidade cardiovascular.3 Esse complexo agregado de fatores predisponentes das DCV constitui a condição definida como síndrome metabólica (SM).4
Recente estimativa de SM em nível mundial aponta prevalência entre 20-25% na população adulta.3 Nos Estados Unidos da América a prevalência de SM foi de 34,7% em 2011-2012, definida pelo critério harmonizado, o qual sintetiza outros critérios de classificação elaborado por diferentes organizações para definição desta condição.5 Entre cidades da América Latina a prevalência da SM encontrada entre os anos de 2003 e 2005 foi de 21%, definida pelo critério americano do National Cholesterol Education Program Expert Panel (NCEP-ATPIII), apresentando uma variação de 14% a 27%, segundo os territórios estudados.6 Já no Brasil, a prevalência foi ainda maior, variando em torno de 30% entre indivíduos com idade de 19 a 64 anos em diferentes regiões do pais.7
Diante desta situação, o governo brasileiro lançou o Plano de Ações Estratégicas para Enfrentamento das DCNT (2011-2022), que contempla, dentre outras ações, gerar informações e conhecimentos sobre o processo saúde-doença e seus determinantes sociais para formulação de políticas de saúde no Brasil.8 Neste sentido, foi concebida a primeira Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) voltada à vigilância de fatores de risco e proteção de doenças crônicas na população brasileira.9
Nesta perspectiva, a partir dos dados da PNS de 2013, o objetivo deste estudo foi estimar a prevalência da SM e de seus componentes para a população brasileira com idade ≥ 18 anos e sua associação com variáveis sociodemográficas, comportamentais e biológicas.
A PNS é um inquérito transversal com representatividade nacional da população brasileira residente em domicílios particulares realizada entre agosto e dezembro de 2013. A PNS compreendeu um levantamento populacional sobre saúde e seus determinantes realizado no Brasil pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em parceria com o Ministério da Saúde.9
O processo de amostragem foi organizado por conglomerados em três estágios, onde a unidade primária de amostragem (UPA) foi composta por setores censitários, a unidade secundária foi o domicílio e a unidade terciária, os moradores com 18 anos ou mais de idade. Dentro de cada estágio, os participantes foram selecionados por meio de amostragem aleatória simples. Foi considerado o peso do domicílio correspondente, a probabilidade de seleção do morador, ajustes de não resposta por sexo e calibração pelos totais populacionais, por sexo e classes de idade estimadas, com o peso de todos os moradores. Uma descrição detalhada da metodologia aplicada para a PNS-2013 foi publicada anteriormente.9
Para descrever as condições de saúde da população brasileira, a PNS foi constituída por módulos temáticos que abordaram a percepção individual da saúde e estilo de vida, presença de doenças crônicas, bem como informações sociodemográficas. Para fins deste estudo, foram selecionados os indivíduos que possuíam dados sobre os fatores que compõe a SM, ou seja, diagnóstico médico autorreferido de diabetes mellitus e hipercolesterolemia, além dos valores das medidas de pressão arterial (PA) e circunferência da cintura (CC).
Entre os 69.954 domicílios ocupados com morador selecionado para a entrevista na PNS-2013, foram entrevistados 60.202 indivíduos com 18 anos ou mais de idade, representando uma taxa de resposta dos moradores selecionados de 86%.9 Desse total foram excluídas 800 gestantes gerando uma amostra final composta por 59.402 indivíduos.
A Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) aprovou o projeto da PNS em junho de 2013, sob o parecer n.º 328.159. Todos os entrevistados que concordaram em participar da pesquisa assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.9
Neste estudo, a variável de desfecho SM foi definida de acordo com a proposta de harmonização dos consensos internacionais de cardiologia (IDF/NHLBI/AHA/WHF/IAS/IASO), caracterizada pela presença de três entre cinco fatores de risco metabólicos.4 Em nosso trabalho, uma vez que a PNS não disponibilizou dados bioquímicos, a classificação da SM foi realizada considerando a presença de pelo menos três das quatro situações disponíveis no banco de dados: 1) diagnóstico autorreferido de diabetes; 2) valores de PA considerados limítrofes para diagnóstico de Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) (sistólica ≥ 130 mm Hg e/ou diastólica ≥ 85 mmHg); 3) valores de CC acima do ponto de corte estabelecido como limiar de obesidade abdominal para a população da América do Sul (homens ≥ 90 cm e mulheres ≥ 80 cm); e, 4) diagnóstico autorreferido de hipercolesterolemia.
A PA foi aferida por uma equipe treinada usando aparelho digital calibrado. Os indivíduos precisavam estar em repouso e foram orientados a esvaziar suas bexigas, não fumarem ou beberem durante o período de 30 minutos anterior à medição e não fazerem qualquer atividade física durante o período de uma hora anterior à medição. As medidas de PA foram feitas com os indivíduos na posição sentada, depois de terem descansado durante pelo menos cinco minutos. Os indivíduos foram instruídos a manterem-se relaxados e apoiados contra o encosto da cadeira, não cruzarem as pernas e deixarem o seu braço esquerdo livre de roupas e apoiado em uma mesa ao mesmo nível que o seu peito ou coração. Três medidas de PA foram aferidas, com intervalos de dois minutos entre elas. A média entre a segunda e a terceira medida foi utilizada para o presente estudo. Nessa técnica, as pressões sistólica e diastólica foram calculadas por meio de algoritmos a partir do ponto de oscilação máxima que corresponde à PA média.9
Quanto às medidas antropométricas, aferiu-se o peso (kg), a altura (m) e a CC (cm) - tendo-se como referência para o perímetro o ponto médio entre a última costela e a crista ilíaca, sendo utilizados, respectivamente, balança eletrônica portátil, estadiômetro portátil, fita métrica flexível e inelástica com precisão de 0,1 cm. Os procedimentos para a realização da antropometria seguiram o mesmo protocolo utilizado na Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) 2008-2009 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).9
A seleção das variáveis independentes foi realizada com base no modelo conceitual dos determinantes distais e proximais, desenvolvido para mostrar o impacto de múltiplos fatores sociodemográficos, comportamentais e de comorbidades no estado de saúde da população, para a SM.10
Os fatores sociodemográficos utilizados incluíram: sexo, idade (18 - 59 anos e ≥ 60 anos), escolaridade (≤ 8 anos e > 8 anos), cor da pele (branca/não branca), situação conjugal (viver com companheiro ou não), macrorregião (Sul/Sudeste/Centro-Oeste e Norte/Nordeste). As macrorregiões foram dicotomizadas de modo de contrastar os polos brasileiros de desenvolvimento, sendo as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste as mais desenvolvidas. As variáveis comportamentais foram autopercepção de saúde, considerando a junção das respostas “muito boa” e “boa” definindo como referência às respostas “regular”, “ruim” e “muito ruim”.
Para construção da variável atividade física (AF), foram consideradas as seguintes informações sobre a realização em tempo livre e o volume, a duração e a intensidade do esforço para a atividade física, sendo o período de referência utilizado para as questões de AF no questionário, os três meses anteriores ao dia da entrevista. A intensidade do esforço foi obtida pela conversão do tipo de exercício físico ou esporte relatados em AF vigorosa ou moderada conforme as determinações do Compêndio de Atividade Física (CAF).11 A duração do esforço em cada sessão foi expressa em minutos e dividida em três agrupamentos: < 19; 20 a 29; >30 minutos. A frequência semanal foi determinada pelo número de dias com prática de AF por semana e, para efeitos de análise, foi dividida em: 0 a 2 dias, 3 a 4 dias e > 5 dias semanais.
Dessa forma, a variável AF foi, inicialmente, agrupada em três categorias, conforme recomendação da Organização Mundial de Saúde: ativo (indivíduo que alcance ou ultrapasse 150 minutos de atividade física moderada ou 75 minutos de atividade física vigorosa por semana em sessões de pelo menos 10 minutos de duração); inativo (indivíduo que negue praticar AF no lazer) e ativo insuficiente (quando realiza AF abaixo da recomendação).11 Por fim, optou-se por unir as categorias de inativo e ativo insuficiente, transformando-as em uma variável dicotômica (ativo/inativo).
As variáveis correspondentes às comorbidades aqui analisadas foram os diagnósticos médicos prévios autorreferidos de acidente vascular cerebral (AVC), insuficiência renal crônica (IRC), depressão e outras doenças cardiovasculares (DCV). Para esta última consideraram-se os relatos de diagnósticos de DCV anteriores, como por exemplo: infarto, angina, insuficiência cardíaca dentre outras. O excesso de peso foi identificado segundo pontos de corte do índice de massa corporal (IMC). Nos indivíduos com faixa etária entre 18 e 59 anos, foram considerados com excesso de peso, os valores ≥ 25 kg/m2.12 Para aqueles com idade igual ou superior a 60 anos foram considerados valores > 27 kg/m2 como excesso de peso.12
As análises estatísticas foram processadas por meio do software Stata versão 13.0 (Stata Corp., College Station, EUA), utilizando-se survey comands, cujos procedimentos de análise levam em consideração os efeitos do plano e da ponderação amostral.13
A comparação entre as prevalências de SM, para cada comorbidade e para a carga de doenças foi baseada em seus respectivos intervalos de confiança de 99% (IC99%). As razões de prevalência (RP), com seus respectivos IC99%, foram calculadas por meio de modelos de regressão simples e múltiplos de Poisson.14
O processo de modelagem estatística foi conduzido mediante modelo conceitual dos fatores determinantes da SM,10 aplicando-se abordagem hierarquizada nas análises e utilizando o método stepwise forward para a introdução das variáveis, considerando como elegíveis aquelas com p < 0,20 (análise univariada); permaneceram no modelo aquelas variáveis em que o IC99% não incluiu o “1” ou que contribuíram para o ajuste do modelo.
As associações entre a SM e os potenciais fatores associados foram inseridos de acordo com os fatores sociodemográficos, comportamentais e de comorbidades, analisados por meio de três modelos múltiplos. No nível distal da análise (Modelo 1) foram consideradas as variáveis sociodemográficas idade, escolaridade, cor da pele, situação conjugal e região de moradia; para a composição do Modelo 2, utilizaram-se as variáveis comportamentais atividade física e autopercepção de saúde, ajustadas pelo Modelo 1; por fim, no Modelo 3, foram introduzidas as variáveis referentes aos determinantes proximais (comorbidades) sendo seus efeitos ajustados pelo Modelo 2. Destaca-se que uma vez definido o conjunto de variáveis em um Modelo hierarquicamente superior este não sofria mais qualquer alteração nos outros níveis de análise.
A justificativa para preservar as variáveis em cada um dos modelos foi alicerçada na importância do resultado para a compreensão da ocorrência da SM e na magnitude do efeito, bem como sua variabilidade, aqui representada pelo IC99%.14 Além disso, as análises foram estratificadas por sexo, considerando que na análise descritiva a SM mostrou acometer de modo diferencial à população masculina e feminina, o que pode refletir fatores de associação distintos entre os grupos.
A descrição das características sociodemográficas, comportamentais e de comorbidades de 59.402 indivíduos com idade superior a 18 anos, de acordo com a ausência ou presença da SM estão descritas na Tabela 1. Foi identificada elevada frequência de indivíduos fisicamente inativos (98,1%) e 53,8% que apresentavam excesso de peso. Houve um relato predominante de autopercepção de saúde muito boa ou boa (65,9%) e uma frequência expressiva de baixa escolaridade (39,1%) entre os indivíduos.
Tabela 1 Características sociodemográficas, comportamentais e de comorbidades dos adultos e idosos - Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), Brasil, 2013
Variáveis | SM* | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
Total* | Masculino | Feminino | ||||
N = 59.402† | N = 25.920† | N = 33.482† | ||||
%* | IC99% | %* | IC99% | %* | IC99% | |
Idade | ||||||
18-59 anos | 81,8 | 80,9 - 82,5 | 83,3 | 82,4 - 84,1 | 80,4 | 79,6 - 81,1 |
≥ 60 anos | 18,2 | 17,4 - 19,0 | 16,7 | 15,9 - 17,5 | 19,6 | 18,8 - 20,9 |
Escolaridade | ||||||
> 8 anos | 60,9 | 59,7 - 62,0 | 60,2 | 58,9 - 61,4 | 61,5 | 60,5 - 62,5 |
≤ 8 anos | 39,1 | 37,9 - 40,2 | 39,8 | 38,6 - 41,0 | 38,5 | 37,4 - 39,5 |
Cor da Pele | ||||||
Branca | 47,4 | 46,4 - 48,5 | 46,8 | 45,7 - 47,9 | 48,1 | 47,0 - 49,1 |
Não branca § | 52,5 | 51,5 - 53,6 | 53,2 | 52,1 - 54,3 | 51,9 | 50,9 - 53,0 |
Situação Conjugal | ||||||
Não vive com companheiro | 55,7 | 54,6 - 56,7 | 53,4 | 52,2 - 54,6 | 57,8 | 56,8 - 58,8 |
Vive com companheiro | 44,3 | 43,2 - 45,3 | 46,6 | 45,4 - 47,8 | 42,2 | 41,2 - 43,2 |
Região de moradia | ||||||
NE/N | 34,0 | 33,3 - 34,7 | 34,2 | 33,4 - 35,1 | 33,8 | 32,9 - 34,6 |
SE/S/CO | 66,0 | 65,3 - 66,7 | 65,8 | 64,9 - 66,6 | 66,2 | 65,4 - 67,0 |
Atividade Física | ||||||
Ativo | 1,9 | 1,6 - 2,2 | 2,2 | 1,9 - 2,5 | 1,6 | 1,3 - 1,9 |
Inativo | 98,1 | 97,8 - 98,4 | 97,8 | 97,5 - 98,1 | 98,4 | 98,0 - 98,6 |
Autopercepção de saúde | ||||||
Muito boa/ boa | 65,9 | 65,0 - 66,9 | 70,3 | 69,3 - 71,2 | 62,1 | 61,1 - 63,1 |
Regular - Muito ruim | 34,1 | 33,0 - 34,9 | 29,7 | 28,8 - 30,7 | 37,9 | 36,9 - 38,9 |
Excesso de peso | ||||||
Não | 46,2 | 45,1 - 47,3 | 47,5 | 46,4 - 48,7 | 45,0 | 43,9 - 45,9 |
Sim | 53,8 | 52,7 - 54,9 | 52,5 | 51,3 - 53,6 | 55,0 | 54,0 - 56,0 |
Outras DCV ‡ | ||||||
Não | 95,8 | 95,3 - 96,2 | 96,1 | 95,6 - 96,5 | 95,5 | 95,1 - 95,9 |
Sim | 4,2 | 3,8 - 4,7 | 3,9 | 3,5 - 4,4 | 4,5 | 4,1 - 4,9 |
Insuficiência Renal Crônica | ||||||
Não | 98,6 | 98,3 - 98,8 | 98,6 | 98,4 - 98,9 | 98,5 | 98,2 - 98,7 |
Sim | 1,4 | 1,2 - 1,7 | 1,4 | 1,1 - 1,6 | 1,5 | 1,3 - 1,7 |
Acidente Vascular Cerebral | ||||||
Não | 98,5 | 98,2 - 98,7 | 98,4 | 98,1 - 98,6 | 98,5 | 98,3 - 98,7 |
Sim | 1,5 | 1,3 - 1,8 | 1,6 | 1,4 - 1,9 | 1,5 | 1,3 - 1,7 |
Depressão | ||||||
Não | 92,3 | 91,7 - 92,9 | 96,1 | 95,6 - 96,5 | 88,9 | 88,3 - 89,6 |
Sim | 7,7 | 7,1 - 8,2 | 3,9 | 3,5 - 4,4 | 11,1 | 10,4 - 11,7 |
SM: síndrome metabólica; IC 99%: intervalo de 99% de confiança; N: norte; NE: nordeste; SE: sudeste; S: sul; CO: centro-oeste; DCV: doença cardiovascular;
(*)Gerada considerando o peso amostral;
(†)Número de indivíduos no banco de dados;
(§)Amarelo, indígena, pardo, preto;
(‡) infarto, angina, insuficiência cardíaca ou outra.
Na Tabela 2 são apresentadas as prevalências de SM, das comorbidades e a carga dos componentes da SM na população brasileira. A obesidade abdominal foi o fator com maior prevalência neste estudo (65,2%, IC99% 64,4-65,9), seguindo-se da PA elevada (40,7%, IC99% 39,6-41,7). Observa-se que em todas as comorbidades, as mulheres apresentaram os resultados mais expressivos, sendo a PA elevada (46,9%, IC99% 45,5-48,3) a única condição em que os homens mostraram maior prevalência. No somatório dos componentes, verifica-se ainda que apenas ~1/4 da população não apresentou qualquer das alterações estudadas (23,8% [IC99% 22,9-24,7]), enquanto que 38,1% (IC99% 37,2-39,0) dos participantes já apresentavam pelo menos um dos componentes da SM e 29,2% (IC99% 28,3-30,1) conviviam com dois dos fatores considerados. A condição de SM foi estimada em 8,9% (IC99% 8,4-9,5) da população brasileira, com a proporção de mulheres nesta condição (10,3% [IC99% 9,6-11,2]) superando estatisticamente o observado na população masculina (7,5% [IC99% 6,7-8,3]).
Tabela 2 Prevalência (%) das comorbidades e carga de doenças (fatores de risco para SM), por sexo, dos adultos e idosos. Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), Brasil, 2013
Doença, carga e SM | Sexo | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
Total N = 59.402 |
Masculino N = 25.920 |
Feminino N = 33.482 |
||||
%* | IC99% | %* | IC99% | %* | IC99% | |
Diabetes | 7,1 | 6,6 - 7,6 | 6,3 | 5,6 - 7,2 | 7,8 | 7,1 - 8,5 |
PA elevada | 40,7 | 39,6 - 41,7 | 46,9 | 45,5 - 48,3 | 34,9 | 33,7 - 36,3 |
Hipercolesterolemia | 14,7 | 14,0 - 15,5 | 11,9 | 10,9 - 13,1 | 16,9 | 16,0 - 17,9 |
CC elevada | 65,2 | 64,4 - 65,9 | 55,6 | 54,0 - 57,1 | 73,9 | 72,7 - 75,0 |
Carga de doença | ||||||
0 | 23,8 | 22,9 - 24,7 | 28,0 | 26,7 - 29,4 | 19,9 | 18,8 - 21,1 |
1 | 38,1 | 37,2 - 39,0 | 34,8 | 33,5 - 36,2 | 41,0 | 39,8 - 42,3 |
2 | 29,2 | 28,3 - 30,1 | 29,7 | 28,4 - 31,0 | 28,7 | 27,6 - 29,9 |
3 | 7,5 | 7,1 - 8,1 | 6,5 | 5,8 - 7,3 | 8,5 | 7,8 - 9,3 |
4 | 1,4 | 0,9 - 1,2 | 1,0 | 0,7 - 1,3 | 1,8 | 1,5 - 2,2 |
Condição de SM† | 8,9 | 8,4 - 9,5 | 7,5 | 6,7 - 8,3 | 10,3 | 9,6 - 11,2 |
SM: síndrome metabólica; N: número de indivíduos no banco de dados; IC 99%: intervalo de 99% de confiança; PA: pressão arterial; CC: circunferência da cintura;
(*)Gerada considerando o peso amostral;
(†)Condição de SM, somatório da carga de doença ≥ 3 fatores.
A Tabela 3 apresenta a prevalência da SM segundo as variáveis de exposição estudadas. Destacam-se maiores prevalências do agravo entre indivíduos com maior idade (≥ 60 anos), menor tempo de escolaridade (≤ 8 anos) e que vivem com companheiro. A SM foi maior entre os indivíduos que residem nas regiões SE/S/CO, fisicamente inativos, com excesso de peso e que consideravam sua saúde precária. Quanto às comorbidades, de forma geral, maiores prevalências de SM foram encontradas entre os indivíduos que autorreferiram diagnóstico médico prévio de IRC, AVC e outras doenças cardiovasculares, em relação aos que afirmaram não apresentar a doença. Além disso, identificamos que, independentemente da característica ou condição considerada como risco, a prevalência de SM foi sempre maior dentre as mulheres.
Tabela 3 Prevalência de SM, segundo variáveis de exposição estudadas - Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), Brasil, 2013
Variáveis | SM* | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
Total | Masculino | Feminino | ||||
N = 59.402 | N = 25.920 | N = 33.482 | ||||
p (%)* | IC99% | p (%)* | IC99% | p (%)* | IC99% | |
Idade | ||||||
18-59 anos | 5,8 | 5,3 - 6,3 | 5,4 | 4,7 - 6,3 | 6,1 | 5,5 - 6,8 |
≥ 60 anos | 23,2 | 21,4 - 25,1 | 17,5 | 14,7 - 20,8 | 27,6 | 25,0 - 30,3 |
Escolaridade | ||||||
> 8 anos | 6,3 | 5,7 - 6,9 | 6,8 | 5,8 - 7,8 | 5,8 | 5,1 - 6,6 |
≤ 8 anos | 13,1 | 12,1 - 14,2 | 8,4 | 7,1 - 9,9 | 17,6 | 15,9 - 19,3 |
Cor da Pele | ||||||
Branca | 9,7 | 8,9 - 10,6 | 8,9 | 7,7 - 10,5 | 10,4 | 9,3 - 11,6 |
Não branca† | 8,3 | 7,5 - 9,0 | 6,1 | 5,2 - 7,1 | 10,3 | 9,2 - 11,4 |
Situação Conjugal | ||||||
Não vive com companheiro | 6,9 | 6,4 - 7,6 | 4,6 | 3,8 - 5,6 | 8,9 | 8,1 - 9,8 |
Vive com companheiro | 11,5 | 10,5 - 12,5 | 10,7 | 9,3 - 12,2 | 12,3 | 10,9 - 13,7 |
Região de moradia | ||||||
NE/N | 7,3 | 6,6 - 8,0 | 5,3 | 4,4 - 6,2 | 9,1 | 8,0 - 10,3 |
SE/S/CO | 9,8 | 9,1 - 10,6 | 8,6 | 7,5 - 9,8 | 10,9 | 9,9 - 12,1 |
Atividade Física | ||||||
Ativo | 1,8 | 0,7 - 4,9 | 2,5 | 0,7 - 8,6 | 1,0 | 0,3 - 3,4 |
Inativo | 9,1 | 8,6 - 9,7 | 7,6 | 6,8 - 8,4 | 10,5 | 9,7 - 11,3 |
Autopercepção de saúde | ||||||
Muito boa/ boa | 4,8 | 4,3 - 5,3 | 4,5 | 3,8 - 5,4 | 5,0 | 4,4, 5,7 |
Regular - Muito ruim | 17,1 | 15,9 - 18,3 | 14,4 | 12,5 - 16,5 | 19,0 | 17,4 - 20,7 |
Excesso de peso | ||||||
Não | 4,8 | 4,3 - 5,5 | 3,4 | 2,6 - 4,4 | 6,2 | 5,4 - 7,2 |
Sim | 12,5 | 11,7 - 13,4 | 11,1 | 9,9 - 12,5 | 13,7 | 12,5 - 14,9 |
Outras DCV ‡ | ||||||
Não | 8,3 | 7,7 - 8,8 | 6,9 | 6,1 - 7,7 | 9,5 | 8,8 - 10,3 |
Sim | 24,9 | 20,9 - 29,4 | 21,8 | 15,9 - 29,2 | 27,3 | 22,2 - 33,2 |
Insuficiência Renal Crônica | ||||||
Não | 8,8 | 8,2 - 9,3 | 7,2 | 6,4 - 8,1 | 10,2 | 9,4 - 11,0 |
Sim | 21,9 | 16,6 - 28,3 | 25,7 | 17,3 - 36,3 | 18,8 | 12,8 - 26,8 |
Acidente Vascular Cerebral | ||||||
Não | 8,7 | 8,1 - 9,2 | 7,2 | 6,4 - 8,1 | 10,0 | 9,3 - 10,8 |
Sim | 27,0 | 20,6 - 34,5 | 22,7 | 14,2 - 34,2 | 31,4 | 22,6 - 41,7 |
Depressão | ||||||
Não | 8,3 | 7,7 - 8,8 | 7,1 | 6,3 - 7,8 | 9,4 | 8,6 - 10,3 |
Sim | 17,1 | 14,6 - 19,9 | 15,6 | 10,7 - 22,3 | 17,6 | 14,7 - 20,9 |
SM: síndrome metabólica; P: prevalência; IC 99%: intervalo de 99% de confiança; N: norte; NE: nordeste; SE: sudeste; S: sul; CO: centro-oeste; DCV: doença cardiovascular;
(*)Gerada considerando o peso amostral;
(†)Amarelo, indígena, pardo, preto;
(‡)infarto, angina, insuficiência cardíaca ou outra.
Nas tabelas 4 e 5 estão disponíveis os resultados referentes ao processo de modelagem hierarquizado (modelo hipotético-causal), distintos para homens e mulheres, sobre os fatores associados à SM. No modelo final para a população feminina, identificamos que a probabilidade de ter SM foi maior dentre os indivíduos nas seguintes situações: idade ≥ 60 anos (RP 3,20 [IC99% 2,76-3,72]), escolaridade ≤ 8 anos (RP 1,46 [IC99% 1,23-1,74]), viver com companheiro (RP 1,27 [IC99% 1,11-1,45]), residir nas regiões SE/S/CO (RP 1,18 [IC99% 1,02-1,38]), autopercepção de saúde regular à muito ruim (RP 2,35 [IC99% 1,99-2,78]), AVC (RP 1,36 [IC99% 1,00-1,86]), outras DCV (RP 1,29 [IC99% 1,03-1,62]), excesso de peso (RP 2,09 [IC99% 1,79-2,42]) e depressão (RP 1,31 [IC99% 1,07-1,59]) (Tabela 4).
Tabela 4 Análise bivariável e modelos multivariáveis para os fatores associados com a síndrome metabólica entre mulheres brasileiras segundo níveis hierárquicos das variáveis de exposição estudadas - Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), Brasil, 2013
Variáveis | Análise bivariável | Modelo 1 | Modelo 2 | Modelo 3 | ||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
RP | IC99% | RP | IC99% | RP | IC99% | RP | IC99% | |
Idade | ||||||||
18-59 anos | 1 | 1 | 1 | 1 | ||||
≥ 60 anos | 4,49 | 3,90- 5,18 | 3,44 | 2,95- 4,01 | 2,99 | 2,56- 3,48 | 3,20 | 2,76- 3,72 |
Escolaridade | ||||||||
>8 anos | 1 | 1 | 1 | 1 | ||||
≤ 8 anos | 3,01 | 2,55- 3,55 | 1,98 | 1,67- 2,34 | 1,54 | 1,29- 1,83 | 1,46 | 1,23- 1,74 |
Situação Conjugal | ||||||||
Não vive com companheiro | 1 | 1 | 1 | |||||
Vive com companheiro | 1,37 | 1,18- 1,58 | 1,38 | 1,21- 1,58 | 1,33 | 1,17- 1,52 | 1,27 | 1,11- 1,45 |
Região de moradia | ||||||||
NE/N | 1 | 1 | 1 | 1 | ||||
SE/S/CO | 1,20 | 1,02- 1,41 | 1,18 | 1,01- 1,36 | 1,30 | 1,12- 1,52 | 1,18 | 1,02- 1,38 |
Cor da Pele | ||||||||
Branca | 1 | |||||||
Não branca* | 0,98 | 0,84- 1,15 | ||||||
Atividade Física | ||||||||
Ativo | 1 | |||||||
Inativo | 10,06 | 3,08- 32,84 | ||||||
Autopercepção de saúde | ||||||||
Muito boa/ boa | 1 | 1 | 1 | |||||
Regular - Muito ruim | 3,76 | 3,23- 4,38 | 2,65 | 2,24- 3,14 | 2,35 | 1,99- 2,78 | ||
Acidente Vascular Cerebral | ||||||||
Não | 1 | 1 | ||||||
Sim | 3,13 | 2,29- 4,27 | 1,36 | 1,00- 1,86 | ||||
Outras DCV† | ||||||||
Não | 1 | 1 | ||||||
Sim | 2,86 | 2,32- 3,51 | 1,29 | 1,03- 1,62 | ||||
Excesso de peso | ||||||||
Não | 1 | 1 | ||||||
Sim | 2,19 | 1,85- 5,59 | 2,09 | 1,79- 2,42 | ||||
Depressão | ||||||||
Não | 1 | 1 | ||||||
Sim | 1,86 | 1,54- 2,26 | 1,31 | 1,07- 1,59 | ||||
Insuficiência Renal Crônica | ||||||||
Não | 1 | |||||||
Sim | 1,84 | 1,26- 2,69 |
RP: razão de prevalência; IC 99%: intervalo de 99% de confiança; N: norte; NE: nordeste; SE: sudeste; S: sul; CO: centro-oeste; DCV: doença cardiovascular;
(*)Amarelo, indígena, pardo, preto;
(†)infarto, angina, insuficiência cardíaca ou outra.
Tabela 5 Análise bivariável e modelos multivariáveis para os fatores associados com a síndrome metabólica entre homens brasileiros segundo níveis hierárquicos das variáveis de exposição estudadas - Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), Brasil, 2013
Variáveis | Análise bivariável | Modelo 1 | Modelo 2 | Modelo 3 | ||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
RP | IC99% | RP | IC99% | RP | IC99% | RP | IC99% | |
Idade | ||||||||
18-59 anos | 1 | 1 | 1 | 1 | ||||
≥ 60 anos | 3,23 | 2,55- 4,08 | 2,74 | 2,17- 3,46 | 2,07 | 1,61- 2,67 | 2,60 | 2,04- 3,31 |
Escolaridade | ||||||||
> 8 anos | 1 | |||||||
≤ 8 anos | 1,24 | 0,99- 1,54 | ||||||
Situação Conjugal | ||||||||
Não vive com companheiro | 1 | 1 | 1 | 1 | ||||
Vive com companheiro | 2,30 | 1,82- 2,92 | 1,81 | 1,43- 2,30 | 1,74 | 1,37- 2,20 | 1,48 | 1,17- 1,88 |
Região de moradia | ||||||||
NE/N | 1 | 1 | 1 | 1 | ||||
SE/S/CO | 1,63 | 1,31- 2,02 | 1,49 | 1,20- 1,85 | 1,74 | 1,40- 2,14 | 1,57 | 1,28- 1,94 |
Cor da Pele | ||||||||
Branca | 1 | |||||||
Não branca† | 0,67 | 0,54- 0,84 | ||||||
Atividade Física | ||||||||
Ativo | 1 | |||||||
Inativo | 3,02 | 0,84- 10,90 | ||||||
Autopercepção de saúde | ||||||||
Muito boa/ boa | 1 | 1 | 1 | |||||
Regular - Muito ruim | 3,17 | 2,51- 4-01 | 2,72 | 2,12- 3,50 | 2,59 | 2,01- 3,33 | ||
Acidente Vascular Cerebral | ||||||||
Não | 1 | |||||||
Sim | 3,15 | 1,99- 4,98 | ||||||
Outras DCV‡ | ||||||||
Não | 1 | |||||||
Sim | 3,17 | 2,29- 4,39 | ||||||
Excesso de peso | ||||||||
Não | 1 | 1 | ||||||
Sim | 3,27 | 2,45- 4,37 | 3,58 | 2,73- 4,70 | ||||
Depressão | ||||||||
Não | 1 | 1 | ||||||
Sim | 2,19 | 1,49- 3,23 | 1,41 | 0,98- 2,02 | ||||
Insuficiência Renal Crônica | ||||||||
Não | 1 | 1 | ||||||
Sim | 3,57 | 2,41- 5,28 | 1,85 | 1,23- 2,76 |
RP: razão de prevalência; IC 99%: intervalo de 99% de confiança; N: norte; NE: nordeste; SE: sudeste; S: sul; CO: centro-oeste; DCV: doença cardiovascular;
(*) Amarelo, indígena, pardo, preto;
(†)infarto, angina, insuficiência cardíaca ou outra.
Em relação à população masculina, o modelo final não incluiu as variáveis de escolaridade, cor da pele, outras DVC e AVC, permanecendo a idade ≥ 60 anos (RP 2,60 [IC99% 2,04-3,31]), viver com companheiro (RP 1,48 [IC99% 1,17-1,88]), residir nas regiões SE/S/CO (RP 1,57 [IC99% 1,28-1,94]), ter pior (“regular à muito ruim”) autopercepção de saúde (RP 2,59 [IC99% 2,01-3,33]) e apresentar IRC (RP 1,85 [IC99% 2,23-2,76]), excesso de peso (RP 3,58 [IC99% 2,73-4,70]) e depressão (RP 1,41 [IC99% 0,98-2,02]) (Tabela 5).
Em relação a variável atividade física, para não comprometer a análise, optamos por não incluí-la no modelo, haja vista a baixa prevalência de indivíduos fisicamente ativos (1,8%), o que resultaria em estimativas pouco precisas, decorrente de grande erro-padrão (Tabela 4 e 5). Além disso, considerando o referencial adotado, tornam-se desnecessárias tais comparações, uma vez que quase a totalidade da população brasileira é caracterizada como fisicamente inativa (98,1%) (Tabela 1).
A SM é um fenômeno multidimensional determinado pela interação de um conjunto de fatores que afeta a qualidade de vida das pessoas.3 Apesar da existência de estudos sobre doenças crônicas e seus fatores de risco na população brasileira,15 como é o caso do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto, não se tem até o momento, dados com representatividade nacional da prevalência de SM no país. Assim, o presente estudo avaliou pela primeira vez os fatores associados à SM em uma amostra representativa da população brasileira com idade superior a 18 anos, o que representa um marco na investigação do agravo no Brasil, colaborando na construção de evidências capazes de direcionar estratégias resolutivas de prevenção e controle deste agravo.
Nós identificamos que aproximadamente 9% da população brasileira apresentou a condição de SM, de acordo com a definição de harmonização dos consensos.4 Não obstante, nosso estudo revela dados preocupantes, ao contabilizar que somente 23,8% da população não apresenta nenhum dos componentes da SM, e que 67,3% apresentam entre um e dois componentes para caracterizar este desfecho, o que demonstra elevado número de indivíduos sob o risco de desenvolver a SM propriamente dita.
Em relação ao sexo, a maior ocorrência de SM foi encontrada entre a população feminina (10,3%, IC99% 9,6-11,2), fato que vem sendo amplamente registrado na literatura científica,16,17 especialmente dentre aquelas com idade > 59 anos, o que pode ser explicado pelas modificações hormonais ocorridas após a menopausa.17 Nesta fase do ciclo da vida há uma tendência de acúmulo de gordura abdominal, bem como de aumento da densidade das partículas de LDL circulantes na corrente sanguínea, tornando-as mais aterogênicas, condições conhecidamente associadas ao maior risco de DCV.18 Pode-se ainda destacar o elevado número de morbidades encontrado entre as mulheres deste estudo, que apresentaram maiores prevalências de diabetes, hipercolesterolemia e obesidade abdominal, em relação ao sexo masculino.
A diferenciação considerável na prevalência e combinações de anormalidades da SM entre os sexos sugere uma fisiopatologia distinta entre homens e mulheres,19 possivelmente explicada pelos diferentes níveis de hormônios sexuais que influenciam os mecanismos regulatórios do metabolismo.20 A maior atividade andrógena encontrada entre os homens, assim como a redução dos níveis de estrogênios ocorrido após a menopausa entre as mulheres são condições que favorecem um aumento na gordura abdominal visceral e na concentração de lipídeos na corrente sanguínea, o que está correlacionado com resistência à insulina, hipertensão e aumento do risco cardiovascular.20
Entre os componentes da SM, destaca-se na população estudada os resultados de CC elevada (65,2%, IC99% 64,4-65,9). A obesidade abdominal desempenha papel importante na SM,21,22 pois está associada a uma desordem metabólica capaz de influenciar, de forma prejudicial, a parede da artéria, acarretando em desregulação da vasoconstricção, ativação de cascatas inflamatórias e elevação dos efeitos das adipocinas, considerados fatores indutores de DCV.22 Estudo de coorte conduzido por Lee et al.,22 mostrou que o aumento adicional de 500cm3 no volume de gordura subcutânea e visceral está associado com a incidência de SM e agravamento dos fatores de risco para DCV.22 Uma coorte de indivíduos obesos conduzida na Itália mostrou que a obesidade abdominal contribuiu para prevalência de SM em mulheres obesas, mas não em homens.19
Em nosso trabalho, uma possível explicação para a alta prevalência de CC elevada pode decorrer dos menores pontos de corte estabelecidos pela padronização por etnia para a obesidade abdominal (≥ 90 cm para homens e ≥ 80 cm para mulheres),4 se comparada com os valores limítrofes instituídos pelo NCEP-ATPIII (102 cm para homens e 88 cm para mulheres).23 Conquanto, esta prevalência elevada e preocupante de obesidade abdominal na população brasileira se reflete na elevação do risco de desenvolver algum agravo cardiovascular22 e os consequentes riscos de aumento da morbimortalidade e impacto sobre o sistema de saúde.2
A relação positiva entre a prevalência da SM e o aumento da idade, aqui encontrada, tem sido amplamente divulgada, especialmente pelas diferenças atribuídas ao sexo,17 não somente pelo efeito cumulativo, reflexo do tempo de exposição aos fatores de risco relacionados aos comportamentos alimentares inadequados e estilos de vida não saudáveis, como também pela contribuição dos fatores biológicos em ambos os sexos, devido a relação direta com o equilíbrio nos níveis de testosterona/estrogênio, especificamente, entre as mulheres.20 A SM tem sido ligeiramente mais diagnosticada entre os homens com menos de cinquenta anos de idade, fato que se inverte após cinquenta anos, ao afetar com maior magnitude a população feminina.17
Do ponto de vista sociodemográfico, este estudo mostrou que viver nas regiões SE/S/CO se apresentou como fator associado a SM, o que pode ser explicado, em parte, por estas regiões concentrarem os principais centros urbanos do país, contribuindo na promoção de estilos de vida caracterizados por hábitos alimentares não saudáveis e baixa frequência de exercícios físicos, que tem por consequência o aumento do risco de obesidade, DM tipo 2, hipertensão arterial, DCV e SM.5
Em uma revisão sistemática realizada entre países da América do Sul essa hipótese foi confirmada ao mostrar que um padrão de hábitos alimentares e estilo de vida ocidentais foram encontrados em maior proporção nas grandes áreas urbanas, onde doenças crônicas não transmissíveis foram relacionadas a estes comportamentos.24 Além disso, por meio de pesquisa conduzida no Brasil, foi evidenciado que houve consumo elevado de calorias nas capitais situadas nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, enquanto nas capitais do Norte e Nordeste foi observado um consumo abaixo da média entre a população.25
É importante destacar que nessas regiões de grandes centros urbanos, a sociedade é cada vez mais induzida por mensagens veiculadas de ofertas de alimentos, dietas e comportamentos ocidentais.26 Nos últimos anos, no Brasil, as regiões metropolitanas tem apresentado redução no consumo domiciliar de arroz polido, feijão, cereais e leguminosas (queda de 60%, 49% e 25% respectivamente), com concomitante aumento contínuo do consumo de alimentos como: bebidas e infusões (22% e 24%), alimentos preparados e misturas industriais (67%), destacando-se o crescimento em 490% da quantidade adquirida de refrigerante entre os anos de 1974 a 2009, evidenciando uma mudança de comportamento alimentar que nem sempre favorece escolhas saudáveis em regiões desenvolvidas.27
Nossos resultados mostraram ainda que o nível de escolaridade mais baixo foi associado à prevalência de SM nas mulheres, porém tal associação não foi evidenciada entre a população masculina. Esse achado é consistente com a literatura internacional, como foi observado em um estudo conduzido na China, onde o nível educacional também apresentou relação inversa com a prevalência de SM estritamente entre as mulheres.28 Na Coréia, distintamente, foi identificado que homens com menor escolaridade apresentavam menores razões de chances (OR) tanto para SM (OR 0,76, IC 95% 0,60-0,96), quanto para dois de seus componentes isolados: CC elevada (OR 0,73, IC 95% 0,60-0,91) e baixo colesterol HDL (OR 0,73, IC 95% 0,59-0,91), quando comparados aos homens de maior escolaridade.29 Ainda neste estudo, entre as mulheres socialmente desfavorecidas com menor nível de educação, desempregadas, menor nível de renda e que realizavam trabalhos manuais foi observada uma maior prevalência de SM, assim como destacado em nossos resultados quanto ao nível de educação.29
Todavia, resultado antagônico foi notado em uma população masculina de alto nível educacional, onde a distribuição de fatores de risco cardiovascular foi mais observada neste estrato populacional. Isso pode ser reflexo do ambiente socioeconômico, que aumenta o risco de SM em um dos gêneros, de maneira mais específica.30
Em relação a variável situação conjugal, não está claro como o estado civil contribui para a SM. No presente estudo, a situação de viver com companheiro se mostrou associado a SM e em maior magnitude na população masculina. Tal constatação foi também evidenciada entre australianos, onde as mulheres que se casaram ganharam mais peso em comparação com as não casadas, após ajuste dos potenciais fatores de confusão.31 Do mesmo modo, no estudo de Averett et al.,32 o casamento foi associado a um risco aumentado de sobrepeso/obesidade, tanto para homens quanto para mulheres.32
Ortega et al.,33 em 2011, identificaram que o sexo afeta a relação entre obesidade, fatores de risco cardiometabólicos e estado civil devido a mudanças em fatores comportamentais.33 Embora a maioria dos estudos tenha relatado que as pessoas casadas tornaram-se mais sedentárias,34 com reflexo direto no excesso de peso e impacto nas comorbidades desencadeadoras da SM, colaborando com os resultados encontrados neste trabalho, outros estudos mostram resultados diferentes, atribuindo ao tipo de relação conjugal o desfecho da SM.26,35 Nesse caso, considera-se que relações conjugais positivas podem proteger de situações estressantes, fornecendo tanto benefícios materiais quanto de suporte, enquanto que relações negativas ou a falta de um relacionamento podem aumentar a exposição aos conflitos, com consequente elevação do nível de estresse,35 fator reconhecidamente associado à SM.10
Em relação aos aspectos comportamentais, identificamos que a autopercepção de saúde negativa “regular à muito ruim” foi um importante fator associado à SM. A autopercepção de saúde é um indicador global no qual a pessoa considera, além de possíveis doenças que a acometam, o impacto que as mesmas geram no bem-estar físico, social e mental.32 Na Espanha, contrapondo os nossos resultados, em estudo multicêntrico e observacional realizado com portadores de DM e/ou SM recentemente diagnosticada, 42,2% dos indivíduos acreditavam ter boa ou excelente saúde, representando pouca consciência acerca do risco cardiovascular que apresentavam.36 Neste trabalho a associação da autopercepção negativa “regular à muito ruim” com a SM chama a atenção, porque pode refletir que a população estudada apresentou consciência de sua condição de saúde, porém permanece situada dentro da faixa de risco para desenvolvimento de complicações metabólicas, supondo que possam existir outros fatores que a impeçam de sair desta condição e que mereçam serem melhor investigados.
Quanto à prevalência e à associação da SM com as comorbidades (DCV, AVC e depressão), todas se mostraram em maior frequência entre o sexo feminino comparativamente ao sexo masculino, com exceção da IRC. A associação entre SM e IRC encontrada exclusivamente entre os homens, pode em parte ser justificada pela alta prevalência de hipertensão arterial instalada neste grupo.19 Nas últimas décadas, tornou-se cada vez mais evidente que o prognóstico de pacientes hipertensos é fortemente afetado pelo comprometimento renal, especialmente em termos de mortalidade e eventos cardiovasculares.37 Em relação ao maior número de comorbidades associadas à SM entre as mulheres do estudo, pode ser explicado, parcialmente, pela baixa procura dos homens pelos serviços de saúde, o que gera um subdiagnóstico.2
As DCV constituem a primeira causa de morte no Brasil,2 devendo ser prioridade de saúde pública, por meio de políticas para sua prevenção e controle. A direção da associação entre DCV e SM foi demonstrada em uma coorte dinamarquesa, em que mulheres idosas com SM apresentaram um risco de 1,7 (IC95% 1,44-2,05) para o desenvolvimento de DCV.38 Esta correlação também pode ser explicada por Salas et al.,16 que mostraram que adultos obesos, principalmente as mulheres, correm particularmente o risco de desenvolver SM, com implicações significativas para sua saúde, sobretudo DCV e diabetes. Estes resultados destacam a importância da perda de peso para reduzir as morbidades associadas à SM.16
Outra condição de doença associada à SM foi a depressão, com maior prevalência encontrada entre as mulheres. Do mesmo modo, estudo conduzido na Coréia com indivíduos de meia idade entre 40-64 anos, encontrou elevada prevalência entre as mulheres 11,7%, comparativamente aos homens 4,1%.39 Esses achados podem ser sugestivos do que foi encontrado em uma coorte prospectiva entre a população holandesa, onde a depressão foi consideravelmente associada à maior CC e ao nível de triglicerídeos durante um seguimento de 6 anos.40 Nesse contexto esses resultados podem supor que a idade mais avançada pode estar associada a um aumento da resposta ao estresse e do nível de cortisol mais frequentemente entre as mulheres do que entre os homens.39
O padrão metodológico reforçou a robustez dos resultados apresentados, porém algumas limitações devem ser abordadas. Até o momento de submissão deste estudo, o IBGE não havia publicado os dados laboratoriais de HDL, o que nos levou caracterizar à SM na ocorrência de três dentre os quatro - e não cinco - componentes disponíveis no banco de dados.
Outro ponto concerne à utilização de diagnósticos médicos autorreferidos. A população investigada respondeu se “algum médico já lhe deu o diagnóstico de diabetes?” ou “(...) hipercolesterolemia?”, o que reduz o viés de classificação, pois foram consideradas presentes quando havia resposta positiva ao diagnóstico médico anterior destas doenças; por outro lado, dadas as questões de subdiagnóstico, há a possibilidade real da presença de indivíduos que desconheciam sua condição de saúde no momento da entrevista. De qualquer modo, mesmo diante dessas situações, observamos que a elevada prevalência da SM em nosso estudo é consistente com a literatura,7,10,16 o que alerta para a possibilidade de que esta prevalência possa estar subestimada, implicando em um prognóstico negativo para a população brasileira com idade ≥ 18 anos.
Outra limitação deste estudo é o delineamento transversal, razão pela qual os fatores socioeconômicos, comportamentais e as comorbidades aqui analisados não podem, inequivocamente, serem considerados causais para a SM. Especialmente no que concerne às comorbidades, é importante destacar o papel da causalidade reversa nas associações identificadas, uma vez que o início do curso clínico para as DCV, AVC, depressão e IRC seria a SM, apesar do delineamento não permitir afirmar que este fato aconteceu na população estudada. Todavia, a utilização de dados com representatividade nacional e de um modelo conceitual para embasar não apenas a seleção das variáveis, mas também a estratégia analítica, permite produzir informações relevantes para o diagnóstico das condições de saúde da população brasileira, no que se refere à SM, alinhadas com as prioridades nacionais de saúde pública.
Identificamos elevada prevalência de SM na população adulta e idosa no Brasil, sendo que esta esteve associada com variáveis sociodemográficas (idade, escolaridade, situação conjugal e região de moradia), comportamentais (autopercepção de saúde) e de comorbidades (AVC, DVC, excesso de peso, depressão e IRC) de forma diferente entre os sexos.
Por fim, a relevância da carga de cada componente da SM, reitera a SM como ferramenta clínica e epidemiológica na identificação de indivíduos e grupos populacionais com maior vulnerabilidade à ocorrência de DCV e como norteadora de intervenções custo-efetivas sobre os fatores apresentados. Assim, nossos resultados sugerem a necessidade de fortalecimento de políticas públicas de promoção de saúde a fim de favorecer a adoção de comportamentos saudáveis, de outro modo, será pouco provável o cumprimento das metas previstas no Plano Nacional de Enfrentamento das DCNT no Brasil: 2011-2022.