versão impressa ISSN 0066-782X
Arq. Bras. Cardiol. vol.103 no.5 São Paulo nov. 2014 Epub 12-Set-2014
https://doi.org/10.5935/abc.20140138
Pazopanibe (PZP) pode induzir prolongamento da repolarização cardíaca e efeitos pró-arrítmicos, à semelhança de outros inibidores da tirosina quinase. Objetivos: Demonstrar prolongamento da repolarização cardíaca e efeitos eletrofisiológicos pró-arrítmicos induzidos pelo PZP, assim como investigar possíveis efeitos de metoprolol e diltiazem na prevenção de alterações no ECG (prolongamento do intervalo QT) em um modelo experimental em ratos.
Ratos Sprague-Dawley adultos machos (24) foram designados de modo aleatório para quatro grupos (n = 6). O primeiro grupo (normal) recebeu 4 ml de água da torneira, enquanto os demais receberam 100 mg/kg de PZP (comprimido de Votrient®) através de sonda orogástrica. Após 3 horas, os animais receberam por via intraperitoneal: solução salina, para o grupo normal e para o segundo grupo (controle-PZP+SP); 1 mg/kg de metoprolol (Beloc, Ampola, AstraZeneca), para o terceiro grupo (PZP+metoprolol); e 1mg/kg de diltiazem (Diltiazem, Mustafa Nevzat), para o quarto grupo (PZP+diltiazem). Uma hora após a administração desses medicamentos, e sob anestesia, calculou-se o intervalo QTc registrando-se o ECG em DI.
Os valores médios do intervalo QTc foram: grupo normal, 99,93 ± 3,62 ms; grupo controle-PZP+SP, 131,23 ± 12,21 ms; grupo PZP+metoprolol, 89,36 ± 3,61 ms; e grupo PZP+diltiazem, 88,86 ± 4,04 ms. Os grupos PZP+metoprolol e PZP+diltiazem apresentaram intervalos QTc significativamente mais curtos comparados aos do grupo controle-PZP+SP (p < 0,001).
Ambos metoprolol e diltiazem evitaram o prolongamento do intervalo QT induzido por PZP. Tais medicamentos podem ser uma promissora estratégia para evitar o prolongamento do intervalo QTc associado ao uso de inibidores da tirosina quinase.
Palavras-Chave: Arritmias Cardíacas / terapia; Pirimidinas / efeitos adversos; Sistema de Condução Cardíaco / fisiologia; Coração / fisiologia
Pazopanib (PZP) may induce prolonged cardiac repolarization and proarrhythmic effects, similarly to other tyrosine kinase inhibitors.
To demonstrate PZP-induced prolonged cardiac repolarization and proarrhythmic electrophysiological effects and to investigate possible preventive effects of metoprolol and diltiazem on ECG changes (prolonged QT) in an experimental rat model.
Twenty-four Sprague-Dawley adult male rats were randomly assigned to 4 groups (n = 6). The first group (normal group) received 4 mL of tap water and the other groups received 100 mg/kg of PZP (Votrient® tablet) perorally, via orogastric tubes. After 3 hours, the following solutions were intraperitoneally administered to the animals: physiological saline solution (SP), to the normal group and to the second group (control-PZP+SP group); 1 mg/kg metoprolol (Beloc, Ampule, AstraZeneca), to the third group (PZP+metoprolol group); and 1mg/kg diltiazem (Diltiazem, Mustafa Nevzat), to the fourth group (PZP+diltiazem group). One hour after, and under anesthesia, QTc was calculated by recording ECG on lead I.
The mean QTc interval values were as follows: normal group, 99.93 ± 3.62 ms; control-PZP+SP group, 131.23 ± 12.21 ms; PZP+metoprolol group, 89.36 ± 3.61 ms; and PZP+diltiazem group, 88.86 ± 4.04 ms. Both PZP+metoprolol and PZP+diltiazem groups had significantly shorter QTc intervals compared to the control-PZP+SP group (p < 0.001).
Both metoprolol and diltiazem prevented PZP-induced QT interval prolongation. These drugs may provide a promising prophylactic strategy for the prolonged QTc interval associated with tyrosine kinase inhibitor use.
Key words: Arrhythmias, Cardiac / therapy; Pyrimidines / adverse effects; Heart Conduction System / physiology; Heart / physiology
Os inibidores da tirosina quinase (TKIs) dirigidos a múltiplos alvos tornaram-se importantes para o tratamento de várias malignidades nos últimos anos1. Sorafenibe é um inibidor da Raf quinase que inibe os receptores do fator de crescimento endotelial vascular 1, 2 e 3 (VEGFr-1, -2 e -3, respectivamente), o receptor do fator de crescimento derivado de plaqueta (PDGFr-b), a tirosina quinase-3 semelhante a Fms (Flt-3) e c-kit. Sunitinibe inibe VEGFr-1, -2 e -3, PDGFr-a e -b, c-kit, Flt-3, fator estimulante de colônia de granulócitos tipo 1, e receptor do fator neurotrófico derivado da glia (RET)2. Pazopanibe é um potente TKI dirigido a múltiplos alvos, tais como VEGFr, PDGFr e c-kit2,3. Há muitos estudos em andamento com pazopanibe em diferentes tipos de tumores. Pazopanibe mostrou-se ativo em monoterapia para pacientes com câncer avançado de células renais, para cujo tratamento foi aprovado4.
Ao explorarem o índice terapêutico dos TKIs, os pesquisadores de oncologia confrontam-se com efeitos adversos dos medicamentos, como a toxicidade cardíaca5. O prolongamento do intervalo QT tem chamado atenção devido ao risco de graves arritmias cardíacas, como torsade de pointes, podendo associar-se com arritmia ventricular e morte súbita cardíaca6.
Vários estudos relataram prolongamento do intervalo QTc com o uso de TKIs, tais como sunitinibe7,8, vandetanibe7,9,10, dasatinibe7 e crizotinibe11. No entanto, dados sobre a ocorrência de prolongamento do intervalo QTc com o tratamento com pazopanibe são limitados. Metoprolol é um agente antiarrítmico classe 2 segundo a classificação de Vaughan-Williams e membro do grupo dos betabloquedores12. Diltiazem é um agente antiarrítmico classe 4, pertencente ao grupo dos medicamentos não diidropiridina, conhecidos como bloqueadores dos canais de cálcio12. Este estudo teve por objetivo demonstrar que pazopanibe induz prolongada repolarização cardíaca, assim como investigar os possíveis efeitos corretivos do metoprolol e diltiazem nas alterações eletrocardiográficas em um modelo experimental.
Após a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Animais, os experimentos foram realizados segundo as regras do Guia de Cuidados e Uso de Animais de Laboratório adotado pelo National Institutes of Health Norte-Americano. Os animais receberam dieta sem restrições e foram alojados aos pares em gaiolas de aço, em ambiente com temperatura controlada (22 ± 2 ºC) e ciclos de claro/escuro de 12 horas. Os procedimentos experimentais foram aprovados pelo Comitê de Pesquisa Animal da Universidade de Ege. Todos os estudos animais atenderam rigorosamente às diretrizes de experimento animal do Comitê para Cuidados Humanizados.
Os eletrocardiogramas (ECG) foram registrados em ratos machos anestesiados na posição de pronação. Os eletrodos consistiram em agulhas de calibre 26 colocadas por 1 cm no subcutâneo. As derivações padrão nos membros foram construídas a partir de eletrodos colocados nas patas. Os ratos foram anestesiados com uma combinação de 40 mg/kg de cloridrato de quetamina (Alfamine®, Ege Vet, Alfasan International B.V., Holanda) e 4 mg/kg de cloridrato de xilazina (Alfazyne®, Ege Vet, Alfasan International B.V., Holanda), administrados por via intraperitoneal. O ECG foi registrado sob anestesia na derivação DI (Biopac MP 150). Os seguintes parâmetros foram avaliados usando-se o programa Biopac Student Lab Pro, versão 3.6.7 (BIOPAC Systems, Inc.): intervalo QT, duração da onda T e frequência cardíaca. Utilizou-se a fórmula de Fridericia para calcular o intervalo QTc.
Os ratos foram designados de modo aleatório para quatro grupos (n = 6), que são detalhados na Tabela 1. O primeiro grupo (grupo normal) recebeu 4 ml de água potável, enquanto os demais receberam 100 mg/kg de pazopanibe através de sonda orogástrica. Comprimidos contendo 200 mg de pazopanibe (Votrient®, GlaxoSmithKline) foram esmagados e suspensos em água potável até a concentração de 10 mg/ml. De acordo com o peso de cada rato, a solução do medicamento em suspensão foi complementada até 4 ml com água potável e administrada através de sonda orogástrica. Três horas após a administração oral de pazopanibe, os animais receberam por via intraperitoneal: solução salina (SP), para o grupo normal e para o segundo grupo (grupo controle-PZP+SP); 1 mg/kg de metoprolol (Beloc, Ampola, AstraZeneca), para o terceiro grupo (grupo PZP+metoprolol); e 1mg/kg de diltiazem (Diltiazem, Mustafa Nevzat), para o quarto grupo (grupo PZP+diltiazem). Uma hora após a administração desses medicamentos, e sob anestesia, calculou-se o intervalo QTc registrando-se o ECG em DI. Um observador (O.E.), cego para os dados de laboratório, mediu os intervalos QT do início do complexo QRS até o final da onda T. Seis batimentos consecutivos foram avaliados, e as médias aritméticas dos intervalos RR e QT foram obtidas.
Tabela 1 Descrição detalhada dos grupos
Grupos | Início do estudo (sonda orogástrica) | 3 horas depois (intraperitoneal) | 1 hora depois |
---|---|---|---|
Grupo 1 (normal) (n=6) | Água potável | SP | ECG são registrados |
Grupo 2 (controle-PZP+SP) (n=6) | PZP | SP | |
Grupo 3 (PZP+metoprolol) (n=6) | PZP | Metoprolol | |
Grupo (PZP+diltiazem) (n=6) | PZP | Diltiazem |
PZP: pazopanibe; SP: solução salina.
Os resultados foram apresentados como média ± erro padrão da média (EPM). Utilizou-se o teste de Shapiro-Wilk para testar as distribuições normais. Todas as variáveis apresentaram distribuição normal. Usou-se Análise de Variância de um fator (ANOVA) para avaliar os grupos com variáveis contínuas de distribuição normal. O teste de Bonferroni para múltiplas comparações foi realizado. A análise dos dados foi realizada com o programa SPSS, versão 15.0, para Windows (Chicago, IL, EUA).
Adotou-se o valor de p < 0,05 como estatisticamente significativo, e o valor de p < 0,001 como altamente significativo.
A Figura 1 mostra os ECGs de todos os grupos, e a Tabela 2 resume os intervalos QTc de todos os grupos.
Figura 1 a) ECG do grupo normal de ratos que receberam apenas solução salina sem pazopanibe (PZP); b,c,d) Alterações do ECG em ratos que receberam solução salina, metoprolol e diltiazem 3 horas após a administração de PZP; b) Prolongamento do intervalo QT no grupo controle de ratos que receberam apenas solução salina após a administração de PZP; c) Encurtamento do intervalo QT no grupo PZP+metoprolol; d) Encurtamento do intervalo QT no grupo PZP+diltiazem. Os intervalos QT são mostrados nas áreas negras.
Tabela 2 Valores dos intervalos QTc em todos os grupos
Grupos | QTc (ms) | Frequência cardíaca (bpm) | Duração da onda T (ms) | Duração do QT (ms) |
---|---|---|---|---|
Grupo normal | 99,93 ± 3,62 | 266 ± 21,69 | 28,33 ± 1,21 | 60,83 ± 0,98 |
PZP+SP (controle) | 131,23 ± 12,21** | 231,33 ± 67,95 | 47 ± 4,09** | 85 ± 9,33** |
PZP+metoprolol | 89,36 ± 3,61†† | 164,67 ± 27,04† | 29,33 ± 2,73†† | 64 ± 0,89†† |
PZP+diltiazem | 88,86 ± 4,04†† | 176,67 ± 9,30† | 29,67 ± 1,36†† | 62 ± 1,78†† |
PZP: pazopanibe; SP: solução salina; bpm: batimentos por minuto.
**p < 0,001 grupo controle comparado ao grupo normal
†p < 0,05 grupo diltiazem ou metoprolol comparado ao grupo controle
††p < 0,001 grupo diltiazem ou metoprolol comparado ao grupo controle.
O intervalo QTc foi significativamente mais longo no grupo controle-PZP+SP do que no grupo normal (131,23 ± 12,21 ms vs 99,93 ± 3,62 ms, respectivamente) (p < 0,001).
Tanto o tratamento com metoprolol quanto o tratamento com diltiazem encurtaram significativamente os intervalos QTc em comparação aos do grupo controle-PZP+SP (89,36 ± 3,61 ms, 88,86 ± 4,04 vs 131,23 ± 12,21 ms, respectivamente) (p < 0,001).
Vários medicamentos da classe 'terapia molecular alvo-dirigida', tais como os TKIs dirigidos a múltiplos alvos, inibidores da histona desacetilase, agentes dirigidos a alvos vasculares, inibidores da proteína farnesil transferase (FTPase), inibidores da proteína quinase C, e inibidores da quinase Src/Abl, mostraram ter um efeito no intervalo QT13.
A síndrome do QT longo (SQTL) é um distúrbio do sistema elétrico do coração que pode ser hereditário (congênito) ou adquirido. A SQTL congênita em geral resulta de distúrbios nos canais iônicos de sódio ou potássio da membrana cardíaca14. A evolução clínica dos pacientes com SQTL varia, devido à incompleta penetrância do prolongamento do intervalo QT, que pode ou não causar arritmias. Quanto ao risco de desenvolvimento de eventos cardíacos que ameaçam a vida, tais como torsade de pointes e parada cardíaca, os pacientes com SQTL podem ser classificados nas seguintes três categorias principais: risco muito alto, risco alto e risco baixo. Aqueles com baixo risco podem apresentar apenas prolongamento do intervalo QT, sendo o risco de eventos cardíacos que ameaçam a vida de 0,5%15. Os principais desequilíbrios eletrolíticos associados com intervalo QT longo são hipocalcemia, hipofosfatemia, hipocalemia e hipomagnesemia16. Em geral, os agentes farmacológicos que causam significativo prolongamento do intervalo QT apresentam efeitos bloqueadores dos canais de potássio que afetam predominantemente a corrente repolarizante retificadora tardia, IK (que é a soma de dois componentes distintos cinética- e farmacologicamente: um rápido, IKr, e outro lento, IKs), que desempenha importante papel na atividade elétrica dos miócitos ventriculares cardíacos. O componente IKr tem papel principal na finalização da fase de platô do potencial de ação e na orientação da repolarização da membrana celular17,18. Ocorre disfunção desses canais em determinadas formas de SQTL hereditárias e adquiridas19.
Estudos in vitro sugeriram que a maioria dos medicamentos que prolongam o intervalo QT bloqueia o componente IKr que é codificado pelo hERG (gene humano relacionado com o éter-a-go-go) em seres humanos. Embora a corrente funcional IKr tenha sido identificada em várias espécies animais, como cães, cobaias e coelhos, existe muito pouca, se é que há alguma, corrente funcional IKr ou do tipo hERG no ventrículo do rato20. Estudos com antibióticos macrolídeos em ratos mostraram boa concordância entre as avaliações de prolongamento do intervalo QT com base em dados de ECG em ratos e os achados clínicos em seres humanos; no entanto, tais resultados devem ser cuidadosamente avaliados, considerando-se a existência de diferenças entre ratos e seres humanos21.
Pacientes com câncer podem ser particularmente suscetíveis ao prolongamento do intervalo QT, pois muitos deles (16% a 36%) apresentam alterações no ECG basal e usam medicamentos concomitantes, tais como antieméticos, antimicóticos ou antibióticos, que podem prolongar o intervalo QT7,9. Além disso, pacientes com câncer frequentemente apresentam sintomas, tais como náusea, vômito, diarreia e redução da ingestão oral, que podem levar a distúrbios eletrolíticos, que representam risco de prolongamento do intervalo QT7,22.
Os TKIs tiveram importante papel no tratamento de várias malignidades nos últimos anos, trazendo uma significativa melhora na evolução dos pacientes1. O uso de pequenas moléculas de inibidores da tirosina quinase-receptores do fator de crescimento vascular endotelial (VEGFr-TKIs) mostrou aumento do risco e da incidência de eventos adversos fatais (EAFs) em pacientes tratados para câncer. Comparada a 0,7% para os controles, a incidência de EAFs associada ao uso de VEGFr-TKIs foi de 1,5%. Toxicidade cardíaca é a segunda causa mais comum de EAFs1. O uso de TKIs na última década revelou um novo espectro de efeitos adversos pró-arritmogênicos, sendo o prolongamento do intervalo QT um dos mais importantes7,9. O prolongamento do intervalo QT foi relatado em vários estudos utilizando terapia molecular alvo-dirigida, tendo o prolongamento do intervalo QT chamado atenção devido ao risco de arritmia cardíaca maligna e morte súbita cardíaca23.
Prolongamento do intervalo QT foi associado com vários TKIs dirigidos a múltiplos alvos, tais como sunitinibe, vandetanibe e nilotinibe7,9,10,24. Alguns estudos clínicos relatam que 2% (11/558) dos pacientes que receberam pazopanibe apresentaram prolongamento do intervalo QT. Torsade de pointes foi relatada em menos de 1% (2/977) daqueles recebendo pazopanibe em estudos com monoterapia. Em um ensaio clínico randomizado, 3 de 290 pacientes em uso de pazopanibe apresentaram valores pós-basais de QTc entre 500 e 549 ms. Nenhum dos pacientes recebendo placebo apresentou valores pós-basais de QTc maiores do que ou iguais a 500 msec25. A despeito desses achados, French e cols.26 conduziram uma série de experimentos detalhados examinando a potencial cardiotoxicidade de sunitinibe, sorafenibe e pazopanibe em roedores sob efeito de estresse com dobutamina, e não encontraram qualquer alteração em bioquímica, mitocôndrias, frequência cardíaca, ECG ou ecocardiografia com strain radial e circunferencial em monitoramento de 12 horas. Entretanto, em um recente estudo clínico avaliando o efeito de doses orais repetidas de pazopanibe na condução cardíaca de pacientes com tumores sólidos, obtiveram-se concentrações supraterapêuticas com a administração de pazopanibe por 8 dias, o que produziu uma redução dependente da concentração na frequência cardíaca e um prolongamento do intervalo QTc independente da concentração27.
Os betabloqueadores são considerados terapia profilática de primeira linha na SQTL. Conforme as diretrizes atuais, há indicação classe I para o tratamento com betabloqueadores para pacientes com diagnóstico clínico de SQTL28,29. Diferentes betabloqueadores têm eficácia semelhante na prevenção de eventos cardíacos em pacientes com SQTL30. Um outro estudo mostrou que o pré-tratamento com diltiazem e propranolol reduz o prolongamento do intervalo QTc induzido por epinefrina31. Um estudo em animais abordou os efeitos benéficos dos bloqueadores de canais de cálcio em insuficiência cardíaca e SQTL30. Além disso, pró-arritmia e prolongamento do intervalo QT foram demonstrados predominantemente com agentes antiarrítmicos classes Ia, Ic e III32,33. Portanto, metoprolol e diltiazem foram selecionados para avaliação no presente estudo34.
O presente estudo avaliou o prolongamento do intervalo QT induzido por pazopanibe em um modelo experimental com ratos. Primeiramente, demonstrou-se prolongamento do intervalo QTc nos ratos tratados apenas com pazopanibe. Três horas após a administração do medicamento, os ratos do grupo controle, que receberam pazopanibe e injeção intraperitoneal de solução salina, apresentaram prolongamento do intervalo QTc, corroborando assim os estudos prévios que mostraram associação entre TKIs e alterações do ECG7,9. Em segundo lugar, este estudo mostrou que o efeito de prolongamento do intervalo QT do pazopanibe pode ser revertido por alguns medicamentos. Os grupos PZP+metoprolol e PZP+diltiazem não apresentaram prolongamento do intervalo QTc quando comparados ao grupo controle-PZP+SP. No entanto, os intervalos QTc dos grupos PZP+metoprolol e PZP+diltiazem foram semelhantes entre si e significativamente mais curtos do que aqueles do grupo controle. Com base nos resultados do estudo, tanto metoprolol quanto diltiazem foram considerados eficientes para prevenir o efeito de prolongamento do intervalo QT induzido por pazopanibe.
Com frequência, pacientes com câncer necessitam de tratamento com TKIs que prolongam o intervalo QT. Os riscos e os benefícios dessa terapia precisam ser pesados. O tratamento deve ser iniciado com a suspensão do medicamento que precipita a alteração. Fatores de risco subjacentes devem ser avaliados, a administração do medicamento possivelmente precipitante deve ser interrompida, e condições reversíveis, como distúrbios metabólicos, devem ser corrigidos antes do início do medicamento34. O uso concomitante de vários medicamentos que prolongam o intervalo QT deve ser evitado. Os pacientes devem ser orientados quanto ao risco pró-arrítmico. Monitorização periódica com ECG e acompanhamento rigoroso são essenciais para a detecção precoce e tratamento de pacientes de alto risco e com história de prolongamento do intervalo QT, para pacientes em uso de antiarrítmicos, e para indivíduos com doença preexistente relevante, como bradicardia e desequilíbrio eletrolítico35.
Este estudo apresenta limitações. A primeira decorre do fato de se tratar de estudo experimental em ratos. Permanecem à espera de investigação adicional questões como a relevância desses resultados experimentais para seres humanos no contexto clínico e suas implicações terapêuticas. Em segundo lugar, no nosso estudo não se realizou teste de estabilidade ventricular. Devido a essa limitação, os possíveis efeitos profiláticos dos medicamentos com relação à pró-arritmia não podem ser avaliados com base em nossos resultados. Consequentemente, diferentes estudos com modelos específicos de estabilidade ventricular são necessários para que o uso profilático de tais medicamentos seja recomendado.
A redução da toxicidade cardíaca de tais agentes requer melhor conhecimento dos possíveis efeitos colaterais cardíacos do pazopanibe e identificação dos pacientes que correm maior risco. Este estudo avaliou os efeitos do metoprolol e do diltiazem na prevenção do prolongamento do intervalo QT induzido por pazopanibe.
Concluindo, metoprolol e diltiazem encurtaram significativamente o prolongamento do intervalo QT induzido por pazopanibe. Embora metoprolol e diltiazem tenham evitado o prolongamento do intervalo QT, estudos de longo prazo que incluam teste de estabilidade ventricular em diferentes modelos podem fornecer evidência para o uso profilático de tais medicamentos em pacientes de alto risco tratados com pazopanibe.