versão impressa ISSN 1808-8694
Braz. j. otorhinolaryngol. vol.81 no.1 São Paulo jan./fev. 2015
http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2014.09.006
A disfagia pode ser frequentemente observada em indivíduos com distúrbios neurológicos e prejudica a deglutição de alimentos, o que pode levar a complicações como engasgos, desnutrição e aspiração pulmonar.1
A doença de Parkinson (DP) é uma das doenças neurodegenerativas mais comuns em populações de idosos, com uma incidência mundial entre 1 e 20 a cada 1000 indivíduos/ano.2 , 3 É caracterizada pela disfunção dos gânglios basais em movimentos voluntários, causando tremor em repouso, rigidez, acinesia (ou bradicinesia) e instabilidade postural.2 , 4
A disfagia é muito comum na DP e afeta mais de 80% dos indivíduos, refletindo as deficiências motoras subjacentes e a extensão da progressão da doença.5 As dificuldades de deglutição mais frequentemente associadas com a DP estão relacionadas com as fases oral e faríngea, resultando em uma formação anormal do bolo, atraso no reflexo de deglutição e prolongamento do tempo de trânsito faríngeo com deglutições repetitivas para ejeção do bolo alimentar, denominada festinação lingual.3 , 6
As alterações relacionadas com a disfagia têm uma influência direta sobre o estado nutricional e a saúde dos pacientes, e estão associadas com o aumento da morbidade e mortalidade.7 , 8 Entretanto, poucos estudos descrevem a progressão da disfagia e sua gravidade na DP.9 Há poucas informações sobre o aspecto temporal da progressão da disfagia na DP.
O conhecimento da progressão da disfagia na DP pode auxiliar na diminuição do risco de pneumonia por aspiração e, consequentemente, reduzir o risco de morte, uma vez que essa é uma das causas mais frequentes de óbito nesses pacientes.10 , 11 Tal conhecimento também pode orientar médicos e terapeutas sobre o que esperar de seus pacientes e sobre quais tratamentos podem ser necessários ao longo do tempo.
No Brasil, o tratamento da deglutição é realizado por fonoaudiólogo, por meio da utilização de métodos que visam a compensação e reabilitação (quando possível) das alterações no processo de deglutição. Tem por principal objetivo, preservar a alimentação oral segura pelo maior tempo possível. Baseia-se em manobras que, de acordo com Crary,12 podem ser categorizadas em compensatórias ou de reabilitação. As manobras compensatórias referem-se à intervenção comportamental na disfagia, caracterizada por modificações dietéticas, mudanças na forma de administração da dieta e na posição do paciente, além de adaptações no mecanismo da deglutição. Essas manobras são comumente conhecidas como manobras posturais. Têm por finalidade dirigir o bolo e modificar a velocidade do fluxo, tais como manobra de queixo para baixo, rotação e inclinação da cabeça, cabeça para trás, entre outras.
As manobras caracterizadas por modificações na dieta, promovem mudanças nos estímulos sensoriais. Modificando o volume e a consistência dos alimentos pode-se alterar o estímulo sensorial. A adaptação do mecanismo de deglutição exige mudanças no padrão em relação à força muscular, amplitude de movimento e coordenação de eventos, como, por exemplo, a deglutição com esforço, a manobra supraglótica, as deglutições múltiplas, entre outros.
Como manobras de reabilitação, há exercícios sensoriomotores orais que permitem modificações da força, do comprimento e da amplitude de movimento das estruturas envolvidas em cavidade oral, faringe e laringe. Podem-se destacar algumas manobras amplamente utilizadas, como, por exemplo: manobra Shaker, exercícios para controle lingual, exercícios vocais e exercícios faríngeos.
Este artigo tem por objetivo descrever o tratamento da deglutição e a investigação de fatores associados com a funcionalidade da deglutição em uma série de casos de pacientes com doença de Parkinson (DP).
Trata-se de um estudo prospectivo longitudinal realizado com 24 pacientes disfágicos com DP idiopática, em levodopaterapia exclusiva e/ou associada a outras medicações parkinsonianas. Os sujeitos foram observados por um período de cinco anos (2006-2011), em um ambulatório de disfagia de um grande hospital universitário brasileiro. Consistiu em uma série de casos aberta, ou seja, durante os cinco anos, houve pacientes que entraram e saíram do estudo.
Apenas os pacientes que tiveram pelo menos três avaliações, queixas de dificuldade para engolir, alimentação por via oral exclusiva e consultas regulares no ambulatório de neurologia, foram incluídos no estudo. Os pacientes com alimentação por via alternativa, doenças concomitantes ou outros distúrbios capazes de causar disfagia foram excluídos da análise.
Todos foram submetidos à avaliação de deglutição, classificação da funcionalidade da deglutição por meio da Functional Oral Intake Scale (FOIS)13 e intervenção fonoaudiológica terapêutica a cada três meses.
A avaliação foi realizada por meio de Videoendoscopia da Deglutição (VED) e avaliação clínica. Em ambas as avaliações, foram oferecidos três tipos de alimentos: 1) suco de limão colorido com corante verde; 2) consistências de néctar, mel e pudim, todas coloridas com corante verde (obtidos com a adição de 2, 3 e 4 colheres de chá de um espessante (Thicken-easy(r)) para 100 mL de água, respectivamente, e ofertados em duas quantidades diferentes, 3 mL e 7 mL); e 3) uma consistência sólida foi representada por um biscoito de amido de milho.
O alimento foi oferecido aos pacientes na seguinte sequência: líquido e néctar (3 mL, 3 mL, 7 mL e 7 mL); mel (3 mL, 3 mL, 7 mL e 7 mL); pudim (2 colheres de sobremesa); e sólido (1/2 biscoito de amido de milho). A alimentação líquida foi administrada em seringas de 20 mL, com a amostra introduzida na cavidade oral do paciente. Ao serem observadas dificuldades de deglutição, manobras de proteção das vias aéreas e/ou mudanças de postura de cabeça foram efetuadas, a fim de auxiliar a alimentação oral de forma segura.
A VED foi realizada por um otorrinolaringologista, enquanto o alimento foi ofertado por um fonoaudiólogo.
Na avaliação clínica, à medida que os pacientes deglutiam, foi realizada ausculta cervical para identificar sinais anormais na fase faríngea da deglutição. Também foram observados o tempo de trânsito oral do bolo, escape anterior ou posterior, ausculta cervical positiva (com sinais sugestivos de estase, penetração ou aspiração laringotraqueal), tosse (antes, durante ou após a deglutição) e voz molhada.
Com base na avaliação clínica e na VED, a FOIS13 foi aplicada. A FOIS classifica os pacientes em níveis. Para o presente estudo, os níveis foram descritos da seguinte forma: Nível 1) nada via oral; Nível 2) dependente de alimentação por via alternativa com mínima oferta de alimentos por via oral; Nível 3) dependente de via alternativa de alimentação com ingesta oral constante de alimentos ou líquidos; Nível 4) dieta via oral total em apenas uma ou duas consistências (néctar e mel, mel e pudim); Nível 5-A) dieta via oral total com múltiplas consistências, mas com restrição de duas consistências (por exemplo, líquidos e sólidos), com ou sem compensação; Nível 5-B) dieta oral total com múltiplas consistências, mas com restrição de uma consistência (por exemplo, sólido ou líquido), com ou sem compensação; Nível 5-C) dieta oral total com múltiplas consistências, mas requerendo compensação; Nível 6) dieta oral total com múltiplas consistências sem preparação especial, mas com limitações específicas de alimentos (por exemplo: fibras, grãos e hortaliças) e modificações de velocidade e volume se necessário; e Nível 7) dieta oral total sem restrições.
Na avaliação inicial, os pacientes receberam uma classificação FOIS correspondente. Todas as vezes que retornaram ao hospital, foram reavaliados e reclassificados por meio da FOIS. Para analisar a funcionalidade da deglutição ao longo do seguimento, foi realizada a análise de sobrevivência de Kaplan-Meyer. Os sujeitos foram observados até a ocorrência do evento "melhora" ou do evento "piora", isto é, foram observados até o momento no qual foi percebida queda ou elevação de um nível ou subnível da FOIS. Os pacientes cuja funcionalidade da deglutição permaneceu a mesma, foram observados durante o período de acompanhamento e nenhum evento foi registrado.
Após as avaliações de deglutição, a cada três meses os pacientes receberam intervenção fonoaudiológica terapêutica em relação à consistência e volume adequados dos alimentos, além de manobras ou exercícios para melhorar a funcionalidade da deglutição. Eles foram orientados a realizar as manobras e/ou exercícios diariamente e receberam instruções por escrito.
Como manobras compensatórias foram utilizadas: 1) queixo para baixo: para melhorar a proteção das vias aéreas durante a deglutição; 2) mudança na consistência do bolo: para facilitar a alimentação de pacientes com diminuição da coordenação da língua, contração reduzida da faringe, atraso no reflexo da deglutição, proteção das vias aéreas reduzida e/ou dificuldade de mastigação; 3) deglutição com esforço: para aumentar a força de ejeção do bolo e aproximar as estruturas da laringe, melhorando a proteção das vias aéreas; 4) frequência de deglutição (múltiplas deglutições): para eliminar estases; 5) efeitos do bolo: mudanças no volume, na viscosidade, na temperatura, na textura ou no sabor, para melhorar a sensibilidade oral e faríngea, facilitando a manipulação e o controle do bolo.
Como estratégias de reabilitação foram utilizados: 1) exercícios para fortalecimento de língua: para aumentar a força na ejeção do bolo; 2) exercícios para controle de língua: para melhorar a mobilidade da língua e facilitar a manipulação do bolo na cavidade oral; 3) manobra de Shaker: para aumentar a força nos músculos supra-hioides, reduzindo a penetração e o risco de aspiração; 4) exercícios vocais: para aumentar a proteção das vias aéreas, através da melhora na adução glótica; 5) manobra de Masako: para aumentar os movimentos dos músculos da faringe contra a base da língua durante o ato de deglutição.
Os pacientes foram classificados em grupos, de acordo com as mudanças na funcionalidade da deglutição ao longo do seguimento medidas pela FOIS. Foram observados três grupos: um grupo que melhorou, outro que permaneceu estável e o terceiro que piorou.
A fim de investigar os fatores relacionados à funcionalidade da deglutição ao longo do seguimento, foram utilizados os testes Qui-quadrado, Kruskal-Wallis e Fisher. O sexo, a idade na primeira avaliação, a idade de início dos sintomas e a duração da doença (duração da doença = tempo entre o início dos sintomas da DP e a primeira avaliação) foram considerados como variáveis independentes.
A funcionalidade da deglutição ao longo do seguimento foi descrita pela análise de sobrevivência de Kaplan-Meier. É importante mencionar que os resultados de uma análise de sobrevivência expressam a probabilidade do paciente não sofrer de um determinado evento.
A análise estatística foi realizada utilizando o programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 13.0 para Windows, e p-valores inferiores a 0,05 foram considerados significativos.
Esse estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (número de protocolo 796/2005).
Esta série de casos, com 24 pacientes, foi constituída por 16 homens e oito mulheres. A idade média de início dos sintomas da DP foi de 53,8 (± 6,5) anos. A idade média na primeira avaliação foi de 65,4 (± 8,6) anos. A duração média da doença foi de 139,2 (± 65) meses, ou seja, houve uma média de 11 anos entre os primeiros sintomas e a primeira avaliação para o tratamento da deglutição.
No total, dez pacientes melhoraram, cinco permaneceram estáveis e nove pioraram sua funcionalidade de deglutição durante o acompanhamento. As características desses grupos estão descritas na tabela 1. Não houve diferença estatisticamente significante entre os grupos.
Tabela 1 Análise descritiva dos aspectos clínicos de uma série de casos de pacientes com doença de Parkinson acompanhados em um ambulatório de disfagia entre 2006 e 2011, estratificados pela funcionalidade da deglutição (n = 24)
Piorou (n = 9) | Estável (n = 5) | Melhorou (n = 10) | |||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Variáveis | Min-Max | Média ± DPa | Mediana | Min-Max | Média ± DPa | Mediana | Min-Max | Média ± DPa | Mediana |
Gênero (Masculino/feminino) | 2/7 | 3/2 | 4/6 | ||||||
Idade na primeira avaliação (anos) | 51-78 | 63,3 ± 9,7 | 64 | 52-75 | 65,4 ± 8,5 | 66 | 53-81 | 65 ± 10,7 | 61 |
Idade de início dos sintomas (anos) | 39-74 | 53,5 ± 11,3 | 57 | 49-65 | 53,8 ± 6,4 | 52 | 49-75 | 59 ± 11 | 53 |
Duração da doença (meses) | 24-204 | 68,6 ± 65,7 | 48 | 36-204 | 139,2 ± 65 | 168 | 24-144 | 80 ± 36,5 | 78 |
Tempo até a piora da deglutição (meses)b | 7-78 | 50,2 ± 23,9 | 33 | − | − | − | − | − | − |
Tempo de acompanhamento (meses) | − | − | − | 15-37 | 27,6 ± 9,7 | 30 | − | − | − |
Tempo até a melhora da deglutição (meses)c | − | − | − | − | − | − | 1-67 | 3,7 ± 2 | 10 |
a Desvio-padrão (DP).
b Tempo estimado desde o aparecimento dos sintomas da doença.
c Tempo estimado a partir da primeira avaliação.
Nessa série de casos, não foi encontrada nenhuma associação significativa entre as mudanças na funcionalidade da deglutição e os aspectos clínicos investigados.
A figura 1 mostra a curva de sobrevivência para piora na deglutição. Essa curva ilustra a chance de não sofrer piora da deglutição nessa série de casos.
Figura 1 Curva de Kaplan-Meier considerando a piora da deglutição de acordo com os níveis da FOIS, em pacientes com doença de Parkinson (DP) acompanhados em um ambulatório de disfagia entre 2006 e 2011 (n = 24). *Observação censurada mostra pacientes perdidos durante o acompanhamento ou pacientes sem piora na funcionalidade da deglutição durante o período de observação.
Alguns pacientes foram, gradualmente, perdendo a funcionalidade da deglutição. De acordo com a análise de Kaplan-Meier, eles tinham 17% de probabilidade de piora da funcionalidade da deglutição no décimo mês de acompanhamento.
A figura 2 mostra a curva para a melhora da deglutição. Essa curva ilustra a chance de melhora nessa série de casos. A maioria melhorou a funcionalidade da deglutição até o décimo mês. De acordo com a análise de Kaplan-Meier, em dez meses de acompanhamento a probabilidade de melhora na funcionalidade da deglutição foi de 44%.
Figura 2 Curva de Kaplan-Meier considerando a melhora da deglutição de acordo com os níveis da FOIS, em pacientes com doença de Parkinson (DP) acompanhados em um ambulatório de disfagia entre 2006 e 2011 (n = 24). *Observação censurada mostra pacientes perdidos durante o acompanhamento ou pacientes sem melhora na funcionalidade da deglutição durante o período de observação.
As frequências das manobras indicadas na intervenção terapêutica estão descrita na tabela 2. As manobras de queixo para baixo, mudança na consistência do bolo, fortalecimento da língua, exercícios vocais, deglutições múltiplas e efeito do bolo foram sugeridas para 50% ou mais dos pacientes.
Tabela 2 Frequência de manobras recomendadas no tratamento da deglutição em uma série de casos de pacientes com doença de Parkinson (DP), acompanhados em um ambulatório de disfagia entre 2006 e 2011 (n = 24)
Categorias | Manobras | N (%) |
---|---|---|
Manobras compensatórias | Queixo para baixo | 16 (66,7) |
Mudança na consistência do bolo | 19 (79,2) | |
Deglutição com esforço | 10 (41,7) | |
Frequência de deglutição (múltiplas deglutições) | 19 (79,2) | |
Efeito do bolo | 20 (83,3) | |
Manobras de reabilitação | Fortalecimento da língua | 16 (66,7) |
Controle da língua | 10 (41,7) | |
Manobra de Shaker | 3 (12,5) | |
Exercícios vocais | 12 (50,0) | |
Manobra de Masako | 4 (16,7) |
Nesta casuística, foi observada média de 11 anos entre o início da DP e a primeira avaliação do paciente no ambulatório de disfagia. Tal constatação pode ser explicada por diversos fatores, incluindo a falta de informação ou a latência entre o início da DP e o início dos problemas de deglutição. A literatura indica que a demora na procura por ajuda profissional pode ser prejudicial, especialmente porque a disfagia é prevalente na DP de longo prazo, embora possa ser subclínica, especialmente no curso inicial da doença.5 , 14 Avaliações objetivas demonstraram a deglutição prejudicada em mais de 50% dos pacientes com DP que relataram deglutição normal.14 Durante o curso da doença, de 75% a 97% dos pacientes irão apresentar alterações no processo da deglutição.15 - 17 Devido às evidências supracitadas, faz-se importante atentar para sintomas de alterações na deglutição, a fim de se evitar as complicações da disfagia, tais como: desnutrição, perda de peso e complicações pulmonares.
Müller et al.,18 em um estudo post-mortem, encontraram idade de início da DP de 60 anos (em média), tempo médio de sobrevida de aproximadamente 14 anos e latência da disfagia de 10 anos. Os autores observaram menor tempo de sobrevida após o início das queixas de deglutição.
O presente estudo não encontrou associação entre a variável sexo e a funcionalidade da deglutição na DP. Na literatura, a relação entre broncoaspiração e sexo também não foi encontrada.19 , 20 Tais achados revelam que os aspectos relacionados com o gênero, tais como hormônios, diferenças anatômicas, dentre outras diferenças entre os sexos masculino e feminino, parecem não influenciar diretamente a deglutição de pacientes com DP.
Embora o comprometimento progressivo da deglutição seja um fato esperado, neste estudo, a manutenção ou melhora da funcionalidade da deglutição foi observada na maioria dos pacientes durante o período de acompanhamento.
Não houve diferença estatística entre os grupos que permaneceram sem mudanças, o que melhorou e o que piorou a funcionalidade da deglutição. Apesar de o presente estudo não ter encontrado aspectos estatisticamente associados às alterações da deglutição em pacientes com DP, Lorefalt et al.21 relataram uma redução significativa de alimentos sólidos em pacientes idosos com DP, o que sugere influência do fator idade. Na DP, a mortalidade mais elevada está associada a alguns aspectos, tais como: idade avançada, disfagia e diagnóstico tardio.22 Segundo Auyeng et al.,23 o início tardio está associado a um impacto negativo na sobrevivência do paciente com DP.
A avaliação e o tratamento precoce da deglutição no paciente com DP são muito importantes. Manor et al.8 constataram que, na DP, o tratamento da deglutição, em fases iniciais da disfagia, foi capaz de prevenir a pneumonia por aspiração e ajudar na manutenção da qualidade de vida. Portanto, o tratamento precoce da deglutição pode influenciar positivamente sua funcionalidade. De acordo com a literatura, manobras compensatórias utilizadas no tratamento da deglutição podem melhorar a proteção das vias aéreas e reduzir as complicações da disfagia.24
Apesar da falta de estudos controlados e além do fato de a DP ser progressiva e neurodegenerativa, existem outros estudos que indicam que a melhora na deglutição pode ser alcançada através de intervenções relativamente simples.25 , 26
Embora o presente estudo não tenha tido como objetivo verificar a eficácia dos métodos de intervenção terapêutica, os pacientes incluídos nesse tratamento da deglutição apresentaram melhora nos primeiros dez meses. De acordo com Robbins,12 quando algumas manobras são executadas repetidamente, elas promovem a neuroplasticidade e melhoram a funcionalidade da deglutição.
O tratamento da deglutição de pacientes com doenças neurodegenerativas é relativamente recente. Por muitos anos acreditou-se que a doença degenerativa teria uma consequente disfagia progressiva e que a deglutição não poderia ser reabilitada e, assim, qualquer tentativa de intervenção terapêutica estaria fadada ao fracasso.
O tratamento da deglutição em uma doença neurodegenerativas visa a funcionalidade da deglutição de modo seguro com manutenção do estado nutricional e das condições respiratórios.
Como resultado deste estudo, verificou-se que as intervenções mais recomendadas foram compensatórias. O maior uso de manobras compensatórias na DP pode ser explicado pelo resultado instantâneo dessas manobras, o que pôde ser verificado empiricamente na avaliação clínica e instrumental. Vale salientar que a indicação das manobras foi verificada durante a realização do exame instrumental.
As manobras compensatórias auxiliam no direcionamento adequado do bolo alimentar. Assim, como utilizado nesta serie de casos, estudos demonstram que o uso de líquidos espessados, como as consistências néctar e mel, pode prevenir aspirações, em virtude da redução da velocidade do fluxo alimentar.27 Já, a manobra de queixo para baixo e frequentemente recomendada para a deglutição de líquidos finos, com a finalidade de reduzir o escape precoce e, possível, entrada na via aérea.28 Na literatura evidencia-se a recomendação de manobra de queixo para baixo combinada com líquidos espessados para prevenir pneumonia aspirativa em pacientes com DP.20
Vale salientar que o programa de tratamento da deglutição apresentado recomendou a mudança de consistência do bolo alimentar quando manobras posturais e/ou manobras de intervenção terapêutica, não se mostraram eficientes no momento da avaliação.
A mudança na consistência do bolo, o efeito do bolo, as alterações de viscosidade, sabor ou temperatura do bolo podem aumentar o input sensorial e prevenir aspirações.
Outra estratégia bastante indicada neste tratamento foi a frequência de deglutição. As deglutições múltiplas foram preconizadas para serem realizadas durante a alimentação diária, com o objetivo de limpar estases e reduzir a probabilidade de penetração ou aspiração laríngea.
Quanto às manobras de reabilitação, foram indicados exercícios de mobilidade, fortalecimento e controle da musculatura da língua, lábios, bochechas, especialmente, a musculatura envolvida na mastigação, manipulação e propulsão do bolo alimentar. Pacientes com DP apresentam hipocinesia como consequência da redução de dopamina, consequentemente, a fase orofaríngea da deglutição é geralmente mais longa e lenta.29
Exercícios vocais foram indicados para a metade dos pacientes, pois há evidências de que a maximização da adução glótica e da elevação laríngea pode promover melhora na proteção de vias aéreas e na mobilidade da língua durante a deglutição,27 o que refletirá na redução do risco de broncoaspiração.
Estudos futuros sobre a eficácia dos métodos de intervenção na deglutição de pacientes com DP são necessários. A melhora e a estabilização, não esperadas em doenças neurodegenerativas e encontradas no presente estudo, podem sugerir que o tratamento da deglutição afeta positivamente o desempenho dessa função em pacientes com DP, embora não se possa afirmar tal dedução devido ao desenho metodológico utilizado.
Em conclusão, a funcionalidade da deglutição foi caracterizada por estabilização ou melhora, especialmente nos primeiros dez meses de acompanhamento. O tratamento da deglutição foi baseado em avaliações trimestrais e caracterizado, principalmente, por manobras compensatórias. Dentre os aspectos investigados, não houve fator associado às mudanças na funcionalidade da deglutição nessa série de casos com DP.