versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561
Ciênc. saúde coletiva vol.23 no.11 Rio de Janeiro nov. 2018
http://dx.doi.org/10.1590/1413-812320182311.26932016
Na atualidade o câncer constitui-se como uma doença crônica incapacitante em decorrência do tratamento complexo e continuado. A criança ou adolescente em tratamento oncológico é exposta a repetidos procedimentos médicos invasivos dos quais decorrem efeitos colaterais e dor, além de sofrerem com a interrupção da rotina escolar e social, a suspensão de atividades de lazer, a alteração na alimentação, as mudanças na autoimagem, os sentimentos de incerteza sobre o tratamento, as internações frequentes, as perdas que prejudicam sua socialização e interferem de modo adverso sobre a manutenção de seus relacionamentos cotidianos1. Estas consequências extrapolam o âmbito individual e alcançam a vida familiar como um primeiro núcleo de socialização e apoio para os indivíduos2, sobretudo para crianças e adolescentes cujo grau de autonomia na tomada de decisão e na manutenção das condições materiais de existência é limitado. Portanto, o câncer infantojuvenil, pode ser considerado como uma deficiência, tendo por base uma perspectiva crítica à conceituação tradicionalmente definida pelo modelo médico de doença3 que a delimita aos aspectos biológicos. O conceito crítico do que é deficiência incorpora a visão de um fenômeno complexo e multifacetado, e expressa as desigualdades sociais, culturais e econômicas4.
Historicamente a definição de deficiência se deslocou do modelo biomédico para o modelo social, que a entende não apenas como uma limitação do corpo, mas como a relação de desigualdade imposta por ambientes com barreiras a um corpo com impedimentos5. A partir desta ampliação, o conceito de deficiência passa a ser um conceito guarda-chuva que engloba, além do corpo biológico com impedimentos, as limitações de atividades ou restrições de participação. Entretanto, no Brasil, o modelo biomédico da deficiência parece ainda fundamentar as ações de assistência e as políticas sociais, independente do avanço do debate teórico em torno do modelo social.
A deficiência surge, portanto, como tema para as políticas públicas, principalmente as de caráter distributivo e de proteção social6. Nesta revisão conceitual e de ampliação do conceito, as doenças genéticas, crônicas e infecciosas graves passam a ser classificadas como deficiência7. Cabe apontar, neste novo cenário, os diferentes sentidos e as tensões em jogo na redefinição deste conceito no que concerne à construção das identidades e da autoclassificação dos grupos sociais nem sempre concordantes.
Tendo por bases essas reflexões, nosso intuito foi contextualizar brevemente a razão pela qual o câncer, como uma doença limitante e de tratamento prolongado, vincula-se ao que se denomina de deficiência no plano das políticas públicas, apesar de não se enquadrar como uma deficiência em si. Há de se destacar, nesta direção, a expressão deste entendimento em recente alteração no plano das políticas públicas, a Lei 12.470/ 2011 - Lei Orgânica da Assistência Social8 é um exemplo -, onde o conceito de deficiência sofreu alteração no sentido de ampliá-lo.
A experiência do adoecimento por câncer em crianças e adolescentes é muito complexa e condensa diversos significados. Expressa, muitas vezes, mudanças profundas na rede de familiares envolvidos, devido: às dificuldades financeiras, o distanciamento entre membros da família, conflitos intrafamiliares e a forçada reorganização do cotidiano familiar. As demandas destacadas por cuidadores de crianças com leucemia, em estudo realizado por Kohlsdorf e Costa Júnior1, incluem a necessidade de maior atenção e monitoramento dirigidos ao paciente; alterações na rotina profissional dos cuidadores que necessitam de adaptações financeiras, decorrentes do aumento dos gastos; e, mudanças de residência devido às exigências do tratamento. Por estas razões, é de extrema importância compreender as demandas sociais geradas no processo de tratamento oncológico infantojuvenil e as atuais respostas do sistema de proteção social brasileiro a estas situações que impactam de modo peculiar a existência coletiva e individual das crianças e adolescentes em tratamento e suas famílias.
Este artigo tem como objetivo problematizar os avanços e limites do sistema de proteção social brasileiro frente às demandas sociais decorrentes do tratamento oncológico infantojuvenil que ultrapassam os limites específicos da atenção à saúde. A necessidade dessa reflexão se impôs no contexto da experiência da primeira autora em uma enfermaria pediátrica de um hospital público de referência em oncologia no município do Rio de Janeiro, que acompanha crianças e adolescentes com câncer e suas famílias, o que resultou no estudo sobre o tema no âmbito de uma Pós-graduação em Saúde Pública na mesma cidade. Este parte do reconhecimento da complexidade desta doença caracterizada por severas exigências clínicas e diversas repercussões no cotidiano familiar e da vida social. O artigo atém-se aos direitos sociais desta parcela da população.
O acesso ao tratamento oncológico perpassa diversas áreas da vida do paciente e de sua família, não estando relacionado apenas ao aspecto médico-biológico da doença. As condições socioeconômicas, emocionais e culturais também podem influenciar no acesso e na continuidade do tratamento. Isto porque, a partir do adoecimento infantojuvenil, diversas são as demandas sociais que emergem para o cotidiano familiar. A literatura já apontou, em nosso passado recente, a relevância de discernimento quanto às demandas e às necessidades em saúde como conceitos históricos particulares relacionados a um determinado tipo de economia e modelo de organização social, bem como sua importância para o planejamento das ações em saúde9. As demandas sociais aqui problematizadas encontram-se no escopo de preocupações ligadas à garantia de direitos sociais previstos constitucionalmente e às respostas do poder público em situações que envolvem as políticas públicas de saúde como é o caso do câncer infantojuvenil. Nesta direção, discute-se a relevância dos sistemas de proteção social enquanto recurso fundamental para a efetivação do tratamento. Cabe atenção nesse ponto para as estimativas de casos novos de câncer em crianças e adolescentes até os 19 anos no Brasil, o que justifica a necessidade de se discutir as demandas crescentes deste grupo social em um contexto de considerável desigualdade social. Estimam-se, para o Brasil, no ano de 2016, 420.310 casos novos de câncer. Como o percentual mediano dos tumores pediátricos observados nos Registros de Câncer de Base Populacional (RCBP) brasileiros encontra-se próximo de 3%, depreende-se que ocorrerão aproximadamente 12.600 casos novos de câncer em crianças e adolescentes até os 19 anos10. As neoplasias ocupam a segunda posição de óbitos ocorridos em 2013 para crianças/adolescentes (de 1 a 19 anos), ficando abaixo somente dos óbitos por causas externas, configurando-se como a doença de maior letalidade11. Esses dados destacam a importância desta doença crônica não transmissível, na formulação de políticas e ações de promoção da saúde da criança e do adolescente4.
Para Monteiro e Pimentel12, o dinamismo dos processos saúde-doença é remetido ao reconhecimento das interferências das condições de existência tanto na produção de agravos, quanto na recuperação da saúde dos indivíduos. Esta percepção vem exigindo a superação do modelo tradicional de atenção centrado no atendimento biomédico, o que implica em admitir o quanto o tratamento deve atentar aos aspectos sociais que perpassam os processos saúde e doença. Pode-se perceber que, se a incidência do câncer não está relacionada diretamente a fatores socioeconômicos, a efetivação do tratamento certamente está13. Nessa perspectiva, as condições de acesso ao tratamento e a sua manutenção determinam as possibilidades de enfrentamento da doença14.
O tratamento oncológico infantojuvenil, em geral, gera inúmeras demandas sociais que expressam as desigualdades sociais presentes na sociedade contemporânea. Nesse sentido, as demandas emergentes após o adoecimento crônico, de acordo com Silva et al.13, relacionam-se a estas condições socioeconômicas dos indivíduos e de sua rede de apoio familiar. O processo de adoecimento da criança e do adolescente é apresentado, primeiramente como uma questão privada e de âmbito familiar, daí a importância de se dar atenção aos aspectos da vida cotidiana, às mudanças na rotina, à organização dos cuidados15. O impacto da doença para o paciente e sua família precisa ser compreendido, uma vez que é nesse contexto que surge a doença, e é com essa estrutura sociofamiliar que vão responder à situação de doença14.
Portanto, a experiência do adoecimento crônico, incluindo o câncer, também é influenciada por externalidades, referentes às políticas sociais, que proporcionam acesso aos serviços de saúde e a outros condicionantes que interferem nas suas vidas16. A efetiva realização do tratamento oncológico pressupõe o atendimento satisfatório de um conjunto de necessidades como: habitação, transporte, alimentação, renda e o acesso a bens e serviços sociais. Para Silva e Fonseca16, a formação dos sistemas de proteção social tem origem nas necessidades das sociedades de impedir ou diminuir o impacto de determinados riscos sobre os indivíduos ou grupos sociais. Tais riscos decorrem de certas vicissitudes da vida social, como a velhice, a infância, a doença, a invalidez, as privações, etc.
Diante desta perspectiva, “o exercício vital das famílias é semelhante às funções das políticas públicas: ambas visam dar conta da reprodução e da proteção social dos grupos que estão sob sua tutela”17, a diferença é que uma se efetiva no âmbito privado e a outra na esfera pública, no campo dos direitos à proteção social. Mas, como destaca a autora, se, nas sociedades tradicionais e pré-capitalistas, a família se ocupava quase exclusivamente dessas funções, nas sociedades contemporâneas elas devem ser partilhadas com o Estado.
A partir dessas considerações percebe-se a centralidade das políticas de proteção social, como recurso fundamental para responder às demandas sociais e, assim possibilitar a efetivação do tratamento. As políticas sociais são aqui consideradas como resultado de relações complexas e contraditórias estabelecidas entre Estado e sociedade civil, no âmbito dos conflitos e luta de classes que envolvem o processo de produção e reprodução do capitalismo18. No entanto, as políticas sociais vêm sofrendo, nos últimos anos, com a desresponsabilização por parte do Estado e o retrocesso nos ganhos obtidos com a promulgação da Constituição de 1988.
Este estudo foi estruturado com base em uma perspectiva qualitativa19, a partir da análise de documentos oficiais que apresentam os direitos sociais de pessoas com câncer, como: Leis, Decretos, Portarias e Políticas somados à literatura sobre crianças e adolescentes com câncer. A análise teve por objetivo descrever os documentos relacionados ao sistema de garantia de direitos dos pacientes oncológicos e seus familiares no Brasil. Tal delineamento visou ampliar a compreensão das demandas em relação ao grupo pesquisado. O projeto de pesquisa foi submetido à apreciação e aprovado pelo Comitê de Ética da Escola Nacional de Saúde Pública.
Com base na abordagem qualitativa, os documentos oficiais permitem cotejar, a partir de seu conteúdo, as diretrizes vigentes e suas possíveis lacunas. Trata-se de tornar possível por meio da análise a realização de ponderações e modificações às interpretações correntes sobre o tema. Na presente pesquisa documental busca-se uma maior aproximação com a realidade por meio da análise dos documentos levantados, descritos e apresentados a seguir, que, por suas características intrínsecas, promovem um melhor conhecimento da organização e dinâmica da sociedade no que tange ao tema tratado, permitindo novas interpretações dos eventos a ele relacionados20.
A organização e análise dos dados foram realizadas em duas etapas. A primeira consistiu no levantamento dos documentos em si cujas características atendiam aos seguintes critérios: (1) relevância na explicitação dos direitos sociais da pessoa com câncer (2) potencial de abrangência na divulgação das informações para os gestores, profissionais de saúde e para a sociedade; (3) exprimir o objetivo de proteger a criança e o adolescente e o compromisso manifesto de garantia de acesso aos serviços públicos, em especial ao de saúde. Ou seja, os documentos que compõem o corpus de análise são aqueles que guardam relação com o objetivo mais amplo de viabilizar o acesso e garantir a manutenção do tratamento oncológico infantojuvenil. Visando atender a estes critérios, na identificação e no levantamento dos documentos foi utilizado o portal virtual de acesso aberto do INCA. Neste portal foram acessados documentos relativos aos direitos sociais da pessoa com câncer e à questão da proteção social à criança e adolescente com câncer, disponíveis até março de 2016, na seção de orientações ao paciente e familiares. A partir deste primeiro rastreamento foram também resgatadas as legislações nos websites do Governo Federal e do Governo Estadual do Rio de Janeiro.
Na segunda etapa, realizou-se a organização e a classificação do material de modo a permitir descrevê-lo e comentá-lo criticamente. O material reunido perfaz um total de oito documentos descritos no Quadro 1. Observou-se que os documentos selecionados são, em grande parte, de abrangência nacional. Apenas as legislações referentes à gratuidade no transporte público coletivo são de competência dos governos dos estados e municípios.
Quadro 1 Documentos destinados à atenção à criança e ao adolescente com câncer.
Definição | Objetivo | Público a que se destina | Resposta oferecida | |
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LOAS Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993. Dispõe sobre a organização da Assistência Social e dá outras providências8. | A Assistência Social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas. | I- a proteção social, que visa à garantia da vida, à redução de danos e à prevenção da incidência de riscos, especialmente: a) a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; b) o amparo às crianças e aos adolescentes carentes; c) a promoção da integração ao mercado de trabalho; d) a habilitação e reabilitação das pessoas com deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; e e) a garantia de 1 (um) salário-mínimo de benefício mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família; II - a vigilância socioassistencial, que visa a analisar territorialmente a capacidade protetiva das famílias e nela a ocorrência de vulnerabilidades, de ameaças, de vitimizações e danos; III - a defesa de direitos, que visa a garantir o pleno acesso aos direitos no conjunto das provisões socioassistenciais. | À família, à maternidade, à criança e ao adolescente, ao idoso e aos portadores de deficiência. | Universalização dos direitos sociais, a fim de tornar o destinatário da ação assistencial alcançável pelas demais políticas públicas. Concessão do Benefício de Prestação Continuada. Concessão de benefícios eventuais, no caso de nascimento, morte, situações de vulnerabilidade temporária e de calamidade pública. (Varia de acordo com os estados e municípios). |
Programa Bolsa Família Lei no 10.836, de 9 de janeiro de 2004. Cria o Programa Bolsa Família e dá outras providências32. | Programa de transferência de renda com condicionalidades, destinado a famílias em situação de pobreza e extrema pobreza. | Objetivos: Promover o acesso à rede de serviços públicos, em especial, de saúde, educação e assistência social; Combater a fome e promover a segurança alimentar e nutricional; Estimular a emancipação sustentada das famílias que vivem em situação de pobreza e extrema pobreza; Combater a pobreza; e Promover a intersetorialidade, a complementaridade e a sinergia das ações sociais do Poder Público. | As famílias em situação de pobreza e extrema pobreza, que tenham em sua composição gestante, nutriz, criança e/ou adolescente. | Proporciona renda às famílias em situação de pobreza e extrema pobreza. |
Saque FGTS Lei Nº 8.922 de 25 de Julho de 1994. Acrescenta dispositivo ao art. 20 da Lei nº 8.036, de 11 de maio de 1990, para permitir a movimentação da conta vinculada quando o trabalhador ou qualquer de seus dependentes for acometido de neoplasia maligna33. | Permite a movimentação da conta vinculada quando o trabalhador ou qualquer de seus dependentes for acometido de neoplasia maligna. | Permitir a movimentação na conta vinculada do trabalhador no FGTS. | Ao trabalhador, cujo ele próprio ou qualquer de seus dependentes for acometido de neoplasia maligna. | Oferece a possibilidade de o trabalhador ter mais uma fonte de renda quando ele próprio ou seu dependente estiver realizando tratamento oncológico. |
Passe intermunicipal Lei nº 4510, de 13 de janeiro de 2005. Dispõe sobre a isenção do pagamento de tarifas nos serviços de transporte intermunicipal de passageiros por ônibus do estado do Rio de Janeiro, para alunos do ensino fundamental e médio da rede pública estadual de ensino, para as pessoas portadoras de deficiência e portadoras de doença crônica de natureza física ou mental que exijam tratamento continuado e cuja interrupção no tratamento possa acarretar risco de vida, e dá outras providências35. | Dispõe sobre a isenção do pagamento de tarifas nos serviços de transporte intermunicipal de passageiros por ônibus do estado do Rio de Janeiro, para alunos do ensino fundamental e médio da rede pública estadual de ensino, para as pessoas portadoras de deficiência e portadoras de doença crônica de natureza física ou mental que exijam tratamento continuado e cuja interrupção no tratamento possa acarretar risco de vida, e dá outras providências. | A isenção do pagamento de tarifa nos serviços convencionais de transporte rodoviário intermunicipal de passageiros por ônibus do Estado do Rio de Janeiro, bem como nos transportes coletivos aquaviário, ferroviário e metroviário, não seletivos, sob administração estadual, para alunos do ensino fundamental e médio da rede pública estadual, para pessoas portadoras de deficiência e para pessoas portadoras de doença crônica de natureza física e/ou mental, cuja interrupção no tratamento possa acarretar risco de vida. | Alunos do ensino fundamental e médio da rede pública estadual, pessoas portadoras de deficiência e portadores de doença crônica. | Gratuidade no transporte público coletivo para realização do tratamento de saúde. |
Passe Municipal Lei nº 3650, de 21 de setembro de 2001. Dispõe sobre a concessão pelo poder executivo de passe de transporte aos portadores de deficiência e de doenças crônicas de natureza física, mental ou psiquiátrica, nos transportes administrados e/ou concedidos pela Secretaria de Estado de Transportes36. | Concessão pelo poder executivo de passe de transporte aos portadores de deficiência e de doenças crônicas de natureza física, mental ou psiquiátrica, nos transportes administrados e/ou concedidos pela Secretaria de e Estado de Transportes. | Assegurar aos portadores de doenças crônicas, de natureza física ou mental, e de deficiências, que exijam tratamento continuado e/ou diário, e cuja interrupção possa acarretar risco de vida e/ou agravamento do estado de saúde, bem como dificuldades de locomoção reconhecida, e que necessitem para sua terapia ou tratamento o uso dos serviços de transportes coletivos de passageiros a isenção do pagamento das tarifas, mediante apresentação do passe especial de portadores de doenças crônicas e de deficiências. | Pessoas com doença crônica e deficiências. | Gratuidade no transporte público coletivo municipal para realização do tratamento de saúde. |
CLT Decreto-Lei n.º ٥.452, de 1º de maio de 1943 Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho27. | Regulamenta as relações individuais e coletivas de trabalho, nela previstas. | Tem por objetivo regular as relações de trabalho. | Trabalhadores que possuam vínculo com a previdência social. | Não garante o afastamento do trabalhador para acompanhar o filho em tratamento médico. |
Política Nacional para a Prevenção e Controle do Câncer Portaria Nº 874, de 16 de maio de 2013 Institui a Política Nacional para a Prevenção e Controle do Câncer na Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS)22 | É a Política Nacional para a Prevenção e Controle do Câncer na Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). | Reduzir a mortalidade e a incapacidade causadas por esta doença e ainda a possibilidade de diminuir a incidência de alguns tipos de câncer, bem como contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos usuários com câncer, por meio de ações de promoção, prevenção, detecção precoce, tratamento oportuno e cuidados paliativos. Identificar e intervir sobre os determinantes e condicionantes dos tipos de câncer e orientadas para o desenvolvimento de ações intersetoriais de responsabilidade pública e da sociedade civil que promovam a saúde e a qualidade de vida. Eliminar, reduzir e controlar os fatores de risco físicos, químicos e biológicos e a intervenção sobre seus determinantes socioeconômicos, além de integrar ações de detecção precoce do câncer. | Destina-se a toda a população. | Promover tratamento oportuno e seguro dos pacientes diagnosticados com câncer e lesões precursoras, de forma mais próxima possível ao domicílio da pessoa; Atendimento multiprofissional a todos os usuários com câncer, com oferta de cuidado compatível a cada nível de atenção e evolução da doença; Realização de tratamento dos casos raros ou muito raros que exijam alto nível de especialização e maior porte tecnológico em estabelecimentos de saúde de referência nacional; e Oferta de reabilitação e de cuidado paliativo. |
TFD Portaria/SAS/Nº 055 de 24 de fevereiro de 1999. Dispõe sobre a rotina do Tratamento Fora de Domicílio no Sistema Único de Saúde – SUS, com inclusão dos procedimentos específicos na tabela de procedimentos do Sistema de Informações Ambulatoriais do SIA/SUS e dá outras providências34. | É o instrumento legal que viabiliza o encaminhamento de pacientes portadores de doenças não tratáveis em seu município/estado de origem a outros municípios/estados que realize o tratamento necessário. O TFD pode ser intermunicipal ou interestadual. | Visa garantir o acesso de pacientes de um município/estado a serviços assistenciais de outro município/estado. Realiza o custeio das despesas referentes a transporte, diárias para alimentação e hospedagem do paciente e acompanhante. É responsável pelas despesas em caso de óbito do paciente | A todas as pessoas que necessitam se deslocar de seu município/estado de origem para realizar tratamento de saúde em outro município/estado. | O TFD custeará as despesas relativas a transporte aéreo, terrestre e fluvial; diárias para alimentação e pernoite para paciente e acompanhante, devendo ser autorizadas de acordo com a disponibilidade orçamentária do município/estado. Em caso de óbito do usuário em Tratamento Fora do Domicílio, a Secretaria de Saúde do Estado/Município de origem se responsabilizará pelas despesas decorrentes. |
Dentre as normativas para a proteção social das crianças e adolescentes com câncer no Brasil, destaca-se a Política Nacional para a Prevenção e Controle do Câncer (PNPCC). Desde os anos 30 iniciou-se uma preocupação com a prevenção e o controle do câncer, tomando-o como um problema de saúde pública. Naquela época, já se idealizava uma ampla política de combate ao câncer, de âmbito nacional, capaz de orientar as ações preventivas e assistenciais em larga escala corrigindo a tendência de se priorizar as ações terapêuticas individuais, conforme ocorria nos ambientes médico-hospitalares. O objetivo era promover a detecção precoce do câncer e permitir o acesso a um tratamento de qualidade e equitativo em todo o território nacional21.
A PNPCC tem por objetivo a “redução da mortalidade e da incapacidade causadas por esta doença e ainda a possibilidade de diminuir a incidência de alguns tipos de câncer, bem como contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos usuários com câncer”. Visa ainda, promover atendimento multiprofissional aos pacientes diagnosticados, oferecendo tratamento compatível a cada nível de atenção e evolução da doença, além de ofertar tratamento oportuno o mais próximo possível do domicílio da pessoa22. Esta política reconhece o câncer como doença crônica, que necessita de cuidado integral, também destaca a importância da identificação e intervenção sobre os determinantes e condicionantes dos tipos de câncer através de ações intersetoriais que promovam a saúde e a qualidade de vida22. Sendo assim, ela perpassa os diversos aspectos abordados pelos demais documentos apresentados aqui.
A elaboração e aprovação da PNPCC podem ser consideradas um ganho significativo para a população em geral. Entretanto, a política por si só não garante condições concretas para a sua efetivação. Na análise de ações para promoção, prevenção e detecção precoce para o controle do câncer do colo do útero Carvalho23 identificou um descompasso entre a proposta da PNPCC e as ações implementadas, concluindo que esta política ainda não foi efetivada no âmbito municipal. A autora indica ainda a ausência de trabalhos científicos sobre a PNPCC, portanto, uma lacuna na produção do conhecimento sobre o tema. Soma-se a esta observação quanto aos limites de sua abrangência quando se pondera sobre os reflexos desta doença incapacitante na instância familiar como um objeto também pouco contemplado na produção de conhecimento sobre o tema.
Um dos primeiros e principais impactos do tratamento oncológico infantojuvenil para a família é a perda ou diminuição da renda familiar, uma vez que, na maioria dos casos, um dos pais ou responsável se vê obrigado a deixar o trabalho para acompanhar o tratamento do filho. Situação mais grave nos casos em que o provedor é também o único responsável pela criança ou adolescente. Estudos apontam que o adoecimento por câncer de um dos filhos, com a reorganização do cotidiano, pode acarretar o rompimento do vínculo empregatício e comprometer a renda familiar24 devido à dificuldade em conciliar as atividades do cuidado e do trabalho. A permanência prolongada do responsável no cuidado ocasiona frequentemente uma diminuição da renda familiar, dificultando assim a reprodução social de toda a família, bem como a manutenção do tratamento do paciente25. Em seu estudo, sobre os cuidadores/familiares de crianças com câncer, Beck e Lopes26, constatou prejuízo no trabalho em todos aqueles em atividade laboral quando a criança adoeceu e todos afirmaram ser muito difícil conciliar as atividades de cuidado e de trabalho.
No que tange à demanda da família por renda é importante destacar que, como apresentado no Quadro 1, a Consolidação das Leis do Trabalho27 garante apenas o afastamento do próprio trabalhador por motivo de doença (artigo 473 da CLT), não se estendendo para pessoa da família em situação de doença. Os servidores públicos diferentemente, mas com limitações, possuem direito à licença remunerada para acompanhamento de filho doente por determinado período seguida por licença sem remuneração28 (Lei nº 8.112/90 - Capítulo - Das Licenças - Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União, das Autarquias e das Fundações Públicas Federais).
Portanto, frente à precarização das condições de trabalho e de vida da população, torna-se paradoxal, no contexto da atenção à saúde, a demanda por acompanhamento contínuo de um responsável durante o tratamento oncológico infantojuvenil. Isto porque não há respaldo da legislação trabalhista que garanta a manutenção do emprego ou da renda daquele responsável. Ou seja, em termos comparativos, há por parte do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)29, a garantia/necessidade de acompanhamento por parte dos responsáveis junto às crianças ou adolescentes em tratamento de saúde, porém inexiste na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) qualquer previsão de benefício de seguridade social ou de trabalho para tais responsáveis/cuidadores incumbidos desta responsabilidade.
Deve-se ainda considerar os pais ou responsáveis que exercem atividades laborativas informais, ou seja, sem qualquer vínculo trabalhista ou previdenciário. Para estes, as transformações societárias das últimas décadas acirraram as desigualdades sociais, sujeitando um grande contingente de trabalhadores à dependência da assistência social para garantir a sua sobrevivência e a de sua família30 e excluindo outra grande parcela destes benefícios.
A omissão das políticas em relação aos cuidadores/familiares que necessitam deixar o emprego em prol dos cuidados à criança ou adolescente com câncer representa um dos limites do sistema de proteção social brasileiro. A alternativa que se apresenta para essas situações onde o familiar necessita deixar o emprego para acompanhar o tratamento do filho doente ou nos casos em que os pais se encontram desempregados é a de acessar a Política de Assistência Social através do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e/ou do Programa Bolsa Família (PBF). A Lei Orgânica da Assistência Social prevê a concessão do Benefício de Prestação Continuada (BPC)8, que é a transferência de renda destinada a idosos ou pessoas com deficiência, sendo incorporadas as pessoas com doenças genéticas, crônicas e infecciosas graves, cuja renda familiar per capita seja inferior a ¼ de salário mínimo. O valor da transferência é de um salário mínimo mensal. Tal transferência independe de contribuições para o sistema de previdência social e não está condicionada ao cumprimento de contrapartidas.
A possibilidade de o usuário em tratamento oncológico requerer tal benefício ocorre efetivamente com a alteração da LOAS pela Lei 13.146/2015. A partir dessa emenda passou-se a considerar pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas31. A garantia do BPC para as famílias de baixa renda ou sem renda cuja criança ou adolescente esteja realizando tratamento oncológico é fundamental, já que elas, consumidas pelo processo de tratamento, sem renda e sem condições de trabalho, encontram-se em situação de insegurança social13. Entretanto, o BPC possui critérios de seletividade que devem ser atendidos para a concessão do benefício. O principal é a renda familiar per capita que não pode ultrapassar ¼ do salário-mínimo. Também é necessário passar por avaliação social e clínica realizada por técnicos do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS). Essas circunstâncias expõem os usuários, na visão de Silva et al.13 , a situações de incerteza em relação à garantia do benefício e à própria manutenção da renda.
Ainda com relação ao atendimento da demanda por renda, destaca-se a Lei 10.836 de 9 de Janeiro de 2004, que rege o Programa Bolsa Família e o Saque do FGTS. Quanto ao primeiro, este é o maior programa de transferência de renda atualmente no país, assumindo centralidade no Sistema Brasileiro de Proteção Social. O PBF “destina-se à população que vive em situação de fragilidade decorrente da pobreza, ausência de renda, acesso precário ou nulo aos serviços públicos ou fragilização de vínculos afetivos”32. Entretanto, as famílias atendidas pelo PBF devem cumprir exigências básicas, que são: participar de ações no acompanhamento da saúde e do estado nutricional dos filhos, matricular e acompanhar a frequência escolar das crianças e ou adolescentes no ensino fundamental e participar das atividades socioeducativas ofertadas pelos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS). O PBF foi incluído por sua significância para a subsistência das famílias de crianças e adolescentes com câncer, do ponto de vista de quem atua na assistência aos usuários do serviço.
Cabe destacar que tanto o BPC quanto o PBF destinam-se a famílias em situação de vulnerabilidade, tendo como principal critério a renda per capita. É importante sinalizar que os programas sociais focalizados e seletivos, com critérios restritos e inflexíveis, tendem a limitar o acesso dos usuários aos benefícios e serviços dessa política. Dessa forma excluem parcelas da população que, mesmo estando em situação de vulnerabilidade, não atendem aos critérios estabelecidos13.
Em relação ao segundo, trata-se de legislação que garante o Saque do FGTS para o trabalhador cujo dependente esteja com câncer33. O saque do FGTS é a possibilidade de obtenção de uma renda extra, em um momento em que os gastos da família se elevam. Entretanto, devemos considerar que é uma renda pontual e cuja possibilidade de acesso existe apenas para as pessoas que em algum momento trabalharam com vínculo previdenciário.
No que se refere à realização do tratamento há outra demanda crucial relacionada ao deslocamento necessário do domicílio à unidade de saúde. Para esta situação foi criada a Portaria/SAS/Nº 055, de 24 de fevereiro de 1999, que dispõe sobre a rotina do Tratamento Fora de Domicílio (TFD), no Sistema Único de Saúde (SUS). Ela viabiliza o encaminhamento de pacientes portadores de doenças não tratáveis em seu município/estado de origem a outros municípios/estados que realizem o tratamento exigido. É uma forma de garantir o acesso do paciente ao tratamento necessário, mesmo quando este não exista em seu município ou estado34. O TFD custeia os gastos com transporte, hospedagem e alimentação. Porém, essa portaria destaca que os municípios e estados irão custear os gastos acima relacionados de acordo com a disponibilidade orçamentária, o que pode acarretar a não efetivação deste direito.
Cabe também observar, como consta dos dados apresentados, as Leis referentes à gratuidade nos transportes públicos coletivos da rede municipal e intermunicipal35,36, que em conjunto com o TFD, visam garantir o acesso do paciente à unidade de saúde onde realiza tratamento. Entretanto, a gratuidade nos transportes públicos coletivos também possui alguns limites, não servem para todos os tipos de ônibus; tem número de passagens pré-determinados por mês; e, o trâmite para sua concessão é demorado. E, ainda existem os casos de pacientes que não possuem condições clínicas de utilizar o transporte público, tornando o seu acesso à unidade de saúde uma questão a ser resolvida no âmbito da família e da comunidade.
Em seu estudo, Maldaner et al.37 destaca que a distância entre a residência e a unidade de saúde repercute em ônus financeiro para a família, podendo contribuir para a descontinuidade ou interrupção do tratamento.
Por fim, pondera-se que as políticas de proteção social não vêm conseguindo atender às demandas impostas pelo tratamento oncológico que, além das já citadas, podemos destacar: condições adequadas de habitação e saneamento básico; condições de higiene – rede de esgoto e água potável; alimentação saudável; acessibilidade; acesso a bens e serviços sociais13.
Como apresentado neste artigo, o tratamento oncológico infantojuvenil gera inúmeras demandas, como: a reorganização da rotina familiar para acompanhar a criança e ou adolescente, a alteração da situação de trabalho dos responsáveis, a necessidade de manutenção da renda familiar, o deslocamento do domicílio à unidade de saúde, dentre outras. Trata-se de questões complexas que extrapolam o escopo deste trabalho. O levantamento das Leis, Decretos, Portarias e Políticas somados à literatura sobre as crianças e ou adolescentes com câncer destacou aspectos relacionados à demanda por renda e deslocamento.
A PNPCC pode, sem dúvida, ser considerada um avanço para o controle e prevenção do câncer, entretanto, como uma política recente, encontra barreiras em sua implementação no atual contexto da saúde pública no Brasil. Ainda é notório o distanciamento entre a política escrita e a efetivação da garantia do direito aos que dela deveriam se beneficiar de fato.
Em relação à demanda por acompanhamento da criança ou adolescente, os funcionários públicos possuem garantia por lei de acompanhar os filhos doentes ainda que por tempo limitado. Os demais trabalhadores, que exercem atividades de trabalho formais ou informais, não possuem qualquer garantia de manutenção de seus empregos ou de sua renda durante o período de tratamento dos filhos, o que se destaca como um limite importante da atual política de proteção social brasileira.
Quanto ao BPC, grandes avanços foram alcançados, como a ampliação do conceito de deficiência, as mudanças no conceito de família e os mecanismos de avaliação, que passaram a incluir avaliação social além da perícia médica. Estes propiciaram um maior acesso ao benefício para pacientes com câncer. Porém, alguns desafios se apresentam, como: a concessão do benefício de acordo com a renda per capita, como principal critério, balizada em um valor muito baixo e a concessão do benefício que ainda muito depende dos critérios de avaliação utilizados pelo perito médico. Por estas razões, mesmo sendo esta uma das principais políticas de proteção social, seu alcance ainda é reduzido.
Ainda com relação à renda, a criação do PBF significou um avanço no âmbito do Sistema Brasileiro de Proteção Social, como mecanismo de combate à pobreza no país, caracterizando-se como única fonte de renda para muitas famílias. No entanto, o mesmo é focalizado na população pobre e extremamente pobre, tendo como principal critério de acesso a renda per capita, o que demonstra o seu caráter restritivo. Cabe ainda destacar, que uma das contrapartidas para o recebimento do benefício é a frequência escolar, que pode ficar comprometida devido ao tratamento oncológico infantojuvenil. Sendo assim, famílias que estavam inseridas no programa antes do adoecimento do filho, podem ser excluídas do mesmo devido ao não cumprimento deste critério.
Quanto às legislações que garantem o transporte para deslocamento do paciente de seu domicílio até a unidade de saúde, tanto o TFD quanto a gratuidade no transporte público se constituem como importantes mecanismos de garantia do tratamento oncológico infantojuvenil, porém ambas apresentam limites significativos. No caso do TFD a legislação define que a atuação dos estados e municípios nesta área dependerá da disponibilidade orçamentária, deixando brechas para a não execução ou execução parcial do que é preconizado na Portaria. Em relação à gratuidade no transporte público, a aprovação desse direito tem sido demorada, restrita a alguns tipos de veículo e conta com número de passagens reduzidas comprometendo o acesso do paciente à unidade de saúde.
Depreende-se que o atual sistema de proteção social brasileiro é um importante instrumento para a garantia do tratamento oncológico infantojuvenil. No entanto, diante da magnitude da situação do câncer no Brasil, há, neste momento, demanda por políticas públicas mais abrangentes e com critérios menos inflexíveis, que possibilitem as condições necessárias para que o tratamento e o cuidado sejam exercidos.
Com base no material reunido cabe reiterar que este estudo restringe-se à questão da proteção social relacionada ao câncer entre crianças e adolescentes e seu impacto nas relações familiares a partir de um conjunto específico de documentos oficiais escolhidos mediante os critérios expostos. Ainda que tenha sido considerada uma dimensão relevante do problema, este não se encontra reduzido a esta, pois se trata de um fenômeno complexo e multifacetado. Não foi objetivo do estudo, por exemplo, contemplar uma discussão das interfaces e interrelações entre demandas sociais e demandas de saúde no âmbito mais amplo das políticas públicas de saúde no Brasil, o que poderia ser considerado aqui como um limite do estudo. Destaca-se, no entanto, a urgente necessidade de ampliação das políticas públicas que oferecem suporte a essas famílias, possibilitando-lhes o acesso integral à saúde, entendendo que a garantia de suporte social e financeiro são fatores essenciais para o objetivo maior da promoção da saúde. Os estudos sobre a população infantojuvenil em tratamento oncológico demandam a agregação de saberes, que tenham como norte a atenção integral, envolvendo pacientes e família. Sendo assim, é necessário aprofundar o conhecimento sobre as demandas apresentadas, em seu caráter singular e coletivo, e a proteção social destinada a esta parcela da população, objetivando a melhoria da qualidade da assistência oncológica.
Por fim, é necessário chamar a atenção dos profissionais de saúde, da sociedade civil e do poder público quanto às questões de caráter coletivo do câncer infantojuvenil, e de seu tratamento, que estão para além dos aspectos biológicos e psicológicos abordados como inerentes ao adoecimento por câncer neste grupo social. São questões fundamentais relacionadas aos direitos sociais que têm impacto profundo na vida do paciente e de sua família como pretendemos indicar e contribuir para o debate. Ademais este estudo pode contribuir para uma maior visibilidade dos documentos oficiais disponíveis como ferramenta auxiliar na abordagem de profissionais dedicados ao cuidado em saúde.