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Reconstrução da cadeia ossicular na otite média crônica: resultados auditivos e análise de fatores prognósticos

Reconstrução da cadeia ossicular na otite média crônica: resultados auditivos e análise de fatores prognósticos

Autores:

Syriaco Atherino Kotzias,
Mariana Manzoni Seerig,
Maria Fernanda Piccoli Cardoso de Mello,
Leticia Chueiri,
Janaina Jacques,
Martin Batista Coutinho da Silva,
Daniel Buffon Zatt

ARTIGO ORIGINAL

Brazilian Journal of Otorhinolaryngology

versão impressa ISSN 1808-8694versão On-line ISSN 1808-8686

Braz. j. otorhinolaryngol. vol.86 no.1 São Paulo jan./fev. 2020 Epub 30-Mar-2020

http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2018.09.005

Introdução

Otite média crônica (OMC) é definida como a presença de doença inflamatória irreversível na orelha média. Geralmente afeta a cadeia ossicular, leva a perda auditiva condutiva. A erosão total ou parcial da cadeia ossicular é observada em cerca de 80% dos pacientes que apresentam otite média crônica colesteatomatosa (OMCC), enquanto que na ausência de colesteatoma ela pode estar presente em aproximadamente 20%. A bigorna é o ossículo mais frequentemente afetado, seguido pelo estribo e martelo.1

O objetivo da reconstrução da cadeia ossicular é restaurar a audição. Há muitos fatores que podem afetar os desfechos nesse procedimento, inclusive o estado da orelha média e da tuba auditiva, a técnica cirúrgica, o tipo de prótese e a condição dos remanescentes ossiculares residuais.2,3 Em 1971, Austin classificou a ruptura da cadeia ossicular em 4 grupos (A - D) com base na presença ou ausência do cabo do martelo e do arco do estribo. Kartush acrescentou três categorias a essa classificação: cadeia ossicular intacta (0), fixação da cabeça do martelo (E) e fixação do estribo (F).4 Kartush também descreveu um escore, denominado MERI (Índice de risco da orelha média), para estratificar os pacientes de acordo com a gravidade da doença. O escore MERI leva em consideração a presença ou ausência de otorreia e colesteatoma, perfuração da membrana timpânica, estado da cadeia ossicular (critérios de Austin-Kartush), tecido de granulação na orelha média e cirurgia anterior (tabela 1).5 A fim de prever os resultados auditivos na reconstrução da cadeia ossicular, Dornhoffer e Gardner desenvolveram outro índice intitulado OOPS (do inglês ossiculoplasty outcome parameter staging ou estadiamento do parâmetro de desfecho da ossiculoplastia). Esse índice analisa quase os mesmos parâmetros que o escore MERI, porém classifica a cadeia ossicular da seguinte forma: normal ou anormal com ou sem martelo, não leva em consideração a condição do estribo (tabela 2).2,6,7

Tabela 1 Índice de Risco da Orelha Média (MERI) 

Fator de risco Valor de risco
Otorreia
I Seca 0
II Ocasionalmente úmida 1
III Persistentemente úmida 2
IV Úmida, fenda palatina 3
Perfuração
Ausente 0
Presente 1
Colesteatoma
Ausente 0
Presente 1
Estado ossicular (Austin/Kartush)
O: M + B + E + 0
A: M + E + 1
B: M + E- 2
C: M-E + 3
D: M-E- 4
E: Fixação da cabeça do ossículo 2
F: Fixação do estribo 3
Granulação ou efusão da orelha média
Não 0
Sim 1
Cirurgia anterior
Nenhuma 0
Estadiamento cirúrgico 1
Revisão 2

MERI 0, normal; MERI 1-3, doença leve; MERI 4-6, doença moderada; MERI 7-12, doença grave.

Tabela 2 Índice do Estadiamento do Parâmetro de Desfecho da Ossiculoplastia (OOPS) 

Fator de risco Valor de risco
Fatores da orelha média
Drenagem
Nenhum 0
Presente ˃ 50% do tempo 1
Mucosa
Normal 0
Fibrótica 2
Ossículos
Normal 0
Anormal, martelo + 1
Anormal, martelo- 2
Fatores cirúrgicos
Tipo de cirurgia
Sem mastoidectomia 0
Mastoidectomia canal wall-up 1
Mastoidectomia canal wall-down 2
Cirurgia de revisão
Não 0
Sim 2

O objetivo deste estudo é verificar a eficiência desses escores na predição de desfechos em ossiculoplastias e também avaliar o impacto das condições da cadeia ossicular nos resultados.

Método

Aprovação do comitê de ética

Este estudo foi aprovado pelo comitê de ética de nossa instituição em 4 de julho de 2017, sob o número de protocolo 073627/2017.

Seleção de pacientes

Os registros de todos os pacientes submetidos à cirurgia otológica pelo autor sênior entre fevereiro de 2006 e dezembro de 2016 foram revisados. Foram incluídos pacientes com otite média crônica e erosão ou ruptura da cadeia ossicular identificados durante a cirurgia na qual a ossiculoplastia foi feita. Casos congênitos e tumorais foram excluídos. Também foram excluídos pacientes que não tinham registros adequados da cirurgia e audiogramas pré ou pós-operatórios. Nos pacientes que necessitaram de cirurgia de revisão, apenas a primeira ossiculoplastia feita pelo autor sênior foi incluída e quando a cirurgia foi feita em estágios, incluímos apenas o procedimento na qual a ossiculoplastia foi feita. No entanto, pacientes que haviam sido submetidos a ossiculoplastia prévia em outros lugares e foram submetidos a cirurgia de revisão foram incluídos. Os seguintes dados foram obtidos dos prontuários analisados: sexo do paciente, idade na cirurgia, tabagismo, OMC com ou sem colesteatoma, indicação de cirurgia, lateralidade do procedimento, procedimento feito, história de cirurgia anterior e se foi feita por estágios ou revisão, presença de otorreia pré-operatória, estado intraoperatório da mucosa e ossículos (presença ou ausência de bigorna, estribo e martelo). A reconstrução da cadeia ossicular foi feita com o uso de ossículos autólogos, osso cortical ou cartilagem tragal. Os pacientes foram classificados de acordo com o índice OOPS e MERI.

Métodos audiométricos

Os limiares de via aérea (VA) e via óssea (VO) em 0,5, 1, 2 e 3 kHz foram registrados e usados para calcular as médias de tom puro (PTA, do inglês pure tone average). Nos casos em que o limiar de 3KHz não estava registrado foi utilizada a média entre 2 e 4 KHz. O GAP AO (gap aéreo ósseo) foi a diferença entre o limiar de VA e limiar da VO. Os limiares de reconhecimento da fala (SRT) pré-operatório e pós-operatório foram registrados.

Analise estatística

Os dados foram analisados com o software IBM/SPSS, versão 19 (statistical package for social sciences). Variáveis contínuas foram testadas com o teste de Pearson. Comparações de variáveis categóricas foram feitas com o coeficiente de contingência. Um valor de p < 0,05 foi considerado indicativo de significância estatística.

Medidas de desfecho

As medidas de desfecho primário incluíram resultados auditivos e foram obtidas de 90 dias a 5 anos após a cirurgia. Consideramos um período mínimo de acompanhamento de 6 meses. A ossiculoplastia bem-sucedida foi definida como GAP AO pós-operatório ≤ 20 dB. Os escores MERI e OOPS foram determinados para todos os pacientes. Para comparar as categorias de risco, os pacientes foram divididos em seis grupos: para o índice OOPS, os pacientes foram classificados como baixo risco (1-3), risco intermediário (4-6) e alto risco (7-9) e de acordo com o escore MERI, eles foram divididos em doença leve (1-3), doença moderada (4-6) e doença grave (7-12). Então, para uma análise detalhada, foram avaliados o tipo de cirurgia, doença da orelha média, estado da cadeia ossicular de acordo com a classificação de Austin-Kartush apresentada na tabela 1, as próteses usadas e os pacientes foram divididos em grupos para comparar os resultados auditivos.

Resultados

Foram revisados 269 prontuários entre fevereiro de 2006 e dezembro de 2016. Cinco pacientes foram excluídos por não se enquadrarem no diagnóstico de otite média crônica (três pacientes apresentavam paragangliomas do osso temporal e dois apresentavam atresia congênita da orelha) e 88 não haviam sido submetidos a ossiculoplastia. Também foram excluídos 104 pacientes sem registros adequados relacionados ao seu diagnóstico, cirurgia, dados clínicos ou audiométricos. Foram incluídos no estudo 68 pacientes (72 orelhas).

A idade média dos pacientes foi 36,6 ± 15,52 anos e 54,1% eram do sexo feminino, enquanto 48,61% eram do masculino. Não houve prevalência de orelha (50% esquerda ou 50% direita). O diagnóstico mais comum foi otite média crônica primária com colesteatoma (58,4%), seguido por OMC sem colesteatoma em 41,6%, e, nesse último grupo, 20,8% dos pacientes apresentavam doença supurativa. No geral, a otorreia foi encontrada em 64% das orelhas. Apenas 14% dos pacientes eram fumantes (tabela 3). No total, 23 timpanoplastias, 38 mastoidectomias canal Wall-Up (CWUM) e 11 mastoidectomias canal Wall-Down (CWDM) foram feitas (fig. 1).

Tabela 3 Informações demográficas 

Número de orelhas 72
Média da idade (anos) 36,6 ± 15,52
Sexo, n (%) Masculino Feminino
35 (48,6%) 37 (51,4%)
Lateralidade, n (%) Orelha direita Orelha esquerda
36 (50%) 36 (50%)
Tabagismo, n (%) Sim Não
10 (14%) 62 (86%)
Otorreia, n (%) Sim Não
46 (64%) 26 (36%)
Diagnostico, n (%) Otite média crônica não supurativa 15 (20,8%)
Otite média crônica supurativa 15 (20,8%)
Colesteatoma primário adquirido 40 (55,6%)
Colesteatoma secundário adquirido 2 (2,8%)

Figura 1 Tipo de cirurgia. 

A erosão da bigorna foi a anormalidade ossicular mais frequente e foi observada em 31 (43%) orelhas, seguida pela erosão do estribo em 19 (26%) e erosão do martelo e estribo em 15 (21%). A erosão do martelo com estribo intacto foi observada em apenas 7 orelhas (10%) (fig. 2).

Figura 2 Estado da cadeia ossicular pré-operatória. M + S + indica martelo e estribo presentes; M + S-, martelo presente e estribo ausente; M- S + , martelo ausente e estribo presente e M-S-, martelo e estribo ausentes. 

A prótese mais frequentemente usada foi a cartilagem tragal (n = 47), correspondeu a 65% dos casos. A bigorna autóloga foi usada em 17 (24%) pacientes e osso cortical foi usado em 8 (11%). O grupo de cartilagem tragal apresentou GAP AO pós-operatório ≤ 20 dB em 72,3% dos casos, enquanto 59% dos pacientes com bigorna autóloga e 62,5% do grupo que recebeu osso cortical apresentaram PTA - GAP >20 dB (p = 0,04).

O GAP AO médio pré-operatório foi de 34,63 ± 9,94 dB e o pós-operatório foi de 17,26 ± 12,92 dB. A média do SRT pré-operatório foi de 54,72 ± 14,98 dB e após a cirurgia foi de 40,42 ± 20 dB, demonstrou uma melhoria de 14,30 dB (p < 0,05).

Antes da cirurgia, 87,5% dos pacientes apresentavam um GAP >20 e 61% dos pacientes obtiveram um GAP AO pós-operatório ≤ 20 dB (fig. 3). Uma melhoria no SRT foi observada em 77,8% dos pacientes após a cirurgia, enquanto 7% mantiveram o mesmo SRT e 15,3% apresentaram resultados de deterioração.

Figura 3 Comparação entre GAP (Gap aéreo-ósseo) pré-operatório e pós-operatório. 

Três grupos de pacientes, com base em baixo risco (OOPS 1-3; Grupo 1), risco intermediário (OOPS 4-6; Grupo 2) e alto risco (OOPS 7-9; Grupo 3) foram arbitrariamente criados para avaliar o impacto da gravidade da doença nos resultados da reconstrução da cadeia ossicular. Dos pacientes do grupo 1, 73% obtiveram um GAP AO ≤20 dB, embora essa tendência não tenha alcançado significância estatística (p = 0,265) (tabela 4).

Tabela 4 Correlação entre o índice OOPS e o gap aéreo-ósseo (GAP AO) no pré-operatório 

OOPS GAP AO ≤ 20 dB GAP AO > 20 dB
Baixo risco (1-3) 73,1% (19) 26,9% (7)
Risco intermediário (4-6) 53,5% (23) 46,5% (20)
Alto risco (7-9) 66,7% (2) 33,3% (1)
Total 61,1% (44) 38,9% (28)

p > 0,05.

Os pacientes também foram divididos em três grupos de acordo com o índice MERI: doença leve (MERI 1-3; Grupo 4), doença moderada (MERI 4-6; Grupo 5) e doença grave (MERI 7-12; Grupo 6). Observamos que 70% dos pacientes do Grupo 4 apresentaram um GAP AO ≤ 20 dB no seguimento, enquanto no Grupo 6, 64% apresentaram um GAP >20 dB, demonstrou-se que pacientes com doença leve de acordo com o índice MERI tiveram melhores resultados pós-operatórios do que pacientes com doença grave (p = 0,01) (tabela 5).

Tabela 5 Correlação entre o índice MERI e o gap aéreo-ósseo (GAP AO) no pré-operatório 

Índice MERI GAP AO ≤ 20 dB GAP AO > 20 dB
Doença leve (1-3) 70% (7) 30% (3)
Doença moderada (4-6) 72,5% (29) 27,5% (11)
Doença grave (7-12) 36,4% (8) 63,3% (14)
Total 61,1% (44) 38,9% (28)

p < 0,05.

Em relação à cadeia ossicular, observamos que o ossículo mais frequentemente erodido foi a bigorna (n = 31). Os melhores resultados de reconstrução da cadeia ossicular ocorreram no Grupo A de Austin-Kartush (74% dos pacientes apresentaram um GAP AO ≤ 20 dB), seguido pelo Grupo C (85,7% atingiram um GAP AO ≤ 20 dB), enquanto os piores resultados foram observados em pacientes com erosão do estribo (GAP ≤ 20 dB em 63,2% dos pacientes) e pacientes sem martelo e sem estribo (80% deles apresentaram um GAP >20 dB) (p = 0,02) (tabela 6).

Tabela 6 Correlação entre os critérios de Austin-Kartush e os resultados auditivos de acordo com o gap aéreo-ósseo (GAP) no pós-operatório 

GAP ≤ 20 dB GAP > 20 dB Total
M + S + 23 (74,2%) 8 (25,8%) 31 (100%)
M + S- 12 (63,2%) 7 (36,8%) 19 (100%)
M- S + 6 (85,7%) 1 (14,3%) 7 (100%)
M- S- 3 (20%) 12 (80%) 15 (100%)
Total 44 (61%) 28 (39%) 72 (100%)

M + S + , martelo e estribo presentes; M + S-, martelo presente e estribo ausente; M- S + ; martelo ausente e estribo presente; M- S-, martelo e estribo ausentes.p < 0,05.

Discussão

Em pacientes com OMC, o objetivo da cirurgia é fornecer uma orelha seca, garantir a função da tuba auditiva e restaurar o sistema de condução sonora da orelha média. A reconstrução da cadeia ossicular representa um desafio até mesmo para otologistas experientes e o sucesso é alcançado com um resultado audiométrico bom e duradouro, representado pelo fechamento do GAP AO pós-operatório menor ou igual a 20 dB.2,5 Em nosso estudo, 61% dos pacientes apresentaram um GAP ≤ 20 dB e esse resultado foi semelhante a outras series.2,8-11 Observamos também uma melhoria média de 14,3 dB nos limiares de reconhecimento da fala no pós-operatório. A média do GAP antes da cirurgia foi de 34,63 dB e diminuiu para 17,26 dB após a reconstrução, mostrou uma melhoria de 17,36 dB.

A reconstrução ideal deve ser de fácil execução e os materiais devem ser bem tolerados pelo paciente, com baixa taxa de reabsorção ou extrusão, devem proporcionar bons resultados auditivos ao longo do tempo. Uma ampla variedade de materiais pode ser usada para reconstrução ossicular, isto é, autoenxertos (bigorna autóloga, cartilagem tragal, osso cortical), cimento ósseo ou prótese. Acreditamos que os materiais de autoenxerto são uma boa opção devido à biocompatibilidade, baixa taxa de extrusão e seu menor preço, em comparação a outros tipos de próteses. Emir et. al. relataram uma taxa de sucesso de 58,1% com bigorna autóloga e 71,4% com osso cortical.11 O'Connel et al. descreveram uma série de 156 pacientes submetidos a ossiculoplastia com prótese de titânio e verificaram que 67% dos pacientes obtiveram GAP ≤ 20 dB no seguimento de curto prazo (< 6 meses).12 Nessa série, a maior parte das reconstruções foi feita com cartilagem do trágus, apresentando 72,3% de sucesso e com seguimento médio (inclusive exames audiométricos) de um ano. Geralmente usamos cartilagem tragal na presença do estribo, interpondo-a entre o capitulum e o cabo do martelo. Se o estribo está ausente ou erodido, usamos o osso cortical, posicionando-o entre a platina do estribo e o cabo do martelo, ou até a membrana timpânica, se o martelo estiver ausente. Sugerimos que a ausência de estribo provavelmente possa explicar nossos resultados ruins com osso cortical.

O uso de um índice de estratificação de risco permite aos cirurgiões comparar os pacientes de acordo com as condições pré-operatórias, pode ajudar a prever os resultados auditivos e os riscos de complicações ou recorrência e também pode ser útil para os pacientes, fornece informações úteis sobre a doença, de forma que possam modificar os fatores de risco relacionados ao insucesso da cirurgia. Entretanto, a criação de uma ferramenta ideal é difícil, por causa das variações em diferentes populações, habilidade do cirurgião, técnicas cirúrgicas e elementos extrínsecos à orelha média (tabagismo, doença adenoideana, ambiente onde vivem e refluxo gastroesofágico).6 Dornhoffer e Gardner criaram o índice OOPS, consideraram que a ausência de martelo, mucosa da orelha média fibrótica e otorreia poderiam ser úteis no prognóstico dos resultados auditivos após ossiculoplastias.7 Cox et al. identificaram uma forte correlação positiva entre o escore do índice OOPS e a média do GAP AO pós-operatório e verificaram que os resultados auditivos tendem a permanecer estáveis, especialmente em pacientes de menor risco.2 Em nosso estudo, demonstramos melhores resultados audiométricos nos pacientes do Grupo 1 (73,1% atingiram GAP AO ≤ 20 dB), mas não foi estatisticamente significante. Ao usar esse índice, observamos que mais da metade dos pacientes eram classificados como risco intermediário, com apenas três pacientes no grupo de alto risco.

O índice MERI, descrito por Kartush, estratifica os pacientes de acordo com o ambiente da orelha média (presença de otorreia, tecido de granulação), perfuração de membrana timpânica, existência de colesteatoma e fornece um escore diferente para cada tipo de erosão ou fixação ossicular.11 No presente estudo, 70% dos pacientes classificados como doença leve (escore 1-3) apresentaram fechamento pós-operatório de GAP ≤ 20 dB, enquanto no grupo de doença grave (escore 7-12) obtivemos sucesso apenas em 36,4% dos pacientes (p = 0,017).

Quando se trata do dano aos ossículos individuais como determinante dos resultados auditivos nas ossiculoplastias, os dados da literatura são controversos. Muitos autores acreditam que a presença do martelo prediz os melhores resultados, independentemente da condição do estribo.4,7,13,14 Blom et al. analisaram os grupos de Austin-Kartush em sua metanálise e demonstraram uma diferença significativa na média do GAP em favor do Grupo B (11,1) quando comparado ao Grupo C (15,7).4 Bared e Angeli relataram a presença do cabo do martelo como fator prognóstico favorável na reconstrução da cadeia ossicular.14 Sabe-se que o martelo contribui para a estabilidade da membrana timpânica e consequente estabilidade da cadeia ossicular. Ele também previne a lateralização do enxerto e age para melhorar a condução do som através da alavanca catenária.

Por outro lado, alguns autores consideram que a presença da supraestrutura do estribo é crucial nos desfechos audiométricos. Castro et al. revisaram 153 ossiculoplastias e encontraram que a média do GAP pós-operatório em pacientes com supraestrutura do estribo foi de 11,6 ± 10,2 dB, enquanto que em pacientes sem estribo essa média aumentou para 17,7 ± 9,91, associaram a taxa de sucesso à presença desse ossículo.3 Em nosso estudo, observamos que em pacientes com ausência ou erosão da bigorna (Grupo A de Austin-Kartush) a interposição foi bem sucedida em 74,2%. Comparando os pacientes dos Grupos B e C, obtivemos melhores resultados no Grupo C, nos quais a supraestrutura do estribo estava presente, com 85,7% de sucesso. Os pacientes do grupo B apresentaram GAP ≤ 20 dB em 63% dos casos e os pacientes do grupo D tiveram os piores resultados (80% permaneceram com GAP >20 dB). Portanto, com base nessa série, podemos observar que a presença da supraestrutura do estribo é um bom preditor de sucesso na reconstrução da cadeia ossicular.

Conclusão

Classificamos nossos pacientes de acordo com dois sistemas e concluímos que o índice OOPS parece não ser preciso no prognóstico dos desfechos auditivos, enquanto o índice MERI pode ser uma ferramenta valiosa para os cirurgiões estimarem os riscos e prever o sucesso da cirurgia, bem como selecionar os melhores candidatos para a reconstrução. Em relação à cadeia ossicular, concluímos que status de cada ossículo é importante para o sucesso, principalmente a presença do estribo. Nesta série, o sucesso cirúrgico foi de 61% dos casos e também apresentou melhora de 17,26 no GAP AO após a cirurgia. Na presença da supraestrutura do estribo, a taxa de sucesso foi de 85,7%.

REFERÊNCIAS

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