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Relação entre a mobilidade diafragmática e as curvaturas da coluna vertebral em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica

Relação entre a mobilidade diafragmática e as curvaturas da coluna vertebral em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica

Autores:

Márcia Aparecida Gonçalves,
Bruna Estima Leal,
Gabriella Da Cunha Viegas,
Mariana Nunes Lúcio,
Giovana Zarpellon Mazo,
Elaine Paulin

ARTIGO ORIGINAL

Fisioterapia e Pesquisa

versão On-line ISSN 2316-9117

Fisioter. Pesqui. vol.24 no.3 São Paulo jul./set. 2017

http://dx.doi.org/10.1590/1809-2950/15809024032017

RESUMEN

En la enfermedad pulmonar obstructiva crónica (EPOC), los pacientes pueden presentar reducción de la movilidad diafragmática y muchas compensaciones en la columna torácica, en las cinturas escapular y pélvica. No obstante, no está clara la relación de la movilidad diafragmática con las alteraciones posturales en la columna vertebral y en la pelvis de esos individuos. Se tuvo el objetivo de ver si hay relación entre la movilidad diafragmática con las curvaturas de la columna vertebral de los pacientes con la EPOC y en los individuos aparentemente saludables. Fueron evaluados 22 pacientes con la EPOC y 22 individuos aparentemente saludables. Las evaluaciones fueron: la antropometría, la espirometría, la movilidad diafragmática y la evaluación postural. Fueron analizadas cuatro alteraciones posturales: la lordosis cervical, la cifosis torácica, la lordosis lumbar, la posición pélvica. No hubo diferencia estadísticamente significativa entre los grupos, en relación a las variables edad, la masa corporal, la estatura y el IMC, confirmando que los grupos fueron pareados. No hubo diferencia estadísticamente significante en ninguna de las variables referentes a las curvaturas de la columna vertebral y a la posición de la pelvis entre los grupos estudiados. En el grupo EPOC hubo correlación de la movilidad diafragmática con la cifosis torácica (r = -0,543; p = 0,009). Ya en relación al grupo de los individuos aparentemente saludables, no hubo correlación de la movilidad cuanto a los individuos aparentemente saludables que presentaron los mismos ángulos de curvatura de la columna vertebral y la misma posición de la pelvis. No obstante, los pacientes con la EPOC presentaron relación entre la movilidad diafragmática y el ángulo de la curvatura torácica.

Descritores: Enfermedad Pulmonar Obstructiva Crónica; Diafragma; Coluna Vertebral

INTRODUÇÃO

A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) é a quarta principal causa de morte no mundo. É uma doença comum, evitável e tratável, caracterizada por limitação persistente do fluxo aéreo, usualmente progressiva, associada a um aumento da resposta inflamatória crônica nas vias aéreas e nos pulmões à exposição de partículas ou gases nocivos1). Existem evidências de que a DPOC acarreta prejuízos na mecânica respiratória e na postura2 3.

Na DPOC a mecânica respiratória é prejudicada por diversos fatores, dentre eles, as alterações dos volumes e capacidades pulmonares que ocorrem devido aos processos fisiopatológicos da doença tais como, perda de recolhimento elástico, obstrução ao fluxo aéreo, aprisionamento de ar4 e a hiperinsuflação pulmonar5. Estudos tem demonstrado que esses mecanismos estão relacionados com a redução da mobilidade diafragmática que ocorre pela redução da relação tensão comprimento na zona de aposição e no raio de curvatura do músculo diafragma6.

Já está bem estabelecido na literatura que os pacientes com DPOC apresentam redução da mobilidade diafragmática devido a sua doença7 8 9 10 11 12. Contudo, poucos estudos tem investigado os comprometimentos no alinhamento postural2 3. Apesar da escassez na literatura no que se refere à descrição quantitativa das alterações posturais em pacientes com DPOC, observa-se na prática clínica os comprometimentos posturais que parecem ficar mais evidentes principalmente nos pacientes em estágios mais avançados da doença3.

Algumas evidências sugerem que a atitude postural do tórax hiperinsuflado pode levar a uma série de alterações na coluna cervical, coluna torácica, cintura escapular e pélvica2 3 13. Além disso, outra hipótese seria que a biomecânica da caixa torácica pode influenciar a mecânica corporal global e qualquer anormalidade da caixa torácica poderá resultar em alterações na postura e no balanço de todo o corpo14. Destaca-se que ainda não está claro o quanto uma variável pode influenciar a outra, desta forma, torna-se necessário a realização de pesquisas futuras.

Baseado no exposto verifica-se que a redução da mobilidade diafragmática e as alterações posturais são frequentemente observadas em pacientes com DPOC. Contudo, não existem estudos direcionados a avaliar a alteração da mobilidade do diafragma e as curvaturas torácicas nessa população. Portanto, o objetivo do estudo foi verificar se existe relação entre a mobilidade diafragmática e as curvaturas da coluna vertebral no paciente com DPOC e nos indivíduos aparentemente saudáveis.

METODOLOGIA

O presente estudo é uma pesquisa analítica do tipo transversal e de abordagem quantitativa. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com seres humanos da Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis (CAAE: 08857612.2.0000.0118). Todos os indivíduos foram informados sobre a pesquisa e assinaram termo de consentimento livre e esclarecido, conforme determina a resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde.

Participaram do estudo 44 indivíduos de ambos os sexos (21 homens e 23 mulheres), os quais foram divididos em dois grupos: grupo 1 composto por 22 pacientes com DPOC, com idade de 65,8 (± 8,0) anos e o grupo 2 composto por 22 indivíduos aparentemente saudáveis, com 63,7 (± 5, 2) anos.

No grupo DPOC foram incluídos pacientes com diagnóstico de DPOC segundo a classificação do Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease (GOLD) 1 e que preenchiam os seguintes critérios de inclusão: 1) estabilidade clínica no último mês e no início do protocolo de avaliação; 2) pacientes que não faziam uso de suplementação de oxigênio; 3) inexistência de outras doenças respiratórias ou cardiovasculares associadas; 4) pacientes sem envolvimento em programas de reabilitação pulmonar nos 6 meses anteriores ao início do presente estudo; 5) pacientes que não foram submetidos a cirurgias recentes na coluna vertebral ou em membros inferiores e/ou que não tiveram fraturas nos 6 meses anteriores.

Como critérios de exclusão foram considerados: 1) presença de exacerbações da doença durante a pesquisa; 2) intercorrências clínicas de natureza cardiorrespiratória durante as avaliações; 3) incapacidade de realizar qualquer uma das avaliações do estudo (falta de compreensão ou colaboração) e; 4) desistência do paciente durante o período de avaliação.

Foram incluídos no grupo indivíduos aparentemente saudáveis, com espirometria normal (VEF1/CVF ≥ 0,7; VEF1 ≥ 80% do previsto, CVF ≥ 80% do previsto), sem comorbidades associadas e com idade, peso e IMC compatível com os pacientes com DPOC. Foram excluídos desse grupo os indivíduos que apresentassem incapacidade de realizar qualquer uma das avaliações do estudo (falta de compreensão ou colaboração) e/ou que desistissem durante o processo da avaliação.

Parâmetros avaliados

Antropometria

Para a realização das medidas antropométricas foi utilizada uma balança previamente calibrada para a aferição da massa corporal e um estadiômetro para a mensuração da estatura. Obtidos os valores antropométricos, calculou-se o índice de massa corporal (IMC) por meio da equação: massa corporal/estatura2 e os indivíduos foram classificados, conforme o IMC, em baixo peso (≤ 18,5 kg/m2), normal (18,5-24,9 kg/m2), sobrepeso (25-29,9 kg/m2) e obeso (≥30 kg/m2)15. Os pacientes foram orientados a utilizarem roupas leves, retirarem os calçados e permanecerem eretos até a estabilização dos valores aferidos.

Espirometria

A espirometria foi realizada para verificar a capacidade pulmonar dos indivíduos do estudo por meio do espirômetro digital portátil Easy One ndd Medical Technologies, previamente calibrado, de acordo com os métodos e critérios recomendados pela American Thoracic Society e European Respiratory Society16. Foram mensurados os seguintesparâmetros: capacidade vital forçada (CVF), volume expirado forçado no primeiro segundo (VEF1) e a razão VEF1/CVF antes e 15 minutos após a inalação do broncodilatador (BD) salbutamol (400µg) nos pacientes com DPOC. Foram realizadas no mínimo três manobras aceitáveis e duas reprodutíveis. As variáveis espirométricas estão expressas em valores absolutos e em valor percentual dos valores previstos de normalidade, segundo os determinados por Pereira et al.17. Os critérios de prova de função pulmonar normal consistem de CVF e VEF1 ≥ 80% do predito e VEF1/CVF ≥ 0,7.

Mobilidade diafragmática

Foi avaliada por meio de radiografias de tórax em incidência anteroposterior. Inicialmente foi colocada uma régua de graduação radiopaca sob o hemitórax direito do indivíduo, na direção longitudinal e no sentido craniocaudal, próximo à transição tóracoabdominal. Em seguida os indivíduos foram posicionados na mesa de radioscopia em decúbito dorsal e foram orientados previamente a realizarem duas séries de dez repetições de respirações diafragmática com o objetivo de desenvolver propriocepção do movimento diafragmático e possibilitar a avaliação da amplitude máxima do diafragma durante o exame de radiografia.

Após o treinamento de respiração diafragmática, os indivíduos realizaram duas manobras de capacidade vital lenta (CVL) utilizando um ventilômetro Wright Respirometer Brit. ® Pat. 765206 - UK. A primeira manobra foi próxima da capacidade pulmonar total (CPT) até próximo do volume residual (VR); e a segunda partindo do VR até próximo da CPT. O maior valor foi registrado para posterior comparação com o valor aferido durante o exame da mobilidade diafragmática para verificar se os indivíduos realizaram o mesmo esforço respiratório (inspiratório e expiratório) antes e durante a avaliação da mobilidade diafragmática.

As imagens em inspiração e expiração máximas foram registradas no mesmo filme. A medida da mobilidade diafragmática foi determinada por meio do método da mobilidade diafragmática pela distância (MDdist)18.

Avaliação postural

Foi utilizado o Software para Análise Postural (SAPO) disponível em meio eletrônico e validado por Ferreira et al.19. Os indivíduos do sexo masculino foram orientados a utilizar uma bermuda para fazer as fotografias e as do sexo feminino, bermuda e top. Inicialmente, por meio da anatomia palpatória foram identificados os pontos anatômicos nas seguintes regiões do corpo: acrômio, sétima vértebra cervical (C7), trágus da orelha, sétima vértebra torácica (T7), primeira vértebra lombar (L1), espinha ilíaca ântero-superior (EIAS), trocanter maior (Figura 1). Após a identificação dos pontos, os mesmos foram demarcados com bolas de isopor, com diâmetro de 20 mm, fixadas nas partes do corpo com fita adesiva dupla face.

Fonte: Yi et al., 2008

Figura 1 Medidas angulares das curvaturas da coluna vertebral: A) medida angular da lordose cervical; B) medida angular da cifose torácica; C) medida angular da lordose lombar; D) medida angular da posição da pelve 

Todos os sujeitos foram posicionados na posição ortostática estática, mantendo-se na vista lateral esquerda, a uma distância de 50 cm à frente de uma parede preta e ao lado de um fio de prumo demarcado com três bolas de isopor com distância de 50 cm entre elas, para possibilitar a calibração da fotografia. Seus pés foram posicionados livremente em cima de um tapete de EVA preto, para isso, foi informado ao indivíduo, por meio de um comando verbal, para se colocar em uma posição confortável, com o olhar fixo em um ponto na linha dos seus olhos, mantendo sua postura relaxada.

Para a realização das fotografias foi utilizada uma câmera fotográfica (Sanyo BD 200 14.1 mega pixels, DSC - W610) que foi posicionada em um tripé (altura de 97 cm) e a 2,30m de distância do participante. As fotografias foram transferidas para o computador e analisadas com o software de avaliação postural (SAPO). As análises de ângulos e medidas das fotografias foram feitas com o Programa Excel a partir das coordenadas dos pontos anatômicos obtidas com o SAPO.

Para marcação dos pontos e definição das alterações posturais que seriam avaliadas foi utilizado o protocolo de Yi et al.20:

  1. Lordose cervical: ângulo formado a partir de três pontos anatômicos: trágus da orelha, C7 e acrômio, sendo o acrômio a vértice do ângulo. Caracterizou-se que, quanto maior a medida angular, mais anteriorizada a posição da cabeça e menor a lordose cervical;

  2. Cifose torácica: ângulo formado a partir de três pontos anatômicos: acrômio, T7 e L1, sendo L1 a vértice do ângulo. Caracterizou-se que, quanto maior a medida angular, maior a cifose torácica;

  3. Lordose lombar: ângulo formado a partir de três pontos anatômicos: L1, espinha ilíaca ântero-superior (EIAS) e trocanter maior, sendo a EIAS a vértice do ângulo. Caracterizou-se que, quanto menor a medida angular, maior a lordose lombar;

  4. Posição pélvica: ângulo formado a partir de três pontos anatômicos: EIAS, trocanter maior e o ponto médio da interlinha articular do joelho na face lateral, sendo o ponto médio da interlinha articular a vértice do ângulo. Caracterizou-se que, quanto maior a medida angular, maior a anteversão da pelve.

Análise estatística

Os dados foram analisados por meio do programa SPSS for Windows, versão 20.0 e tratados com análise descritiva como média e desvio-padrão que foram aplicadas em todas as variáveis. Para verificar a normalidade dos dados foi aplicado o teste de Shapiro-Wilk. Para comparar as variáveis idade, peso, altura, VEF1 (%prev), CVF (%prev), mobilidade diafragmática, lordose cervical, cifose torácica, lordose lombar, posição pélvica entre os grupos DPOC e indivíduos aparentemente saudáveis foi utilizado o teste de t de Student e para comparar as variáveis IMC e VEF1/CVF (L) foi utilizado o teste de U Mann Whitney. Para correlacionar a mobilidade diafragmática com a lordose cervical, cifose torácica, lordose lombar e a posição pélvica foi utilizado o teste o coeficiente de correlação linear de Pearson (r). Foi adotado um nível de significância de 5%.

RESULTADOS

As características antropométricas, pulmonares e a mobilidade do diafragma dos grupos estudados estão apresentadas na Tabela 1. Não houve diferença estatisticamente significativa entre a idade, massa corporal, estatura e o IMC, confirmando que os grupos foram pareados em relação às variáveis antropométricas.

Tabela 1 Comparação da função pulmonar, mobilidade diafragmática e alterações posturais entre os grupos DPOC e indivíduos aparentemente saudáveis (n=44) 

Variáveis DPOC (n=22) Saudáveis (n=22) Valor de p
Dados demográficos e antropométricos
Sexo (M/F) 11/11 10/12 -
Idade (anos) 65,8±8,0 63,7±5,2 0,312
Massa corporal (kg) 71,1±16,4 75,5±14,1 0,345
Estatura (cm) 164,5±8,0 164,9±11,3 0,915
IMC (kg/m2) 26,2±5,8 27,6±3,6 0,110
Função Pulmonar
VEF1/CVF (L) 0,56±0,10 0,79±0,04 <0,001*
VEF1 (%prev) 49,6±15,7 95,0±10,3 <0,001*
CVF (%prev) 68,2±15,4 95,0±10,7 <0,001*
MD (mm) 41,7±18,3 62,9±11,5 <0,001*
Lordose Cervical (°) 85,3±18,0 81,1±13,1 0,380
Cifose Torácica (°) 29,5±3,2 29,5±4,2 0,975
Lordose Lombar (°) 96,3±8,7 98,5±8,6 0,413
Posição Pélvica (°) 4,7±2,4 4,6±1,9 0,884

Os valores estão expressos em média e ± desvio padrão; IMC (kg/m2): índice de massa corporal em quilogramas por metro2; VEF1 (%prev): percentual do previsto do volume expiratório forçado no primeiro segundo; CVF (%prev): percentual do previsto da capacidade vital forçada; MD: mobilidade diafragmática. mm: milímetro; º: grau. *p<0,05

Já em relação à função pulmonar houve diferença estatisticamente significante em todas as variáveis da espirometria, principalmente no volume forçado no primeiro segundo (VEF1) que caracteriza a presença da DPOC. O grupo DPOC mostrou grau de obstrução grave, enquanto os indivíduos aparentemente saudáveis apresentaram valores espirométricos dentro da normalidade (VEF1% previsto 49,6±15,7 e 95,0±10,3 respectivamente, p<0,001).

Houve diferença significante nos valores da mobilidade diafragmática entre os grupos estudados, sendo que os pacientes com DPOC mostraram valores inferiores quando comparados aos indivíduos saudáveis (41,7±18,3mm e 62,9±11,5mm, respectivamente, p<0,001)

Não houve diferença estatisticamente significante em nenhuma das variáveis referentes às curvaturas da coluna vertebral e posição da pelve, mostrando semelhança da postura corporal do paciente com DPOC e dos indivíduos aparentemente saudáveis.

A figura 2 mostra que houve correlação estatisticamente significante no grupo DPOC entre a mobilidade diafragmática e o ângulo de curvatura da cifose torácica (r=-0,543; p=0,009). No entanto, não houve correlação da mobilidade diafragmática com as demais variáveis estudadas (tabela 2).

Figura 2 Correlação do ângulo da cifose torácica (°) com a mobilidade diafragmática (mm) no grupo DPOC (n = 22) (r = -0,543; p = 0,009) 

Tabela 2 Relação entre a mobilidade diafragmática e as curvaturas da coluna vertebral no grupo DPOC (n=22) e no grupo de indivíduos aparentemente saudáveis (n=22) 

Grupos Coeficiente de correlação® P
Lordose Cervical
DPOC - 0,085 0,708
Saudáveis 0,122 0,589
Cifose Torácica
DPOC - 0,543 0,009*
Saudáveis 0,211 0,346
Lordose Lombar
DPOC 0,031 0,892
Saudáveis 0,324 0,142
Posição da Pelve
DPOC 0,132 0,559
Saudáveis - 0,327 0,138

r: Coeficiente de Correlação de Pearson. *p<0,05

Em relação ao grupo de indivíduos aparentemente saudáveis não houve correlação da mobilidade diafragmática com nenhuma das variáveis da coluna vertebral e posição da pelve.

DISCUSSÃO

O presente estudo teve por objetivo verificar a relação entre a mobilidade diafragmática e as curvaturas da coluna vertebral nos pacientes com DPOC e nos indivíduos saudáveis. Os resultados mostraram que apenas no grupo DPOC houve correlação negativa entre a mobilidade diafragmática e o ângulo da curvatura torácica, mostrando que quanto menor a mobilidade diafragmática, maior o grau da cifose torácica. No entanto, não houve correlação com as demais curvaturas vertebrais avaliadas. Já no grupo de indivíduos saudáveis não houve correlação com nenhuma das variáveis estudadas.

A hipótese para esse achado seria a presença da redução da mobilidade diafragmática nos pacientes com DPOC. Algumas evidências sugerem que a redução da mobilidade diafragmática devido a ineficiência do músculo diafragma pode acarretar num inevitável aumento compensatório da atividade dos músculos da caixa torácica e músculos acessórios da ventilação que assumem um importante papel em pacientes com DPOC21 22. Com o recrutamento dos músculos acessórios e dos músculos da caixa torácica23 ocorre o padrão respiratório apical. Esse padrão respiratório eleva os potenciais de ação dos músculos como o esternocleidomastoideo, resultando em alterações posturais24 25.

Em relação ao ângulo da cifose torácica não houve diferença significativa entre os grupos DPOC e indivíduos saudáveis. Nossos resultados são condizentes com o estudo de Dias et al.3 que avaliaram a cinemática da coluna torácica, cervical e cintura escapular de 19 pacientes com DPOC e 19 indivíduos saudáveis e encontraram somente maior elevação da escápula. Em contrapartida, Pachioni et al.2 comparam 15 pacientes com DPOC e 15 indivíduos saudáveis e observaram três importantes alterações posturais nos pacientes com DPOC: cifose torácica, desnivelamento pélvico posterior e báscula anterior da pelve. A discrepância entre as medidas podem estar relacionadas às diferenças de metodologias para avaliação postural e falta de padronização na técnica de avaliação das curvaturas torácicas.

A relação encontrada entre a mobilidade diafragmática e o ângulo da cifose torácica é preocupante, pois, estudos tem mostrado que o aumento na curvatura torácica pode prejudicar a função pulmonar26 27 28, aumentar a dispneia27, afetar o desempenho das atividades de vida diária29 30, reduzir a qualidade de vida30 e prever a mortalidade independente da osteoporose vertebral subjacente31. Como o paciente já apresenta todos esses prejuízos em decorrência da sua doença, o seu quadro pode ser agravado na presença do aumento no ângulo da curvatura torácica.

O presente estudo comparou os ângulos das curvaturas da coluna vertebral e da posição da pelve entre os grupos DPOC e indivíduos saudáveis e observou-se semelhança entre os grupos. Este fato provavelmente é decorrente da homogeneidade da idade dos grupos estudados, pois o envelhecimento é uma característica comum nas duas populações, e pode ser um fator determinante para surgimento de comprometimentos no sistema musculoesquelético e consequentemente alterações posturais. No processo natural de envelhecimento diversas alterações podem causar danos aos diferentes sistemas do organismo32. Com o avanço da idade, podem surgir alterações posturais tais como, anteriorização da cabeça, protrusão (anteropulsão) dos ombros, aumento da cifose torácica, redução da lordose lombar e flexão dos joelhos e do quadril33.

Os pacientes com DPOC já sofrem esses processos naturais decorrentes do envelhecimento, no entanto, com a progressão da sua doença, essas alterações podem ser intensificadas devido aos fatores fisiopatológicos da sua doença. É evidente na literatura que o agravamento das alterações posturais na coluna vertebral pode interferir na função respiratória, contudo, deve-se levar em conta que o paciente com DPOC já apresenta comprometimentos respiratórios e seu quadro pode ser ainda mais agravado em virtude da alteração postural.

O rigor metodológico para a realização das avaliações foram pontos fortes desta pesquisa. Porém, existem limitações inerentes a esse estudo, pode-se citar o fato deste ser de corte transversal, o que dificulta verificar a relação causa-efeito entre o aumento do ângulo da cifose torácica e a redução da mobilidade diafragmática. Para isso seria importante a realização de um estudo longitudinal prospectivo para demonstrar a real influência entre essas variáveis. Aponta- se também como limitação, a falta de padronização na técnica para avaliação das curvaturas da coluna vertebral pelo método SAPO. Mas apesar disso, os resultados encontrados fornecem subsídios importantes em relação às curvaturas da coluna vertebral e a mobilidade diafragmática no paciente com DPOC e indivíduos saudáveis. Destaca-se ainda, a relevância clínica do presente estudo na detecção precoce das alterações posturais juntamente com a avaliação da mobilidade diafragmática em pacientes com DPOC podendo possibilitar o planejamento e execução do tratamento mais adequado.

CONCLUSÃO

Com o intuito de analisar a correlação entre a mobilidade diafragmática e os ângulos das curvaturas vertebrais e da posição da pelve concluímos que apenas o grupo DPOC apresentou correlação negativa entre as variáveis. Foi observado que quanto menor a mobilidade diafragmática, maior o ângulo da curvatura da cifose torácica.

Em relação às alterações posturais foi verificado que tanto os pacientes com DPOC quanto os indivíduos aparentemente saudáveis apresentam os mesmos ângulos de curvatura da coluna vertebral e a mesma posição da pelve. Contudo, somente o grupo DPOC apresentou redução na mobilidade diafragmática.

REFERÊNCIAS

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