versão impressa ISSN 2359-4802versão On-line ISSN 2359-5647
Int. J. Cardiovasc. Sci. vol.30 no.1 Rio de Janeiro jan./fev. 2017
http://dx.doi.org/10.5935/2359-4802.20170017
Embora intervenções coronárias percutâneas primárias (ICP-P) venham recentemente contribuindo com a redução da mortalidade, o infarto do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST (IAMCSST) ainda é uma das principais causas de mortalidade no mundo.1 Taxas de mortalidade foram relatadas em 7-10% em alguns registros.2 Atualmente, são usados diversos fatores de risco e sistemas de escores validados na predição de mortalidade em pacientes com IAMCSST. Na era fibrinolítica, o escore TIMI (thrombolysis in myocardial infarction - risco de trombólise no infarto do miocárdio) foi desenvolvido como um escore de risco clínico para prever uma mortalidade de 30 dias em pacientes com IAMCSST.3 O escore TIMI foi derivado e validado com pacientes elegíveis para tratamento fibrinolítico incluídos em ensaios clínicos; portanto, não é facilmente aplicado em pacientes com IAMCSST submetidos a ICP-P. Recentemente, o escore GRACE (Global Registry of Acute Coronary Events - Registro Global de Eventos Coronários Agudos) foi definido para prever mortalidade de 6 meses em pacientes com síndrome coronariana aguda (SCA), mas pacientes em estado crítico, como aqueles que foram a óbito precocemente, podem estar sub-representados.4 Além desses escores clínicos, alguns sistemas de escore baseados em angiografia, como o de Gensini, o SYNTAX (synergy between percutaneous coronary intervention with Taxus and cardiac surgery - sinergia entre intervenção coronária percutânea com Taxus e cirurgia cardíaca) e o ACC/AHA (American College of Cardiology/American Heart Association) foram estabelecidos para avaliar a gravidade de lesões e proporcionar informações prognósticas para pacientes com doença arterial coronariana (DAC). Embora esses sistemas de escore proporcionem uma avaliação quantitativa, as informações detalhadas provenientes de angiografia não são suficientemente utilizadas. Na prática clínica, existe a necessidade de uma estratificação de pacientes com IAMCSST, com o objetivo de identificar aqueles com maior risco e diminuir a incidência de eventos cardiovasculares adversos maiores por meio de medidas preventivas apropriadas.
O sistema de escore de Gensini é um método objetivo para determinar a gravidade da DAC de acordo com achados angiográficos.5 Foi originalmente desenvolvido para quantificar a gravidade da DAC. Porém, estudos subsequentes demonstraram sua habilidade para identificar pacientes em alto risco de eventos adversos, tratados com ICP-P.6 Contudo, ainda sabe-se muito pouco sobre a associação entre a gravidade da DAC avaliada pelo escore de Gensini e mortalidade intra-hospitalar em pacientes com IAMCSST submetidos a ICP-P.
O objetivo do presente estudo foi avaliar o papel preditivo do escore de Gensini na detecção de mortalidade intra-hospitalar em pacientes com IAMCSST tratados com ICP-P.
Nosso estudo de centro único foi retrospectivo e não-randomizado (pesquisa prospectiva de informações, retrospectivamente). Foram incluídos em nosso estudo 539 pacientes consecutivos com primeiro IAMCSST submetidos a ICP-P dentro das primeiras 12 horas do início dos sintomas, entre 2004 e 2013. Variáveis demográficas, anamnese e características clínicas dos pacientes, bem como eventos adversos maiores intra-hospitalares foram obtidos de relatórios médicos. Já que nosso instituto é um centro terciário, a ICP-P foi a estratégia de reperfusão escolhida para a maioria dos casos de IAMCSST. De forma breve, o diagnóstico de IAMCSST foi feito pelo critério de sintomas clássicos de isquemia coronária (dores no peito > 30 minutos), detecção de > 1 mm de supradesnivelamento do segmento ST em pelo menos duas derivações contínuas e elevação de biomarcadores cardíacos, e definido pelas diretrizes da American College of Cardiology e da European Society of Cardiology.7 Todos os pacientes com IAMCSST foram admitidos e monitorados na unidade coronariana intensiva e o tempo de internação foi definido como o primeiro período de hospitalização de pacientes com IAMCSST. Critérios de exclusão incluíram CRM (cirurgia de revascularização miocárdica) ou ICP prévia, história prévia de IAMCSST, reperfusão com droga trombolítica, malignidade conhecida e doença hepática grave, dados insuficientes de registros clínicos e angiográficos.
A gravidade da DAC foi calculada pelo escore de Gensini, em que o cálculo é baseado na avaliação do número de segmentos estenóticos e seus respectivos graus de estreitamento luminal e localização na árvore coronária.5 A gravidade da doença foi expressa como a soma dos escores para cada lesão. Dois investigadores, cegos aos dados dos pacientes, analisaram os resultados da angiografia coronária. O protocolo do estudo foi aprovado pelo comitê de ética local (2013-157).
Os dados foram processados pelo SPSS 16.0 (SPSS Inc, Chicago, IL, EUA). Todos os dados estão expressos em números e porcentagens, e variáveis contínuas foram testadas para distribuição normal com o teste de Kolmogorov-Smirnov. Dados contínuos com distribuição normal estão apresentados como média e desvio padrão e comparados pelo teste t não pareado, e dados não normalmente distribuídos estão apresentados como mediana e intervalo interquartil e comparados pelo teste U de Mann-Whitney. Dados categóricos estão apresentados como contagens e porcentagens e comparados com o teste do qui-quadrado. A análise de regressão logística foi feita para identificar preditores independentes de mortalidade intra-hospitalar. Para a análise multivariada, foi feita uma regressão logística passo a passo (forward stepwise) usando-se as variáveis que se mostraram significativas na análise univariada, juntamente com fatores de risco. Valores de P < 0,05 foram considerados estatisticamente significativos.
A população do estudo foi composta por 539 pacientes com primeiro IAMCSST submetidos a ICP-P. Dos 539, 416 (77,2%) eram do sexo masculino e 123 (22,8%) do sexo feminino. A idade média da população do estudo era de 59,14 ± 12,68 anos. As características base estão apresentadas nas Tabelas1 e 2. A taxa de mortalidade intra-hospitalar foi de 5,4% (29 pacientes, 16 homens). Vinte e nove pacientes (5,3%) foram a óbito durante o período de internação. As causas do óbito para esses 29 pacientes foram: arritmias cardíacas malignas como taquicardia ventricular e fibrilação ventricular em 8 pacientes (27,5%), choque cardiogênico em 8 pacientes (27,5%), edema pulmonar agudo em 4 pacientes (13,7%), insuficiência cardíaca direita em 3 pacientes (10,3%), complicações hemorrágicas em 2 pacientes (6,8%), choque séptico em 1 paciente (3%), regurgitação mitral aguda em 1 paciente (3%), ruptura do septo ventricular em 1 paciente (3%) e ruptura da parede livre ventricular em 1 paciente (3%). A taxa de mortalidade foi de 10,5% em pacientes do sexo feminino e 3,8% em pacientes do sexo masculino (P = 0,004). Dos 539 pacientes submetidos à ICP-P, 454 (84%) foram tratados com êxito com BMS (stent não revestido). Dos outros 85 pacientes, 18 (4%) foram tratados com DES (stents eluidores de drogas), 26 (5%) com angioplastia coronária transluminal percutânea (PTCA); em 18 (3%) dos pacientes o procedimento falhou e 23 (5%) pacientes foram submetidos à CRM. A mortalidade intra-hospitalar não diferiu entre os grupos tratados com tratamentos diferentes durante a ICP-P (P > 0,05).
Tabela 1 Características clínicas e demográficas base dos grupos
Sobrevivência (n = 510) | Óbito (n = 29) | Valor de p | |
---|---|---|---|
Idade (anos) | 58,58 ± 12,52 | 68,96 ± 11,52 | 0,001* |
Gênero (masc.), n (%) | 400 (%78,4) | 16 (%55,2) | 0,004 |
Tabagismo, n (%) | 233 (%45,7) | 13 (%44,8) | 0,928 |
Frequência cardíaca (bat/minuto) | 79,90 ± 16,99 | 86,51 ± 24,64 | 0,004 |
Pressão arterial sistólica, (mmHg) | 132,23 ± 24,96 | 116,96 ± 24,67 | 0,756 |
Pressão arterial diastólica, (mmHg) | 77,73 ± 14,60 | 69,29 ± 17,43 | 0,119 |
Diabetes mellitus n (%) | 116 (%22,7) | 10 (%34,5) | 0,146 |
Hipertensão, n (%) | 218 (%42,8) | 19 (%65,5) | 0,017 |
Hiperlipidemia, n (%) | 96 (%18,8) | 5 (%17,29) | 0,832 |
Doença renal crônica, n (%) | 18 (%3,5) | 10 (%34,5) | 0,001 |
Doença arterial coronariana, n (%) | 84 (%%16,5) | 6 (%20,7) | 0,553 |
Fração de ejeção do ventrículo esquerdo, (%) | 50,98 ± 8,50 | 34,72 ± 5,66 | 0,028 |
Diâmetro diastólico final do ventrículo esquerdo, (mm) | 48,52 ± 5,58 | 29,38 ± 4,17 | 0,436* |
*Dados sem distribuição normal comparados pelo teste U de Mann-Whitney.
Tabela 2 Achados laboratoriais dos grupos
Sobrevivência (n = 510) | Óbito (n = 29) | Valor de p | |
---|---|---|---|
Glicose (mg/dL) | 149,37 ± 68,17 | 199,42 ± 103,91 | 0,048* |
Ureia (mg/dL) | 38,09 ± 17,82 | 59,03 ± 35,34 | 0,001* |
Creatinina (mg/dL) | 1,05 ± 0,49 | 1,41 ± 0,66 | 0,001* |
Ácido úrico (mg/dL) | 5,52 ± 2,01 | 7,59 ± 2,97 | 0,002* |
Lipoproteína de alta densidade, (mg/dL) | 42,13 ± 23,01 | 40,00 ± 7,82 | 0,670 |
Lipoproteína de baixa densidade, (mg/dL) | 113,74 ± 36,70 | 112,95 ± 46,49 | 0,881* |
Triglicérides (mg/dL) | 140,06 ± 100,43 | 128,20 ± 76,43 | 0,569* |
Albumina (g/dL) | 3,40 ± 0,54 | 3,15 ± 0,57 | 0,085* |
Leucócitos (n/µL) | 11,695,39 ± 4,031,71 | 14,646,42 ± 7,062,39 | 0,017* |
Hemoglobina (g/dL) | 13,77 ± 1,97 | 12,55 ± 2,07 | 0,006* |
Hematócritos (%) | 41,19 ± 5,18 | 37,68 ± 5,60 | 0,202 |
Plaquetas (x103/µL) | 248,37 ± 70,35 | 253,25 ± 100,67 | 0,010 |
Neutrófilos (n/µL) | 7,953,01 ± 3,384,94 | 10,045,93 ± 6,286,28 | 0,032* |
Linfócitos (n/µL) | 2531,72 ± 2362,84 | 2407,87 ± 2173,31 | 0,279* |
*Dados sem distribuição normal comparados pelo teste U de Mann-Whitney.
Na análise estatística inicial, vimos que algumas variáveis diferiram significativamente entre pacientes que sobreviveram e aqueles que foram a óbito. O sexo feminino, história de hipertensão, doença renal crônica, idade, níveis de glicose sanguínea na internação, ureia, creatinina e ácido úrico, frequência cardíaca, contagem de leucócitos, hemoglobina, plaquetas e neutrófilos e FEVE mostraram-se significativamente, do ponto de vista estatístico, diferentes entre os dois grupos (P < 0,05 para todos). Os dados angiográficos estão demonstrados na Tabela 3. Os escores médios de Gensini foram significativamente diferentes na comparação entre os pacientes que sobreviveram (54,54 ± 26,34) e aqueles que foram a óbito (80,17 ± 26,51) (P = 0,001) (Figura 1). O vaso relacionado ao infarto foi a artéria coronária descendente anterior esquerda (DAE) em 224 pacientes (41,5%), a artéria coronária circunflexa (CX) em 104 pacientes (19,2%) e a artéria coronária direita (ACD) em 196 pacientes (36,3%). A mortalidade intra-hospitalar não diferiu entre os grupos de diferentes vasos relacionados ao infarto (P > 0,05).
Tabela 3 Dados angiográficos
Sobrevivência (n = 510) | Óbito (n = 29) | Valor de p | |
---|---|---|---|
Envolvimento da artéria coronária | |||
DAE, n (%) | 210 (41,1) | 14 (48,2) | 0,148 |
CX, n (%) | 104 (20,3) | 5 (17,2) | |
ACD, n (%) | 196 (38,4) | 10 (34,4) | |
Escore de Gensini | 54,54 ± 26,34 | 80,17 ± 26,51 | 0,001 |
DAE: artéria coronária descendente anterior esquerda; CX: artéria coronária circunflexa; ACD: artéria coronária direita
Foi aplicada uma análise de regressão logística para identificar fatores de risco independentes para mortalidade intra-hospitalar em pacientes com IAMCSST submetidos a ICP-P. Os resultados da análise de regressão logística univariável estão demonstrados na Tabela 4. Para a análise multivariada, foi feita uma regressão logística passo a passo (forward stepwise), utilizando-se as variáveis que mostraram-se significativas na análise univariável, juntamente com os fatores de risco. O modelo de análise multivariada de regressão de Cox de risco proporcional revelou que o escore de Gensini (P = 0,037), sexo feminino (P = 0,039), níveis de ureia (P = 0,041), níveis de ácido úrico (P = 0,008) e FEVE (P = 0,001) mostraram-se independentemente associados à mortalidade intra-hospitalar em pacientes com IAMCSST submetidos a ICP-P (Tabela 5).
Tabela 4 Resultados da análise de regressão logística univariável
Variável | OR | Valor de p |
---|---|---|
Sexo feminino | 2,955 | 0,005 |
Escore de Gensini | 1,029 | 0,001 |
Ureia | 1,026 | 0,001 |
Ácido úrico | 1,363 | 0,001 |
FEVE | 0,797 | 0,001 |
Histórico de hipertensão | 1,007 | 0,020 |
Histórico de doença renal crônica | 14,36 | 0,001 |
Idade | 1,076 | 0,001 |
Glicose sanguínea no momento da internação | 1,007 | 0,001 |
Creatinina | 1,811 | 0,001 |
Ácido úrico | 1,363 | 0,001 |
Frequência cardíaca | 1,022 | 0,048 |
Pressão arterial sistólica | 0,974 | 0,002 |
Pressão arterial diastólica | 0,962 | 0,004 |
Contagem de leucócitos | 1,000 | 0,004 |
Contagem de neutrófilos | 1,156 | 0,001 |
Hemoglobina | 0,733 | 0,002 |
Hematócritos | 0,879 | 0,001 |
Albumina | 0,424 | 0,044 |
Tabela 5 Efeitos de diversas variáveis sobre mortalidade intra-hospitalar pela análise de regressão multivariável
Variável | OR ajustado | 95% IC | Valor de p |
---|---|---|---|
Sexo feminino | 7,780 | 1,10-54,66 | 0,039 |
Escore de Gensini | 1,033 | 1,00-1,06 | 0,037 |
Ureia | 1,030 | 1,00-1,06 | 0,041 |
Ácido úrico | 1,544 | 1,11-2,13 | 0,008 |
FEVE | 0,761 | 0,65-0,88 | 0,001 |
* Registrando gênero, idade, histórico de hipertensão, doença renal crônica, glicose sanguínea no momento da internação, ureia, creatinina, ácido úrico, frequência cardíaca, PAS, PAD, contagem de leucócitos, neutrófilos, hemoglobina, hematócritos, albumina, FEVE e escore de Gensini.
O estudo, independentemente, examinou 25 angiogramas selecionados aleatoriamente, estimou visualmente escores das lesões e calculou os escores de Gensini. O coeficiente da correlação intra- e inter-observador foi de 0,96 e 0,95 para o escore de Gensini, indicando boa reprodutibilidade e confiabilidade.
O principal achado deste estudo foi que o escore de Gensini está independentemente associado à mortalidade intra-hospitalar em pacientes com IAMCSST submetidos à ICP-P. Porém, o sexo feminino, níveis mais altos de ureia e ácido úrico séricos e FEVE mais baixa também mostraram-se associados à mortalidade intra-hospitalar neste grupo de pacientes.
O IAMCSST é a parte mais importante de SCA. Consistentemente com nossos dados, taxas de mortalidade intra-hospitalar variaram entre 6% e 14%.8 Sabe-se que muitos fatores, como IM prévio, tempo porta-balão, presença de diabetes, anemia, insuficiência renal crônica e fração de ejeção no momento da internação são preditores de mortalidade nessa era.9 Até hoje, diversos escores de risco validados baseados em pacientes, como TIMI, GRACE, ZWOLLE, CADILLAC e PAMI foram estabelecidos para prever mortalidade em pacientes com IAMCSST.10-13 A maioria desses escores foram baseados em parâmetros clínicos como idade, gênero, classe de Killip, níveis séricos de creatinina e grau de alteração do segmento ST. Este não é um fato surpreendente, já que esses escores foram desenvolvidos antes do uso difundido de ICP-P para IAMCSST. Os escores TIMI e GRACE são ferramentas valiosas para a estratificação de risco inicial de pacientes com IAMCSST. O escore TIMI é amplamente aceito devido à sua facilidade de uso. Apesar de ter boa potência preditiva, o escore GRACE é limitado em seu uso à beira do leito, pois requer gráficos e software computadorizados especializados. Esses escores não foram especificamente otimizados para pacientes com IAMCSST submetidos à ICP-P. Na era do ICP-P, alguns sistemas de escore como o CADILLAC (Controlled Abciximab and Device Investigation to Lower Late Angioplasty Complications),12 Stent-PAMI (Stent-Primary Angioplasty in Myocardial Infarction)10 e o MCRS (The Mayo Clinic Risk Score)14 incluíram variáveis angiográficas no algoritmo do escore. O escore de risco CADILLAC conseguiu prever com precisão mortalidade de 30 dias e 1 ano após ICP-P em pacientes com IAMCSST. Baptista et al.15 aplicaram o escore de risco PAMI a uma pequena população de pacientes com IAMCSST e revelaram que este método conseguiu prever mortalidade intra-hospitalar de 30 e 60 dias. O escore MCRS também é um modelo de risco validade para a estratificação de risco pré-procedimento e tem mostrado boa capacidade na predição de mortalidade intra-hospitalar.11 Além desses escores, estabelecidos de uma combinação de variáveis clínicas e angiográficas, alguns sistemas de escore baseados apenas em dados angiográficos, como o SYNTAX, estão associados a monitoramentos a curto e longo prazo em pacientes com IAMCSST submetidos a ICP-P.16-18
O objetivo de sistemas de escore coronário é quantificar a gravidade de estenose coronária. Diferentes artérias coronárias transportam diferentes volumes de sangue para o coração, e os escores coronários levam isso em consideração. O grau de estenose também foi considerado nesses sistemas de escore. De modo geral, a habilidade individual desses escores baseados em dados angiográficos de prever a mortalidade é incerta, e uma importante limitação é que esses escores são muito limitados a pacientes eletivos.19 Embora o escore SYNTAX seja frequentemente usado para prever mortalidade em pacientes com IAMCSST submetidos à ICP-P, a porcentagem do diâmetro da estenose não é considerado no escore, e é feita uma distinção somente entre doenças oclusivas (100%) e não oclusivas (50-99% de estenose). Além disso, a estenose é considerada grave quando causa ≥ 50% de redução no diâmetro luminal na avaliação visual nos vasos ≥ 1,5 mm. Contudo, no escore de Gensini, lesões que causam < 50% de redução no diâmetro luminal em vasos < 1,5 mm de diâmetro são consideradas no algoritmo do escore. O escore de Gensini foi originalmente desenvolvido para quantificar a gravidade da DAC, e é amplamente usado em ensaios clínicos para avaliar a extensão e a gravidade da DAC. Todavia, estudos subsequentes demonstraram sua habilidade de identificar pacientes tratados com ICP que correm alto risco de eventos adversos. Porém, pouco se sabe sobre a correlação entre o escore de Gensini e mortalidade a curto prazo em pacientes com IAMCSST.20-23 Há poucos estudos publicados recentemente que avaliaram o escore de Gensini no contexto de ICP-P. Um relato recente demonstrou que o escore de Gensini está associado a eventos cardíacos adversos maiores (ECAM) durante a internação e 6 meses após ICP em pacientes com IAMCSST.24 Portanto, os autores concluíram que o escore poderia ser usado para prever ECAM a curto prazo em pacientes com IAMCSST no período pós ICP. Acet et al.25 viram que o índice do escore TIMI está significativamente associado ao escore de Gensini na predição da extensão e gravidade da DAC em pacientes com IAMCSST.
Este estudo representa a análise da relação entre o escore de Gensini e mortalidade intra-hospitalar em pacientes com IAMCSST submetidos a ICP-P. O presente estudo demonstrou que pacientes com IAMCSST que apresentam escores de Gensini mais altos, independentemente de outras variáveis clínicas, corre maior risco de mortalidade intra-hospitalar. De acordo com nosso estudo, um aumento de 1 ponto no escore de Gensini está relacionado a um aumento de 3% no risco de mortalidade intra-hospitalar em pacientes com IAMCSST submetidos a ICP-P. São diversos os fatores responsáveis por esse achado: O escore de Gensini se concentra na artéria coronária principal esquerda (LMCA), DAE proximal e segmento médio da DAE, às quais foram atribuídos fatores de ponderação relativamente maiores. A oclusão dessas artérias coronárias causa grandes áreas de infarto que podem estar relacionadas a taxas mais altas de mortalidade. Uma das limitações da aplicação do escore de Gensini na estratificação de risco é a ausência de qualquer variável clínica. Esta deficiência pode ser resolvida por meio de sua combinação com modelos de risco baseados em fatores clínicos. Em nosso estudo, também vimos que o sexo feminino, níveis mais altos de ureia e ácido úrico e FEVE mais baixa mostraram-se associados à mortalidade intra-hospitalar de pacientes com IAMCSST submetidos a ICP-P. Esses achados foram consistentes com estudos prévios da literatura.20-23 Na análise de regressão univariada, diferentemente de outras variáveis, a hemoglobina, hematócrito, albumina e FEVE demonstraram-se negativamente correlacionados à mortalidade intra-hospitalar, o que significa que valores mais baixos dessas variáveis estavam associados a uma maior mortalidade. Contudo, essa associação deixou de ser significativa após a análise multivariada, com exceção da FEVE. A taxa de mortalidade foi de 10,5% (13/123) em mulheres e 3,8% (16/416) em homens. A taxa mais alta de mortalidade intra-hospitalar de pacientes do sexo feminino é geralmente atribuída a internações tardias, maior número de comorbidades, idade mais avançada e mais complicações hemorrágicas após intervenções.26-28 Nosso estudo destaca a importância de ajuste de mortalidade a essas variáveis. Não foi encontrada diferença na presença de diabetes, embora outros estudos tenham relatado que isso tende a ser mais comum.
O resultado de nosso estudo apresenta um aperfeiçoamento de fatores de risco convencionais existentes e sistemas de escore para pacientes com IAMCSST. Um dos pontos fortes do estudo é que todos os pacientes internados com diagnóstico de IAMCSST foram incluídos, ao contrário de relatos de alguns registros em que apenas os dados de alguns pacientes selecionados foram analisados. Melhorar a predição de mortalidade é um grande desafio, e selecionar o tratamento adequado é difícil, mas acreditamos que a combinação de fatores de risco estabelecidos como o TIMI e GRACE com avaliações de escores angiográficos proporciona a melhor quantidade de informações para a predição de mortalidade intra-hospitalar em pacientes com IAMCSST submetidos a ICP-P. Fatores de risco disponíveis como hipertensão, tabagismo, diabetes, LDL, histórico familiar de IM e variáveis clínicas como idade, sexo, tempo porta-balão e biomarcadores também devem ser considerados para o aperfeiçoamento da predição de mortalidade.
Nosso estudo tem algumas limitações importantes. Primeiramente, trata-se de um estudo retrospectivo de centro único. Os resultados desse estudo não podem ser extrapolados a todos os pacientes, como aqueles que apresentam outros tipos de SCA ou aqueles que não foram tratados com ICP. O tamanho relativamente pequeno da amostra indica a necessidade de validação dos achados com uma coorte de pacientes maior. O tempo porta-balão e início do infarto são parâmetros importante que também podem estar associados à mortalidade intra-hospitalar. Porém, devido ao design retrospectivo e número insuficiente de relatórios médicos, uma quantidade considerável de dados de pacientes sobre o início do infarto ou tempo porta-balão estava faltando ou não se mostrou confiável. Dessa forma, esses parâmetros não puderam ser estudados. Na prática clínica, escores angiográficos são calculados por avaliação visual das lesões (em vez de via determinação do laboratório), o que provavelmente leva a uma maior variabilidade interobservador. Além disso, o escore de Gensini não foi comparado a outros sistemas de escore angiográficos como o SYTAX, frequentemente usado para prever mortalidade em pacientes com IAMCSST submetidos à ICP-P. Estudos randomizados prospectivos multicêntricos com amostras maiores serão necessários para confirmar mais efetivamente nossa hipótese.
Está claro que há uma necessidade clínica de um sistema de escore preciso para identificar pacientes com maior risco de mortalidade intra-hospitalar que requerem mais cuidados intensivos. O escore de Gensini pode ter um papel valioso na estratificação de risco de pacientes com IAMCSST submetidos a ICP-P. Contudo, o escore de Gensini deve ser aperfeiçoado por meio de uma combinação que inclua variáveis clínicas, procedurais e laboratoriais.