versão impressa ISSN 0101-2800
J. Bras. Nefrol. vol.37 no.1 São Paulo jan./mar. 2015
http://dx.doi.org/10.5935/0101-2800.20150015
O Resveratrol - 3,5,4’-trihidroxi-droxiestilbeno (RESV) (Figura 1) - é uma fitoalexina polifenólica de ocorrência natural em muitas plantas e seus produtos processados, como uvas, frutas vermelhas, vinho tinto e amendoim,1 que apresenta inúmeros benefícios à saúde. O RESV é um dos estilbenos naturais mais importantes e tem sido amplamente estudado. Foi demonstrado que a substância possui propriedades de promoção da saúde e características antioxidantes, antiinflamatórias, cardioprotetoras, antidiabetes, anti-câncer, quimiopreventivas e neuroprotetoras.2-6 Diversos estudos recentes relatam os potenciais benefícios à saúde cardiovascular e efeitos sobre doença renal proporcionados pelo RESV.
O RESV é um potente agente antioxidante que pode atuar como quelante de espécies reativas de oxigênio (ERO) e ferro.7 Além disso, o RESV pode ter vários efeitos protetores contra distúrbios associados à idade, como doença renal, através da ativação da sirtuína 1 deacetilase dependente de NAD+ (SIRT1). Esta proteína foi associada à extensão da vida em restrição calórica e ao retardamento do aparecimento de doenças relacionadas ao envelhecimento. Além disso, a SIRT1 pode regular várias funções celulares, incluindo apoptose, biogênese mitocondrial, inflamação, metabolismo de glicose/lipídios, autofagia e adaptações ao estresse celular, através da desacetilação das proteínas alvo.7
O excesso de ERO está associado a uma variedade de doenças e ao processo de envelhecimento, suscitando uma série de vias de resposta celular.8,9 O estresse oxidativo é induzido por um desequilíbrio entre a produção de ERO e defesas antioxidantes. Assim, antioxidantes exógenos ou a modulação de enzimas antioxidantes podem reduzir o estresse oxidativo. Estudos anteriores demonstram que o RESV pode quelar diretamente as ERO.10 Além de quelar ERO, o RESV administrado por vias exógenas modula a expressão e a atividade de enzimas antioxidantes tais como superóxido dismutase (SOD), glutationa-peroxidase (GPx) e catalase, seja por regulação transcricional via fator nuclear eritroide 2 relacionado ao fator 2 (Nrf2), proteína ativadora 1 (AP-1), proteína forkhead box O (FOXO), ou por meio de modificações enzimáticas.11
O envelhecimento é um processo inevitável que afeta todos os órgãos. A ruptura da homeostase celular relacionada à idade leva a reduções na capacidade de resposta ao estresse fisiológico e disfunções de órgãos. Foram identificadas sete sirtuínas em mamíferos, sendo a SIRT1 a mais intimamente associada ao Sir2.12 A SIRT1 deacetila diversos substratos e é um importante regulador de uma ampla gama de processos celulares, incluindo os de respostas ao stress, sobrevivência celular, biogênese mitocondrial e metabolismo em resposta a energia celular e estado redox.12,13 Foi demonstrado que o RESV ativa a SIRT1 através de vários mecanismos.
Park et al.14 demonstraram que o RESV ativa a SIRT1 através da ativação da proteína quinase ativada por AMP (AMPK). Isto foi possível através da inibição da fosfodiesterase 4 (PDE 4) e da elevação de adenosina monofosfato cíclico (AMPc) nas células, proporcionando assim um novo mecanismo para explicar a ativação da SIRT1 por RESV.14 Uma relação direta entre a SIRT1 e os benefícios metabólicos do RESV foram demonstrados em estudo mais recente de Price et al.15
A cisplatina é um agente quimioterápico largamente utilizado para o tratamento de tumores malignos em órgãos sólidos. No entanto, um fator limitante de fundamental importância à dosagem do tratamento com cisplatina é a nefrotoxicidade. Dano direto ao DNA, lesão inflamatória e estresse oxidativo são reconhecidamente mecanismos através do quais a cisplatina induz injúria renal.16
Mais especificamente, a morte celular por apoptose induzida por cisplatina após dano ao DNA é o principal mecanismo para a citotoxicidade nas células tubulares renais.16 Em resposta ao dano ao DNA, a p53 pode induzir a interrupção do ciclo celular e apoptose; a apoptose induzida por p53 afeta a atividade transcricional e membros da família Bcl-2 na mitocôndria.17 Na doença renal, a p53 está envolvida no processo de apoptose observado em lesões isquêmicas e nefrotoxicidade induzida por ácido aristolóquico.18
Além disso, foi demonstrado que a regulação para baixo da p53 por RNA de interferência pequeno é uma forma eficaz de evitar ou tratar a nefrotoxicidade induzida por cisplatina.19 A ativação da p53 é regulada por modificações pós-traducionais da p53 tais como ubiquitinação, fosforilação e acetilação.20 Notadamente, a acetilação da p53 afeta a sua afinidade de ligação ao DNA.21
Kim et al.16 demonstraram que a ativação da SIRT1 por RESV reduz a acetilação da p53 mediada pela cisplatina e melhora a lesão renal induzida por cisplatina através da inibição da via apoptótica. A expressão da proteína SIRT1 foi diminuída pela cisplatina em células tubulares proximais de camundongos e o ativador da SIRT1, o RESV, reduziu a acetilação da p53 e a apoptose induzidas pela cisplatina. Através da experimentação in vivo, os autores relataram que a ativação da SIRT1 por RESV diminuiu a apoptose induzida por cisplatina no rim.16
Stiaccini et al.22 demonstraram que o RESV é um potente ativador da SIRT1 com elevada atividade na expressão da proteína SIRT1. Em estudo recente publicado por Schirmer et al,23 os níveis de mRNA da SIRT1 não foram alterados em peixes-zebra expostos a doses de 20-200 µM de RESV por 30 e 60 minutos. No entanto, estudos in vitro utilizando células de ratos24 e adipócitos viscerais humanos25 mostraram que tempos de incubação mais longos seriam necessários para se observar alterações no mRNA da SIRT1 e na expressão proteica. Com efeito, no estudo in vitro de Stiaccini et al.,22 as células foram incubadas por 24 horas com RESV 200 nM, a fim de medir o aumento na expressão de SIRT1. Contudo, o RESV foi um ativador fraco do sistema de sinalização celular por causar aumentos na expressão de SIRT1.22
Está bem documentado que a fosforilação da Smad3 é um mecanismo de sinalização subjacente à fibrogênese em resposta a mediadores fibrogênicos tais como TGF-β, angiotensina II (AII) e produtos finais da glicação avançada.26 As evidências que sugerem que a acetilação da Smad3 é também uma importante via de sinalização que leva à produção de ECM incluem dados de experimentos utilizando um modelo de roedor para DRC e células em cultura tratadas com TGF-β1. Níveis significativamente elevados de acetilação da Smad foram observados em ratos submetidos a nefrectomia 5/6 e após tratamento com TGF-β1 em cultura celular. Além disso, o RESV reduziu significativamente os níveis de acetilação de Smad3 no rim remanescente de roedores submetidos a nefrectomia 5/6 e em culturas celulares tratadas com TGF-β1. A supressão da SIRT1 nas células em cultura aumentou os níveis de acetilação da Smad3 e atenuou o efeito do RESV sobre a acetilação da Smad3.26
Foi demonstrado que o RESV protege o rim remanescente de ratos submetidos a nefrectomia 5/6, em modelo roedor para doença renal crônica (DRC).27 No mesmo modelo, o tratamento com RESV atenuou significativamente o declínio da taxa de filtração glomerular (TFG). Em células mesangiais em cultura, o RESV reduziu a expressão proteica da matriz extracelular (ECM) induzida pelo fator de crescimento transformante β1 (TGF-β1), e os seus efeitos foram dependentes da SIRT1. A SIRT1 inibe a sinalização de TGF-β1 pela desacetilação da Smad3. A perda do alelo para a SIRT1 agrava a lesão renal em ratos sujeitos a nefrectomia 5/6. Além disso, a supressão da SIRT1 aumenta os efeitos do TGF-β1 na ECM, suprimindo acentuadamente os efeitos protetores do RESV. O presente estudo fornece fortes evidências de que a SIRT1 protege o rim de roedores em modelo de DRC através da inibição da sinalização do TGF-β1 através da desacetilação da Smad3 e redução da fibrose renal.27 Em resumo, o tratamento com RESV atenua significativamente o dano renal em ratos submetidos a nefrectomia. Os efeitos protetores renais do RESV estão relacionados à ativação da SIRT1, à redução da acetilação de Smad3 e à sinalização do TGF-β1.27
O RESV regula a expressão de genes alvo da FOXO e pode regular a sobrevivência e/ou a apoptose celular por meio da modulação global da expressão gênica via desacetilação dos fatores de transcrição da FOXO.28 A SIRT1 desempenha um papel intermediário na ação do RESV sobre a expressão gênica mediada pela FoxO1. A forma desfosforilada da FoxO1, distribuída no núcleo, é desacetilada pela SIRT1, regulando para cima a expressão de genes gliconeogênicos.29
A FoxO1 pertence a uma família de fatores de transcrição que inclui FoxO3a, FoxO4 e FoxO6 em mamíferos. Estas proteínas desempenham papéis importantes no envelhecimento, no metabolismo celular, na resistência à insulina e ao estresse oxidativo.30 Recentemente, foi demonstrado em modelo de diabetes em rato que a hiperglicemia induz a fosforilação da FoxO1 e suprime a expressão de FoxO1 no rim. Além disso, H2O2 regula negativamente a FoxO1 por fosforilação dependente de PI3-quinase/AKT, e a FoxO1 regula para baixo a expressão de catalase nas células mesangiais.31
Em estudo recente de Kitada et al.32 os autores demonstraram que o RESV amenizou a lesão renal e aprimorou a biogênese mitocondrial com disfunção de superóxido dismutase dependente do manganês (MnSOD) nos rins de camundongos db/db. Isto foi conseguido através de melhorias no estado de estresse oxidativo no rim através da quelação de ERO, normalização da disfunção de Mn-SOD e do resgate parcial do metabolismo de glicose/lipídios.32
Subauste & Burant33 relataram que estresse oxidativo excessivo causa diminuição na proteína FoxO1 in vitro total, observação também verificada in vivo em camundongos db/db. Os autores postularam que o RESV protege os adipócitos aumentando as defesas antioxidantes dependentes de FoxO1/SIRT1.33
O estresse oxidativo tem sido visto como um fator patogênico crítico no desenvolvimento da ND. Diversos papéis tem sido atribuídos às ERO na patogênese e progressão da ND, dado que a produção de ERO no rim é elevada na presença de diabetes e ND.34
Em modelo de diabetes em rato, o RESV protege o rim do estresse oxidativo induzido pela expressão elevada de fibronectina e colágeno IV. Sob condições de estresse, níveis elevados de ERO inibem a fosforilação e a acetilação de proteínas FoxO1, resultando em maior atividade de ligação FoxO1-DNA.35
A FoxO1 subsequentemente controla os níveis de ERO pela regulação transcricional de um sistema de vários níveis.35 A supressão dos níveis de mRNA de FoxO1 e a elevação dos níveis de fósforo-FoxO1 foram correlacionadas à regulação negativa do mRNA da catalase no rim de ratos diabéticos.35 O RESV aumenta os níveis de FoxO e SIRT1 em vários tipos de células,29,36,37 apresentando associação com aumento da longevidade e da defesa contra o estresse oxidativo.37
O estresse oxidativo está ligado à patogênese da nefropatia diabética (ND).35 No entanto, os mecanismos envolvidos na geração de ERO na diabetes ainda não foram elucidados. A nicotinamida adenina dinucleotídeo fosfato (NADPH) oxidase38 e o desacoplamento da óxido nítrico sintase endotelial (eNOS)38 nos glomérulos diabéticos foram elencadas como as principais fontes de produção de ERO em modelo de ND em ratos.38
Wu et al.35 observaram que o malondialdeído (MDA), um produto da peroxidação lipídica, é um indicador sensível dos níveis de ERO. Em tal estudo, os autores observaram que o aumento dos níveis de ERO e a redução da atividade de SOD estiveram correlacionados com a elevação dos níveis de fibronectina e colágeno. Estes dados sugerem que o aumento do estresse oxidativo eleva a expressão de fibronectina e colágeno IV. Estes achados também indicam que a produção excessiva de ERO na diabetes está associada à progressão da ND, e que os antioxidantes podem ter utilidade no tratamento.35
O efeito dos LPS é acompanhado por uma elevação de óxido nítrico em nível plasmático e nos órgãos, o que não foi observado na presença de RESV. Há muito debate sobre este tema na literatura. Alguns estudos demonstram a ausência de envolvimento do óxido nítrico no mecanismo de ação do RESV,39 ao passo que outros indicam que os efeitos do RESV são mediados através do NO.40 Ainda assim, os dados corroboram a utilização de RESV como tratamento terapêutico de sepse induzida por endotoxemia e óbito induzido por endotoxemia.41
Tratamento subagudo (sete dias) com RESV foi eficaz na prevenção de letalidade induzida por lipopolissacarídeos (LPS) em camundongos.42 Em estudos anteriores, o RESV atenuou nefrotoxicidade,43 neurotoxicidade44 e resposta de fase aguda em ratos.45
Sebai et al.43 relataram uma clara redução no estresse oxidativo induzido por LPS e letalidade após pré-tratamento subagudo com RESV, ao passo que o tratamento agudo com RESV administrado 12 e 24 horas antes da intoxicação não conseguiu reduzir a letalidade dos LPS em camundongos.
O tratamento precoce de SHR com RESV atenua o desenvolvimento de hipertensão e previne contra disfunção endotelial. Aparentemente temos o envolvimento de um triplo mecanismo: 1) atenuação do estresse oxidativo vascular que resulta em aumento da biodisponibilidade de NO; 2) interrupção do desacoplamento da eNOS possivelmente através da inibição da oxidação da tetrahidrobiopterina (BH4) por radicais livres; e 3) aumento da expressão de importantes proteínas envolvidas na via do NO, especificamente a eNOS e a guanilil ciclase solúvel (sGC).46
A disfunção endotelial é uma marca característica da hipertensão.47 A perturbação da síntese de NO e/ou de sua biodisponibilidade causam disfunção endotelial. O estresse oxidativo, particularmente quando induzido por superóxido, quela NO através da formação de radicais de peroxinitrito altamente reativos.48,49 Já foi demonstrado que o estresse oxidativo leva ao desacoplamento da eNOS, resultando em comprometimento do relaxamento dependente do endotélio.50 A eNOS desacoplada gera ERO em vez de NO, reduzindo, assim, a produção de NO e aumentando o estresse oxidativo.51 Em resumo, o estresse oxidativo pode contribuir para a disfunção endotelial por meio da quelação de NO e do desacoplamento da eNOS.
Numerosos estudos mostram que o RESV altera significativamente a resposta ao NO e aumenta o vaso-relaxamento dependente do endotélio.52 Estudos revelam que o RESV também aumentou a expressão de eNOS em cultura celular.53 Os efeitos do RESV e outros polifenóis do vinho tinto foram avaliados em ratos espontaneamente hipertensos (SHR). No entanto, os resultados destes estudos não foram conclusivos, já que a maioria não relatou alterações na pressão arterial,54 e apenas um estudo em ratas descreveu redução da pressão arterial.55
Bhatt et al.46 demonstraram que o RESV atenua significativamente o aumento da pressão arterial observada em SHR. Consequentemente, vários estudos investigaram os efeitos do RESV e outros polifenóis do vinho tinto sobre a função endotelial.54-56 Não foram observadas alterações na pressão arterial após tratamento crônico de SHR com RESV nos estudos de Thandapilly et al. É interessante notar que, em ambos os estudos, o RESV foi administrado em SHR adultos com hipertensão estabelecida. Em outro estudo, o tratamento com RESV normalizou a função endotelial e reduziu significativamente a pressão arterial de SHR.46 Assim, verifica-se que os efeitos benéficos do tratamento com RESV sobre a pressão arterial podem ser relacionados aos eventos que ocorrem antes de elevações da pressão arterial.
A nitrosilação de proteínas é um indicador da formação de peroxinitrito em tecidos vasculares. Ratos espontaneamente hipertensos exibiram níveis significativamente elevados de nitrotirosina no homogeneizado de aorta em comparação a ratos Wistar Kyoto (WKY). Além disso, níveis elevados de nitrotirosina foram normalizados pelo tratamento com RESV. Assim, o RESV impede a quelação de NO e aumenta a sua disponibilidade biológica em SHR através da redução do estresse oxidativo.46
Além da quelação de NO, outro importante mecanismo pelo qual o estresse oxidativo pode contribuir para a disfunção endotelial é o desacoplamento da enzima eNOS. As consequências fisiológicas do desacoplamento da eNOS são particularmente prejudiciais, uma vez que este reduz a produção de NO e resulta na formação de superóxidos, aumentando assim ainda mais o estresse oxidativo.56 A produção de superóxido é sensível ao L-NNA, inibidor de eNOS, sugerindo que a eNOS é mais provavelmente desacoplada em SHR. Curiosamente, o tratamento com RESV normaliza a produção de superóxido, sugerindo um novo papel para o RESV na prevenção do desacoplamento da eNOS.51
É sabido que a oxidação do cofator tetrahidrobiopterina (BH4) para BH2 oferece uma importante contribuição para o desacoplamento da eNOS. Curiosamente, a suplementação de BH4 aboliu a produção elevada de superóxido em SHR. Este achado indica que o estresse oxidativo vascular contribui para a disfunção endotelial e a hipertensão desacoplando a eNOS e, possivelmente, pela oxidação da BH4. Foi descrito que a suplementação de BH4 iniciada em idade precoce (5-16 semanas de idade) suprime o desenvolvimento de hipertensão em SHR.46 Expressão regulada para cima da proteína eNOS foi também observada em SHR e ratos WKY recebendo RESV, o que sugere supra-regulação da transcrição. Em conjunto, estes dados sugerem que o desacoplamento da eNOS desempenha um importante papel na disfunção endotelial. O RESV impede o desacoplamento da eNOS e resgata a função endotelial em SHR.46
O efeito de RESV na presença de nitroprussiato de sódio (SNP) foi investigada em SHR e ratos WKY. O vaso-relaxamento induzido por SNP foi semelhante em ambos os grupos. RESV elevou significativamente o relaxamento em resposta a doses mais elevadas de SNP em SHR.46 O mediador proximal para o vaso-relaxamento induzido por NO é a guanilila ciclase solúvel (sGC), enquanto sua subunidade β1 é responsável pela resposta da sGC ao NO.57 A expressão basal de sGC foi maior nos SHR em comparação aos ratos WKY, o que pode ser explicado por um aumento compensatório da resposta em face à redução da biodisponibilidade de NO. SHR e ratos WKY tratados com RESV demonstraram maior expressão da subunidade β1 da sGC.46
A hiperuricemia, enquanto distúrbio metabólico, é geralmente associada a gota, doença renal, hipertensão, doença cardiovascular, inflamação, diabetes e síndrome metabólica.58 A reabsorção e a secreção de ácido úrico (AU) são controladas por proteínas transportadoras de ânions orgânicos específicas das membranas renais apical e basolateral. A proteína transportadora de urato 1 (URAT1) e o transportador de glicose 9 (GLUT9) mediam a reabsorção de urato da luz dos túbulos renais para o sangue, e mantem a homeostasia do urato plasmático.59 O cassete de ligação de ATP humano, subfamília G, 2 (ABCG2) está localizado nas membranas de borda em escova dos túbulos renais proximais para controlar a secreção de urato, e sua mutação genética em oócitos de Xenopus resulta em redução da velocidade de transporte de urato.60 O ABCG2 está associado a hiperuricemia e gota em indivíduos brancos, chineses Han, japoneses e afro-americanos.61
Agentes uricosúricos reduzem os níveis de urato através da regulação de URAT1, GLUT9 e OAT1 no rim.59 Portanto, estas proteínas relacionadas ao transporte de urato renal apresentam alvos importantes para a prevenção e tratamento de hiperuricemia e gota.62 Transportadores renais de cátions orgânicos/ carnitina (OCTs e OCTNs) estão envolvidos na excreção de cátions orgânicos, incluindo fármacos orgânicos e seus metabólitos. Alterações na expressão de OCTs e OCTNs renais prejudicam o balanço renal de cátions orgânicos e induzem toxicidade do soluto renal.63,64 A regulação para baixo de mOCT1, mOCT2, mOCTN1 e mOCTN2 no rim foi descrita em ratos hiperuricêmicos com injúria renal.65
A uromodulina (UMOD), proteína mais abundante na urina normal, está associada a hiperuricemia e doença renal.66 Camundongos com deficiência de UMOD tem depuração de creatinina reduzida e expressão supra-regulada de importantes transportadores distais de eletrólitos.67 A UMOD é um útil marcador para disfunção renal em hiperuricemia associada a anomalias em transportadores renais de íons orgânicos.67
Em camundongos com hiperuricemia induzida por oxonato, o RESV reduziu os níveis de ácido úrico e aprimorou a excreção de urato. Os efeitos antihiperuricêmicos do RESV foram relacionados com a regulação renal de mURAT1, mGLUT9, mABCG2 e mOAT1.68 Além disso, a melhoria da função renal, bem como regulação para cima dos níveis renais das proteínas mOCT1, mOCT2, mOCTN1 e mOCTN2, contribuíram para reforçar os efeitos renoprotetores do RESV.68
O nível sérico de urato é mais frequentemente associado à excreção renal de urato. O transporte renal de urato torna-se cada vez mais relevante para a homeostasia do urato plasmático. O RESV reduz os níveis de urato através da regulação para baixo da expressão de mGLUT9. Como consequência, a reabsorção de urato é inibida, a mABCG2 é regulada para baixo e a expressão de mOAT1 é regulada para cima para elevar a secreção de urato nos rins de ratos hiperuricêmicos.68 Portanto, foi sugerido que o RESV surtiria efeitos anti-hiperuricêmicos através da regulação de diferentes proteínas relacionadas ao transporte renal de urato para aumentar a excreção renal de urato em camundongos hiperuricêmicos.52
A hiperuricemia é um dos vários fatores de risco bem descritos que contribuem para o estabelecimento de distúrbios da função renal. A creatinina, um substrato de OCT1 e OCT2 nos túbulos renais proximais, é também considerada um biomarcador de disfunção renal.64 Em sintonia com a melhora da disfunção renal, os efeitos renoprotetores do RESV podem ser mediados pela expressão renal aumentada de mOCT1 em camundongos hiperuricêmicos.68,69
Há um crescente corpo de evidências que associa o sistema renina-angiotensina (SRA) à patogênese da doença vascular crônica. AII é um importante componente do SRA e um peptídeo vasoativo.70 Depreende-se da literatura que a AII é capaz de ativar a síntese de ET-1 em vários tipos de células vasculares, incluindo células da musculatura lisa vascular em cultura.71 Foi mostrado que a ET-1 media o efeito de promoção do crescimento da AII, desempenhando assim um importante papel na doença cardiovascular e no remodelamento vascular.72
A AII também estimula a NADPH oxidase ligada à membrana, que gera espécies reativas de oxigênio nas células da musculatura lisa vascular.73 Relatos anteriores indicam que as ERO mediam a indução gênica da ET-1 nos fibroblastos cardíacos, nas células endoteliais vasculares e nas células da musculatura lisa.73
Zhang et al.71 demonstraram que o RESV exerce um efeito inibidor tipo antioxidante sobre a proliferação celular da musculatura lisa e a expressão gênica da ET-1 induzida pela AII. Além disso, o RESV suprime a via dos sinais extracelulares regulados por quinases (ERK), reduz a proliferação celular induzida pela AII e reduz a expressão gênica da ET-1. É plausível supor que a via de sinalização ativada pela AII consista de um número de etapas redox-sensíveis, e que o tratamento com RESV module o estado redox da célula através de suas propriedades antioxidantes. Em resumo, o RESV inibe a formação de ERO induzida pela AII, a fosforilação dos ERK, a expressão gênica da ET-1 e a proliferação celular em células da musculatura lisa vascular.71
Albertoni et al.73 demonstraram que 24 horas de tratamento de células mesangiais com AU estimulou ET-1, AII e o sistema renina-angiotensina. Em outros experimentos conduzidos por parte do mesmo grupo (artigo no prelo) o AU induziu um aumento na expressão de mRNA da pré-pró-endotelina-1 (PPET-1) e na síntese de peptídeos, na expressão de mRNA de angiotensinogênio (AGT) e na produção do peptídeo AII após de seis e 12 horas. Além disso, o estudo demonstrou que o RESV reduziu a expressão gênica de ppET-1 induzida por AU e a produção de AII e ET-1 em células mesangiais, o que sugere que o RESV pode minimizar o impacto destes hormônios sobre a função glomerular (artigo no prelo).
Nas células mesangiais, o AU induz um aumento na concentração intracelular de Ca2+ ([Ca2+]i).73 Este aumento de [Ca2+]i é inibido pelo RESV, proporcionando a primeira evidência direta de que o AU induz um aumento de [Ca2+] i que é suprimido pelo RESV (artigo no prelo). A principal nova descoberta deste estudo é que o aumento da AII e [Ca2+]i nas células musculares lisas é atenuado pelo RESV. Isto é possível, pelo menos em parte, pelo papel que o RESV desempenha no bloqueio dos efeitos prejudiciais da hiperuricemia sobre a função glomerular que levam à glomeruloesclerose (artigo no prelo).
O RESV exerce efeitos protetores contra injúria renal aguda e crônica através de vários mecanismos. O RESV ativa a SIRT1 através de vários mecanismos, tais como a ativação de AMPK através da inibição da PDE 4 e da elevação de cAMP, e a regulação para baixo de p53 pelo siRNA. A SIRT1 posteriormente inibe a sinalização de TGF-β1 através da desacetilação da Smad3.
O RESV melhora a injúria renal e aprimora a biogênese mitocondrial com Mn-SOD. Além disso, o RESV regula a expressão de genes alvo da FOXO e pode regular a sobrevivência e/ou apoptose celular por meio da modulação global da expressão gênica através da desacetilação de fatores de transcrição da FOXO. Foi mostrado que o RESV protege os rins de ratos diabéticos contra o estresse oxidativo induzido pela expressão aumentada de fibronectina e colágeno IV. Os benefícios adicionais de RESV incluem atenuação da toxicidade renal induzida por LPS, neurotoxicidade e da resposta de fase aguda em ratos. O RESV altera significativamente a resposta a NO e aumenta o vasorelaxamento dependente do endotélio. O RESV reduz ainda os níveis séricos de urato e aumenta a excreção de urato em hiperuricemia. Por fim, o RESV bloqueia alguns dos efeitos da hiperuricemia sobre a função glomerular que levam à glomeruloesclerose. Levando isso em consideração, o RESV pode proporcionar um útil tratamento suplementar para evitar a injúria renal.