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Revisão sistemática de métodos de triagem nutricionalpara idosos brasileiros domiciliados

Revisão sistemática de métodos de triagem nutricionalpara idosos brasileiros domiciliados

Autores:

Manuela de Almeida Roediger,
Maria de Fátima Nunes Marucci,
Bruna Zillesg Borges dos Santos,
Daiana Aparecida Quintiliano Scarpelli Dourado,
Maria de Lourdes Nascimento da Silva,
Elza Cristina Silva Queiroz

ARTIGO ORIGINAL

Ciência & Saúde Coletiva

versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561

Ciênc. saúde coletiva vol.24 no.6 Rio de Janeiro jun. 2019 Epub 27-Jun-2019

http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232018246.18072017

Abstract

The scope of this article is to identify a specific method of nutritional screening for use on elderly Brazilians living at home. It is a systematic review article using the PubMed, LILACS and Web of Science databases. The eligibility criterion was articles about nutritional screening methods for the elderly. The articles were read by evaluators who selected the methods and classified them according to evidence of validity, reproducibility and acceptability. EndNote software was used for scrutiny of the articles. Twelve methods of nutritional screening were identified, 3 being developed for use in the US population (n = 4), though none for the Brazilian population. In seven methods, the forms were filled out by the elderly themselves, and 4 of these presented anthropometric measures. Only one method produced information on acceptability. Reproducibility and validity was identified in 1 and 8, respectively, however only the Determine Your Nutritional Health® - DNH method presented acceptability data, which is a fundamental aspect in the choice for adaptation and use of the method in another country. Among the methods studied, the DNH was the most appropriate for cross-cultural adaptation and use on elderly Brazilians living at home.

Keywords Nutritional assessment; Nutritional status; Elderly

Introdução

Bem-estar nutricional é um componente da saúde e da qualidade de vida e da independência de idosos1. Estima-se que aproximadamente 75% dos idosos no mundo apresentam uma ou mais doenças que poderiam ser prevenidas ou controladas com alimentação adequada, que pelo menos 50% apresentam problemas de saúde que exigem intervenção nutricional e em torno de 20 a 40% estão em risco nutricional. A identificação da condição nutricional desse grupo pode ser uma alternativa para mudanças nesse cenário epidemiológico1,2.

Dentre os métodos que verificam risco nutricional, a triagem nutricional, por meio de questionários, constitui um método que pode ser utilizado em estudos de base populacional e clínicos por permitir reunir informações sobre condição de saúde, alimentação e nutrição de indivíduos3. Comparado a outros métodos como antropometria, bioimpedância elétrica, exames bioquímicos e absorciometria radiológica de dupla energia (DXA), esse método apresenta menor custo e tempo de realização, não é invasivo, fácil de ser administrado e pode ser utilizado por profissionais de saúde, desde que bem treinados4.

A triagem nutricional pode ser um método adequado para uso em idosos domiciliados, atendidos pelos serviços de atenção básica, e para rastreamento daqueles que estão sob risco nutricional, possibilitando intervenção precoce5. Quando hospitalizados, os danos à saúde desse grupo populacional podem ser irreparáveis, tendo em vista que a má nutrição, especialmente a subnutrição, repercute em complicações e morbidades que podem comprometer o estado de saúde e levar o indivíduo idoso ao óbito6.

De acordo com Bonnie e Callen7 existem vários métodos de triagem nutricional disponíveis em outros países com diferenças culturais, regionais e étnicas que apresentam qualidades psicométricas (validade e reprodutibilidade) avaliadas e que propõem diferentes modos de identificação de risco nutricional. Contudo, no Brasil, ainda não existem métodos dessa natureza desenvolvidos ou adaptados e validados para a população idosa.

O presente estudo tem como objetivo identificar o método específico de triagem nutricional mais adequado para a utilização em idosos domiciliados pelos profissionais de saúde, especialmente o nutricionista, no sentido de adaptá-lo posteriormente à realidade cultural brasileira.

Métodos

Trata-se de estudo de revisão sistemática, adotando os critérios propostos por Egger et al.8 A etapa inicial consistiu na identificação de artigos publicados nas bases “Lilacs, PubMed e Web of Science”, utilizando conjuntos de palavras-chave que permitiram a elaboração das estratégias de busca (Quadro 1).

Quadro 1 Sentenças de buscas utilizadas em cada base de dados elaboradas a partir das palavras-chave e dos operadores booleanos. 

Conjunto PubMed
#1 (“Nutrition screening”[MeSH] OR “ screening tools”[tiab] OR “screening “[tiab])
#2 (“Elderly”[MeSH] OR “elderlies”[tiab] OR “older adults”[tiab]) OR “older people”[tiab]) OR “seniors”[tiab])
#3 (“Reproducibility of Results”[MeSH] OR “reproducibility”[tiab]) OR “reliability”[tiab])
#4 (“validity”[tiab] OR “validation”[tiab] OR “validation studies”[Publication Type])
#1 AND #2 AND #3 AND #4 (“Nutrition screening”[MeSH] OR “ screening tools”[tiab] OR “ “ screening “[tiab]) AND (“Elderly”[MeSH] OR “elderlies”[tiab] OR “older adults”[tiab]) OR “older people”[tiab]) OR “seniors”[tiab]) AND (“Reproducibility of Results”[MeSH] OR “reproducibility”[tiab]) OR “reliability”[tiab]) AND (“validity”[tiab] OR “validation”[tiab] OR “validation studies”[Publication Type])
Conjunto LILACS
#1 (“Triagem nutricional”) OR “Avaliação nutricional”
#2 “Idosos”
#1 AND #2 (“Triagem nutricional”) OR “Avaliação nutricional”AND (“Idosos”)
Conjunto Web of Science
#1 (“Nutrition screening”[MeSH] ) AND (“Elderly”[MeSH] OR “older adults”[tiab]) OR “older people”[tiab]) OR “seniors”[tiab]) AND (“Reproducibility”[ MeSH]) OR “reliability”[tiab]) AND (“validity”[ MeSH]] OR “validation”[tiab]

As palavras-chave foram estabelecidas com base nas referências bibliográficas de artigos relacionados como: i) ao assunto de interesse (métodos de triagem nutricional); ii) à população de estudo (idosos ≥ 60 anos, domiciliados); e iii) as propriedades psicométricas avaliadas (reprodutibilidade e validade).

Constituíram critérios de elegibilidade, artigos originais em língua portuguesa, inglesa ou espanhola, com informações sobre métodos de triagem nutricional para população idosa (≥ 60 anos).

Os resumos ou abstracts dos artigos identificados foram lidos por dois avaliadores, que selecionaram quais seriam os artigos a serem lidos na íntegra. A etapa seguinte foi realizada por três avaliadores que extraíram as informações desses artigos, relacionadas às características dos métodos, aos aspectos metodológicos e operacionais, bem como às propriedades psicométricas. A identificação, a leitura e a extração dos dados foram realizadas de modo independente, sem necessidade de consenso entre os avaliadores8.

Após essa etapa, as pesquisadoras responsáveis por este estudo avaliaram todas as informações extraídas pelos avaliadores e realizaram uma classificação geral desses métodos de triagem nutricional, quanto à evidência de dados de validade e reprodutibilidade, seus respectivos valores, bem como a aceitabilidade e a operacionalização dos mesmos. Foram considerados com alta (+++) evidência, aqueles que apresentavam todos esses dados e foram satisfatórios (coeficiente de correlação intraclasse - CCI > 0,75; sensibilidade e especificidade > 80% e Kappa > 0,6) ; como moderada (++), aqueles que apresentavam todos esses dados, contudo com resultados inferiores aos considerados satisfatórios (CCI entre 0,40-0,75; sensibilidade e especificidade entre 50-80% e Kappa entre 0,4-0,6); baixa (+), quando apresentavam todos esses dados com valores insatisfatórios; e nenhuma (-), quando não apresentavam nenhuma evidência desses dados. Aqueles métodos de triagem nutricional, cuja pontuação (+) foi > 12 pontos foram considerados, “muito bom”; entre 8 a 12 pontos, “Bom”; e quando < 8 pontos, “Ruim”9.

Foi utilizado o programa EndNote10 para gerenciamento dos artigos encontrados e identificação de duplicatas.

Resultados

Foram identificados 1.058 artigos (710 na base PubMed, 103 na Lilacs e 245 na Web of Science). A partir da leitura dos resumos desses artigos, identificaram-se 55 métodos de triagem nutricional descritos na literatura, contudo apenas 12 eram específicos para idosos domiciliados (Figura 1).

Figura 1 Seleção dos artigos nas bases de dados de pesquisa e identificação dos métodos de triagem nutricional específicos para idosos domiciliados. 

As características gerais e metodológicas incluindo os aspectos operacionais e as propriedades psicométricas dos métodos de triagem nutricional selecionados estão descritas no Quadro 2 e a avaliação desses métodos estão apresentadas no Quadro 3.

Quadro 2 Descrição dos métodos de triagem nutricional, segundo diferentes países para idosos domiciliados. 

Métodos de triagem nutricional País / Ano Amostra estudada Formato e áreas de estudo Escore de classificação Propriedades psicométricas
1. Australian Nutrition Screening Initiative – ANS I11 Austrália 1995 Idosos > 70 anos 12 questões autorrespondidas, com resposta dicotômica (sim e não), sobre ingestão alimentar, pobreza, isolamento social, dependência e deficiência, condições agudas e crônicas, alteração de peso e uso de medicamentos 0-2 Baixo risco 3-5 Risco Moderado ≥ 6 Risco Alto Sensibilidade 0,32-0,47 Especificidade 0,74 a 0,79
2. Chinese Nutrition Screening – CNS12 China - Hong Kong 2005 Idosos > 65 anos 16 questões autorrespondidas, com resposta dicotômica (sim e não), sobre aspectos da alimentação, alteração de peso, presença de doença, aspectos psicológicos, uso de medicamentos e referência de saúde. 2 - Bem nutrido 1 - Risco de mã nutrição 0 - Má nutrido Reprodutibilidade 0,77
3. Mini Nutritional Assessment Short Form - MNA-SF13 2001, EUA Idosos, média de idade 74,4 anos 6 questões preenchidas pelo entrevistador, com escore, sobre aspectos da alimentação, problemas neurológicos, alteração de peso, IMC, mobilidade e presença de doenças. ≥12 - bom estado nutricional ≤11 - risco de subnutrição Reprodutibilidade 0,96 Validação discriminante p<0,0001
4. Malasian tool14 Malásia 1999 Idosos 11 questões autorrespondidas, sobre fatores que afetam a ingestão alimentar < 4 sem risco ≥ 4 risco alto de subnutrição Sensibilidade 58% Especificidade 80%
5. Nutritional form for the Elderly of Noruega (NUFFE- NO)15 Noruega 2012 Idosos ≥ 65 anos 15 questões autorrespondidas, com escore, sobre aspectos da alimentação, alteração de peso, dificuldades para realização de atividades, problemas gastrointestinais, presença de doenças e número de medicamentos. Máximo do escore é 30, quanto maior o escore pior é a condição nutricional do idoso Reprodutibilidade 0,71
6. Nutritional Risk Index (NRI)16 St. Louis -EUA 1990 Idoso / ≥ 55 anos 16 questões preenchidas pelo entrevistador, com resposta dicotômica (sim e não), sobre alteração de peso, aspectos da alimentação, presença de doenças, desconfortos associados com a ingestão de alimentos e mudanças nos hábitos alimentares. < 8 baixo risco ≥ 8 alto risco Reprodutibilidade 0,65 a 0,71
7. Nutrition Risk Score (NRS)17 Cambridge - Inglaterra 1999 Idosos > 65 anos 5 questões preenchidas pelo entrevistador, com escore, que avaliam perda de peso, IMC, aspectos da alimentação e fator de estresse clínico. 0 a 3 - baixo risco 4 a 5 - risco moderado 6 a 15 - alto Risco
8. Determine Your Nutritional Health (DNH)18 Inglaterra 1990 Idosos ≥ 60 anos 10 questões autorrespondidas com resposta dicotômica (sim e não), sobre ingestão alimentar, pobreza, isolamento social, alteração de peso, dependência/deficiência, condições agudas e crônicas e uso de medicamentos 0/2- Baixo risco 3/5 - Risco nutricional moderado ≥ 6 - Risco nutricional alto Reprodutibilidade 0,44 Sensibilidade 36% Especificidade 46%
9. Nutrition Screening toll for use in elderly South Africans tool- MNA19 South Africa 2005 Idosos > 60 anos 10 questões preenchidas pelo entrevistador, com escore, sobre capacidade cognitiva, referência de saúde, aspectos da alimentação, presença de doenças, uso de medicamentos, alteração de peso e circunferência do braço. Bem nutrido Alto risco de desnutrição Desnutrido Sensibilidade 82 % a 87 % Especificidade 72 % a 95%
10. Nutrition Screening Toll (NST)20 Ayrshire - Escócia 2001 Idosos > 65 anos 06 questões preenchidas pelo entrevistador, com escore, sobre alterações de peso, apetite, ingestão de alimentos e de líquidos, habilidade para comer e condições clínicas. ≤ 6 risco moderado ≥ 7 alto risco Reprodutibilidade 0,77 a 0,94
11. Seniors in the Community: Risk Evaluation for Eating and Nutrition (SCREEN I)21 Guelph-Canadá 2001 Indivíduos ≥ 55 anos 15 questões autorrespondidas pelo indivíduo sobre alteração de peso; modificação da dieta por conta de doença; aspectos da alimentação, dificuldade para desempenhar atividades < 60 pontos aumento do risco nutricional Reprodutibilidade 0,68 Sensibilidade 94% e Especificidade 32%
12. Seniors in the Community: Risk Evaluation for Eating and Nutrition II (SCREEN II)22 Guelph-Canadá 2005 Indivíduos ≥ 55 anos 17 questões autorrespondidas pelo indivíduo sobre alterações de peso, modificação da dieta por conta de alguma patologia, aspectos da alimentação, dificuldade para desempenhar atividades < 60 pontos aumento do risco nutricional Reprodutibilidade 0,83 Sensibilidade 79% a 84% Especificidade 58 a 62%

Nota: Métodos obtidos das bases de dados “PubMed, Lillacs e Web of Science”. Propriedades psicométricas avaliadas pelos indicadores de reprodutibilidade, validade, sensibilidade e especificidade. (–) não apresentou dados referentes as propriedades psicométricas do método.

Quadro 3 : Avaliação dos métodos de triagem nutricional para uso em idosos domiciliados. 

Métodos de triagem nutricional Validação Reprodutibilidade Aceitabilidade e Operacionalização Classificação geral
Evidência do teste Validade do método Evidência do teste Reprodutibilidade do teste
ANSI +++ + - - ++ Ruim
CNS +++ + ++ ++ ++ Bom
MNA-SF +++ +++ +++ +++ + Muito bom
Malasian tool +++ + - - + Ruim
NUFFE- NO - - +++ ++ - Ruim
NRI - - ++ ++ + Ruim
Nutrition risk score - - - - ++ Ruim
DNH +++ + +++ + +++ Bom
South Africans tool +++ + - - - Ruim
NST - - +++ ++ + Ruim
SCREEN I +++ + +++ ++ + Bom
SCREEN II +++ + +++ ++ + Bom

ANSI: Australian Nutrition Screening Initiative; CNS: Chinese Nutrition Screening; MNA-SF: Mini Nutritional Assessment Short Form; NUFFE-NO: Nutritional form for the Elderly of Noruega; NRI: Nutritional Risk Index; DNH: Determine Your Nutritional Health; NST: Nutrition Screening Toll; SCREEN: Seniors in the Community: Risk Evaluation for Eating and Nutrition.

Nota: Avaliação dos métodos considerando todos os tópicos analisados, sendo classificados como: alta (+++); moderada (++); baixa (+) e nenhuma (-) evidência. Classificação geral dos métodos: Muito bom, quando > 12 pontos (+); Bom, entre 8 a 12 pontos (+); e Ruim, quando < 8 pontos (+).

Métodos de triagem nutricional

Identificou-se 12 métodos de triagem nutricional11-22, para idosos (≥ 60 anos) domiciliados, sendo três para maiores de 55 anos16,21,22. Três desses métodos foram desenvolvidos em populações estadunidenses (3)13,16,18, os demais foram na África (n = 1)19, na Austrália (n = 1)11, no Canadá (2)21,22, na China (n = 1)12, na Escócia (n = 1)20, na Inglaterra (1)17, na Malásia (n = 1)14 e na Noruega (n = 1)15. Não foi verificado nenhum questionário desenvolvido no Brasil (Quadro 2).

Grande parte dos métodos (N = 7)11,12,14,15,18,21,22 são autorrespondidos por idosos, familiares ou cuidadores, sendo que nenhum deles foi desenvolvido para preenchimento com o uso de computadores. Dos métodos administrados por entrevista (N = 5)13,16,17,19,20, todos foram realizados por profissionais de saúde (nutricionistas, médicos ou enfermeiros) (Quadro 2).

Características dos métodos e diagnóstico

Todos os métodos consideram como critério para a definição de risco nutricional a presença de pelo menos três fatores de risco como: a perda de peso não intencional ou a mudança recente no peso corporal; os aspectos relacionados à alimentação; e a presença de doenças que interferem na ingestão alimentar do idoso (Quadro 2).

A maioria dos métodos (N = 7)13,15,17,19,20,21,22utiliza escore ou escala com valores diferentes, cuja soma resulta no valor final que classifica os indivíduos quanto ao risco nutricional. Quatro métodos11,12,16,18 utilizaram forma de resposta sim e não e um14 não apresentou com clareza a forma de resposta (Quadro 2).

Dos métodos analisados, cinco11,12,17,18,19 adotaram a seguinte classificação de risco nutricional: baixo risco (normal ou bem nutrido), risco nutricional moderado (risco de desnutrição ou de má nutrição) e risco nutricional alto (subnutrido), com diferentes valores de pontuação para cada classificação. Os demais utilizaram classificações diferenciadas (Quadro 2).

Dos métodos analisados, 2 incluem dados antropométricos como circunferência da panturrilha (CP)15 autorreferida e circunferência muscular do braço (CB)19 aferida por equipe treinada e 1 contempla um indicador nutricional, o índice de massa corporal -IMC (dados de peso e altura utilizados para o cálculo do IMC, foram aferidos por equipe treinada)13, como parte da triagem nutricional, sendo que um método não ficou clara a inclusão desses dados14. Nos demais11,12,16,17,18,20,21,22, os idosos referem ou preenchem a melhor resposta que condiz a sua situação (Quadro 2).

Características operacionais

O tempo médio de realização descrito para três métodos variou entre 4 e 10 minutos11,12,16,18. Treinamentos e orientações para o preenchimento foram descritos em seis métodos11,12,16,18,20,21. Não foi verificada a presença de manual para o entrevistador. O treinamento dos avaliadores envolvidos na coleta de dados foi mencionado em dois métodos11,12. De todos os métodos analisados, apenas um18 incluiu planos e metas para intervenção nutricional (dados não apresentados).

Aceitabilidade

Dos métodos analisados, apenas um18 apresentou informações sobre aceitabilidade, sendo destacado como bem aceito e de fácil compreensão pelos indivíduos avaliados (dados não apresentados).

Reprodutibilidade

Oito métodos de triagem nutricional12,13,15,16,18,20,21,22apresentaram análise de reprodutibilidade (teste-reteste). O tamanho da amostra para a análise de reprodutibilidade nos estudos variou de 15 a 657 indivíduos. O intervalo de tempo entre as realizações dos métodos (teste-reteste) foi apresentado em três métodos e variou de 1 a 4 semanas12,16,18 (Quadro 2).

Observou-se que os métodos utilizaram diferentes testes estatísticos para análise de reprodutibilidade, a saber: CCI e Kappa. Sete métodos12,15,16,18,20,21,22 utilizaram o CCI e identificaram valores variando entre 0,44 a 0,83 e dois utilizaram o Kappa13,20, apresentando resultados variando entre 0,77 a 0,96 (Quadro 2).

Validade

Apenas um método de triagem nutricional13 realizou a análise de validade com o teste estatístico adequado para essa análise, utilizando a análise discriminante stepwise, obtendo como resultado valor de p < 0,0001 (Quadro 2).

Seis métodos11,14,18,19,21,22 utilizaram valores de sensibilidade e de especificidade variando de 32% a 94% e de 46% a 95%, respectivamente, como análise de validação, contudo, não é considerada como “adequada” para validar um método, mas sim para propor valores de referência (Quadro 2).

A antropometria foi adotada como medida padrão-ouro (critério ou objetiva) para comparação em todos os métodos de triagem nutricional. Outras medidas critério foram utilizadas nos estudos como Mini avaliação nutricional (MAN), Mini avaliação nutricional versão reduzida (MAN-SF), exames bioquímicos e ingestão alimentar (dados não apresentados).

Avaliação dos métodos de triagem nutricional

Pelos resultados da avaliação dos 12 métodos selecionados, apenas 1 (Mini Nutritional Assessment Short Form - MNA-SF) foi considerado como “muito bom”, 4 (Chinese Nutrition Screening – CNS, Determine Your Nutritional Health - DNH, Seniors in the Community: Risk Evaluation for Eating and Nutrition II - SCREEN II e Nutrition Screening Toll - NST) foram classificados como “bom”, e os demais como “ruim”, portanto, foram excluídos da análise. Dentre os considerados como “muito bom e bom”, apesar de alguns apresentarem melhores pontuações quanto às suas propriedades psicométricas, optou-se pelo método DNH, por apresentar maior aceitabilidade em relação aos demais (Quadro 3).

Discussão

O presente estudo, por meio de revisão, apresenta e discute características de 12 métodos que permitem identificar risco nutricional em idosos domiciliados. Grande parte dos métodos foi desenvolvido para uso em populações estadunidense, inglesa e canadense, sendo que não foi identificado nenhum específico para idosos brasileiros. Os métodos foram, em sua maioria, autorrespondidos pelos idosos e contemplam questões sobre alimentação, perda de peso não intencional, presença de doença, condições neuropsicológicas, problemas bucais, uso de medicamentos, referência de saúde e dificuldades para mastigação e para desempenhar atividades básicas e instrumentais, além de medidas antropométricas.

Identificar um método para triagem nutricional de idosos em nível populacional constitui tarefa desafiadora. Envolve a avaliação de suas propriedades psicométricas, o grupo populacional para o qual foi desenvolvido, aspectos operacionais, características do método e informações que podem ser derivadas dos dados. Ressalta-se ainda que, apesar dos métodos apresentarem valores de reprodutibilidade e validade, estas devem ser avaliadas a cada nova utilização em outro local e grupo a ser estudado23.

Discutem-se, também, conceitos envolvidos na avaliação das propriedades psicométricas dos métodos identificados, reforçando aspectos metodológicos importantes relativos aos testes estatísticos para avaliação de reprodutibilidade, intervalo de tempo entre as realizações do método e as opções de medidas padrão ouro (critério ou objetiva) de risco nutricional para avaliação de validade24.

De todos os aspectos citados, três são fundamentais e devem ser considerados na escolha de um método para identificação de risco nutricional. O primeiro é a sua operacionalização, o segundo sua aceitabilidade e o terceiro refere-se às propriedades psicométricas. Alguns estudos destacam a importância de escolher um método que apresente excelentes propriedades psicométricas.

Entretanto, outros estudos ressaltam a necessidade de não somente escolher um método por sua qualidade psicométrica, mas consideram até mesmo mais relevante a aceitabilidade e a operacionalização do mesmo24,25. Cabe ressaltar que cada região deve escolher aquele que atenda melhor à sua necessidade na prática clínica ou em estudos epidemiológicos26. Considerando a realidade brasileira, com diferenças de etnia, de cultura, de região, de renda, de escolaridade, de condições de vida, de saúde e de alimentação, é essencial optar por um método que atenda todos esses quesitos, especialmente os de aceitabilidade e de operacionalização.

Neste estudo, dentre os métodos classificados como “muito bom” (MNA-SF) e “bom” (CNS, DNH, SCREEN II e NST) apesar da MNA-SF e do SCREEN II apresentarem melhores pontuações quanto às propriedades psicométricas, no quesito aceitabilidade e operacionalização, assim como a CNS e a NST, não apresentaram resultados satisfatórios ou suficientes para escolhê-los, diferentemente do DNH.

Destaca-se ainda que o método (MNA-SF) utiliza variáveis antropométricas, como peso e altura (para cálculo do índice de massa corporal – IMC) e circunferência da panturrilha, que podem constituir limitações26,27. Uma das limitações refere-se à necessidade de treinamento prévio da equipe, para que não haja erros de medida e/ou interpretação dos dados e, a outra, está relacionada à execução das mensurações dessas variáveis, que necessitam de maior tempo para realização, além do custo, mesmo que considerado baixo, pois muitos serviços de atenção básica não dispõem dos equipamentos para realização dessas mensurações26.

Baseado nessas considerações, constatou-se que a DNH pode ser o método mais indicado para triagem nutricional de idosos domiciliados para adaptação transcultural e uso no Brasil. Tal indicação pode ser explicada, tendo em vista que esse método apesar de apresentar resultados razoáveis quanto às propriedades psicométricas, foi o que apresentou melhor pontuação quanto ao quesito aceitabilidade e operacionalização18,28.

O método DNH foi desenvolvido e validado nos Estados Unidos18,28 e utilizado para validação em outros países como na Austrália11 e na Inglaterra29. Esse método é baseado em 10 questões autorrespondidas com enunciados afirmativos, não necessita de equipamentos ou treinamentos específicos para mensurações corporais, é acessível, bem compreendido pelos idosos, de fácil utilização, constituindo método prático, barato e exequível em nível populacional18,28.

Dentre as limitações presentes nos métodos avaliados, duas foram destacadas neste estudo. A primeira é que poucos estudos apresentam informações sobre os aspectos operacionais, como: i) duração total da entrevista; ii) treinamento e orientações para preenchimento do método pelos idosos; iii) manual de orientações para o entrevistador realizar a entrevista; e iv) planos e metas para intervenção nutricional, visto que a duração da entrevista é uma informação essencial que permite estabelecer a relação de custo-efetividade; o treinamento prévio para os idosos que serão avaliados é importante, pois permite reforçar conceitos relacionados à alimentação e nutrição; a existência de manual está relacionada à homogeneização dos procedimentos para a realização da entrevista, favorecendo a minimização de erros sistemáticos30; e os planos e metas de intervenção são fundamentais para assegurar a orientação necessária para tratamento ou prevenção de indivíduos em risco nutricional31.

A segunda refere-se aos problemas em relação à falta de descrição com clareza do tipo de teste que foi realizado para a validade e a reprodutibilidade, assim como, não há um padrão-ouro para avaliar o risco nutricional, tornando difícil analisar a validade dos métodos. Estudos sugerem que a validade do método deve ser analisada de acordo com o uso a que se destina3,9. Ressalta-se, ainda, que alguns estudos testaram a validade do método na mesma amostra populacional na qual este foi desenvolvido, influenciando o processo de validação26.

Mesmo diante dessas limitações esta revisão da literatura é relevante, tendo em vista que não existem estudos brasileiros dessa natureza, e pemite identificar um método de triagem nutricional, a DNH, que pode ser adaptado para o Brasil, para utilização por profissionais de saúde, em idosos domiciliados.

A adaptação transcultural do método DNH para população idosa brasileira domiciliada preencherá uma lacuna para estudos epidemiológicos e clínicos, tendo em vista que, até o momento, não existem métodos de triagem nutricional, desenvolvidos ou adaptados, para esse grupo. O método DNH, a partir de todas as características apresentadas pode desempenhar de forma adequada a função de identificar, precocemente, a condição nutricional de um indivíduo e detectar a necessidade de realizar uma avaliação de forma mais completa e detalhada.

Conclusão

Dentre os métodos de triagem nutricional identificados no presente estudo concluiu-se que a DETERMINE YOUR NUTRITIONAL HEALTH (DNH)® poderia constituir um método adequado para ser utilizado na população idosa brasileira domiciliada, desde que o mesmo passe por processo de adaptação transcultural e avaliação das propriedades psicométricas.

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