versão impressa ISSN 0066-782Xversão On-line ISSN 1678-4170
Arq. Bras. Cardiol. vol.111 no.1 São Paulo jul. 2018
https://doi.org/10.5935/abc.20180130
A doença arterial coronariana (DAC) é a principal causa de morte no mundo, sendo mais comumente causada por aterosclerose nas artérias coronárias. A DAC tem etiologia complexa, devendo-se principalmente a uma combinação de fatores de risco tradicionais e predisposição genética. Os fatores de risco tradicionais incluem diabetes tipo 2, dislipidemia, hipertensão arterial e tabagismo.1 Entretanto, esses fatores não são suficientes para identificar indivíduos assintomáticos com alto risco e não explicam todos os casos de DAC. A influência da hereditariedade na suscetibilidade à DAC é responsável por 40% a 50% dos casos.2
Polimorfismos são variações genéticas comuns, presentes em mais de 1% da população.3 O polimorfismo é uma substituição de nucleotídeo que não altera a estrutura primária do aminoácido da proteína resultante.3 O polimorfismo de nucleotídeo único (SNP, sigla em inglês) é uma variação no DNA em um único nucleotídeo que ocorre em posição específica do genoma. O SNP pode ser um marcador de suscetibilidade a doença.3 Populações de indivíduos saudáveis e afetados podem ser avaliadas por genotipagem de SNP em um gene e suas sequências reguladoras.4 Estudos de associação genômica ampla (GWAS, sigla em inglês) foram usados para criar escores de risco genético para melhorar a predição de risco de DAC.4-6 Entretanto, seu valor como preditor independente de risco para DAC não é claro.
Nesta edição dos Arquivos Brasileiros de Cardiologia, Pereira et al.,7 apresentam interessante estudo sobre a geração de um escore de risco genético multilocus baseado em variantes comuns já associadas com DAC. Os autores avaliaram se o escore de risco genético era independente dos fatores de risco tradicionais e se aprimorava a predição de risco de DAC em comparação ao modelo usando apenas o modelo com fatores de risco tradicionais.
Após avaliar dados do Instituto Nacional de Pesquisa do Genoma Humano, os autores analisaram 33 variantes genéticas previamente associadas com DAC. A população estudada foi selecionada do GENEMACOR (GENEs in a population from the Portuguese island of MAdeira with CORonary artery disease), um estudo populacional caso-controle com 1.566 casos e 1.322 controles. O risco coronariano foi determinado por análise de regressão logística. Duas curvas ROC foram construídas, uma com e outra sem o escore de risco genético, sendo o teste de DeLong usado para compará-las. A área sob a curva ROC do fator de risco tradicional foi estimada em 0,72, que estatisticamente aumentou para 0,74 quando o escore de risco genético foi adicionado, revelando melhor adequação do modelo. A força do estudo está na avaliação de amostra grande e homogênea, pois apenas residentes permanentes da Ilha da Madeira foram incluídos.
Os escores de risco genético têm sido muito estudados, resultando em grande progresso para a melhor compreensão do papel da influência genética na DAC e da função de cada novo locus.4,8-13 Entretanto, o papel da maioria das variantes genéticas no desenvolvimento da doença permanece desconhecido.10 Além disso, a presença ou ausência de um fator de risco tradicional pode determinar se um fator genético vai contribuir ou não para a doença.5
Embora no estudo de Pereira et al.,7 a adição do escore de risco genético tenha resultado em um escore estatisticamente superior para a identificação de pacientes de alto risco, a diferença entre as duas curvas de fator de risco foi pequena. Portanto, considerando o baixo controle dos fatores de risco tradicionais na população geral e o alto custo financeiro envolvido na determinação de escores de risco genético, é importante manter o foco na prevenção e no controle dos fatores de risco tradicionais até que o papel dos escores de risco genético seja melhor esclarecido.