Compartilhar

Sentidos do cuidado com o idoso hospitalizado na perspectiva dos acompanhantes

Sentidos do cuidado com o idoso hospitalizado na perspectiva dos acompanhantes

Autores:

Isis de Moraes Chernicharo,
Márcia de Assunção Ferreira

ARTIGO ORIGINAL

Escola Anna Nery

versão impressa ISSN 1414-8145

Esc. Anna Nery vol.19 no.1 Rio de Janeiro jan./mar. 2015

http://dx.doi.org/10.5935/1414-8145.20150011

RESUMEN

Objetivo:

Identificar y analizar los sentidos de la atención al anciano hospitalizado desde la perspectiva de los acompañantes.

Métodos:

Investigación cualitativa, exploratoria y descriptiva. Participaron 30 acompañantes de ancianos hospitalizados. Se realizó entrevista individual y observación sistemática. Los datos fueron analizados por el software Alceste 2010.

Resultados:

Los resultados muestran la prevalencia del acompañante familiar de género femenino. Los sentidos atribuidos por los acompañantes a la atención del anciano se amparan en las actividades de auxilio, relacionamiento entre el acompañante y el usuario y el enfermero, apoyo institucional y orientaciones de atención.

Conclusión:

Se concluye que los sentidos de la atención se asientan en las necesidades y demandas del acompañante para mejor cuidar del anciano que necesita de su auxilio y, para tanto, la educación en salud por parte del enfermero emerge como importante estrategia a ser implantada junto a ellos en el hospital.

Palabras-clave: Anciano; Hospitalización; Cuidadores; Enfermería

CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Há diversas formas de caracterizar o termo envelhecer. Dentre elas, encontra-se o envelhecimento bem-sucedido e o envelhecimento mal sucedido, englobando o idoso frágil ou dependente.

Envelhecer bem-sucedido se tornou um aglomerado de características como: longevidade, independência, baixo risco de doenças e incapacidades, um bom funcionamento físico e mental, o envolvimento ativo com a vida, participação social, bem-estar subjetivo, satisfação com a vida, autonomia, bem-estar psicológico, estratégias de enfrentamento, prevenção de morbidades, capacidade de aceitação das mudanças fisiológicas decorrentes da idade e adaptação positiva1,2.

Já o envelhecimento mal sucedido se dá quando ocorrem perdas dos projetos de vida; falta de reconhecimento; dificuldade de satisfazer suas próprias necessidades; sentimentos de fragilidade, incapacidade, baixa autoestima, dependência, desamparo, solidão e desesperanças; além de ansiedade, depressão, hipocondria e fobias. As doenças que colocam a vida em risco, a morte de pessoas próximas, a saída dos filhos de casa, as mudanças de residência, a perda da autonomia e as perdas materiais são importantes riscos para que se estabeleça um processo de envelhecimento malsucedido3.

A fragilidade e dependência são outros conceitos importantes quando se trabalha a questão do envelhecimento. Fragilidade é definida como uma vulnerabilidade que o indivíduo apresenta aos desafios do próprio ambiente, ocorrendo devido a uma combinação de doenças ou limitações funcionais que reduzem a capacidade do indivíduo de se adaptar ao estresse causado por doenças agudas, hospitalizações ou outras situações de risco4. A fragilidade apresenta sinais e sintomas que a caracterizam como uma síndrome: fraqueza, fadiga, perda de peso, perda de equilíbrio, baixos níveis de atividades físicas, lento desempenho do processo motor, isolamento social, alterações cognitivas leves e crescente vulnerabilidade a estressores. Tais manifestações ocorrem associadas entre si e não isoladamente5.

A dependência do idoso envolve questões econômicas, cuidado familiar, carência de redes de suportes formais tanto ao idoso quanto ao familiar, seguridade social e questões que envolvem também a dependência dos próprios familiares e idosos sem familiares, e que para conseguir avançar nessas questões, o envelhecer com dependência precisa ser reconhecido como uma importante questão de saúde pública, incluindo estratégias de promoção de saúde até o estabelecimento de redes de apoio a cuidados de longa duração na comunidade, respaldando os idosos dependentes, com ou sem suporte familiar6.

Assim, o idoso frágil apresenta maior risco de dependência, institucionalização, queda, doenças agudas, hospitalização, recuperação lenta e mortalidade. A fragilidade representa um risco para a dependência que se traduz em uma ajuda indispensável para a realização dos atos elementares da vida.

Segundo os dados do Departamento de Informática do SUS (DATASUS)7, a razão de dependência de idosos, no Brasil, aumentou de 13,8 no ano de 2000 para 16,6 no ano de 2010, apontando para a necessidade de uma atenção especializada para lidarem com as consequências sociais, econômicas e de saúde que envolvem o processo de envelhecer, incluindo as comorbidades, que podem levar a hospitalização e que tem potencial de impactar diretamente a qualidade de vida dos mais idosos e de seus familiares.

O Sistema de Informações Hospitalares do SUS do Ministério da Saúde (SIH/SUS)8 mostra que o índice de internação de idosos, em 1 ano (de janeiro de 2011 a janeiro de 2012), no Município do Rio de Janeiro, caracterizou-se por estar em torno de 12.000 a quase 14.000 internações por mês. A hospitalização, de um modo geral, gera muito sofrimento, tanto para o usuário quanto para a sua família. O usuário, ao ser retirado de seu contexto social, perde uma parte da sua autonomia, principalmente, em relação aos seus hábitos, condutas e rotinas, que são alterados e incompatíveis com a rotina hospitalar. O familiar sofre por querer permanecer junto ao usuário no hospital, ou por insegurança, interesse no usuário, sentimento de corresponsabilidade pela recuperação do usuário, oportunidade de aprender, obrigação, respeito e/ou simplesmente para estar junto9.

O Estatuto do idoso, no capítulo IV, artigo 16, diz que: "Ao idoso internado ou em observação é assegurado o direito a acompanhante, devendo o órgão de saúde proporcionar condições adequadas para a sua permanência em tempo integral, segundo critério médico"10:20. Nesse caso, o acompanhante pode ser um familiar ou alguém da comunidade (cuidador informal) ou um cuidador formal. O cuidador informal emerge das relações interpessoais e se constrói no cotidiano familiar e social. Esse indivíduo é eleito pela família e, normalmente, com pouca ou nenhuma experiência de cuidar de pessoas doentes, mas com algum poder decisório. O cuidador formal presta cuidados ao usuário com remuneração e com poder decisório reduzido, já que cumpre tarefas delegadas pela família.

Independentemente do vínculo que esse acompanhante tenha com o usuário (familiar, cuidador formal ou informal), é importante identificar como esses sujeitos entendem o cuidado ao idoso, assim como a sua participação nesse cuidado, pois, assim, é possível discutir e elaborar estratégias para a construção de uma prática de cuidar que vá ao encontro das necessidades e desejos dos usuários e dos acompanhantes, no qual o profissional pode acomodar ou negociar as ações de cuidado tornando o cuidado à pessoa idosa mais seguro e efetivo. Para tal, essa pesquisa tem como objetivos: identificar e analisar os sentidos do cuidado ao idoso hospitalizado na perspectiva dos acompanhantes.

MÉTODO

Pesquisa qualitativa de abordagem exploratória e descritiva, que explorou os sentidos atribuídos por acompanhantes de idosos aos cuidados dos quais necessitam.

Os sujeitos foram 30 acompanhantes de idosos (sujeitos com 60 anos ou mais) internados nos setores de clínica médica e clínica cirúrgica de um Hospital Universitário, público, Federal no Município do Rio de Janeiro - RJ. O recorte da faixa de idade (60 anos ou mais) refere-se à classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS) que caracteriza, cronologicamente como idoso, as pessoas com 60 anos ou mais, em países em desenvolvimento. A amostra foi de conveniência por convite da pesquisadora a todos os que atendiam aos critérios de inclusão, determinando-se o encerramento pelo delineamento do quadro empírico da pesquisa.

Os critérios de inclusão foram: acompanhantes (familiares ou não), em tempo integral ou parcial, de ambos os sexos e, que participam de forma passiva ou ativa do cuidado ao idoso, em qualquer turno (manhã, tarde ou noite).

Foram aplicadas duas técnicas de produção de dados: a observação sistemática e a entrevista em profundidade. Os dados foram produzidos nos meses de outubro de 2012 a fevereiro de 2013, com aplicação da técnica de entrevista, realizada de forma individual e com aplicação de instrumento semiestruturado. Esse instrumento compõe-se de perguntas fechadas no intuito de captar o perfil psicossociodemográfico dos sujeitos da pesquisa, tarefa necessária para se entender as condições de produção dos sentidos que os sujeitos atribuem aos objetos que lhe são relevantes; e de questões abertas para exploração do objeto da pesquisa. O registro foi feito por equipamento eletrônico, sendo fidedignamente transcritos ao término de cada entrevista.

Aos dados psicossociodemográficos aplicou-se os recursos da estatística simples e percentual, para que se possa melhor explorar os sentidos do cuidado à luz da identidade dos grupos aos quais pertencem os sujeitos que os produziram.

Aos dados provenientes das questões abertas foram aplicadas técnicas de análise quanti-qualitativa, por meio da análise lexical dos dados textuais, por rodagem do material no software Alceste 2010. Este Programa realiza análise dos lexemas concorrentes num conjunto de segmentos de texto. O software Alceste possibilita a segmentação do texto, estabelecimento de semelhança entre segmentos e hierarquia de classes de palavras, conduzindo a pressupostos ou trajetórias de interpretações para as pesquisas qualitativas que se utilizam de materiais discursivos.

Em atendimento à Resolução nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, o projeto de pesquisa foi aprovado Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem Anna Nery (EEAN)/Hospital Escola São Francisco de Assis (HESFA), sob o Parecer nº 84115. Obteve-se autorização institucional para a execução do estudo e o Termo de Consentimento foi assinado por todos os sujeitos. O anonimato foi garantido pelo código associado a elementos dos depoimentos que se constituíram nas linhas de comando, sendo a uci, uce e o qui-quadrado, de cada segmento de texto, extraído da análise lexical.

RESULTADOS

Sobre as Características Gerais de Identificação dos Sujeitos

Dos 30 acompanhantes que participaram da pesquisa, 25 (83,3%) eram do sexo feminino e cinco (16,7%) do sexo masculino. Todos nascidos no Brasil, sendo 22 (73,3%) naturais do Rio de Janeiro. Quanto à idade, os sujeitos estão distribuídos nas seguintes faixas-etárias: seis entre 25 e 35 anos; cinco entre 36 e 46 anos; 11 entre 47 e 57 anos; seis entre 58 e 68 anos e dois entre 69 e 79 anos. 13 (43,3%) acompanhantes são solteiros, 12 (40%) vivem com o companheiro(a), dois (6,7%) são casados, dois (6,7%) viúvos e um (3,3%) separado.

Em relação à religião, dez (33,3%) acompanhantes se declararam evangélicos, nove (30%) católicos, cinco (16,7%) espíritas, quatro (13,4%) sem religião, um (3,3%) Testemunha de Jeová e um (3,3%) da umbanda. A renda pessoa variou de um salário mínimo a cinco salários mínimos e a renda familiar variou de um salário mínimo a mais de 11 salários mínimos.

Do total de participantes, 26 (86,7%) tinham algum tipo de vínculo familiar com o usuário, três (10%) eram cuidadores informais e um (3,3%) cuidador formal. Em relação ao tempo que o acompanhante permanecia com o idoso no hospital, metade dos sujeitos da pesquisa (50%) permanecia no hospital de forma integral e a outra metade (50%) permanecia, parcialmente, variando entre duas a 12 horas de acompanhamento.

Sobre a análise lexical utilizando o software Alceste

O corpus foi constituído por 30 unidades de contexto inicial (uci). O programa repartiu o corpus em 1.026 unidades de contexto elementar (uce), formadas por 3.735 palavras ou formas de vocábulos distintos. Posteriormente, o programa reduziu os vocábulos às suas raízes, originando 677 palavras analisáveis e 236 palavras suplementares.

De um total de 1.026 uce, o programa selecionou 826 delas, o que perfaz 81% do corpus. A análise lexical das 30 entrevistas distribuiu os conteúdos em três classes, cujas classes um e três centraram-se no cuidado ao idoso hospitalizado (sentidos e práticas do cuidado, respectivamente) e a classe dois se refere à trajetória do acompanhamento hospitalar.

Este artigo explora os conteúdos presentes na classe um, uma vez que é nesta classe que se concentram os léxicos que exploram os significados do cuidado, objeto da presente discussão. Esses dados representam 39% do corpus de análise.

Os resultados oriundos do software informam as palavras com maior associação estatística à classe, ou seja, maior qui-quadrado (khi2), assim como as u.c.e., que tiveram maior impacto para a formação das mesmas.

As palavras com maior associação estatística à classe, ou seja, maiores valores do coeficiente de associação por meio do qui-quadrado foram: pessoa (khi2 = 73), idoso (khi2 = 41), paciente (khi2 = 40), acho (khi2 = 38), paciência (khi2 = 38), atenção (khi2 = 32), acompanhante (khi2 = 30), coisa (khi2 = 28), cuidar (khi2 = 25), família (khi2 = 24), falta (khi2 = 18), vezes (khi2 = 16), sei (khi2 = 14), requer (khi2 = 14), importante (khi2 = 14), mesma (khi2 = 13), gente (khi2 = 12), mudar (khi2 = 11), seja (khi2 = 11), gostar (khi2 = 11), forma (khi2 = 11), familiar (khi2 = 11), chora (khi2 = 10). As palavras próximo (khi2 = 9), contribui (khi2 = 9), escutar (khi2 = 8), vínculo (khi2 = 8), tranquilidade (khi2 = 8) e relacionamento (khi2 = 8) tiveram um qui-quadrado mais baixo, entretanto, apresentam percentual de 100% de presença nas uce da classe um e, por isso é importante destacá-las neste estudo.

DISCUSSÃO

Os resultados apontam para um perfil dos acompanhantes, predominantemente, do sexo feminino e pelo vínculo familiar, consoantes aos estudos nesta área11-14. Vale ressaltar que a determinação dos acompanhantes não está, biologicamente, relacionada ao sexo feminino, embora a influência psicossocial da prática de cuidado voltado ao gênero feminino ainda esteja presente em nosso cotidiano. A escolha dos acompanhantes é feita segundo preferência ou necessidade da família e não por habilidades pessoais ou experiências prévias:

Nós é que decidimos quem ia ficar aqui. Somos três filhos, então a gente vai revezando. (uce nº 290, uci nº 8).

Eu sou nora. Ela tem mais três filhas e ele. A pessoa que teve maior disponibilidade de estar aqui fui eu. A outra mora muito longe e a outra trabalha. Então eu fiz um acordo. Eu me propus a fazer o revezamento com ela. (uce nº 367, uci nº 12).

Assim, nos deparamos com acompanhantes com características diversas, mas também similares, com atitudes, posturas, comportamentos, hábitos, crenças e experiências diversificadas e, que se encontram frente às normas e rotinas hospitalares. O que pouco se sabe, ou que pouco se discute é o papel do acompanhante do idoso no cenário hospitalar, que, muitas das vezes, se resume à disponibilidade e solidariedade com o usuário.

A gente fica aqui como acompanhante. Com certeza é importante um acompanhante aqui porque ele, embora esteja sendo bem atendido pela equipe, eles não podem ficar aqui diretamente ao lado dele. (uce nº 694/uci nº 23).

Observei que os acompanhantes demonstram carinho com o usuário, ajudando-o a deambular, tomar banho, se arrumar, retirar próteses dentárias e o acompanham à sala de cirurgia. Alimentam primeiro o idoso para depois se alimentarem. (Caderno de campo, 15/10/12).

Nas concepções dos próprios acompanhantes quantos às atividades realizadas no âmbito hospitalar destaca-se a questão de ajudar o usuário com dependência ou limitação física.

Eu ajudo na hora do banho. Eu procuro sempre ajudar. Eu puxo ela para o meu lado. (uce nº 48, uci nº 16).

Eu ajudo a carregar tudo aquilo. Pegar alguma coisa no armário. Estou dando sempre um apoio a ele. (uce nº 693, uci nº 23).

A presença do acompanhante também inclui a demonstração de amor, gratidão, apoio emocional; transmitir força, coragem, otimismo; identificar e atender suas necessidades; facilitar a comunicação; assegurar e fiscalizar o atendimento da equipe e acompanhar a evolução clínica. Atividades estas, mais simples, que são realizadas no intuito de ajudar na realização do cuidado durante o tempo de internação. Essas situações aparecem na classe um associadas às palavras pessoa, idoso, paciência, atenção, acompanhante, cuidar, próximo, vínculo, escuta, contribui, tranquilidade e ajuda.

Cuidado é estar perto, ser atenciosa, dar atenção, ficar monitorando. Com o idoso eu acho que requer mais atenção. (uce nº 947, uci nº 29).

E a gente tem que passar tranquilidade para o paciente. (uce nº 923, uci nº 28).

É difícil porque requer paciência, capacidade de ouvir e de se colocar no lugar do outro. (uce nº 1015, uci nº 30).

Nessas uce se identifica que para cuidar de uma pessoa idosa, os acompanhantes relatam que é preciso ter paciência, atenção e empatia para lidar com o idoso. Um ponto interessante é que os acompanhantes apontam que só isto não basta, é importante que haja o apoio institucional e orientações básicas de cuidado, assim como orientações específicas, conforme as especificidades de cada situação como um facilitador no cuidado ao idoso.

É a única coisa que eu sinto falta no hospital e de apoio psicológico ou psiquiátrico para ela e para mim. Tem gente que surta aqui. Eu tenho que trabalhar. Eu larguei meu trabalho para ficar aqui com ela. Eu estou tendo o amparo do meu chefe, mas vai ter um dia que ele vai dizer que não da mais. (uce nº 805, uci nº 27).

Elas me explicam. E bom que eu aprendo. [...] Eu não tinha visto como estava o curativo, como que estava o buraco. (uce nº 77, uci nº 26).

O enfermeiro necessita preparar aquele que cuida para exercer ações de cuidado integrais e não fragmentadas, como normalmente acontece e, que isso se apresenta como uma situação preocupante haja vista que o acompanhante não está incluído no planejamento de suas ações. Assim, o acompanhante necessita de conhecimentos que são fundamentais para o cuidado, para não acarretar problema para aquele que se cuida13.

Quando eu ia cuidar, eu usava luvas. Eu mesma que fazia o curativo. Uma senhora me ensinou o que eu tinha que fazer, como fazer e eu fazia do jeito que ela tinha falado. (uce nº 311, uci nº 9).

Nesse ínterim, emerge a relação entre profissionais e acompanhantes, visto que a presença do acompanhante representa um elo entre o idoso e a equipe de saúde, e para isso é preciso que os profissionais vejam os acompanhantes como um agente participativo do cuidado ao idoso, possibilitando o compartilhamento de informações e um cuidado congruente às necessidades do idoso e do acompanhante14.

É um bom cuidado, é um bom relacionamento com os médicos, enfermeiros e com o próprio paciente. (uce nº 707, uci nº 23).

E informação com os familiares. Os familiares sofrem muito. O paciente sofre a dor, os familiares é o emocional, é o sentimento. E isso é muito importante também porque a pessoa pode cair na depressão. Então dando a informação, tendo um bom relacionamento, é muito importante. (uce nº 708, uci nº 23).

Ainda não temos uma posição consolidada quanto à percepção dos profissionais da saúde, em especial, dos profissionais de enfermagem no que se refere à presença do acompanhante de idosos no âmbito hospitalar. Há estudo que aponta que a presença do familiar e a sua participação no cuidado como alimentação, locomoção e higiene, é importante para a equipe de enfermagem11. Entretanto, em sua maioria, as publicações são voltadas à saúde da criança ou saúde da mulher. Em outro artigo se aborda a presença do acompanhante emergindo como um transtorno tanto na caracterização física da instituição, quanto nas atitudes dos profissionais de saúde, na criação de vínculos, no cuidado e na própria qualidade da assistência, justamente pelo hospital não ter sido devidamente planejado, do ponto de vista físico, nem preparado no que tange à compreensão da dinâmica das relações sociais que ali acontecem12.

Enquanto conversava com um acompanhante, fomos abordados por uma profissional de enfermagem que sinalizou para a acompanhante que era hora da medicação e se retirou. Qual é a responsabilidade desse acompanhante na administração do medicamento? Em curto espaço de tempo, ela adentra o recinto novamente e solicita a outra acompanhante a mudar o usuário de posição. Qual é o papel do acompanhante? E as competências dos profissionais de enfermagem - técnico, auxiliares e enfermeiros?

As competências do enfermeiro não é o foco desta pesquisa, mas vale à pena destacar a consolidação da prática de enfermagem como ciência e arte, que ainda se encontra em construção e, para isso, é necessário que se defina as suas próprias formas de conhecer, produzir e validar o conhecimento em enfermagem. Quando o enfermeiro sabe o que ele é e o que ele faz, consegue assumir e evidenciar condutas compatíveis com os seus direitos e com os direitos dos usuários e os valores da enfermagem como prática social. O saber-ser e o saber-fazer tornam-se essenciais para a compreensão da enfermagem como prática profissional de cuidar, de ajudar e de assistir, tendo o cuidado como a essência da enfermagem.

Retornando a questão de nível mais macro do cuidado, os acompanhantes sinalizam que tanto a estrutura física do hospital quanto o relacionamento interpessoal com a equipe de saúde pode facilitar ou dificultar a presença do acompanhante e, consequentemente, o cuidado com a pessoa idosa, principalmente quando este permanece longos períodos no hospital. Esses discursos circundam as palavras: acho, falta, vezes, sei, requer, importante, relacionamento, mudar e forma.

Saber cuidar de nós também, coisa que aqui, às vezes, não tem. Aqui as enfermeiras são muito grossas. Tem enfermeiras muito boas, mas tem algumas que são muito grossas. (uce nº 249, uci nº 7).

Lá também não tem um lugar para o acompanhante dormir, mas eles são mais atenciosos. (uce nº 275, uci nº 7).

É desgastante. Igual aquele senhor ali, ele fica aqui vinte e quatro horas, eu não sei como ele aguenta. Tadinho. Às vezes, ele fica sentado ali naquela cadeira, todo o dia, cochila assim, deve dormir muito mal.(uce nº 320, uci nº 10).

Essas observações também estão presentes nas anotações do caderno de campo.

Sobre a acomodação dos acompanhantes, há uma cadeira acolchoada, semi-reclinável. Alguns acompanhantes permanecem na cadeira normal. Alguns deitam a cabeça em um armário que fica do lado da cama do usuário, para tentar tirar um cochilo. Mas a qualquer movimento na enfermaria, eles despertavam. (Caderno de campo, 19/02/2013).

Para finalizar, cabe ressaltar que esses acompanhantes serão, em sua maioria, os cuidadores em domicílio, sendo, portanto, imprescindível o trabalho de educação em saúde, visando o autocuidado e a manutenção da qualidade de vida tanto do idoso quanto do acompanhante13.

Durante os cuidados com o idoso, os acompanhantes estão sempre alertas, atentos aos procedimentos. Ao serem questionados sobre suas posturas, eles me informam que observam como a equipe faz, se há alguma diferente entre o que está sendo feito no momento e como foi feito da última vez e dizem que estão aprendendo, caso seja necessário repetir em casa. (Caderno de campo, 19/02/2013).

Para tal é necessário uma maior integralidade entre os profissionais da área da saúde para detectar os principais problemas e dificuldades dos acompanhantes na realização dos cuidados diários, incluindo o acompanhante como verdadeiros aliados na prática assistencial, capacitando-os para cuidar do idoso no domicílio.

As parcerias e os momentos de diálogo são fundamentais à viabilização da relação de cuidado, pois ao compartilhar a preocupação e o sofrimento do outro, esses profissionais podem perceber o familiar com outro olhar, passando a considerar suas necessidades, suas vontades, seus desejos, suas angústias e questionamentos quanto àquilo que pode ou não fazer no espaço hospitalar, para melhor confortar seu familiar doente12:16.

O entrelaçamento entre os sentidos, ideias, concepções e valores que os acompanhantes atribuem ao cuidado, com os conhecimentos e significados atribuídos pelos profissionais da área da saúde - especialmente os profissionais de enfermagem que tem o cuidado como a verdadeira razão de ser, de saber e de fazer - permitirá a articulação de estratégias eficazes para o alcance da humanização no cuidado15, entendida pelos conceitos de integralidade, transversalidade e autonomia dos sujeitos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os sentidos do cuidado ao idoso hospitalizado se deram a partir da identificação do papel do acompanhante no cenário hospitalar, sendo caracterizados pelo relacionamento afetuoso, pelas atividades de auxílio ao idoso, incluindo a busca do apoio institucional e de orientações acerca do cuidado. Os acompanhantes, também, sinalizam a importância da estrutura hospitalar que ainda não atende as suas necessidades. O relacionamento interpessoal acompanhante-enfermeiro foi significado pela educação em saúde quanto aos cuidados que podem ser realizados em âmbito hospitalar, assim como o preparo para os cuidados domiciliares.

Para tal, o trabalho de educação em saúde deve começar ainda quando o idoso encontra-se hospitalizado, justamente, para que os familiares ou cuidadores possam praticar um cuidado em domicílio de forma segura e efetiva, evitando maior dependência do idoso, assim como uma sobrecarga para o cuidador.

Uma estratégia a ser utilizada para facilitar a manutenção das orientações e capacitação dos cuidadores é a elaboração de materiais educativos que incluam as necessidades e dúvidas cotidianas do cuidado, assim como orientações gerais e específicas para cada necessidade apresentada pelo usuário, garantindo a continuidade de um cuidado pautado em procedimentos seguros e que podem ser praticados pelos cuidadores no lar.

Conclui-se que ao acessar os sentidos dos acompanhantes acerca do cuidado ao idoso, foi possível compreender as reais necessidades e demandas daqueles que darão continuidade ao cuidado e, para isso, é importante que a equipe profissional inclua o acompanhante nos seus planos de cuidado, capacitando estes sujeitos para o cuidado após a alta hospitalar, questões estas que contribuem para os fundamentos do cuidado de enfermagem, entendido como a essência da enfermagem que é consolidada no encontro da enfermeira com aqueles sujeitos envolvidos no cuidado, seja ele o próprio usuário ou o seu acompanhante.

REFERÊNCIAS

Teixeira INDO, Neri AL. Envelhecimento bem-sucedido: uma meta no curso da vida. Psicol. USP. 2008 mar;19(1):81-94.
Depp C, Jeste D. Definitions and predictors of successful aging: A comprehensive review of larger. American Journal of Geriatric Psychiatry. 2006;14:6-20.
Caldas CP. Envelhecimento populacional e transição epidemiológica. In: Gonçalves, LHT; Tourinho FSV (orgs.). Enfermagem no cuidado ao idoso hospitalizado. Barueri (SP): Manole; 2012.
Hazzar WR, Blass JP, Halter JB, Ouslander JG, Tinetti ME (eds.). Principles of geriatric medicine & gerontology. 5ª ed. New York (USA): McGraw-Hill; 2003.
Walston J, Hadley EC, Ferrucci L, Guralnik JM, Newman AB, Studenski SA et al. Research agenda for frailty in older adults: towar a better understanding of psysiology and etiology: summary from the American Geriatrics Society/National Institute on Aging Research Conference on Frailty in Older Aults. JAGS. 2006;54:991-1001.
Caldas CP. Envelhecimento com dependência: responsabilidades e demandas da família. Cad. Saude Publica. 2003 maio/jun; 19(3):773-81.
Ministério da Saúde (BR), DATASUS. Razão de dependência. Indicadores e Dados Básicos - Brasil - 2011; [citado 2013 mar 15]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?idb2011/a16.def
Ministério da Saúde (BR), DATASUS. Sistema de Informações Hospitalares do SUS (SIH/SUS), 2012; [citado 2013 jun 26]. Disponível em: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sih/cnv/nirj.def
Silva L, Bocchi SCM. A sinalização do enfermeiro entre os papéis de familiares visitantes e acompanhante de adulto e idoso. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2005 abr; 13(2):180-7.
Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Dispõe sobre o Estatuto do Idoso e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília (DF), 3 de out 2003: Seção 1: 1.
Souza TV, Oliveira ICS. Interação familiar/acompanhante e equipe de enfermagem no cuidado à criança hospitalizada: perspectivas para a enfermagem pediátrica. Esc Anna Nery. 2010 set;14(3):551-9.
Squassante ND, Alvim NAT. Relação equipe de enfermagem e acompanhantes de clientes hospitalizados: implicações para o cuidado. Rev. bras. enferm. 2009 jan/fev; 62(1):11-7.
Souza LM, Wegner W, Gorini MIPC. Educação em saúde: uma estratégia de cuidado ao cuidador leigo. Rev. Latino-Am. Enfermagem. 2007 mar/abr; 15(2):337-43.
Teixeira MLO, Ferreira MA. Uma tecnologia de processo aplicada ao acompanhante do idoso hospitalizado para sua inclusão participativa nos cuidados diários. Texto & contexto enferm. 2009 set; 18(3):409-17.
Chernicharo IM, Silva FD, Ferreira MA. Humanização no cuidado de enfermagem nas concepções de profissionais de enfermagem. Esc Anna Nery. 2011 out/dez;15(4):686-93.