versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561
Ciênc. saúde coletiva vol.21 no.4 Rio de Janeiro abr. 2016
http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232015214.16552015
A obesidade é reconhecida como uma alteração metabólica multifatorial e de caráter epidêmico. Sua prevalência vem aumentando de maneira alarmante em praticamente todos os países, tornando-se um grave problema de saúde pública. No Brasil, 64,9% das mulheres apresentam sobrepeso e obesidade, sendo sua frequência maior na faixa etária de 55 a 64 anos,1 associados com menor escolaridade2.
Nas mulheres, múltiplos fatores são apontados como principais causas para o desenvolvimento da obesidade, como alterações decorrentes do próprio envelhecimento e também mudanças no estilo de vida, como a diminuição da atividade física e o maior consumo de alimentos de alta densidade energética3. Pesquisadores identificaram que a epidemia de obesidade foi causada por mudanças enfrentadas nos ambientes econômicos, sociais e físicos4.
No Brasil, o crescimento da população idosa tem ocorrido de forma acelerada e a expectativa de vida da população feminina é maior em relação à masculina. Como consequência, maior número de mulheres vai experimentar mudanças relacionadas ao climatério5, razões pelas quais essa fase da vida merece maior atenção no âmbito da saúde pública.
O Climatério é definido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma etapa natural da vida da mulher que corresponde a passagem entre o período reprodutivo e o não reprodutivo, com decréscimo da produção de hormônios esteróides6. Tal período se inicia por volta dos 40 anos, estendendo-se até 60-65 anos. A menopausa é um marco dessa fase, acontecendo por volta dos 49 anos de idade, sendo diagnosticada quando ocorrem doze meses de ausência de fluxo menstrual6.
O hipoestrogenismo decorrente da transição menopausal tem sido apontado como a principal causa responsável pela obesidade, por sintomas vasomotores, urogenitais e psicológicos, menor desempenho sexual e também pelo atual perfil de morbimortalidade em mulheres após os 50 anos quando associados a fatores ambientais, psicossociais e culturais7. Dados recentes têm associado às taxas de mortalidade à idade de início da menopausa, sendo que mulheres com menor idade à menopausa apresentam maior taxa de mortalidade, principalmente por causas cardiovasculares8,9.
Sendo assim, embora os dados de morbidade sejam escassos, os dados de mortalidade em mulheres no climatério justificam a realização de pesquisas nesta área com a finalidade de prover subsídios para a promoção à saúde e prevenção de doenças10. Diante da relevância do tema e de seu impacto na saúde da mulher, o presente estudo teve como objetivo verificar a associação entre sobrepeso e obesidade e fatores sociodemográficos, comportamentais e clínicos em mulheres climatéricas.
Trata-se de estudo transversal descritivo com mulheres climatéricas com idade de 40 a 60 anos, participantes de um evento anual de educação em saúde sobre o câncer de mama, entre os meses de agosto e outubro de 2013, em uma Unidade de Estratégia de Saúde da Família (ESF), no município de Montes Claros-MG, Brasil.
A escolha da referida amostra se deu por acessibilidade, por não existir no município um local específico para atendimento de mulheres no climatério. Foram consideradas elegíveis as mulheres com idade entre 40 e 60 anos com condições físicas de aferição de dados antropométricos. Foram excluídas mulheres grávidas, com incapacidade de responder ao questionário, com doenças psiquiátricas e qualquer fator que impossibilitasse a entrevista (ex: falta de tempo, doença ou analfabetismo, recusa explícita). Os autores conduziram treinamento prévio de todos os entrevistadores e mantiveram supervisão sobre os dados coletados. O estado nutricional avaliado pelo Índice de Massa Corporal (IMC) foi considerado variável desfecho do estudo, sendo categorizado em baixo peso: < 18,5; eutrófico: 18,5-24,9; sobrepeso: 25-29,9 e obesidade: ≥ 30 kg/m2)11. Para cálculo do IMC foi feita aferição da estatura e o peso. Para avaliação do peso corporal, as mulheres foram pesadas vestindo roupas leves e sem calçados, na posição ortostática, com os pés juntos e braços relaxados ao longo do corpo, em uma balança eletrônica portátil Geratherm® Body Fat Scale, com capacidade para 150 Kg, mínima e precisão de 50 g.
A estatura foi medida por meio de fita métrica inelástica marca Carci®, com escala de 0 a 150 cm, fixada em uma parede plana, sem rodapé. Nessa medição, as mulheres foram orientadas a manter os pés juntos, em postura ereta, com olhar fixo no horizonte, sem fletir ou estender a cabeça. As medidas de peso e altura foram realizadas em duplicata e a média feita para posterior cálculo do IMC.
As mulheres responderam a uma entrevista com questões dirigidas referentes às variáveis independentes, que foram alocadas em seis blocos: (1) socioeconômicas e demográficas, (2) reprodutivas e qualidade de vida-MRS, (3) desempenho sexual, (4) saúde geral, (5) hábitos alimentares, (6) comportamento relacionado à saúde.
O bloco das variáveis socioeconômicas e demográficas incluiu a faixa etária (40-45, 46-50, 51-55, 56-60 anos), cor de pele autorreferida (branca e não branca), estado marital (com companheiro fixo e sem companheiro fixo), escolaridade (categorizada em sem instrução/fundamental incompleto, ensino fundamental, ensino médio, ensino superior), renda familiar mensal (até R$ 340,00, de R$ 341 a R$ 678,00, acima de R$ 678,00), ocupação (remunerada e não remunerada) e se possuía casa própria (sim ou não).
As variáveis reprodutivas compreenderam idade da menarca (menor ou igual a 12 anos e acima de 12 anos), idade que entrou na menopausa (menor ou igual a 50 anos, acima de 50 anos e não entrou) e o perfil climatérico (categorizado em pré menopausa e pós menopausa). Pré-menopausa, se os ciclos menstruais estavam naturalmente mantidos; pós-menopausa e se havia amenorreia espontânea, por um período igual ou superior há 12 meses consecutivos. O estado menopausal foi definido com base na história menstrual no último ano. Para avaliação da qualidade de vida foi utilizado o Menopause Rating Scale (MRS), um instrumento validado para o português, composto por 11 questões que abordam sintomas divididos em domínios somato-vegetativos, psicológicos e urogenitais. Através desse instrumento cada mulher dava o seu parecer relativo a cada sintoma, podendo ser classificado como ausente, leve, moderado, severo e muito severo12.
O desempenho sexual foi avaliado a partir do questionário Quociente Sexual (QS-F) -Versão Feminina, composto por 10 questões, cada qual devendo ser respondida numa escala de 0 a 5. É um instrumento que avalia os vários domínios da atividade sexual da mulher (desejo, excitação, orgasmo e seus respectivos correlatos psicofísicos). Quanto maiores os escores para as questões do QS-F (excetuando-se a pergunta relativa à presença de dor), melhor indicativo de desempenho/satisfação sexual da mulher13.
O bloco da saúde geral foi constituído pelas seguintes variáveis: uso de terapia hormonal, que foi dicotomizada em ‘usa ou já usou’ e ‘uso de outros medicamentos’, que foi categorizada em ‘faz uso contínuo de medicamentos’ ou ‘não faz uso’. Para avaliar os hábitos alimentares, utilizaram-se as variáveis: ‘uso de suplemento de soja’, ‘consumo de frutas, verduras e legumes’ e ‘faz dieta’.
Em relação ao ‘uso de suplemento de soja’ foi dicotomizado em ‘sim’ e ‘não’. Para saber o consumo de frutas, legumes e verduras foram feitas duas perguntas (‘quantas vezes consome por semana’ e ‘por dia’). As variáveis foram dicotomizadas em ‘consumo de frutas 3 a 5 vezes/semana’, ‘consumo de verduras e legumes 3 a 5 vezes/semana’, devido ao baixo número de pessoas que relataram consumir a quantidade recomendada pelo guia Alimentar para a População Brasileira14. Quanto a variável ‘fazer dieta’ foi perguntado se faz ou já fez dieta para perder peso e nunca fez.
O bloco ‘comportamento relacionado à saúde’ foi constituído pela variável ‘atividade física’, que foi avaliada de acordo com os critérios estabelecidos pela Sociedade Brasileira de Cardiologia15. Considerou-se sedentária toda mulher sem atividade física regular, ou seja, com frequência mínima de três vezes por semana e duração não inferior a 30 minutos, independente da modalidade de exercício realizado15.
Inicialmente foram realizadas análises descritivas de todas as variáveis investigadas por meio de suas distribuições de frequências. Em seguida, foram realizadas análises bivariadas entre a variável desfecho e cada variável independente, adotando-se o modelo de regressão de Poisson com variância robusta. Foram estimadas Razões de Prevalência (RP) brutas, com seus respectivos intervalos de 95% de confiança. As variáveis que apresentaram nível descritivo (valor-p) inferior a 0,25 foram selecionadas para análise múltipla. Na análise múltipla utilizou-se o modelo de regressão de Poisson hierarquizado. Para este modelo foi seguido o esquema apresentado na Figura 1, composto por blocos de variáveis em níveis distal (variáveis socioeconômicas e demográficas), intermediário (reprodutivas e qualidade de vida-MRS e desempenho sexual) e proximal (saúde geral, hábitos alimentares e comportamento relacionado a saúde)16.
Em cada nível hierárquico adotou-se o procedimento passo à frente (stewise forward procedure), ou seja, iniciou-se o modelo com a variável com maior significância estatística, selecionada na análise bivariada e, a seguir, foram acrescentadas as demais variáveis, uma a uma por ordem decrescente do nível descritivo.
O bloco das características demográficas e socioeconômicas foi o primeiro a ser incluído no modelo, permanecendo como fator de ajuste para os determinantes intermediários e proximais somente aquelas variáveis que apresentaram nível descritivo p < 0,05. Em seguida, foram incluídas as variáveis do nível intermediário (reprodutivas e qualidade de vida-MRS e desempenho sexual), permanecendo no modelo somente aquelas que apresentaram nível descritivo p < 0,05, após o ajuste para as variáveis do nível distal. Por último, foram incluídas as variáveis do nível proximal (saúde geral, hábitos alimentares e comportamento relacionado à saúde), permanecendo no modelo somente aquelas variáveis que apresentaram nível descritivo p < 0,05, após ajuste para as variáveis dos níveis distal e intermediário.
Foram estimadas Razões de Prevalências (RP) com seus respectivos intervalos de 95% de confiança. Para avaliar a qualidade de ajuste do modelo múltiplo utilizou-se o teste de Deviance. Empregou-se o programa estatístico PASW® 17.0 para realização das análises.
O presente estudo foi conduzido conforme a Resolução 466/2012. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Estadual de Montes Claros.
As mulheres que se encontravam esperando o agendamento de mamografia foram convidadas individualmente a participar do estudo. Após o esclarecimento sobre objetivos, responsabilidades e procedimentos da pesquisa, aquelas que desejaram participar assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
A amostra foi composta por 253 mulheres com média de idade igual a 50,2 anos (DP ± 5,8 anos), das quais 86 (34%) foram classificadas como eutróficas, 78 (30,8%) com sobrepeso e 89 (35,2%) com obesidade. Quando somado o número de mulheres com sobrepeso e obesidade, a presença foi de 66% (167 mulheres). A média do IMC foi de 28,1 kg⁄m2 (DP ± 5,6). As demais características do grupo estão apresentadas na Tabela 1.
Tabela 1 Distribuição das mulheres com idade entre 40 a 60 anos segundo características socioeconômicas e demográficas, reprodutivas, qualidade de vida pelo MRS, desempenho sexual, saúde geral, hábitos alimentares e comportamento relacionado a saúde. Montes Claros, 2013.
*Ausência de resposta de 01 pessoa; ** Ausência de resposta de 03 pessoas; *** 58 mulheres não responderam ao QSF.
As Tabelas 2 e 3 apresentam os resultados das análises bivariadas. Verificou-se que as seguintes variáveis se mostraram associadas, ao nível de 0,25%, com o desfecho sobrepeso e obesidade: escolaridade (p = 0,120), ocupação (p = 0,129), casa própria (p = 0,011), idade da menarca (p = 0,012), QV no Climatério (p = 0,002), uso de medicamentos (p = 0,002), uso de suplemento de soja (p = 0,207), consumo de frutas (0,247) e fazer dieta (0,000). Essas variáveis foram selecionadas para análise múltipla final.
Tabela 2 Distribuição (%) de sobrepeso/obesidade, razão de prevalência (RP) bruta e respectivo intervalo de 95% de confiança segundo características, socioeconômicas, demográficas, reprodutivas, sintomas do climatério e função sexual. Montes Claros-MG, 2013.
RPb: razão de prevalência; IC95%: intervalo de 95% de confiança.
Tabela 3 Prevalência (%) de sobrepeso/obesidade, razão de prevalência bruta e respectivo intervalo de 95% de confiança segundo variáveis de saúde geral, hábitos alimentares, comportamento relacionado com a saúde. Montes Claros-MG, 2013.
RPb: razão de prevalência; IC95%: intervalo de 95% de confiança.
Os resultados dos fatores associados ao sobrepeso e obesidade obtidos na análise de regressão logística múltipla hierarquizada estão indicados na Tabela 4. No bloco mais distal de determinação, a variável casa própria foi fator associado ao excesso de peso. Sobrepeso/obesidade foram maiores entre as mulheres que declararam não residir em casa própria (RP = 1,26).
Tabela 4 Resultados da análise de regressão de Poisson múltipla hierarquizada. Montes Claros – MG, 2013.
RP: razão de prevalência; IC95%: intervalo de 95% de confiança. *Ajustada pela variável reside em casa própria. **Ajustada pelas variáveis reside em casa própria e sintoma do climatério. *** Ajustada pelas variáveis reside em casa própria, sintoma do climatério e uso de medicamentos.
No bloco intermediário, a Qualidade de Vida no climatério (MRS) foi fator associado ao sobrepeso e obesidade, independente das características demográficas e condições socioeconômicas dessas mulheres. As prevalências de sobrepeso e obesidade foram maiores entre as mulheres que perceberam sintomas leves (RP = 2,02), moderado (RP = 2,03) e severo (RP = 2,53), quando comparadas com aquelas assintomáticas. Dentre as variáveis do nível proximal, verificou-se que mulheres que faziam uso de medicamentos (RP = 1,26) e que fazem ou já fizeram dieta (RP = 1,49) apresentaram maiores prevalências de sobrepeso/obesidade, após ajuste pelas variáveis dos blocos hierarquicamente superiores.
A frequência de sobrepeso e obesidade na população estudada foi de 66%, com média de IMC de 28,1 kg/m2 (DP = 5,6), valor próximo ao relatado por outros autores10,17,18. Na cidade de Passo Fundo-RS, estudo com 298 mulheres climatéricas revelou que o excesso de peso chega ao redor de 68,3%, com IMC médio de 28,3 kg/m2 (DP = 7,0)19, valor este próximo aos 64% observados em um grupo de 611 mulheres na cidade de Caxias do Sul, com IMC médio de 27,4 kg/m220. Pesquisa realizada com mulheres brasileiras revelou que 64,9% apresentam algum grau de excesso de peso, o que confirma a grandeza deste problema na população feminina1.
Dados do Brasil (2011) demonstraram que o excesso de peso tem aumentado na população feminina e que a maior prevalência se encontra na faixa de 45 a 54 e 55 e 64 anos, com 55,9% e 60,9%, respectivamente21. Resultados semelhantes comprovaram que a obesidade tem aumentado na população feminina1,20,22. Segundo a literatura, em mulheres na meia idade, o sobrepeso e a obesidade são fatores de riscos relevantes no desenvolvimento de doenças crônicas como a síndrome metabólica23.
Diante desse cenário, pode-se constatar que o amadurecimento pode exercer forte influência para o desenvolvimento da obesidade em decorrência da queda hormonal que leva a diminuição do gasto energético. Ao associar essa alteração a fatores externos como hábitos alimentares inadequados e sedentarismo, mulheres na meia idade podem ter um ganho ponderal de peso em média de 2 kg/ano ao longo de três anos24.
Ressalta-se a importância desses achados, pois tornam essa população alvo para programas de saúde pública em busca da prevenção de obesidade e comorbidades associadas. O município de Montes Claros está localizado no limite da região Sudeste com o Nordeste do Brasil. Do ponto de vista econômico e social aproxima-se mais do Nordeste que do Sudeste. Está assentado no semiárido de Minas Gerais, região pobre e carente de chuvas e, naturalmente, de recursos hídricos. Entretanto, as melhorias observadas no poder aquisitivo das famílias de menor renda influenciaram no desequilíbrio entre ingestão e utilização de calorias, desencadeando o excesso de peso. A explicação para tal fato pode estar relacionada à tendência crescente de substituição de alimentos tradicionais na dieta brasileira (como arroz, feijão e hortaliças) por bebidas e alimentos industrializados, implicando aumento na densidade energética e padrões de alimentação capazes de comprometer o equilíbrio energético e aumentar o risco de obesidade nessa população.
De acordo com os resultados da análise múltipla, não possuir casa própria, apresentar gravidade de sintomas pela avaliação do MRS, fazer uso de medicamento de forma contínua e ter feito algum tipo de dieta apresentaram associação com sobrepeso e obesidade. Em contrapartida, estudo realizado com 456 mulheres climatéricas no Paraná obteve resultados diferentes, revelando que os principais fatores relacionados à obesidade são ter três ou mais filhos e não fazer uso de terapia hormonal25.
Constatou-se nesse estudo que a chance de sobrepeso e obesidade entre mulheres que não possuem casa própria é de duas vezes àquela observada entre as mulheres que possuem. Essa variável pode ser entendida como um indicador econômico e refere maior prevalência de sobrepeso e obesidade, como o estudo realizado com 440 mulheres que verificou que rendas mais baixas estavam associadas com excesso de peso26. Pode-se inferir que renda familiar baixa dificulta a aquisição de casa própria e também menor nível de conhecimento para escolha e obtenção de alimentos mais saudáveis que estão associados ao equilíbrio do peso corporal. Uma pesquisa realizada com 758 mulheres demonstrou que 73,6% apresentavam uma alimentação saudável, hábito que aumentou positivamente em relação à renda16. Todavia, essa é uma questão que ainda deve ser melhor explorada a partir de novos estudos, pois outros autores não fizeram essa observação17.
Outro indicador econômico que tem sido descrito por outros autores como associado ao excesso de peso foi a baixa escolaridade10,26. Embora tenha sido referido pela literatura, o resultado do presente estudo não encontrou essa associação.
Em relação aquelas mulheres que apresentaram gravidade de sintomas pela avaliação do MRS, a chance de excesso de peso foi oito vezes maior em relação àquelas que eram assintomáticas. Pesquisa com mulheres no climatério revelou que valores de IMC mais altos tiveram associação com piores escores no MRS, escala que avalia a qualidade de vida17. Na Arábia Saudita, um estudo realizado com 490 mulheres também constatou forte relação entre obesidade e sintomas climatéricos severos27. Na Escócia, concluiu que sintomas vasomotores, como o fogacho, apresentavam correlação com obesidade28. Em contrapartida, estudo com 305 mulheres não apresentou relação de IMC com os sintomas avaliados pelo MRS29.
Em relação à saúde geral, outro fator relacionado ao excesso de peso foi o uso de medicamentos, que mostrou que mulheres que faziam o uso contínuo de fármacos apresentaram a chance de sobrepeso e obesidade duas e meia vezes maior quando comparadas com aquelas que não faziam uso. Pesquisa realizada em um ambulatório de climatério em Ribeirão Preto revelou valores altos de IMC e que 62% das mulheres usavam três ou mais medicamentos por dia30. Em outro estudo com 200 mulheres climatéricas, a média de IMC encontrado revelou obesidade, sendo que quase metade das pacientes estudadas (48,5%) disseram fazer uso de medicação para doenças cardiovasculares e 23% de medicações antidepressivas17. Uma explicação para essa associação positiva é a maior prevalência de morbidades nas idades mais avançadas, dentre elas aquelas que se associam com a obesidade tais como hipertensão arterial, síndrome metabólica, doenças osteomusculares e depressão. Além disso, os medicamentos simbolizam o desejo de modificar o curso “natural” da maioria das doenças, por isso vão além da atividade terapêutica específica, convertendo-se em um traço cultural.
Quanto aos hábitos alimentares, aquelas que já haviam feito alguma dieta para perder peso ou a faziam no período estudado apresentaram alta prevalência de sobrepeso e obesidade em relação àquelas mulheres que nunca haviam feito dieta para redução de peso. Nesse estudo, 40,3% das mulheres disseram fazer ou ter feito dieta para redução de peso. Pesquisa de análise de prontuário com mulheres climatéricas revelou que 66,7% das participantes afirmaram já ter realizado algum tipo de dieta e a média de IMC dessas mulheres era de 30,7 kg/m2, o que caracteriza obesidade18.
Ao correlacionar a presença de sobrepeso e obesidade com o desempenho sexual, percebeu-se ausência de significância estatística, de maneira semelhante a outro estudo31. Por outro lado, outras pesquisas demonstraram associação entre esses fatores, relacionando essa associação principalmente à autopercepção de atratividade física32,33.
A chegada do climatério vem acompanhada do envelhecimento e, muitas vezes, do ganho de peso. Pesquisas mostram que a obesidade muda a autoestima das mulheres criando uma imagem negativa do corpo, comprometendo a satisfação sexual33,34. Além disso, esta visão pode fazer com que a mulher tenha a impressão de que seu poder de sedução se perdeu. Assim, as mulheres no climatério e especialmente após a menopausa podem se sentir incompetentes e incapazes de ter um bom desempenho sexual.
Embora o presente estudo tenha sido desenvolvido como uma amostra não probabilística, o que representa uma limitação à validade externa dos resultados, algumas variáveis foram identificadas e associadas ao excesso de peso, como: ‘não possuir casa própria’, que reflete um nível econômico desfavorável, ‘apresentar sintomas do climatério’, ‘fazer uso contínuo de medicamentos’ e ‘ter feito dieta para controle do peso corporal’.
A frequência de excesso de peso encontrada condiz com os resultados de outros estudos realizados no país evidenciando que medidas devem ser tomadas, uma vez que esta condição mórbida em mulheres climatéricas não seria somente influenciada por fatores biológicos relacionados ao hipoestrogenismo, mas também por fatores psicossociais e pelo estilo de vida.
Desta forma, o sobrepeso e a obesidade associados ao climatério requerem maior atenção à saúde da mulher e abordagem multidisciplinar, tendo em vista prevenir a morbimortalidade nesse grupo populacional. Os resultados indicam também elementos comportamentais, sociodemográficos e clínicos importantes a serem investigados em novos trabalhos.