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Telangiectasia palmar está associada à intensidade do tabagismo

Telangiectasia palmar está associada à intensidade do tabagismo

Autores:

Dragica Petar Pesut,
Ana Milan Samardzic,
Milica Vojin Bulajic,
Tijana Tatjana Cvok-Debeljak

ARTIGO ORIGINAL

Jornal Brasileiro de Pneumologia

versão impressa ISSN 1806-3713versão On-line ISSN 1806-3756

J. bras. pneumol. vol.45 no.2 São Paulo 2019 Epub 18-Abr-2019

http://dx.doi.org/10.1590/1806-3713/e20180273

AO EDITOR:

As telangiectasias palmares (TPs) geralmente envolvem as áreas tenar e hipotenar. Em meados do século XX, elas foram descritas como manifestações vasculares cutâneas, incluindo aranhas vasculares e eritema palmar, durante a gestação.1 Existem diversas etiologias de TP2-4: elas podem apresentar patogenia cutânea primária; podem ser uma manifestação de doenças sistêmicas, neoplásicas ou infecciosas; ou podem ser induzidas por medicamentos. Em 2012, TPs foram relatadas em paciente com doença de Graves.5 Um estudo mais recente sugeriu que a TP é um sinal cutâneo de tabagismo.6

Em nossa prática clínica, encontramos muitos fumantes entre os nossos pacientes. Isso não surpreende, pois a fumaça do tabaco possui componentes que sabidamente causam estresse oxidativo, bem como reduzem as respostas imunes inata e adaptativa, afetando assim a imunidade celular e humoral. O tabagismo é considerado um importante fator de risco para doenças graves como o câncer de pulmão e a DPOC. No entanto, não vimos TP em todos os fumantes. O objetivo deste estudo foi determinar a prevalência de TP entre sujeitos doentes e saudáveis, levando em consideração seu estado geral de saúde e seu status tabágico.

Recrutamos 236 sujeitos adultos. Excluímos os indivíduos em uso de corticosteroides ou de inibidores do receptor do fator de crescimento epidérmico, bem como aqueles com doença de Graves, gestantes, e mulheres em uso de contraceptivos orais. Perguntamos aos participantes sobre seu status tabágico, definido como não fumante, fumante ou ex-fumante (ter parado de fumar há 1 ano ou mais). Perguntamos aos fumantes e ex-fumantes sobre a duração do seu hábito tabágico (em anos) e o número de cigarros fumados por dia. Foi possível determinar a exposição total à fumaça do tabaco (isto é, a carga tabágica total) por meio do cálculo de anos-maço (número de maços fumados por dia multiplicado pelo número de anos que a pessoa fuma/fumou). Durante o exame físico, prestamos especial atenção à presença de TP. Realizamos uma análise estatística para determinar se a TP se associava a características demográficas, doença e intensidade do tabagismo.

A amostra do estudo foi composta por 236 adultos (116 homens e 120 mulheres) com média de idade de 60,87 ± 15,72 anos - 31 eram saudáveis, e 205 apresentavam pelo menos uma doença: DPOC (n = 47); asma (n = 5); pneumonia (n = 17); hipertensão arterial (n = 38); embolia pulmonar (n = 18); câncer de pulmão (n = 41); linfadenopatia (n = 9); ou outras doenças (n = 30). Dos 236 indivíduos avaliados, 32 eram fumantes e 204 eram não fumantes (103 ex-fumantes e 101 que nunca fumaram). O teste do qui-quadrado de Pearson mostrou que a prevalência de TP entre os fumantes não diferiu significativamente da observada entre os não fumantes (p = 0,132). Utilizando o teste t para igualdade de médias, não encontramos diferença significativa entre os fumantes e os ex-fumantes quanto ao número de anos-maço (p = 0,048). Embora nenhum dos que nunca fumaram apresentasse TPs, elas foram encontradas em 88 dos 135 fumantes ou ex-fumantes. O teste t bicaudal para amostras independentes mostrou uma diferença altamente significativa entre os sujeitos com e sem TP quanto à exposição total à fumaça do tabaco (p ≤ 0,001). Encontramos também uma diferença altamente significativa entre os fumantes e os ex-fumantes quanto à prevalência de TP (p ≤ 0,001).

Nosso estudo mostrou que o aparecimento da TP está fortemente associado à intensidade do tabagismo. A falta de uma medida padronizada pode explicar as discrepâncias anteriores quanto a se a TP apresenta correlação com a carga tabágica (anos-maço), com a média de cigarros consumidos por dia nos fumantes6 ou com a média de cigarros consumidos pelos ex-fumantes.

Nossos achados de ausência de TP nos que nunca fumaram e de que a TP existia não só nos fumantes mas também nos ex-fumantes com carga tabágica de uma determinada intensidade podem falar a favor da importância dos componentes da fumaça do tabaco na etiopatogenia da TP. Existem evidências de que alguns sujeitos são mais suscetíveis a doenças relacionadas ao tabagismo. O alto grau de variação no número de anos-maço associado à TP sugere que o aparecimento da TP em fumantes pode ser influenciado por uma suscetibilidade individual aos componentes da fumaça do tabaco.

Constatamos que a TP não se associou a sexo, idade ou nenhuma das doenças apresentadas pelos participantes. Um estudo anterior sugeriu que existe uma associação entre a TP e o câncer de pulmão.3 Diante dos resultados do nosso estudo e do fato de que o tabagismo é um importante fator de risco para o câncer de pulmão, essa associação necessita de uma análise minuciosa em estudos com amostras maiores. Ainda não se sabe se o tabagismo contribui para o aparecimento da telangiectasia e do câncer de pulmão; é possível que ambos sejam consequências de distúrbios da homeostase relacionados ao tabagismo. Entre os indivíduos avaliados em nosso estudo, 41 tinham câncer de pulmão e a TP foi vista em apenas 24 dos 32 fumantes. Por fim, alguns dos fumantes com TP apresentavam outras doenças relacionadas ao tabagismo que não o câncer de pulmão, como a DPOC e doenças cardiovasculares.

A TP em fumantes deve ser foco de pesquisa detalhada em biologia molecular. Detectada por uma simples inspeção na prática clínica, a TP pode servir como indicador de distúrbios da homeostase e pode ser um marcador útil na prevenção primária ou na detecção precoce de sérias doenças relacionadas ao tabagismo.

REFERÊNCIAS

1 Bean WB, Dexter MW, Cogswell RC. Vascular spiders and palmar erythema in pregnancy. J Clin Invest. 1947;26(6):1173.
2 Halachmi S, Gabari O, Cohen S, Koren R, Amitai DB, Lapidoth M. Telangiectasis in CREST syndrome and systemic sclerosis: correlation of clinical and pathological features with response to pulsed dye laser treatment. Lasers Med Sci. 2014;29(1):137-40.
3 Amichai B, Grunwald MH. Palmar telangiectases and lung carcinoma: a possible association? J Eur Acad Dermatol Venereol. 2002;16(2):185-6.
4 Wang G, Chen H, Yang Y, Wu K, Sun J. Telangiectasia macularis multiplex acquisita accompanied by hepatitis B infection. Australas J Dermatol. 2017;58(1):e5-e7.
5 Nabatian A, Suchter MF, Milgraum S. Palmar telangiectases as a manifestation of Graves disease. Cutis. 2012;89(2):84-8.
6 Levi A, Shechter R, Lapidoth M, Enk CD. Palmar Telangiectasias: A Cutaneous Sign for Smoking. Dermatology. 2017;233(5):390-395.