versão impressa ISSN 1414-8145versão On-line ISSN 2177-9465
Esc. Anna Nery vol.21 no.4 Rio de Janeiro 2017 Epub 12-Set-2017
http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2017-0026
O paciente crítico é aquele que necessita de vigilância contínua e assistência de alta complexidade, geralmente, encontra-se internado em uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI).1 Diante da instabilidade desse paciente, o uso do Cateter Venoso Central (CVC) é indispensável para o manejo da terapêutica que esta clientela requer, sendo considerado um dispositivo essencial e amplamente utilizado em UTI.2-4
O CVC é definido como um acesso intravascular, cuja sua ponta está localizada próxima ou dentro do átrio direito coração ou em um de seus grandes vasos.4 Dentre as finalidades desse dispositivo estão: coleta de sangue; infusões contínuas ou intermitentes de soluções intravenosas; administração de hemocomponentes e hemoderivados; nutrição parenteral; administração de medicamentos que não podem ser administrados por via periférica; e estimar valores da pressão venosa central.2,5,6
Apesar dos benefícios, o uso do CVC de curta duração está associado a complicações infecciosas que podem aumentar os custos hospitalares e causar internações prolongadas.2-5 Ressalta-se que o principal mecanismo patogênico desse tipo de infecção ocorre devido à quebra da integridade cutânea causada pela inserção do cateter intravascular, assim pode ocorrer a migração de microrganismos da pele ao redor do sítio de inserção para sua ponta.3,5,7
Uma vez que as infecções relacionadas ao cateter estão atreladas ao aumento da morbidade e mortalidade dos pacientes em uso de dispositivos intravasculares e dos custos hospitalares, medidas de prevenção e controle são recomendadas e adotadas para a sua redução.5,8,9 Uma dessas medidas é o uso de curativo oclusivo no sítio de inserção do CVC. O curativo considerado ideal deve ser capaz de prevenir infecções, fixar adequadamente o cateter, proporcionar conforto, não irritar a pele, possuir fácil aplicação e ter custo-benefício satisfatório.3,9-12
Tem sido discutido se apenas a antissepsia da pele com clorexidina alcoólica realizada durante a inserção do dispositivo intravascular e nos curativos do CVC é suficiente para prevenir e controlar a colonização da pele ao redor do sítio de inserção e, consequentemente, infecções relacionadas ao cateter intravascular.9,11 Foi evidenciado na literatura, que mesmo após essa antissepsia, permanecem bactérias remanescentes que podem colonizar o CVC.5,9,11 Assim, reforça-se a importância do uso de coberturas impregnadas com clorexidina.
Em 2011, os Centers for Disease Control and Prevention (CDC) recomendaram o uso de curativos impregnados com clorexidina, em locais cuja infecção da corrente sanguínea relacionada a cateter não diminui, mesmo após a implantação de medidas básicas de prevenção dessas infecções, tais como, educação e treinamento da equipe, uso de barreira de proteção máxima e uso de clorexidina para antissepsia cutânea na inserção do CVC.5
Na análise de uma revisão sistemática com metanálise de nove ensaios clínicos randomizados, concluiu-se que o curativo gel de clorexidina reduz a incidência tanto de infecção de corrente sanguínea relacionada ao cateter como da colonização de diversos tipos de cateter, com isso, recomendam o uso desse curativo e sugerem a necessidade de realizar novas pesquisas com esse tipo de curativo apenas em cateter central.9
O curativo gel de clorexidina possui atividade antimicrobiana rápida e eficaz, é composto por um filme transparente de poliuretano e possui um hidrogel que libera continuamente clorexidina a 2%.9,11,12 Esse curativo, de acordo com recomendações da literatura e do fabricante, deve ser trocado a cada sete dias e deve-se realizar a troca não programada, quando antes desse período, o curativo apresentar umidade, descolamento, e/ou exsudato que ultrapasse as margens do gel ou impeça a visualização do sítio de inserção.13-16
Estudos mostram que as trocas não programadas são eventos comuns que ocorrem em pacientes de UTI e que as mesmas estão relacionadas ao aumento das infecções relacionadas ao cateter.16-18 Assim, o manejo adequado dos curativos do CVC é uma estratégia utilizada para a prevenção dessas infecções.8,17,19
O curativo utilizado como cobertura do CVC é uma medida importante na diminuição das infecções relacionadas ao cateter e a escolha do tipo de cobertura é uma atribuição da equipe de enfermagem.19 A compreensão dos aspectos relacionados ao seu uso é imprescindível para que a enfermagem realize a avaliação, indicação e manutenção dos curativos, contribuindo com a segurança do paciente que necessita do uso do CVC.
Assim, os objetivos foram: identificar o tempo de permanência do curativo gel de clorexidina aplicado no sítio de inserção do cateter venoso central, descrever motivos de troca e identificar a quantidade utilizada por paciente adulto internado em unidade de terapia intensiva.
Trata-se de um estudo quantitativo com abordagem descritiva, da análise do uso do curativo gel de clorexidina em pacientes críticos. Este estudo é um recorte de um ensaio clínico randomizado,20 e os dados para o presente estudo foram obtidos dos participantes alocados no grupo experimental.
O estudo foi realizado em uma UTI de um hospital de ensino de alta complexidade localizado no interior do estado de São Paulo. Em relação aos critérios de elegibilidade adotados para o presente estudo, foram incluídos pacientes com idade superior a 18 anos, com um CVC de curta duração e em uso do curativo gel de clorexidina.
O recrutamento dos participantes foi realizado pelos pesquisadores encarregados pela coleta de dados que verificava a possibilidade de o paciente fazer parte dos critérios de inclusão. Uma vez atendidos os critérios de elegibilidade, o paciente ou seu responsável (nos casos em que o paciente não tinha condições de manifestar o aceite devido a fatores clínicos, sedação ou inconsciência) era informado sobre as características do presente estudo e solicitado o seu consentimento.
Considerando que a proposta foi avaliar uma tecnologia que ainda não havia sido incorporada na prática clínica do local, propôs-se o treinamento dos enfermeiros assistenciais para a utilização do curativo gel de clorexidina. Sendo que os 13 enfermeiros da UTI consentiram e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) para participar do treinamento e da coleta.
O curativo gel de clorexidina é fabricado pela empresa 3M®, do tipo 1657 (código do fabricante), constituído por um filme transparente estéril de dimensões 8,5 cm X 11,5 cm, na sua porção central possui gel translucido impregnado com Gluconato de Clorexidina a 2%, com uma área de 3 cm X 4 cm, margem adesiva de tecido de poliéster periférica ao filme transparente com fenda e duas fitas finas adesivas independentes do curativo para estabilização do cateter.
Portanto, o treinamento para uso do curativo gel de clorexidina, foi uma aula teórica com duração de 20 minutos com recursos áudio visuais, sendo abordado: propriedades físico-químicas do curativo; custo; momento de início e indicações de uso; preparo da pele; solução utilizada para a antissepsia; como colocar o curativo; tempo de uso; avaliação diária do curativo; e indicação e modo de remoção do curativo. E demonstrado em manequim com CVC como aplicar e retirar o curativo.
Os enfermeiros foram submetidos a um teste e o treinamento foi repetido até que todos atingissem a pontuação de 100%.
Ao longo das primeiras 24 horas, após a inserção do CVC, até cessar o sangramento local, todos os pacientes utilizaram como curativo gaze estéril fixada com uma fita adesiva, medida recomendada pelo CDC. O curativo seguinte, e os consecutivos, foi o curativo gel de clorexidina e suas trocas foram efetuadas conforme recomendação da literatura.5 As trocas que ocorreram após sete dias de permanência do curativo foram classificadas como trocas programadas, e as que ocorreram antes desse período tempo, classificadas como troca não programadas.
Na UTI, em que o estudo foi realizado, eram estabelecidas as seguintes medidas de prevenção de infecções relacionada ao CVC: uso de barreira de proteção máxima (uso de máscara, gorro, avental estéril de manga longa, luvas estéreis e campos estéreis) e clorexidina alcoólica a 0,5% para antissepsia cutânea na inserção do CVC, além do banho diário dos pacientes com clorexidina degermante a 2%.
Na coleta de dados, utilizou-se um instrumento de coleta o qual foi submetido previamente à avaliação de conteúdo e de aparência por cinco juízes, todos eram enfermeiros, sendo que três atuavam na prática clínica da terapia intensiva e dois docentes que atuavam na área acadêmica. Após essa avaliação, contemplaram-se as seguintes variáveis: idade, sexo, apache II, dias de internação, tipo de cateter, sítio de inserção, tempo de permanência do cateter, motivo de retirada do cateter, tempo de permanência do curativo gel de clorexidina, ocorrência da troca do curativo, motivo de troca do curativo gel de clorexidina e quantidade de curativo gel de clorexidina utilizado por paciente.
A coleta de dados foi diária e realizada no período de abril a dezembro de 2014. Os pesquisadores avaliaram o curativo e ao observar que a troca havia sido realizada, checavam no instrumento de coleta de dados do paciente o motivo da troca.
A análise estatística das variáveis foi descritiva e utilizou o programa IBM SPSS versão 24.0 para Windows.
O presente estudo, por se tratar de um novo projeto e abordar objetivos distintos ao do ensaio clínico randomizado, foi submetido e aprovado separadamente pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo sob parecer 1.835.765 e protocolo CAAE 56574716.8.0000.5393 e CAAE: 20121613.2.0000.5393.
De acordo com os critérios de elegibilidade 52 pacientes atendiam aos critérios de inclusão para a análise do uso do curativo gel de clorexidina. Os dados relativos às variáveis sociodemográficas e clínicas desses pacientes são apresentados na tabela 1.
Tabela 1 Distribuição dos pacientes (n = 52) em uso do curativo gel de clorexidina no cateter venoso central, segundo características sociodemográficas e clínicas. Ribeirão Preto-SP, 2014
Variável | % | N |
---|---|---|
Sexo | ||
Masculino | 60 | 31 |
Feminino | 40 | 21 |
Idade (anos completos) | ||
18 - 39 | 13 | 07 |
40 - 49 | 16 | 08 |
50 - 59 | 13 | 07 |
> 60 | 58 | 30 |
APACHE II | ||
9 - 10 | 04 | 02 |
11 - 20 | 17 | 09 |
21 - 30 | 46 | 24 |
31 - 43 | 33 | 17 |
Dias de internação | ||
1 - 10 dias | 63 | 33 |
11 - 20 dias | 25 | 13 |
21 - 50 dias | 12 | 06 |
Fonte: Dados obtidos no estudo.
A média de idade dos pacientes foi de 57,9 anos com desvio padrão de 15,488. A gravidade dos pacientes internados em UTI foi calculada pelo pesquisador nas primeiras 24 horas de internação na unidade pelo índice de gravidade APACHE II. Sendo que o índice médio foi de 26,6 com desvio padrão de 8,428. O tempo médio de internação dos pacientes na unidade foi de 10,96 com desvio padrão de 10,261.
Alguns pacientes deste estudo apresentaram suspeita de infecção relacionada ao CVC, e seus cateteres foram retirados, em outros pacientes os cateteres foram tracionados acidentalmente, e devido à necessidade de manter um acesso intravascular, esses pacientes foram submetidos a uma nova cateterização. Dos 52 pacientes recrutados, seis pacientes tiveram a inserção de um segundo CVC, destes, em cinco foi puncionado um terceiro CVC e apenas um apresentou um quarto cateter, assim, este estudo analisou 64 cateteres. Os dados relacionados a esses cateteres são apresentados na tabela 2.
Tabela 2 Distribuição dos cateteres venosos centrais (n = 64) dos pacientes em uso do curativo gel de clorexidina segundo tipo, local de inserção e motivo de retirada. Ribeirão Preto-SP, 2014
Variável | % | N |
---|---|---|
Tipo de CVC* | ||
Duplo Lúmen | 86 | 55 |
Triplo Lúmen | 14 | 09 |
Local de Inserção CVC* | ||
Veia Jugular | 47 | 30 |
Veia Subclávia | 47 | 30 |
Veia Femoral | 06 | 04 |
Motivo de retirada do CVC* | ||
Óbito | 33 | 21 |
Fim da indicação de uso | 31 | 20 |
Suspeita de infecção | 30 | 19 |
Cateter tracionado acidentalmente | 03 | 02 |
Posicionamento incorreto | 03 | 02 |
Fonte: Dados obtidos no estudo.
*CVC: Cateter Venoso Central.
De acordo com a tabela 2, nota-se a mesma distribuição dos cateteres em veia subclávia e na veia jugular, e a minoria, inseridos em acesso de veia femoral. A maior parte dos cateteres foram do tipo duplo lúmen. O tempo médio de permanência dos CVC foi de 8,6 dias com desvio padrão de 4,97, sendo o tempo mínimo de uso dois e o máximo de 23 dias. O principal motivo de retirada dos CVC foi óbito do paciente.
Considerando que todos os curativos utilizados foram o curativo gel de clorexidina e que os mesmos foram aplicados após as 24 horas de inserção do CVC, o total foi de 159 curativos utilizados em todos os cateteres. A média de curativos utilizados por paciente foi de 3,1 com o mínimo de um e o máximo de 16 curativos (dp = 3,233).
Dos 159 curativos utilizados, 25,8% (41) foram mantidos no sítio de inserção do CVC do paciente por um dia, 23,3% (37) foram mantidos, sem que houvesse a necessidade de troca, por dois dias, 17% (27) por três dias, 13,2% (21) por quatro dias, 6,3% (10) por cinco dias, 4,4% (7) por seis dias e 10,1% (16) por sete dias. O tempo médio de permanência do curativo foi de 3,04 dias (dp = 1,917).
Os motivos de trocas não programada foram categorizados em: curativo úmido (curativo molhado, ou úmido); curativo sujo (curativo saturado, ou com sujidade que impede a visualização do sítio de saída, ou com exsudato ultrapassando as margens do gel, ou presença de fezes no curativo); curativo descolado (curativo com as bordas de fixação descoladas, ou presença de bolhas de ar no gel de clorexidina); perda do curativo (troca devido à descontinuidade do uso do CVC, ou nos casos que houve a necessidade de tracionar o cateter, ou nos casos em que o cateter foi tracionado acidentalmente).
Dentre os 159 curativos utilizados ocorreram 95 trocas, pois entre os 64 CVCs, em 25 deles foram aplicados um único curativo, sem que o curativo fosse substituído por um novo, e em 39 cateteres não houve necessidade de aplicar um novo curativo, após a retirada do último, pela descontinuidade do uso do cateter pelo paciente. Dessas trocas, 87% (83) foram não programadas e 13% (12) trocas programadas. As trocas não programadas foram mais frequentes em veia subclávia e o motivo mais comum foi por curativo descolado (tabela 3).
Tabela 3 Distribuição das trocas não programadas (n = 83) do curativo gel de clorexidina, segundo local de inserção do cateter venoso central. Ribeirão Preto-SP, 2014
Local de inserção dos CVCs* | Motivos de troca não programa | ||||
---|---|---|---|---|---|
Descolado % (n) | Sujo % (n) | Perda do curativo % (n) | Úmido % (n) | Total % (n) | |
Veia Subclávia | 24 (20) | 18 (15) | 05 (4) | 02 (2) | 49 (41) |
Veia Jugular | 23 (19) | 15 (12) | 0 (0) | 0 (0) | 38 (31) |
Veia Femoral | 05 (4) | 08 (7) | 0 (0) | 0 (0) | 13 (11) |
Total | 52 (43) | 41 (34) | 05 (4) | 02 (2) | 100 (83) |
Fonte: Dados obtidos no estudo.
*CVCs: Cateteres Venosos Centrais.
O principal objetivo deste estudo foi avaliar o tempo de permanência do curativo gel de clorexidina, uma vez que o seu uso vem sendo estudado, principalmente, pela literatura internacional, e sugere-se sua eficácia diante de uma significativa redução na colonização dos cateteres e das infecções relacionadas a esse dispositivo.3,6,9,16
É importante realizar a descrição dos motivos da troca não programada do curativo, pois as mesmas são eventos que podem estar relacionadas ao aumento das infecções relacionadas ao cateter.16-18
A predominância dos pacientes que participaram deste estudo foi de homens e a média de idade de 57,9 anos, dado que se assemelha a característica dos pacientes admitidos em outras UTIs do país, em que há a predominância do sexo masculino e as médias de idade foram de 53,69 anos, 55,8 anos, e 60,0 anos.21-23 O envelhecimento populacional do país, em que o número de pessoas com doenças crônicas não transmissíveis vêm aumentando, acarreta a maior vulnerabilidade das faixas etárias mais avançadas, eleva a morbidade e torna mais frequentes internações de pacientes idosos.24
O apache II médio dos pacientes do presente estudo foi de 26,6 e o tempo de permanência médio na UTI foi de 10,96 dias, quando comparado a estudo realizado em outra UTI do estado de São Paulo com índice apache II médio de 10,2 e 4,3 dias de internação.21 Ressalta-se que quanto maior a gravidade do paciente, maior a dependência dos mesmos, maior o tempo de internação em cuidados intensivos.21,25
Os índices altos de gravidade aumentam o risco de infecções relacionadas à assistência à saúde, porque os pacientes se encontram instáveis, necessitam de procedimentos invasivos, apresentam maior tempo de permanência na UTI, requerem inserção de múltiplos cateteres e manipulação excessiva das linhas do CVC.25
Um estudo multicêntrico evidenciou que o rompimento dos curativos é um evento comum nas UTI.17 Esse estudo avaliou 1.419 pacientes de um ensaio clínico randomizado, analisou 11.036 trocas de curativos de cateteres e mostrou que dessas trocas 67% foram não padronizadas. Essas trocas foram maiores em pacientes com altos escores de gravidade.17
Os cateteres do presente estudo foram retirados quando não houve mais indicação de uso, por óbito do paciente, quando houve suspeita de infecção relacionada a esse dispositivo, quando o cateter foi tracionado ou quando o mesmo não estava posicionado corretamente por tração do cateter. Nesse estudo, foram puncionados 12 novos cateteres nos casos em que houve necessidade de continuidade da terapia intravenosa em CVC.
De acordo com as recomendações dos Centers for Disease Control and Prevention Disease (CDC, 2011), os CVCs não devem ser trocados em intervalos de tempo com a finalidade de reduzir taxas de infecções relacionadas ao cateter, sem que haja sinais e sintomas de infecção. Assim, não há necessidade de substituir um cateter que esteja funcionando, a fim de minimizar complicações relacionadas ao procedimento de inserção e permanência do cateter, como pneumotórax, hemotórax, trombose, laceração da veia de inserção, entre outras.5
Os CVCs permaneceram in situ em média por 8,6 dias, o que é considerado um fator de risco para a colonização do cateter.26 Quanto maior o tempo de uso do CVC, maior seu risco de infecção relacionada ao cateter.3,5,19,26 Vale lembrar que o tempo de permanência médio dos CVCs do presente estudo foi maior do que o descrito na literatura. Um ensaio clínico randomizado nacional, descreveu a média de permanência de 4,9 dias no grupo de intervenção (curativo gel de clorexidina) e 5 dias no grupo controle (filme transparente de poliuretano).27 Estudos internacionais apontam médias de 6 dias de uso de cateteres.15,16
Dentre os motivos de retirada do CVC desse estudo, 30% (19) ocorreram devido à suspeita de infecção relacionada ao cateter intravascular, mesmo em uso do curativo gel de clorexidina. Contrapondo esse resultado, em uma metanálise que incluíram nove ensaios clínicos randomizados e avaliaram 6.067 pacientes com 11.214 CVC, sendo 5.586 em uso do curativo de clorexedina comparado 5.628 filmes transparentes de poliuretano. Os resultados demonstraram que o curativo de clorexidina reduz as incidências da infecção da corrente sanguínea relacionada ao cateter (p = 0,002 e IC 95% 0,42-0,79).9
Nessa mesma direção, um ensaio clínico randomizado aponta diminuição no grupo de clorexidina e aponta 0,4 infecções da corrente sanguínea relacionada ao cateter por 1.000 cateteres dia no grupo clorexidina e de 1,3 por 1.000 cateteres dia no grupo poliuretano (p = 0,005, IC 0,09-0,65).15
Em relação a adesividade do curativo, um estudo demonstrou que o tempo de permanência do cateter superior a cinco dias aumenta em mais de cinco vezes o risco de má fixação do curativo, e mais de quatro vezes o risco de desenvolver reação local pelo uso do curativo oclusivo em contato contínuo com a pele.28 Nesse contexto, observa-se na literatura um estudo que descreve que curativos não intactos potencializam a entrada de microrganismos no sítio de inserção.2,29 Assim, a inspeção e palpação diária para checar a integridade, adesividade e saturação do curativo gel de clorexidina, além de rever a necessidade da continuidade do CVC são estratégias essenciais para garantir a segurança do paciente prevenindo as infecções relacionadas ao cateter.5,6,8,19,29,30
No presente estudo, as veias subclávia e jugular foram utilizadas nas inserções da mesma quantidade de cateteres, sendo que em 47% dos cateteres foram inseridos em cada uma das veias, e 6% dos cateteres foram inseridos na veia femoral. Na literatura, a distribuição de cateteres varia entre alguns estudos.5,15,27 Um artigo nacional aponta a veia subclávia (72,1%) como a mais utilizada e nenhum cateter inserido em veia femoral.27 Estudo multicêntrico traz a veia subclávia como a mais utilizada em 39,9% dos pacientes, seguido de femoral (32,8%) e jugular (27,3%).15
Cabe lembrar que o local de inserção do CVC pode influenciar no risco de infecção relacionada a esse dispositivo e, por isso, os Centers for Disease Control and Prevention (CDC, 2011) recomendam evitar a veia femoral para inserção do cateter de curta permanência, uma vez que essa localização está associada a maior colonização do CVC, quando comparado à veia subclávia e a jugular. Com relação a controle de infecção a veia subclávia é a indicada para a inserção do cateter.5
Nessa mesma direção, Pedrolo et al. (2013) realizaram uma revisão integrativa, e constataram que a veia jugular interna apresenta maior risco de infecção quando comparada com a veia subclávia, devido a sua proximidade com as vias aéreas e a dificuldade de imobilização local.26
Quanto à durabilidade do curativo e local de inserção do cateter, no presente estudo observa-se que os motivos de trocas não programadas foram mais frequentes quando o cateter estava inserido na veia subclávia, totalizando 49% (41) das trocas. Em contrapartida, observou-se em um estudo um menor número de trocas nos cateteres inseridos na veia jugular e um número maior de trocas nos acessos de veia femoral, seguidos de veia subclávia.16,31
Os curativos, utilizados como cobertura de CVC, foram projetados para a pele que passa por uma variedades de condições, tais como, movimentação, mudanças de temperatura, transpiração e umidade externa.3,29 No entanto, observou-se na execução do estudo que nem todas as situações estão descritas na literatura.
Quando avaliados os motivos de trocas em todos os sítios de inserção, foi observado em 52% (43) das trocas não programadas que as mesmas ocorreram por motivo de descolamento do curativo, esse fato pode estar relacionado com fatores intrínsecos e extrínsecos ao paciente, tais como características da pele (oleosidade, por exemplo); diaforese; e também deve-se considerar que o curativo pode ter sido molhado durante o banho, cabe aqui ressaltar a importância de proteger o curativo durante o banho no leito.
O tempo de permanência médio do curativo no presente estudo foi de 3,04 dias. E a média de curativos utilizados por paciente foi de 3,1, podendo observar que a quantidade de curativo utilizada foi alta em comparação com o tempo de permanência médio do CVC que foi de 8,6 dias. Esse dado corrobora quando observamos que dentre as 95 trocas de curativos, 83 foram não programadas, antes de sete dias que é o tempo em que o curativo gel de clorexidina pode ser mantido.
No ensaio clínico randomizado que testou curativo com clorexidina e filme transparente de poliuretano apontou que mais de duas trocas de curativos, pelo motivo descolamento está associado a três vezes mais infecções relacionadas ao cateter (p = 0.023 com nível de significância menor o que 5%). Os autores identificaram que a partir da segunda troca esse aumento pode chegar a 12 vezes mais o número dessas infecções (p = 0.0001 com nível de significância menor o que 5%), ou seja, quanto mais trocas por descolamento maior a ocorrência de infecção da corrente sanguínea relacionada ao cateter.17 Na análise univariada realizada, seguindo modelo Cox desse ensaio clínico, demonstrou associação entre descolamento do curativo e colonização do cateter intravascular.17
Nessa mesma perspectiva, um estudo nacional demonstrou que mais de duas trocas do curativo gel de clorexidina, aumenta em mais de nove vezes o risco de desenvolver má fixação do curativo, apresentando p = 0,0061 com nível de significância 5%.28 Sendo que a fixação inadequada resulta no descolamento espontâneo do curativo, e esse fator é motivo para sua troca.28
A finalidade do curativo é ser oclusivo, assim, deve-se mantê-lo totalmente aderido à pele do paciente para proteger o sítio de inserção do cateter, dar estabilidade ao dispositivo e reduzir a contaminação por microrganismos.17,29 Em contrapartida, o presente estudo apontou que em poucas ocasiões foi possível manter o curativo gel de clorexidina por sete dias como recomendado na literatura.
As taxas de infecção da corrente sanguínea relacionada ao CVC diminuem após a implantação de medidas de inserção e manutenção essenciais chamadas de bundle. Os bundles de inserção consistem em: correta higienização das mãos; barreiras de proteção máxima durante a inserção do cateter; uso de checklist na inserção; antissepsia da pele com clorexidina; otimizar a escolha do local de inserção; uso de kits de inserção de cateter com os materiais necessários para a inserção; educação de médicos, enfermeiros e outros profissionais da saúde sobre medidas de prevenção de infecções relacionadas ao cateter.6,30,32,33
Quanto aos bundles de manutenção são destacadas as seguintes medidas: higienização das mãos; avaliação diária do cateter e do sítio de inserção; avaliação diária do curativo e realizar as trocas conforme recomendado; uso de kit para troca de curativo; remoção do cateter quando não houver mais indicação de uso; cuidados com hub e conexões; uso reduzido de conexões nos cateteres; treinamento e educação em saúde de toda a equipe responsável pela inserção, cuidados e manutenção do cateter; e treinamento do paciente e/ou familiares com relação aos cuidados com o CVC.6,30,32,33
Um estudo de antes e depois da implantação de um bundle de prevenção de infecção relacionada ao cateter, observou-se que o tempo médio entre a inserção do cateter e o aparecimento da infecção da corrente sanguínea foi de 11,3 dias na fase em que não foi utilizada as medidas citadas, e de 13,4 dias para a fase de intervenção bundle.32
Devido as trocas excessivas do curativo ser um fator de risco para a sua colonização e infecção relacionada ao cateter, sugere-se a inclusão da avaliação da integridade do curativo nos bundles de manutenção de cateter central.17
Um estudo avaliou a implantação de um bundle de inserção e manutenção de CVC, que contemplava medidas de cuidado e avaliação diária do curativo e relacionadas a realização de trocas quando necessárias.30 Após a implementação desse bundle houve um decréscimo de três para menos que uma infecção da corrente sanguínea relacionada ao cateter por 1.000 cateteres dia. Os autores concluíram que tal resultado demonstram uma melhora na qualidade da assistência prestada ao paciente.30
A partir dos resultados obtidos e discutidos no presente estudo, ressalta-se a importância dos cuidados de enfermagem relacionados a troca do curativo de cateter venoso central, uma vez que essa medida é essencial na prevenção das infecções relacionada ao cateter. No entanto, tais cuidados devem ser realizados em conjunto com outras medidas de prevenção e manutenção. Toda a equipe de saúde envolvida nos cuidados diretos do CVC deve receber capacitação para executar tais medidas. E o bundle institucional deve adotar como um dos itens a avaliação do curativo como rotina diária.
O curativo gel de clorexidina é recomendado por sete dias, porém neste estudo poucas vezes esse curativo permaneceu esse período, sendo seu tempo médio de permanência inferior à indicação de uso.
O descolamento do curativo em cateteres inseridos na veia subclávia foi o motivo mais frequente da troca não programada. O número de curativos utilizados por paciente excede a expectativa para o seu tempo médio de hospitalização, porque se observou que o paciente necessita de um número maior de curativos do que o preconizado pela literatura.
Portanto, a incorporação dessa tecnologia no cuidado deve ser ponderada considerando o custo financeiro para aquisição do curativo gel de clorexidina pelas instituições de saúde.
Devido à escassez de estudos nacionais que avaliem as trocas do curativo gel de clorexidina, ressalta-se a necessidade de realizar mais estudos no Brasil, bem como comparar com outros tipos de cobertura para encontrar qual seria a ideal para os pacientes críticos hospitalizados em instituições de saúde brasileiras e àqueles que avaliem o seu impacto econômico.
Como limitações, pode-se citar as seguintes situações e suas justificativas: a característica da pele da população brasileira como a presença da oleosidade; a região do país onde foi realizado o estudo que tem clima quente praticamente o ano todo contribui para a transpiração excessiva do paciente, mesmo considerando que o local de estudo é uma unidade fechada com temperatura ambiental controlada; a umidade no curativo gel de clorexidina que o banho de leito pode causar; e o tamanho da amostra que, por ser pequena, possa ter limitado a conclusão.
Tais aspectos podem ter influenciado na ocorrência do descolamento do curativo gel de clorexidina e não foram controlados neste estudo. Recomenda-se que devam ser considerados no planejamento de futuros estudos e na incorporação desse curativo na prática clínica.