versão On-line ISSN 2237-9622
Epidemiol. Serv. Saúde vol.23 no.4 Brasília out./dez. 2014
http://dx.doi.org/10.5123/S1679-49742014000400017
to analyze trends in self-reported diabetes mellitusprevalence in Brazilian state capitals, 2006-2012.
Data from a telephone survey conducted in state capitals were analyzed by simple linear regression, taking the indicator value as the dependent variable and survey year as the explanatory variable.
an increasing trend from 5.7% to 7.4 % was found in this period in adults in Brazilian capitals (p=0.008). Prevalence increased in males from 4.8% to 6.5% and in females from 6.4% to 8.1%. The increase in females occurred in 9 capitals: Belém, Belo Horizonte, Curitiba, Macapá, Macéio, Palmas, Recife, Rio Branco and Vitória, whilst in males it occurred in 6: Boa Vista, Florianópolis, Fortaleza, Rio Branco, Rio de Janeiro, São Paulo.
diabetes mellitus has increased in several Brazilian capitals. Monitoring diabetes and risk factor trends is useful for health planning.
Key words: Diabetes Mellitus/trends; Interview; Health Surveys; Public Health Surveillance
evaluar la tendencia de la prevalencia de diabetes mellitus autorreferida en las capitales brasileñas, entre 2006 y 2012.
estudio ecológico con datos de la Vigilancia de Factores de Riesgo y Protección para Enfermedades Crónicas por Encuesta Telefónica (Vigitel) referentes a adultos (≥18 años), analizados por medio de regresión lineal simple.
en el período estudiado, hubo tendencia de aumento de 5,7% para 7,4% en el conjunto de la población adulta de las capitales (p=0,008), de 4,8% para 6,5% entre hombres (p=0,002) y de 6,4% para 8,1% entre mujeres (p=0,039); la elevación entre mujeres ocurrió en 9 capitales - Belém-PA, Belo Horizonte-MG, Curitiba-PR, Macapá-AP, Maceió-AL, Palmas-TO, Recife-PE, Rio Branco-AC y Vitória-ES -; y entre hombres, en 6 capitales - Boa Vista-RR, Florianópolis-SC, Fortaleza-CE, Rio Branco-AC, Rio de Janeiro-RJ y São Paulo-SP.
hubo aumento de la prevalencia de la diabetes en diversas capitales brasileñas; el monitoreo de las tendencias y factores de riesgo es útil a la planificación en la salud.
Palabras-clave: Diabetes Mellitus/tendencias; Entrevista; Encuestas Epidemiológicas; Vigilancia en Salud Pública
O diabetes mellitus é um problema de saúde global, com prevalência estimada para o ano de 2010 de 6,4% entre os adultos de 20 a 79 anos, e com expectativa de incremento anual de 2,2% entre 2010 e 2030.1 Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2008, o diabetes foi responsável por 1,3 milhões das mortes e cerca de 4% das mortes prematuras (<70 anos).2
No Brasil, a taxa de mortalidade por diabetes em 2010 foi de 36 por 100 mil habitantes (54.800 óbitos),3 sendo estimado um contingente populacional de 6 milhões de portadores de diabetes (2006),4 com expectativa de 11,3 milhões em 2030.5
Estudo de revisão realizado em 199 países, considerando como definição de caso de diabetes a glicose plasmática de jejum ≥7mmol/L, estimou a prevalência na população com idade ≥25 anos em 9,8% no sexo masculino e 9,2% no sexo feminino.6 No Brasil, o último inquérito com medidas bioquímicas ocorreu na década de 1980 e foi realizado em nove capitais, apontando 7,6% de prevalência de diabetes em adultos de 30 a 69 anos.7 No entanto, dados provenientes de medidas bioquímicas dispendem alto custo, além da complexidade de realização, sendo cada vez mais utilizada a morbidade referida em inquéritos de saúde como proxy da prevalência de diabetes.4
A Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel), implantada pelo Ministério da Saúde do Brasil em 2006, fornece estimativas de prevalência de diabetes autorreferido por adultos (≥18 anos) residentes nas capitais do país, a partir de um diagnóstico prévio da doença realizado por um médico.8
Este estudo tem como objetivo analisar a tendência da prevalência de diabetes melito autorreferido em adultos residentes nas capitais brasileiras, tendo por base os dados do inquérito Vigitel referentes ao período de 2006 a 2012.
Foi realizado estudo ecológico com dados de adultos (≥18 anos) residentes nas capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal com telefone fixo no domicílio, coletados em cerca de 54 mil entrevistas realizadas anualmente, pelo Vigitel.8 Para as entrevistas, é realizado sorteio amostral probabilístico em dois estágios: (1) sorteio sistemático de 5 mil linhas telefônicas em cada cidade, seguido por re-sorteio e organização de 25 réplicas (sub-amostras) de 200 linhas; e (2) sorteio de um morador adulto do domicílio, solicitado a responder à entrevista.8
O estudo analisou dados referentes à prevalência de diabetes autorreferido, segundo a resposta positiva à seguinte pergunta: Algum médico já lhe disse que o Sr.(a) tem diabetes? O indicador foi expresso pela proporção de adultos que responderam 'Sim' à questão do diabetes, a cada ano de realização do inquérito.
As prevalências foram estimadas utilizando-se fatores de ponderação adotados pelo Vigitel, que consideram: o inverso do número de linhas telefônicas e o número de adultos no domicílio do entrevistado; e o peso pós-estratificação, que visa igualar a composição sociodemográfica (por sexo, faixas etárias e escolaridade) da amostra estudada à população adulta total da cidade, de acordo com o censo populacional e respectivas projeções. Para estimativas relativas ao conjunto das cidades estudadas, foi utilizado um quarto fator de ponderação, calculado pela razão entre a proporção de adultos de uma dada cidade e a proporção de adultos das 27 cidades.8
A partir de 2012, com a disponibilização dos microdados do censo populacional de 2010, foi possível atualizar as estimativas do inquérito mediante projeções intercensitárias, que consideraram as mudanças na composição populacional, com maior proporção de idosos e da população mais escolarizada. Os pesos de pós-estratificação, desde então, são calculados pelo método iterative proportional fitting (IPF) ou rake. Maiores detalhes do método podem ser encontrados em outras publicações.8 - 10
As prevalências foram estimadas para o conjunto da população adulta brasileira, segundo sexo, e para cada capital e o Distrito Federal.
Para análise de tendência, foi utilizado o modelo de regressão linear simples, cuja variável resposta (Yi) é a prevalência de diabetes, e a variável explicativa (Xi), o tempo (ano do levantamento). O valor do coeficiente angular (β) positivo/negativo representa o aumento/decréscimo médio anual na prevalência de diabetes para cada ano do inquérito. Foi adotado o nível de significância α=0,05 e análise de resíduos para atender as suposições do modelo. No processamento dos dados e análises estatísticas, utilizou-se o aplicativo Stata versão 11.1.11
Este estudo foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP), com Registro no 13081 e Parecer no 749/2006, atualizado em 2013: Parecer no 355.590/2013 - Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) no 16202813.2.0000.0008.
Em 2006, o inquérito telefônico Vigitel apontou diagnóstico de diabetes autorreferido em 5,7% da população: 4,8% entre homens e 6,4% entre mulheres. Em 2012, houve aumento para 7,4% na população adulta residente nas capitais brasileiras (p=0,008), sendo a variação anual média da ordem de 0,25 pontos percentuais (pp). Na população masculina, esse aumento ocorreu até alcançar a proporção de 6,5% dessa população (p= 0,002), e na feminina, até 8,1% das mulheres (p= 0,039) (Figura 1).
Em 9 capitais, foi observado aumento de diabetes autorreferido entre as mulheres: Belém-PA, Belo Horizonte-MG, Curitiba-PR, Macapá-AP, Maceió-AL, Palmas-TO, Recife-PE, Rio Branco-AC e Vitória-ES, com destaque para Macapá-AP, cujo aumento médio foi de 0,55 pp ao ano. Entre homens, esse aumento foi verificado em 6 capitais: Boa Vista-RR, Florianópolis-SC, Fortaleza-CE, Rio Branco-AC, Rio de Janeiro-RJ e São Paulo-SP, com destaque para Fortaleza-CE, que apresentou incremento de 0,49 pp ao ano. Rio Branco-AC foi a única capital que apresentou aumento em ambos os sexos (Tabelas 1 e 2).
a) Prevalências ponderadas, no sentido de ajustar a distribuição sociodemográfica da amostra da Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) à
distribuição da população adulta da cidade, em cada ano do levantamento.
b) Coeficiente da regressão linear do valor do indicador sobre o ano do levantamento, em cada categoria de análise.
a) Prevalências ponderadas, no sentido de ajustar a distribuição sociodemográfica da amostra da Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) à
distribuição da população adulta da cidade, em cada ano do levantamento.
b) Coeficiente da regressão linear do valor do indicador sobre o ano do levantamento, em cada categoria de análise.
Em 2012, a maior prevalência de diabetes autorreferido na população masculina foi observada para Curitiba-PR (8,4%) e a menor para Palmas-TO (3,1%); entre mulheres, a maior prevalência foi encontrada em São Paulo-SP (10,6%) e a menor em Teresina-PI (4,6%).
Houve tendência de aumento de diabetes para o conjunto da população adulta das capitais brasileiras, em ambos os sexos, no período 2006-2012. Em 24 das 27 capitais brasileiras, a prevalência de diabetes autor-referido foi maior entre mulheres, frente aos homens.
O aumento da prevalência do diabetes tem sido identificado em todas as regiões do mundo, em função do aumento da expectativa de vida e consequente crescimento da população de idosos, além da influência progressiva de estilos de vida adotados, como sedentarismo, alimentação rica em açúcares, gorduras e calorias, resultando em excesso de peso e obesidade.1 , 2 , 4 , 6 O aumento da prevalência da doença também pode estar relacionado à redução da letalidade, em virtude do maior acesso ao tratamento e/ou ao diagnóstico,12 embora esses possíveis fatores não tenham sido objeto específico deste estudo.
Estimativas da prevalência do diabetes autorreferido nos Estados Unidos da América, provenientes da pesquisa por telefone intitulada Behavioral Risk Factor Surveillance System (BRFSS), apontam frequências mais elevadas (9,7%) em relação ao Brasil, para o ano de 2012.13 A maioria dos estudos de diabetes realizados no Brasil são baseados em informações autorreferidas. Embora existam diferenças metodológicas que limitem a comparação, a tendência de aumento apontada pelo Vigitel persiste em diferentes inquéritos realizados. No ano de 2003, a Pesquisa Mundial de Saúde, a qual contou com amostra nacional de 5 mil indivíduos ≥18 anos, apontou prevalência de 6,2%.14 Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) revelaram um aumento de 2,6% (2003) para 3,6% (2008) em indivíduos com 15 ou mais anos de vida,15 tendência que se mantém quando as prevalências são ajustadas por idade.16
A maior prevalência de diabetes autorreferido no sexo feminino pode estar relacionada à maior procura dos serviços de saúde por parte das mulheres e, portanto, maior oportunidade de diagnóstico,17 além da maior expectativa de vida apresentada por elas.4 A despeito desses fatores, a maior ocorrência da doença em mulheres não é consenso na literatura,6 , 7 , 13 , 18 e pode estar relacionada à maior sensibilidade da medida quando autorreferida pelo segmento feminino. 17 , 19
Foram verificadas diferenças pontuais nas prevalências de diabetes entre as capitais brasileiras, geralmente maiores nas regiões Sudeste e Sul e menores na região Norte do país. Estudos locais podem auxiliar na melhor compreensão desse achado, possivelmente relacionado a diferenças na composição etária, na prevalência da obesidade e no acesso a serviços de saúde, tanto públicos quanto privados, nas diferentes regiões.12 , 15 Comparações específicas entre capitais não foram objeto central deste estudo, sendo que a análise da variação temporal também deve considerar as diferentes prevalências de cada capital no início do período analisado.
A principal limitação do estudo foi o uso da morbidade autorreferida em detrimento de critérios biomédicos para diagnóstico de doença. Estudo comparando dados autorreferidos com medidas bioquímicas mostrou que os primeiros podem subestimar a doença em cerca de 32%,18 proporção essa entendida como casos ainda não diagnosticados. Dessa forma, os dados apresentados dizem respeito apenas aos casos já diagnosticados por médico, sendo o autorrelato uma medida acurada para avaliar a prevalência de diagnóstico conhecido da doença.19 Outra limitação do estudo consistiu no uso do cadastro de telefones residenciais fixos nas capitais, para fins de sorteio da amostra. No sentido de corrigir os vícios potenciais atribuíveis à baixa cobertura de domicílios com telefone fixo, o Vigitel utiliza o método de ponderação e pós-estratificação, com o objetivo de ajustar a distribuição da amostra (população das capitais com telefone) às características da população residente em cada capital (de acordo com os dados do censo demográfico e projeções intercensitárias).8
A implantação das ações previstas no 'Plano de Ações para Enfrentamento de Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) no Brasil, 2011-2022',20 que inclui medidas de vigilância, monitoramento, promoção da atividade física,21 alimentação saudável, tratamento e controle das DCNT, pode ajudar a deter o crescimento da morbimortalidade por diabetes no país. O monitoramento das tendências de diabetes e fatores de risco de doenças crônicas, realizado pela Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico - Vigitel -, é útil para o planejamento em Saúde Pública.