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Terapia Psicológica a Distância – Uma Nova Realidade

Terapia Psicológica a Distância – Uma Nova Realidade

Autores:

Protásio L. da Luz,
Mayra L. Gagliani,
Bellkiss W. Romano

ARTIGO ORIGINAL

Arquivos Brasileiros de Cardiologia

versão impressa ISSN 0066-782Xversão On-line ISSN 1678-4170

Arq. Bras. Cardiol. vol.104 no.6 São Paulo jun. 2015

https://doi.org/10.5935/abc.20150067

A alta tecnologia avança rapidamente na área médica. O avanço mais recente são os estudos de “big data” em que múltiplas tecnologias estão sendo aplicadas em população com a finalidade de incorporar dados de genética, marcadores biológicos e imagem, a fim de avaliar riscos e prever a ocorrência de fenômenos clínicos. Trata-se de uma visão global, multidisciplinar, multinacional, que sustenta e ajuda a implementar ações preventivas.

Uma área que ainda não aderiu a essa modernidade entre nós é a Psicologia. A modalidade presencial de Terapia Psicológica é a única forma de tratamento aceitável para o Conselho Federal de Psicologia. No entanto, a terapia à distância, seja por Internet ou por smartphone, vem sendo utilizada cada vez mais nos EUA, na Europa e na Oceania. Epstein e cols.1 relatou o uso crescente da “e-therapy” bem como o crescimento exponencial das publicações correspondentes. Na Nova Zelândia, Gibson e Cartwright2 documentaram a experiência de adolescentes com a terapia por “smartphone”. Oito aspectos foram identificados pelos adolescentes como vantajosos: privacidade, autonomia, controle, anonimato, facilidade de acesso, personalização, individualização de linguagem e conexão.

A importância dessas novas metodologias tem a ver com a prevalência e incidência de problemas emocionais no mundo todo. Por exemplo, depressão é a doença não fatal mais comum que ocorrerá no século XXI3, sendo também causa importante da perda de capacidade de trabalho e de qualidade de vida, e tragicamente a terceira causa de suicídio entre adultos jovens americanos.

Ampla revisão publicada por Rozansky4 em 2014, no Journal of the American College of Cardiology, mostra que alterações do sono, ansiedade, diversas formas de estresse familiar e no trabalho, falta de propósito na vida, raiva e incapacidade de enfrentar desafios, entre outros fatores, associam-se significativamente com doenças cardiovasculares, mortalidade cardíaca e até mortalidade por todas as causas. Essas associações são dependentes de hábitos de vida não saudáveis, tais como sedentarismo e tabagismo, bem como ativação do sistema nervoso simpático, que, por sua vez, induzem mecanismos fisiopatológicos que causam doenças cardiovasculares5. Portanto, há uma conexão mecanística, biologicamente plausível, entre problemas emocionais, comportamentos e doença orgânica cardiovascular. Se, por um lado, o entendimento dos mecanismos fisiopatológicos pertence aos domínios da biologia celular e molecular, por outro, ao se tentar mudar comportamentos, os médicos precisam do auxílio profissional de psicólogos. E justamente, prevenção é um dos pilares na erradicação de doenças crônicas não transmissíveis como a aterosclerose, diabetes e hipertensão, que são as causas principais de mortalidade no mundo moderno. Requisitos fundamentais na estratégia de prevenção são mudança de estilo de vida, como deixar de fumar, fazer exercícios e adotar dietas saudáveis. É onde as duas ciências se encontram.

Não apenas isso, mas os médicos falham frequentemente em reconhecer problemas emocionais, tanto associados a doenças orgânicas, quanto primários. Ainda, muitos tratamentos psicológicos são mal empregados, sendo o número de casos tratados insuficiente, chegando a apenas aproximadamente 50%3.

Por outro lado, os custos associados à depressão e à demência são astronômicos6,7. Assim, nos EUA, demonstrou-se que o custo da depressão atingiu U$53 bilhões em um ano, relacionados principalmente a absenteísmo e desempenho inadequado no trabalho. Quanto à demência, Hurd e cols.7estimaram custos individuais entre U$42 mil e 56 mil/pessoa/ano, e entre U$ 157 bilhões e 250 bilhões/ano nos EUA. No Brasil, tais custos são quase desconhecidos, mas provavelmente também grandes.

Diante desse cenário, algumas atitudes se impõem, tais como:

  1. identificar fatores psicológicos em doenças orgânicas, bem como condições primárias;

  2. adotar cuidados globais, de modo que a medicina seja orientada ao paciente e não apenas à doença;

  3. incorporar diferentes metodologias de tratamentos, tais como novos medicamentos e novas formas de tratamentos comportamentais;

  4. aumentar o índice de tratamento de alterações mentais.

Quanto ao uso de “terapia psicológica à distância” é nossa impressão que a legislação brasileira precisa mudar, adaptando-se aos novos tempos. Sem desconsiderar a clássica terapia presencial, a terapia à distância deve ser permitida e incentivada em situações especiais que poderão ser explicitadas por legislação apropriada. Hoje no Brasil, terapia à distância só é autorizada na forma de pesquisa e tem provocado o debate em relação a eficiência e segurança, privacidade, questões éticas e legais, e outros aspectos8. Por exemplo, um processo terapêutico poderia ser iniciado com poucas entrevistas iniciais, seguidas de tratamento à distância e entrevistas pessoais intervaladas. Isso beneficiaria pacientes que estão distantes de grandes centros, onde formas terapêuticas mais modernas, como a Terapia Cognitiva Comportamental, não estão disponíveis. Tais alternativas certamente contribuiriam para os processos preventivos tão calorosamente defendidos pela medicina moderna. Compete a psicólogos e seus representantes formais buscar essa atualização inevitável.

REFERÊNCIAS

Epstein R. Distance therapy comes of age. Scientific American Mind May/June 2011. [Cited in 2015 Jan 10]. Available from: http://www.scientificamerican.com/mind
Gibson K, Cartwright C. Young people´s experiences of mobile phone text counselling: Balancing connection and control. Children and youth services review. 2014;43:96-104.
The National Alliance on Mentall Illness, 2013. [Cited in 2015 Jan 10]. Available from: http://www.nami.org
Rozanski A. Behavioral cardiology: current advances and future directions. J Am Coll Cardiol. 2014;64 (1):100-10.
Luz PL, Nishiyama M, Chagas AC. Drugs and lifestyle for the treatment and prevention of coronary artery disease: comparative analysis of the scientific basis. Braz J Med Biol Res. 2011;44(10):973-91.
Wang PS, Simon G, Kessler RC. The economic burden of depression and the cost-effectiveness of treatment. Int J Methods Psychiatr Res. 2003;12(1):22-33.
Hurd MD, Martorell P, Delavande A, Mullen KJ, Langa KM. Monetary costs of dementia in the United States. N Engl J Med. 2013;368(14):1326-34.
Pieta MA, Gomes WB. Psicoterapia pela internet: viável ou inviável? Psicol cienc prof. 2014;34(1):18-31.