versão impressa ISSN 1806-3713versão On-line ISSN 1806-3756
J. bras. pneumol. vol.46 no.4 São Paulo 2020 Epub 01-Jun-2020
http://dx.doi.org/10.36416/1806-3756/e20180237
O sono é considerado um importante restaurador de doenças e lesões. A interrupção do sono está associada à disfunção do sistema imunológico, diminuição da resistência a infecções, alterações no equilíbrio do nitrogênio, prejuízo na cicatrização de feridas e consequências cardiorrespiratórias e neurológicas negativas.1 Em pacientes hospitalizados, aspectos como dor, ansiedade, efeitos de medicamentos, estímulos ambientais e intervenções médicas e de cuidados, além da própria doença aguda, contribuem para afetar a quantidade e qualidade do sono.2,3
Na UTI são encontradas alterações significativas na arquitetura do sono. Os pacientes apresentam sono fortemente fragmentado e distúrbios do ritmo circadiano com latências de sono prolongadas, despertares frequentes e reduzida eficiência noturna do sono.4,5 Os distúrbios do sono são considerados uma complicação frequentemente negligenciada, com prevalência em mais de 50% dos pacientes criticamente doentes, especialmente aqueles muito graves e sépticos.6-11
Para uma investigação adequada dos distúrbios do sono, podem-se utilizar a avaliação clínica, métodos objetivos e métodos subjetivos. Dentre os métodos objetivos, a polissonografia é o exame padrão ouro de monitoramento do sono e pode fornecer informações sobre os estágios e ciclos do sono dos pacientes.12 No entanto, para a realização desse exame, é necessário um local com estrutura física adequada e recursos humanos com treinamento específico, o que exige um investimento financeiro muitas vezes elevado, dificultando sua disponibilidade no âmbito hospitalar, principalmente nas UTIs.5,13,14
Entre os métodos subjetivos de avaliação do sono na UTI, existem questionários usados tanto na rotina clínica quanto em protocolos de pesquisa. Esses questionários são utilizados para fins diagnósticos e de avaliação da resposta ao tratamento, assim como em estudos epidemiológicos e ensaios clínicos. São, na maioria dos casos, os únicos meios possíveis na prática clínica para se avaliar o sono diariamente à beira do leito devido a seu baixo custo, praticidade e rapidez.9,15,16 Dos questionários mais utilizados no ambiente de UTIs que avaliam a qualidade do sono, o Richards-Campbell Sleep Questionnaire, denominado Questionário de Sono Richards-Campbell (QSRC), e o Sleep in the Intensive Care Unit Questionnaire, denominado Questionário de Sono em UTI (QS-UTI), mostram vantagens quanto a sua aplicabilidade e conteúdo.17,18
Esses instrumentos, porém, foram formulados em língua inglesa e direcionados para suas respectivas populações. A fim de que possam ser aplicados no Brasil, o processo de tradução e adaptação transcultural para a língua portuguesa é necessário, visto que a língua original apresenta suas próprias características. Esse processo não se resume em uma comum tradução de conteúdo e deve ser realizado de forma criteriosa, seguindo metodologias recomendadas pela literatura.19-21
Desse modo, o objetivo do presente estudo foi realizar a tradução e a adaptação transcultural dos instrumentos QSRC e QS-UTI para a língua portuguesa usada no Brasil e verificar a confiabilidade interobservador dos questionários.
O estudo obteve aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital de Clínicas da Universidade Federal do Paraná (HC/UFPR), localizado na cidade de Curitiba (PR), conforme o parecer no. 2.342.453. O desenvolvimento do estudo ocorreu na UTI Adulto do HC/UFPR, que apresenta 14 leitos ativos com quartos privativos, entre junho de 2017 e janeiro de 2018.
O QSRC17 é utilizado para avaliar a qualidade do sono em pacientes elegíveis na UTI. Foi validado contra registros de polissonografia, obtendo uma excelente consistência interna e correlação moderada. Consiste em um questionário autoaplicável de cinco itens, usados para avaliar a profundidade do sono percebida, a latência do sono (tempo para dormir) e despertares, assim como a eficiência e a qualidade do sono. Adaptado em estudos posteriores,22-24) o questionário incluiu um sexto item: avaliação do barulho noturno percebido. Cada item do QSRC tem sua resposta registrada pelo paciente em uma escala visual analógica de 0 mm a 100 mm, e os escores mais altos representam melhor sono. O escore médio dos cinco itens é conhecido como escore total e representa a percepção global do sono.
O QS-UTI,18 além de avaliar a qualidade do sono em pacientes críticos, coleta dados sobre uma variedade de fatores ambientais e da rotina de cuidados, conhecidos por interromper o sono. Primeiramente, os pacientes avaliam a qualidade global do sono em casa nas semanas anteriores a sua admissão na UTI, em uma escala de 1 a 10 (1 = ruim; 10 = excelente) e a qualidade global do sono durante a permanência na UTI, assim como a qualidade do sono no primeiro dia, na metade e no final da permanência na UTI. Os pacientes também determinam o nível global de sonolência diurna durante a permanência na UTI utilizando uma escala de 1 a 10 (1 = incapaz de ficar acordado; 10 = totalmente alerta e acordado), assim como o nível global de sonolência diurna no primeiro dia, na metade e no final da permanência na UTI. O efeito dos estímulos ambientais sobre a interrupção do sono é observado também em uma escala de 1 a 10 (1 = sem interrupção; 10 = interrupção significativa) e inclui barulho, luminosidade, cuidados da enfermagem (banhos), exames (radiografias de tórax), avaliação dos sinais vitais, coletas de sangue e administração de medicamentos. Assim como em outro estudo,25 acrescentou-se o item “dor” entre os estímulos ambientais avaliados. Por fim, os pacientes avaliam o efeito dos diferentes barulhos presentes na UTI sobre a interrupção do sono usando uma escala de 1 a 10 (1 = sem interrupção; 10 = interrupção significativa). Os barulhos avaliados incluem os alarmes do monitor cardíaco, sons e alarmes do ventilador mecânico, sons da oximetria de pulso, conversas entre os membros da equipe, alarmes de bombas de infusão, sons de nebulizações e vácuos, sons de televisão e sons dos telefones dos médicos e da UTI.
O presente estudo metodológico foi autorizado pelos idealizadores dos instrumentos QSRC e QS-UTI: Dra. Kathy Richards e Dr. Neil Freedman, respectivamente.17,18 Ambos foram desenvolvidos nos EUA na língua inglesa.17,18 Apenas o QSRC apresenta tradução e validação em língua alemã, chinesa e iraniana, também chamada de farsi.26-28
O processo de tradução e adaptação transcultural seguiu os critérios metodológicos recomendados por literatura especializada,21,29-31 composto pelas seguintes etapas: 1) tradução e concordância: após a autorização dos autores originais, os questionários foram traduzidos para a língua portuguesa usada no Brasil por dois tradutores independentes (T1 e T2), nativos na língua portuguesa e fluentes na língua inglesa; um dos tradutores tinha conhecimento dos questionários e do objetivo do presente estudo; o outro não estava familiarizado com os questionários; 2) síntese das traduções: os dois tradutores, juntamente com o grupo de pesquisa, analisaram detalhadamente as versões independentemente traduzidas e utilizaram uma abordagem de consenso para resolver eventuais discrepâncias existentes, produzindo uma versão consensual; 3) tradução reversa: a versão consensual na língua portuguesa foi reversamente traduzida para o idioma original por dois tradutores independentes, nativos na língua inglesa e fluentes na língua portuguesa, sendo que ambos desconheciam as versões originais dos questionários; 4) revisão pelo comitê de especialistas: um comitê multiprofissional, composto por um especialista em pesquisas metodológicas, médicos, fisioterapeutas e todos os tradutores envolvidos no processo, realizou a comparação entre os questionários originais e as traduções reversas. Seu papel foi identificar possíveis divergências e realizar os ajustes necessários, formulando as versões finais das traduções reversas dos questionários; 5) aprovação dos autores originais: as versões finais reversamente traduzidas para o inglês foram enviadas aos autores originais para suas avaliações e comentários. O comitê de especialistas analisou as considerações dos autores originais, sendo integradas suas sugestões e criadas as versões pré-teste em português; 6) pré-teste na população-alvo e versão final dos questionários: com as versões pré-teste dos questionários foi realizado um treinamento padronizado com dois avaliadores (AV1 e AV2), fisioterapeutas especialistas e atuantes em UTI, a respeito do uso e pontuação dos mesmos. Posteriormente, executou-se um estudo piloto com 11 pacientes, no qual os avaliadores aplicaram os questionários conforme a metodologia descrita nos artigos originais.17,18 O objetivo dessa etapa foi apontar dificuldades durante o uso dos questionários e estabelecer as versões finais (Figura 1).
A coleta de dados foi realizada pelos avaliadores de forma cega e independente. O tempo de aplicação dos questionários, entre um avaliador e outro, ocorreu em torno de 30 min, sendo que a função de avaliador e observador era trocada a cada 5 pacientes. Cada avaliador foi responsável por metade das avaliações. Na tentativa de evitar vieses, as fichas das pontuações eram separadas sem comunicação entre os avaliadores. Foram coletadas informações sobre idade, sexo, motivo da internação, tempo de internação, uso de ventilação mecânica, uso de drogas vasoativas, escores de Acute Physiology and Chronic Health Evaluation II,29 entre outros.
Os participantes integraram uma amostra de conveniência, composta por pacientes clínicos e cirúrgicos. Foram incluídos pacientes de ambos os sexos, com idade ≥ 18 anos, que permaneceram ≥ 72 h na UTI do HC/UFPR, ventilados mecanicamente ou não, e que assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Foram excluídos os pacientes com triagem positiva para delirium de acordo com Confusion Assessment Method for Intensive Care Unit;30; Escala de Coma Glasgow < 15 ou < 11T (em uso de tubo orotraqueal ou traqueostomia)31; Richmond Agitation-Sedation Scale < 0 (em uso de sedativos) ou > 0 (sem uso de sedativos)32; ou pacientes incapazes de compreender a língua portuguesa, escrever ou pontuar as respostas. A triagem dos pacientes elegíveis e a coleta de dados foram realizadas pelo AV1 uma hora antes da aplicação dos questionários, aproximadamente às 9 da manhã.
Os dados foram analisados por meio do pacote estatístico IBM SPSS Statistics versão 22.0 (IBM Corporation, Armonk, NY, EUA). A normalidade e a homogeneidade dos dados foram avaliadas pelo teste de Kolmogorov-Smirnov. As características clínicas e demográficas dos pacientes foram apresentadas em frequência, média e desvio-padrão, ou mediana e intervalo interquartil. A confiabilidade e reprodutibilidade interobservador foram avaliadas pelo coeficiente de correlação intraclasse (CCI) e seu respectivo IC95%, por meio de médias dos escores totais do QSRC, assim como dos domínios 1-5, 6 e 7 do QS-UTI. Em relação à confiabilidade avaliada pelo CCI, considerou-se o seguinte: CCI < 0, ausência de confiabilidade; CCI = 0,00-0,20, pequena confiabilidade; CCI = 0,21-0,40, fraca confiabilidade; CCI = 0,41-0,60, moderada confiabilidade; CCI = 0,61-0,80, boa confiabilidade; e CCI = 0,81-1,00, alta confiabilidade.33 O nível de significância estatística foi de p < 0,05.
O tamanho amostral seguiu a metodologia proposta por Terwee et al.,34 que recomendam de 4 a 10 pacientes para cada item dos instrumentos em uma amostra de pelo menos 50 pacientes.
Durante a primeira etapa foram desenvolvidas as versões T1 e T2 dos questionários na língua portuguesa. Na versão consensual, observaram-se poucas diferenças na tradução dos itens, sendo os diferentes termos considerados sinônimos. Foi priorizado o uso de termos e expressões familiares para a população brasileira. Para o QSRC, o item “ruído” foi substituído por “barulho”; no QS-UTI foram substituídos os itens “pobre” por “ruim”, “estadia” por “permanência” e “disruptivo” por “interrupção”, pois são termos usuais. As traduções reversas do português para a língua inglesa foram muito semelhantes às versões originais e necessitaram de poucas modificações pelos autores originais dos instrumentos.
Durante a reunião com os especialistas, houve um alto grau de concordância verbal e semântica em grande parte dos itens das versões pré-teste. Discutiu-se, com maior atenção, o item 2 do QSRC, onde o termo sleep latency, quando traduzido para o português, significa “latência do sono”; entretanto, optou-se por usar o termo “tempo para dormir”, visto que poderia haver pacientes que não compreenderiam o termo “latência”. Da mesma forma, o item 3 do QS-UTI foi analisado e foi encontrada uma discrepância nas interpretações do termo “no sleep”, que traduzido para o português significa “não dorme”; contudo, por se tratar de um item que avalia a qualidade do sono, o comitê sugeriu sua substituição pelo termo “ruim”, assim como foi determinado para os itens 1 e 2 do QS-UTI, que também se referem à qualidade do sono. Todos os itens estão resumidos nas Tabelas 1 e 2.
Tabela 1 Traduções realizadas pelos tradutores 1 e 2 e a versão final do Questionário de Sono Richards-Campbell.
Item | Versão original | Tradutor 1 | Tradutor 2 | Versão final | ||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Medida | Questão | Medida | Questão | Medida | Questão | Medida | Questão | |
1 | Sleep depth | My sleep last night was: light sleep (0) deep sleep (100) |
Profundidade do sono | Meu sono na última noite foi: sono leve (0) sono profundo (100) |
Profundidade do sono | Meu sono ontem à noite foi: sono leve (0) sono profundo (100) |
Profundidade do sono | Meu sono na última noite foi: sono leve (0) sono profundo (100) |
2 | Sleep latency | Last night, the first time I got to sleep, I: just never could fall asleep (0) fell asleep almost immediately (100) |
Latência do sono | Na última noite, a primeira vez que adormeci, eu: não consegui adormecer (0) adormeci quase imediatamente (100) |
Latência do sono | Nesta noite, a primeira vez que adormeci, eu: não consegui adormecer (0) adormeci quase imediatamente (100) |
Latência do sono Tempo para dormira |
Na última noite, a primeira vez que adormeci, eu: não consegui adormecer (0) adormeci quase imediatamente (100) |
3 | Awakenings | Last night, I was: awake all night long (0) awake very little (100) | Despertar | Na última noite, eu estava: acordado(a) a noite inteira (0) acordei muito pouco (100) |
Despertar | Nesta noite, eu estava: acordado(a) a noite inteira (0) despertei muito pouco (100) | Despertar | Na última noite, eu estava: acordado(a) a noite toda (0) acordei muito pouco (100) |
4 | Returning to sleep | Last night, when I woke up or was awakened, I: couldn’t get back to sleep (0) got back to sleep immediately (100) | Voltando ao sono | Na última noite, quando acordei ou fui despertado(a), eu: não consegui voltar a dormir (0) voltei a dormir imediatamente (100) | Retorno ao sono | Nesta noite, quando acordei ou fui acordado(a), eu: não consegui voltar a dormir (0) voltei a dormir imediatamente (100) |
Retorno ao sono | Na última noite, quando eu acordei ou fui acordado(a): não consegui voltar a dormir (0) voltei a dormir imediatamente (100) |
5 | Sleep quality | I would describe my sleep last night as: a bad night’s sleep (0) a good night’s sleep (100) |
Qualidade do sono | Eu descreveria meu sono na última noite como: uma noite ruim de sono (0) uma boa noite de sono (100) |
Qualidade do sono | Eu descreveria meu sono na última noite como: ruim noite de sono (0) boa noite de sono (100) |
Qualidade do sono | Eu descreveria meu sono na última noite como: ruim noite de sono (0) boa noite de sono (100) |
6 | Noise | I would describe the noise level last night as: very noisy (0) very quiet (100) |
Ruído | Eu descreveria o nível de ruído na última noite como: muito barulhento (0) muito silencioso (100) |
Barulho | Eu descreveria o nível de barulho desta noite como: muito barulhento (0) muito quieto (100) |
Barulho | Eu descreveria o nível de barulho na última noite como: muito barulhento (0) muito quieto (100) |
aAlteração realizada após reunião com o comitê de especialistas.
Tabela 2 Traduções realizadas pelos tradutores 1 e 2 e a versão final do Questionário de Sono em UTI.
Item | Versão original | Tradutor 1 | Tradutor 2 | Versão final |
---|---|---|---|---|
1 | Rate the overall quality of your sleep at home. Use a scale of 1 to 10 (1 is poor; 10 is excellent) |
Avalie a qualidade geral do seu sono em casa. Use uma escala de 1 a 10 (1 = pobre, 10 = excelente) |
Classifique a qualidade global do seu sono em casa. Utilize uma escala de 1 a 10 (1 = ruim, 10 = excelente) | Classifique a qualidade global do seu sono em casa. Utilize uma escala de 1 a 10 (1 = ruim, 10 = excelente) |
2 | Rate the overall quality of your sleep in the ICU. Use a scale of 1 to 10 (1 is poor; 10 is excellent) | Avalie a qualidade geral do seu sono na UTI. Use uma escala de 1 a 10 (1 = pobre, 10 = excelente) |
Classifique a qualidade global do seu sono na UTI. Utilize uma escala de 1 a 10 (1 = ruim, 10 = excelente) | Classifique a qualidade global do seu sono na UTI. Utilize uma escala de 1 a 10 (1 = ruim, 10 = excelente) |
3 | Rate the overall quality of your sleep in the ICU on the following days: (1 is no sleep; 10 is excellent) - On the first night in the ICU - During the middle of your ICU stay - At the end of your ICU stay |
Avalie a qualidade geral do seu sono na UTI nos dias seguintes: (1 = não dorme, 10 = excelente) - Na primeira noite na UTI - Durante a metade da sua estadia na UTI - No final da sua estadia na UTI |
Classifique a qualidade global do seu sono na UTI nos seguintes dias: (1 = não dorme, 10 = excelente) - Na primeira noite na UTI - Durante a metade da sua permanência na UTI - No final da sua permanência na UTI |
Classifique a qualidade global do seu sono na UTI nos seguintes dias: (1 não dorme /a1 = ruim, 10 = excelente) - Primeira noite na UTI - Durante a metade da sua permanência na UTI - No final da sua permanência na UTI |
4 | Rate the overall degree of daytime sleepiness during your ICU stay: (1 is unable to stay awake; 10 is fully alert and awake) |
Avalie o grau geral de sonolência diurna durante sua estadia na UTI: (1 = incapaz de ficar acordado/a, 10 = totalmente alerta e acordado/a) |
Classifique o nível global de sonolência diurna durante sua permanência na UTI: (1 = incapaz de ficar acordado/a, 10 = totalmente alerta e acordado/a) |
Classifique o nível global de sonolência diurna durante sua permanência na UTI: (1 = incapaz de ficar acordado/a, 10 = totalmente alerta e acordado/a) |
5 | Rate the overall degree of daytime sleepiness during your ICU stay on the following days: (1 is unable to stay awake; 10 is fully alert and awake) - On the first night in the ICU - During the middle of your ICU stay - At the end of your ICU stay |
Avalie o grau geral de sonolência diurna durante sua estadia na UTI nos dias seguintes: (1 = incapaz de ficar acordado/a; 10 = totalmente alerta e acordado/a) - Na primeira noite na UTI - Durante a metade da sua estadia na UTI - No final da sua estadia na UTI |
Classifique o nível global de sonolência diurna durante sua permanência na UTI nos seguintes dias: (1 = incapaz de ficar acordado/a; 10 = totalmente alerta e acordado/a) - Na primeira noite na UTI - Durante a metade da sua permanência na UTI - No final da sua permanência na UTI |
Classifique o nível global de sonolência diurna durante sua permanência na UTI nos seguintes dias: (1 = incapaz de ficar acordado/a; 10 = totalmente alerta e acordado/a) - Primeira noite na UTI - Durante a metade da sua permanência na UTI - No final da sua permanência na UTI |
6 | Rate how disruptive the following activities were to your sleep during your ICU stay. Use a scale of 1 to 10 (1 is no disruption; 10 is significant disruption) - Pain - Noise - Light - Nursing Interventions (i.e. baths) - Diagnostic Testing (i.e. chest x-rays) - Vital Signs (blood pressure, pulse, temperature) - Blood Samples - Administration of Medications |
Avalie o grau de disruptiva as seguintes atividades foram para seu sono durante sua estadia na UTI. Use uma escala de 1 a 10 (1 = não interrompe, 10 = interrupção significativa) - Dor - Barulho - Luz - Intervenções da enfermagem (ou seja, banhos) - Testes de diagnóstico (ou seja, radiografias de tórax) - Sinais vitais (pressão sanguínea, pulso, temperatura) - Amostras de sangue - Administração de medicamentos |
Classifique o nível de interrupção do seu sono para as seguintes atividades durante sua permanência na UTI. Use uma escala de 1 a 10 (1 = sem interrupção, 10 = interrupção significativa) - Dor - Barulho - Luminosidade - Intervenções da enfermagem (isto é, banhos) - Testes de diagnóstico (isto é, radiografias de tórax) - Sinais vitais (pressão arterial, pulso, temperatura) - Amostras de sangue - Administração de medicamentos |
Classifique o nível de interrupção do seu sono para as seguintes atividades durante sua permanência na UTI. Use uma escala de 1 a 10 (1 = sem interrupção, 10 = interrupção significativa) - Dor - Barulho - Luminosidade - Cuidados de enfermagem (banhos) - Exames (radiografias de tórax) - Sinais vitais (pressão arterial, pulso, temperatura) - Coletas de sangue - Administração de medicamentos |
7 | Rate how disruptive the following noises were to your sleep during your ICU stay. (1 is no disruption; 10 is significant disruption) - Heart Monitor Alarm - Ventilator Alarm - Ventilator - Oxygen Finger Probe - Talking - I.V. Pump Alarm - Suctioning - Nebulizer - Doctor’s Beepers - Television - Telephone |
Avalie o grau de disruptivo os seguintes ruídos foram para seu sono durante sua estadia na UTI. (1 = não interrompe, 10 = interrupção significativa) - Alarme do monitor cardíaco - Alarme do ventilador - Ventilador - Oximetria de pulso - Conversas - Alarme da bomba de infusão - Sucção - Nebulizador - Telefone do médico - Televisão - Telefone |
Classifique o nível de interrupção do seu sono para os seguintes barulhos durante sua permanência na UTI. (1 = sem interrupção, 10 = interrupção significativa) - Alarme do monitor cardíaco - Alarme do ventilador - Ventilador - Oximetria de pulso - Conversas - Alarme da bomba infusora - Vácuo de sucção - Nebulizador - Telefone do médico - Televisão - Telefone da unidade |
Classifique o nível de interrupção do seu sono para os seguintes barulhos durante sua permanência na UTI. (1 = sem interrupção, 10 = interrupção significativa) - Alarme do monitor cardíaco - Alarme do ventilador - Ventilador - Oximetria de pulso - Conversas - Alarme da bomba infusora - Vácuo de sucção - Nebulização - Telefone do médico - Televisão - Telefone da unidade |
aAlteração realizada após reunião com o comitê de especialistas.
Na etapa pré-teste, os avaliadores não relataram dificuldades oriundas da aplicação ou dúvidas na compreensão dos pacientes sobre os itens; por isso, não foram realizadas alterações complementares às versões finais dos questionários. Os instrumentos foram de rápida aplicação, sendo que o QSRC demandou cerca de 2-3 min para a avaliação de cada paciente na UTI, e o QS-UTI demandou um tempo total de 4-5 min.
O estudo incluiu 50 pacientes que preencheram os critérios de inclusão. Pouco mais da metade dos indivíduos eram do sexo feminino (n = 27; 54%). A média de idade dos participantes foi de 47,7 ± 17,5 anos, com maior prevalência de internação por doenças oncológicas (n = 10; 20%). Somente 1 paciente (2%) estava sob uso de ventilação mecânica, 2 (4%) foram submetidos à traqueostomia, e 2 (4%) faziam uso de sedativos no momento da avaliação, mas sem apresentar desconformidades referentes aos critérios de elegibilidade através do Richmond Agitation-Sedation Scale32 e Confusion Assessment Method for Intensive Care Unit.30 As características demográficas e clínicas, assim como os escores dos questionários, estão demonstrados nas Tabelas 3 e 4, respectivamente.
Tabela 3 Características demográficas e clínicas dos pacientes submetidos ao Questionário de Sono Richards-Campbell e ao Questionário de Sono em UTI (N = 50).a
Variáveis | Resultados |
---|---|
Idade, anos | 47,7 ± 17,5 |
Sexo feminino | 27 (54) |
APACHE II | 14,9 ± 8,5 |
Motivo da internação | |
Oncológico Respiratório Gastroenterológico Neurológico Cardiológico Hepático Renal Gestacional Intoxicação exógena Neuromuscular Endócrino Infectocontagiosa |
10 (20) 8 (16) 6 (12) 5 (10) 5 (10) 4 (8) 3 (6) 3 (6) 2 (4) 2 (4) 1 (2) 1 (2) |
Índice de comorbidade de Charlson | 1,3 ± 1,7 |
Tabagistas | 10 (20) |
Tempo de internamento prévio de UTI, dias | 2,2 ± 4,4 |
Tempo de internamento total de UTI, dias | 3,5 [3-7] |
Uso de ventilação mecânica | 1 (2) |
Tempo total de ventilação mecânica, dias | 0 [0-1] |
Uso de traqueostomia | 2 (4) |
Medicamentos em uso na UTI | |
Analgésicos | 44 (88) |
Sedativos | 2 (4) |
Ansiolíticos | 4 (8) |
Drogas vasoativas | 11 (22) |
Nível de consciência/agitação e sedação no momento da avaliação | |
ECG = 15 ou = 11T RASS = 0 |
48 (96) 2 (4) |
APACHE II: Acute Physiology and Chronic Health Evaluation; ECG: Escala de Coma de Glasgow; e RASS: Richmond Agitation-Sedation Scale. aValores expressos em média ± dp, em n (%) ou mediana [intervalo interquartil].
Tabela 4 Escores totais do Questionário de Sono Richards-Campbell e do Questionário de Sono em UTI segundo os avaliadores 1 e 2.a
Questionários/avaliadores | Escores |
---|---|
QSRC, mm | |
AV1 | 34,3 [23,6-49,8] |
AV2 | 37,9 [21,5-52,3] |
QS-UTI | |
AV1-Domínios 1 a 5 | 6,2 ± 2,0 |
AV2-Domínios 1 a 5 | 6,1 ± 2,3 |
AV1-Domínios 6 e 7 | 3,1 ± 1,5 |
AV2-Domínios 6 e 7 | 3,2 ± 1,7 |
QSRC: Questionário de Sono Richards-Campbell; QS-UTI: Questionário de Sono em UTI; AV1: avaliador 1; e AV2: avaliador 2. aValores expressos em mediana [intervalo interquartil] ou média ± dp.
Os escores do QSRC foram semelhantes entre AV1 e AV2. O teste de reprodutibilidade apresentou alta confiabilidade interobservador (CCI = 0,84; IC95%: 0,71-0,90; p < 0.001).
Os escores também foram semelhantes entre os avaliadores para o QS-UTI. O questionário mostrou boa confiabilidade interobservador para os domínios 1-5 (CCI = 0,75; IC95%: 0,55-0,86; p < 0.001) e alta confiabilidade interobservador para os domínios 6 e 7 (CCI = 0,86, IC95%: 0,76-0,92; p < 0.001).
Cresce o número de estudos referentes à avaliação do sono na UTI, em consequência da intensa preocupação com a qualidade da permanência dos pacientes nesse ambiente e das possíveis sequelas na saúde mental, cognitiva e física dos sobreviventes de uma doença crítica.35 Nesse contexto, alguns questionários foram desenvolvidos para a avaliação específica do sono nessa população. Em comparação com a polissonografia, os questionários proporcionam, a curto e longo prazo, a possibilidade de se avaliar um maior número de pacientes, bem como tornar efetivas as intervenções para a promoção do sono.5
Pelo fato de não haver questionários traduzidos e adaptados transculturalmente de forma criteriosa para a língua portuguesa, o presente estudo facilita o acesso dos diversos profissionais da saúde, a nível nacional, de duas ferramentas que poderão potencialmente melhorar a qualidade assistencial ao paciente gravemente doente internado em UTI, além de possibilitar a comparação entre resultados de estudos realizados em diferentes países.21
Os instrumentos QSRC e QS-UTI foram metodicamente traduzidos e adaptados para a língua portuguesa usada no Brasil, objetivando preservar a confiabilidade dessas ferramentas de avaliação.36) É notório que o uso da tradução literal em questionários da área da saúde não é suficiente, pois existem diferenças relevantes entre os contextos culturais, sociais e econômicos dos públicos-alvo do texto original e da tradução.19 Para ressaltar a relevância das adaptações, Behling & Law37) afirmam que esse procedimento deve ser meticuloso e deve contemplar aspectos técnicos, linguísticos e semânticos.
Achados do presente estudo mostraram um alto grau de confiabilidade interobservador no QSRC, com CCI de 0,84, corroborando o estudo de Chen et al.,24) que também demonstrou alta confiabilidade desse questionário na versão chinesa, com CCI de 0,91. No questionário na língua iraniana, a confiabilidade foi considerada boa, com CCI de 0,71.25
No estudo precursor do QSRC,17 a validação foi realizada contra a polissonografia em uma amostra de 70 pacientes críticos, obtendo-se uma correlação válida e confiável. Sabe-se que parte dos pacientes internados em UTI podem apresentar condições de delirium e altos níveis de uso de medicamentos sedativos; tais condições limitam a aplicabilidade do QSRC, diminuindo a amostra de potenciais pacientes em até metade da população esperada.22 Esse fato pode parcialmente explicar o número reduzido de pacientes recrutados para o presente estudo.
Embora o QS-UTI não apresente validação contra a polissonografia nem estudos de reprodutibilidade, observa-se no estudo pioneiro18 a avaliação de 203 pacientes e um relevante conteúdo que pontua individualmente os possíveis fatores contribuintes para a interrupção do sono. Nesse cenário, são apreciadas dimensões não encontradas no QSRC, tais como qualidade do sono em casa, sonolência diurna, fatores de interrupção do sono causados pelos cuidados da equipe e fatores de origem ambiental. Estudos utilizando esse questionário24,37,38 demonstraram resultados positivos referentes à implementação de protocolos para a promoção do sono na UTI e na avaliação pós-UTI, confirmando sua utilidade na prática clínica.
Um problema a ser enfrentado é a falta de rigidez quanto ao uso de instrumentos de avaliação produzidos em outras localidades. Não ajustar as informações de forma metódica ao público-alvo pode prejudicar a qualidade das informações e, consequentemente, invalidar estudos sobre o tema abordado.39,40
Algumas limitações do presente estudo devem ser consideradas. O pequeno tamanho amostral denota uma dificuldade a ser encarada, uma vez que, para completar os questionários, os pacientes devem permanecer despertos e ser cognitivamente capazes de processar as perguntas. Esse perfil de pacientes pode não ter expressiva representatividade na população da UTI. Outra limitação consiste no fato de que esses instrumentos não são considerados padrão ouro para a avaliação do sono na UTI; entretanto, métodos como a polissonografia são muito complexos para ser utilizados e geram altos custos. Com a intenção de diminuir tais restrições práticas e financeiras, particularmente no ambiente crítico, os questionários tornaram-se uma solução para preencher a lacuna existente na literatura, permitindo a investigação e a implementação de intervenções para melhorar a qualidade do sono em pacientes críticos. Por fim, análises psicométricas, como testes de validação construtiva e de consistência interna desses questionários, são necessárias em estudos futuros.
Em resumo, conclui-se que as versões na língua portuguesa do QSRC e QS-UTI foram metodicamente traduzidas e adaptadas transculturalmente para uso no Brasil, seguindo rígidas metodologias, e apresentaram adequada confiabilidade entre os avaliadores, podendo assim ser utilizadas como importantes ferramentas de avaliação do sono nas UTIs de adultos no Brasil.