Compartilhar

Transplante Cardíaco por Cardiomiopatia Periparto: Uma Experiência de Centro Único

Transplante Cardíaco por Cardiomiopatia Periparto: Uma Experiência de Centro Único

Autores:

Nadia Bouabdallaoui,
Pierre Demondion,
Sylvestre Maréchaux,
Shaida Varnous,
Guillaume Lebreton,
Frédéric Mouquet,
Pascal Leprince

ARTIGO ORIGINAL

Arquivos Brasileiros de Cardiologia

versão impressa ISSN 0066-782Xversão On-line ISSN 1678-4170

Arq. Bras. Cardiol. vol.110 no.2 São Paulo fev. 2018 Epub 19-Fev-2018

https://doi.org/10.5935/abc.20180014

Resumo

Fundamento:

A cardiomiopatia periparto é uma doença idiopática definida pela ocorrência de insuficiência cardíaca aguda durante a gravidez tardia ou pós-parto na ausência de qualquer outra causa definível. Seu curso clínico é variável e casos graves podem exigir transplante. cardíaco.

Objetivo:

Pesquisar os resultados a longo prazo após transplante cardíaco (TC) por cardiomiopatia periparto (CMPP).

Métodos:

De uma única série central de 1938 TC, 14 TC foram realizados por CMPP. Foram avaliadas características clínicas, complicações relacionadas ao transplante e resultados a longo prazo, em comparação com 28 controles pareados por gênero. O principal critério de avaliação foi a morte por qualquer causa; os critérios secundários foram complicações relacionadas ao transplante (rejeição, infecção, vasculopatia do aloenxerto cardíaco). Um valor de p < 0,05 foi considerado estatisticamente significante.

Resultados:

As pacientes com CMPP e controles pareados foram comparáveis ​​para a maioria das variáveis (todos os valores de p > 0,05), exceto para um maior uso de inotrópicos no momento do TC no grupo CMPP (p = 0,03). Durante um seguimento médio de 7,7 anos, 16 pacientes morreram, 3 (21,5%) no grupo CMPP e 13 (46,5%) no grupo controle. A mortalidade foi significativamente menor no grupo CMPP (p = 0,03). Não foram encontradas diferenças significativas em termos de complicações relacionadas ao transplante (p> 0,05).

Conclusões:

Os resultados a longo prazo após TC para CMPP são favoráveis. O transplante cardíaco é uma opção valiosa para pacientes com CMPP que não se recuperaram significativamente sob tratamento médico.

Palavras-chave: Insuficiência Cardíaca; Cardiomiopatias / mortalidade; Período Periparto; Transplante de Coração; Rejeição de Enxerto / mortalidade

Abstract

Background:

Peripartum cardiomyopathy is an idiopathic disorder defined by the occurrence of acute heart failure during late pregnancy or post-partum period in the absence of any other definable cause. Its clinical course is variable and severe cases might require heart transplantation.

Objective:

To investigate long-term outcomes after heart transplantation (HT) for peripartum cardiomyopathy (PPCM).

Methods:

Out of a single-center series of 1938 HT, 14 HT were performed for PPCM. We evaluated clinical characteristics, transplant-related complications, and long-term outcomes, in comparison with 28 sex-matched controls. Primary endpoint was death from any cause; secondary endpoints were transplant-related complications (rejection, infection, cardiac allograft vasculopathy). A value of p < 0.05 was considered of statistical significance.

Results:

PPCM patients and matched controls were comparable for most variables (all p values > 0.05), except for a higher use of inotropes at the time of HT in PPCM group (p = 0.03). During a median follow-up of 7.7 years, 16 patients died, 3 (21.5%) in PPCM group and 13 (46.5%) in control group. Mortality was significantly lower in PPCM group (p = 0.03). No significant difference was found in terms of transplant-related complications (p > 0.05).

Conclusions:

Long-term outcomes following HT for PPCM are favorable. Heart transplantation is a valuable option for PPCM patients who did not recover significantly under medical treatment.

Keywords: Heart Failure; Cardiomyopathies / mortality; Peripartum Period; Heart Transplantation; Graft Rejection. / mortality

Introdução

A cardiomiopatia periparto (CMPP) é definida pela ocorrência de insuficiência cardíaca aguda (IC) durante a gravidez tardia ou pós-parto na ausência de qualquer outra causa definível ou doença cardíaca prévia. Os critérios diagnósticos foram recentemente revisados pelo Grupo de Trabalho ESC sobre CMPP.1 A incidência da doença mostra variações étnicas, com maior prevalência entre as mulheres africanas.2 Uma combinação deletéria de "excesso de sinalização antiangiogênica" e "eixo estresse oxidativo-prolactina" perto do fim da gravidez é sugerido como elemento chave na fisiopatologia da doença.3 Além do tratamento convencional do TC,4 estão sendo investigadas terapias direcionadas, incluindo o bloqueio farmacológico da prolactina.5 Embora a metade das pacientes recuperem completamente a função sistólica do ventrículo esquerdo, o curso clínico da CMPP é muito variável.6,7 Dados das Pesquisas das Cardiomiopatias Associadas à Gravidez (IPAC) avaliaram recentemente uma taxa de mortalidade de 6%, transplante cardíaco e implantação do dispositivo de assistência do ventrículo esquerdo (DAVE) em um 1 ano em pacientes com CMPP e mais de 20% de disfunção persistente do ventrículo esquerdo (VE).6 FEVE inicial < 30%, diâmetro diastólico final VE inicial (DDFVE) > 60 mm, etnia negra e diagnóstico pós-parto foram correlacionados com um prognóstico ruim.6 Até 10% das pacientes com CMPP precisarão de transplante cardíaco de acordo com os dados da literatura.6,8-10 O prognóstico pós-transplante para pacientes com CMPP é ainda contraditório atualmente.11-14 Uma maior incidência de rejeição foi relatada, particularmente durante o primeiro ano após o transplante, juntamente com uma menor sobrevivência do enxerto.13,14 O transplante cardíaco (TC) é, no entanto, considerado como uma opção valiosa para pacientes com CMPP que apresentam IC que não responde ao máximo tratamento convencional. O objetivo deste estudo é comparar a mortalidade por todas as causas e as complicações relacionadas ao transplante após TC para CMPP.

Métodos

Este é um estudo retrospectivo de um único centro não intervencionista. O desfecho primário foi a mortalidade por todas as causas após transplante cardíaco (TC). O desfecho secundário foi o resultado após TC, incluindo complicações relacionadas ao transplante (rejeição, infecção, vasculopatia de aloenxerto cardíaco). Todas as pacientes pertenciam a um único centro e tiveram uma abordagem consistente em ambos níveis, cirúrgico e médico.

População de pacientes

Um total de 1938 pacientes, dos quais 368 mulheres foram transplantadas por IC grave em nossa instituição. Quatorze pacientes preencheram os critérios de diagnóstico de CMPP. Todos os nossos casos de CMPP foram determinados com a definição mais recente da doença.1 Um extenso trabalho foi realizado retrospectivamente para cada paciente para excluir outras causas de insuficiência cardíaca. Vinte e oito pacientes do sexo feminino com idade avançada que realizaram TC durante o mesmo período por outras causas serviram como controles. Cada paciente CMPP foi pareado com duas pacientes do sexo feminino dependendo da idade no momento do transplante (± 5 anos) e da época do transplante (± 6 meses). A sobrevivência foi avaliada até o último acompanhamento. Os dados demográficos, pré e pós-transplante foram recolhidos retrospectivamente nos prontuários médicos informatizados da nossa instituição. As informações sobre o seguimento foram obtidas retrospectivamente por entrevista direta ao paciente para aqueles que ainda estavam vivos no momento da coleta de dados. Como este era um estudo observacional, nosso conselho de ética institucional não estava envolvido.

Curso pós-transplante

Todos os pacientes apresentaram um protocolo similar de seguimento pós-transplante. As biópsias endomiocardiais foram rotineiramente realizadas durante os dois primeiros anos após o TC, depois menos frequentemente (a cada 6 meses para os anos 2 a 5, depois todos os anos após o 5º ano), a menos que tiver indicação clínica. A angiografia coronária foi realizada pela primeira vez no pós transplante de um ano, em seguida, a cada dois anos, se for normal. Consideramos arbitrariamente a rejeição do enxerto como presente ou não presente, independentemente do seu tipo (rejeição mediada por anticorpos ou mediada por células) e gravidade. O diagnóstico de rejeição mediada por células se baseou no sistema de classificação Stanford até 1990,15 depois, na Nomenclatura da Sociedade Internacional de Transplante de Coração e Pulmão (ISHLT;16). As diretrizes ISHLT sobre rejeição mediada por anticorpos (RMA) foram usadas para a definição de rejeições de RMA.17,18 Consideramos a rejeição como "caracterizada" nas seguintes situações: Todas as rejeições mediadas por células de grau > ou = a 1A / 1R; todas as rejeições mediadas por anticorpos comprovadas, independentemente do grau; todas as rejeições sintomáticas, p.e. com compromisso hemodinâmico ou disfunção do VE.19 Todas as rejeições caracterizadas desencadearam intervenções terapêuticas. A vasculopatia de aloenxerto cardíaco (VAC) foi considerada no cenário de qualquer evidência angiográfica de estenose da artéria coronária independentemente da necessidade de tratamento específico.20 Infecções foram definidas como qualquer episódio que requeresse hospitalização ou tratamento intravenoso, incluindo infecções por citomegalovírus (CMV).

A terapia imunossupressora e os tratamentos de rejeição variaram ao longo do tempo. A terapia de indução incluiu metilprednisolona intravenosa e globulina anti-timócito de coelho de 1986 a 2000; e globulina antitimocítica ou Basiliximab desde 2000. A terapia imunossupressora profilática a longo prazo, foi baseada em inibidores da calcineurina (principalmente ciclosporina), azatioprina e corticosteroides orais de longo prazo de 1986 a 2000; e inibidores da calcineurina (ciclosporina ou tacrolimus), micofenolato de mofetil e corticosteroides orais desde 2000. O Everolimus não foi rotineiramente utilizado na população estudada. Devemos destacar que nenhum dos pacientes do grupo CMPP recebeu Bromocriptina.

Considerações estatísticas e análise

Os dados são apresentados como média ± desvio padrão, a menos que seja especificado de outra forma. As comparações entre grupos para variáveis contínuas foram realizadas utilizando o teste t de Student ou o teste U de Mann Whitney conforme apropriado. O teste do qui-quadrado ou o teste exato de Fisher foram usados para variáveis categóricas conforme apropriado. A duração do seguimento foi calculada usando o método Kaplan Meier. A sobrevivência foi definida como estando viva na data-limite para o nosso estudo sem a necessidade de um retransplante. As curvas de sobrevivência de Kaplan-Meier foram construídas para os dois grupos e comparadas usando o teste de log rank. Um valor de p < 0,05 foi considerado de significância estatística. Todas as análises foram realizadas com o uso do software SPSS 18.0 (Chicago, Illinois).

Resultados

Características pré-transplante

As características pré-transplante estão resumidas nas Tabelas 1 e 2. Pacientes no grupo controle foram transplantados por: dilatados idiopáticos (n = 10, 36%), isquêmicos (n = 8, 28,5%), congênitos (n = 1, 3,5%). (n = 2, 7,1%), valvulares (n = 2, 7,1%) e cardiomiopatias (n = 3, 10,7%) ou miocardite (n = 2, 7,1%) induzidas por antraciclinas. Houve significativamente mais pacientes que necessitaram de inotrópicos no grupo CMPP (n = 9, 64% em pacientes com CMPP versus n = 8, 28% nos controles, p = 0,03). As pacientes que necessitaram de suporte hemodinâmico foram indiscriminadamente aquelas recentemente diagnosticados com CMPP e prontamente apresentando choque cardiogênico (n = 4/9), mas também aquelas com CMPP conhecida há muito tempo e gradualmente avançando para a insuficiência cardíaca em estágio final (n = 5/9). Por outro lado, no grupo de controle, as pacientes que necessitaram de suporte inotrópico eram mais frequentemente aquelas que foram recentemente (< 1 ano) diagnosticadas com IC.

Tabela 1 Características gerais dos pacientes CMPP 

Pacientes CMPP Tempo desde o diagnóstico até o TC Tempo na lista de espera Idade no TC (anos) FEVE (%) Inotrópicos BIA ECMO (P + C) VAD Pareados
1 19 anos 1 mês 49 30 S N N N N
2 2 anos 18 meses 30 15 N N N N N
3 8 anos < 1 mês 36 25 S N N N N
4 10 meses 1 mês 39 25 N N N N N
5 5 meses < 1 mês 35 10 S N N S N
6 3 meses < 1 mês 35 23 N N N N N
7 13 anos < 1 mês 44 20 S N N N N
8 1 mês < 1 mês 33 14 S N N N NA
9 4 meses 1 mês 29 15 S S S N N
10 4 anos 9 meses 34 32 S N S S N
11 15 anos 2 meses 47 25 N N N N N
12 1 ano < 1 mês 27 10 N N N N NA
13 9 meses < 1 mês 37 25 S N N N NA
14 1 ano 2 meses 39 35 S N N N N

FEVE: Fração de ejeção do ventrículo esquerdo; BIA: balão intra-aórtico contrapulsação; ECMO (P + C): Oxigenação extracorpórea por membrana (periférica + central); VAD: Dispositivo de assistência ventricular; S: Sim; N: Não; NA: Não aplicável; ano: ano; m: mês.

Tabela 2 Características pré-transplante no grupo CMPP e indivíduos controle 

Variável Grupo CMPP (n = 14) Grupo Controle grupo (n = 28) p
Idade no transplante, anos 36,7 ± 6,5 38,4 ± 8,5 p = 0,4
Gravidez anterior 100% (n = 14) 50% (n = 14) p = 0,3
Fumante 21% (n = 3) 42.8% (n = 12) p = 0,1
Hipertensão 7% (n = 1) 7% (n = 2) p = 0,7
Betabloqueadores 50% (n = 7) 42,8% (n = 12) p = 0,5
Inibidores de ECA 50% (n = 7) 75% (n = 21) p = 0,6
Tempo na lista de espera, meses 2,4 ± 5 3,8 ± 5 p = 0,1
FEVE (%) 22 ± 8 24 ± 14 p = 0,9
Inotrópicos 64% (n = 9) 28,57% (n = 8) p = 0,03
BIA 7% (n = 1) 7% (n = 2) p = 0,7
ECMO 14% (n = 2) 25% (n = 7) p = 0,5
VAD 14% (n = 2) 7% (n = 2) p = 0,4

CMPP: cardiomiopatia periparto; FEVE: Fração de ejeção do ventrículo esquerdo; VD: ventrículo direito; BIA: balão intra-aórtico de contrapulsação; ECMO (P + C): oxigenação extracorpórea por membrana (periférica + central); VAD: dispositivo de assistência ventricular. (Comparações entre grupos para variáveis contínuas foram realizadas utilizando o teste t de Student ou o teste U de Mann Whitney conforme apropriado).

Não encontramos nenhuma diferença significativa a considerar a descendência africana; o tempo passado na lista de espera do transplante; disfunção ventricular direita; e gravidade da IC no momento do diagnóstico. Não houve diferença significativa no tratamento da IC, particularmente em termos de inibidores de ECA ou administração de beta-bloqueadores e taxas de implantação de desfibrilador cardioversor interno (DCI) da terapia de ressincronização cardíaca (TRC) / desfibrilador interno (DI).

Em relação à indicação de suporte circulatório mecânico (SCM), não foi observada diferença significativa. No grupo CMPP, um paciente teve a instalação de balão intra-aórtico de contrapulsação (BIA), dois tiveram oxigenação periférica extracorpórea por membrana (ECMO), um teve um dispositivo de assistência ventricular de longo prazo e um teve implantação cardíaca artificial total CardioWest. No grupo de controle, dois pacientes foram submetidos a BIA, sete tiveram ECMO periféricas ou centrais e dois DAVs de longo prazo.

Características do enxerto e tratamentos imunossupressores

As características do enxerto foram semelhantes nos dois grupos. A duração média da isquemia foi de 159 ± 12 minutos no grupo CMPP versus 178 ± 13 minutos no grupo controle. A média de idade do dador foi de 45 anos para receptores de CMPP e 46 anos para controles. Não observamos diferença significativa em termos de incompatibilidade de gênero. Quando as pacientes foram pareadas por período de transplante, não houve diferença na terapia imunossupressora.

Resultado dos pacientes

Durante um acompanhamento médio de 7,7 anos, 16 pacientes morreram, 3 (21,5%) no grupo CMPP e 13 (46,5%) no grupo controle. A mortalidade foi significativamente menor no grupo CMPP (p = 0,03, Figura 1). As causas da morte são mostradas na Tabela 3. As principais causas de mortalidade de um ano após TC foram rejeição, complicações hemorrágicas e infecções; principais causas de mortalidade a longo prazo (> 1 ano) após TC foram rejeição, VAC e infecções. As taxas de rejeição precoce e tardia foram semelhantes nos dois grupos (p = 0,5 e 0,6, respectivamente). As pacientes com CMPP apresentaram incidência semelhante de infecções, incluindo infecções por citomegalovírus (CMV) em comparação com a população de controle (p = 0,07). Duas pacientes do grupo controle morreram no primeiro ano após transplante por choque séptico e nenhum no grupo CMPP. Mais uma paciente no grupo de controle morreu por choque séptico além do transplante após 1 ano e nenhum no grupo CMPP. As pacientes com CMPP tiveram um risco semelhante de VAC em comparação com o grupo controle (p = 0,4). O estudo patológico de corações explantados não revelou nenhuma lesão específica.

Tabela 3 Complicações relacionadas ao transplante e causas da morte 

Complicações relacionadas ao transplante Grupo CMPP (n=14) Grupo Controle (n=28) p
Rejeição:
Rejeições tratadas < 1 ano pós transplante 50% (n = 7) 50% (n = 14) p = 0,5
Rejeições tratadas > transplante pós-1 ano 71% (n = 10) 50% (n = 14) p = 0,6
Taxa de infecção 35,7% (n = 5) 64,3% (n = 18) p = 0,07
VAC 50% (n = 7) 35,7% (n = 10) p = 0,4
Morte: mortalidade precoce por todas as causas (< 1 ano) 7% (n = 1) 21,4% (n = 6) p = 0,06
Rejeição n = 0 n = 1
Infecção n = 0 n = 2
VAC n = 0 n = 0
Complicações hemorrágicas n = 1 n = 2
Complicações tromboembólicas n = 0 n = 1
Morte: mortalidade tardia por todas as causas (> 1 ano) 21,4% (n = 3) 46,4% (n = 13) p = 0,07
Rejeição n = 1 n = 2
Infecção n = 0 n = 3
VAC n = 1 n = 4
Complicações hemorrágicas n = 1 n = 2
Complicações tromboembólicas n = 0 n = 1
Neoplasia n = 0 n = 1
Desconhecidas n = 1 n = 0

VAC: vasculopatia de aloenxerto cardíaco (as comparações entre grupos para variáveis contínuas foram realizadas usando o teste t de Student ou o teste U de Mann Whitney conforme apropriado).

Figura 1 sobrevivência a longo prazo após transplante cardíaco, grupo CMPP (CMPP (+)) e pacientes controle (CMPP (-)). CMPP: cardiomiopatia periparto. 

Discussão

Neste estudo retrospectivo de centro único, avaliamos os resultados pós-transplante em uma população de pacientes transplantados por insuficiência cardíaca grave no cenário de cardiomiopatia periparto. O acompanhamento médio foi de 7,7 anos. Demonstramos em nossa população que a mortalidade pós-transplante é significativamente menor em pacientes transplantadas por CMPP. As pacientes transplantadas por CMPP não mostraram uma taxa significativamente maior de complicações relacionadas ao transplante em comparação com os indivíduos de controle correspondentes para idade e período de transplante.

Características pré-transplante

Na configuração pré-transplante, utilizamos significativamente mais inotrópicos no momento da TC em pacientes com CMPP em comparação com os indivíduos controle. A necessidade frequente de suporte cardiovascular médico intensivo em pacientes com CMPP que aguardam transplante cardíaco também foi demonstrada por outros.13 É importante destacar que alterações celulares potencialmente deletérias relacionadas à Dobutamina foram recentemente apontadas em pacientes com CMPP,21 e orientações recentes recomendam um uso cauteloso de inotrópicos para pacientes CMPP criticamente doentes.22 Os dados relacionados à SCM no tratamento de pacientes com CMPP são escassos.23,24 Parece, no entanto, que a SCM é uma opção para pacientes que se deterioram apesar da terapia máxima, em uma estratégia de ponte para transplante ou para recuperação.6,22-25 Não há dúvida de que uma grande preocupação no estabelecimento de SCM de longo prazo em pacientes com CMPP se relaciona com um risco possivelmente maior de complicações trombóticas em uma condição protrombótica, como o período periparto.26

O tratamento médico da IC pode ser considerado não ótimo em nossa população, particularmente entre pacientes com CMPP, pois apenas metade recebeu betabloqueadores e inibidores da ECA. Para destacar, as pacientes subtratadas eram, em ambos os grupos, aquelas que necessitavam de suporte circulatório inotrópico e mecânico.

Sete por cento (7%) das pacientes tinham implantação de TRC/DCI. Dados recentes sugerem que TRC é crucial no tratamento de pacientes com CMPP com disfunção sistólica persistente. De fato, foi demonstrada uma recuperação rápida e significativa do VE sob TRC em pacientes com CMPP com disfunção sistólica severa apesar da terapia médica ideal.27

Resultados dos pacientes após transplante cardíaco

Avaliamos os resultados pós-transplante em pacientes transplantadas por CMPP. Mais uma vez, demonstramos uma mortalidade por todas as causas pós-transplante significativamente menor em pacientes transplantadas por CMPP, com uma taxa similar de complicações relacionadas ao transplante em comparação com indivíduos controle. Os dados sobre os resultados a longo prazo após TC para CMPP são contraditórios, relatando resultados favoráveis,11 ou maiores taxas de rejeição e resultados mais pobres.12-14 A prática atual é, no entanto, favorável ao TC para CMPP. Como nós fizemos, uma pesquisa de longo prazo sobre uma pequena coorte de pacientes transplantadas por CMPP mostrou resultados favoráveis.23

Limitações

A principal limitação do nosso estudo é o pequeno número de pacientes, que não permite conclusões definitivas. Nós arbitrariamente julgamos a rejeição de maneira binária (presente: sim ou não), o que pode ser considerado como simplista e de valor limitado.

Conclusão

Avaliamos os resultados pós-transplante a longo prazo na presença da CMPP. Na população estudada, demonstramos uma mortalidade pós-transplante de longo prazo significativamente menor em pacientes transplantadas por CMPP, com uma taxa similar de complicações relacionadas ao transplante em comparação com indivíduos controle. Mostramos que o transplante de coração para pacientes com CMPP que não recuperaram significativamente sob tratamento médico máximo permanece apropriado. O impacto global do transplante de coração para CMPP ainda não foi determinado em uma escala maior em uma população bem caracterizada.

REFERÊNCIAS

1 Sliwa K, Hilfiker-Kleiner D, Petrie MC, Mebazaa A, Pieske B, Buchmann E, et al. Heart Failure Association of the European Society of Cardiology Working Group on Peripartum Cardiomyopathy. Current state of knowledge on aetiology, diagnosis, management, and therapy of peripartum cardiomyopathy: a position statement from the Heart Failure Association of the European Society of Cardiology Working Group on peripartum cardiomyopathy. Eur J Heart Fail. 2010;12(8):767-78. doi: 10.1093/eurjhf/hfq120.
2 Fett JD, Christie LG, Carraway RD, Murphy JG. Five-year prospective study of the incidence and prognosis of peripartum cardiomyopathy at a single institution. Mayo Clin Proc. 2005;80(12):1602-6. doi: 10.4065/80.12.1602.
3 Hilfiker-Kleiner D, Sliwa K. Pathophysiology and epidemiology of peripartum cardiomyopathy. Nat Rev Cardiol. 2014;11(6):364-70. doi: 10.1038/nrcardio.2014.37.
4 Ponikowski P, Voors AA, Anker SD, Bueno H, Cleland JG, Coats AJ, et al; Authors/Task Force Members. 2016 ESC Guidelines for the diagnosis and treatment of acute and chronic heart failure: The Task Force for the diagnosis and treatment of acute and chronic heart failure of the European Society of Cardiology (ESC). Developed with the special contribution of the Heart Failure Association (HFA) of the ESC. Eur J Heart Fail. 2016;18(8):891-975. doi: 10.1002/ejhf.592.
5 Sliwa K, Blauwet L, Tibazarwa K, Libhaber E, Smedema JP, Becker A, et al. Evaluation of bromocriptine in the treatment of acute severe peripartum cardiomyopathy: a proof-of-concept pilot study. Circulation. 2010;121(13):1465-73. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.109.901496.
6 McNamara DM, Elkayam U, Alharethi R, Damp J, Hsich E, Ewald G, et al; IPAC Investigators. Clinical outcomes for peripartum cardiomyopathy in North America: results of the IPAC Study (Investigations of Pregnancy-Associated Cardiomyopathy). J Am Coll Cardiol. 2015;66(8):905-14. doi: 10.1016/j.jacc.2015.06.1309.
7 Goland S, Bitar F, Modi K, Safirstein J, Ro A, Mirocha J, et al. Evaluation of the clinical relevance of baseline left ventricular ejection fraction as a predictor of recovery or persistence of severe dysfunction in women in the United States with peripartum cardiomyopathy. J Card Fail. 2011;17(5):426-30. doi: 10.1016/j.cardfail.2011.01.007.
8 Mielniczuk LM, Williams K, Davis DR, Tang AS, Lemery R, Green MS, et al. Frequency of peripartum cardiomyopathy. Am J Cardiol. 2006;97(12):1765-8. doi: 10.1016/j.amjcard.2006.01.039.
9 Duran N, Günes H, Duran I, Biteker M, Ozkan M. Predictors of prognosis in patients with peripartum cardiomyopathy. Int J Gynaecol Obstet. 2008;101(2):137-40. doi: 10.1016/j.ijgo.2007.11.007.
10 Amos AM, Jaber WA, Russell SD. Improved outcomes in peripartum cardiomyopathy with contemporary. Am Heart J. 2006;152(3):509-13. doi: 10.1016/j.ahj.2006.02.008.
11 Rickenbacher PR, Rizeq MN, Hunt SA, Billingham ME, Fowler MB. Long-term outcome after heart transplantation for peripartum cardiomyopathy. Am Heart J. 1994;127(5):1318-23. PMID: 8172060.
12 Keogh A, Macdonald P, Spratt P, Marshman D, Larbalestier R, Kaan A. Outcome in peripartum cardiomyopathy after heart transplantation. J Heart Lung Transplant. 1994;13(2):202-7. PMID: 8031800.
13 Rasmusson K, Brunisholz K, Budge D, Horne BD, Alharethi R, Folsom J, et al. Peripartum cardiomyopathy: post-transplant outcomes from the United Network for Organ Sharing Database. J Heart Lung Transplant. 2012;31(2):180-6. doi: 10.1016/j.healun.2011.11.018.
14 Rasmusson KD, Stehlik J, Brown RN, Renlund DG, Wagoner LE, Torre-Amione G, et al; Cardiac Transplant Research Database Group. Long-term outcomes of cardiac transplantation for peri-partum cardiomyopathy: a multiinstitutional analysis. J Heart Lung Transplant. 2007;26(11):1097-104. doi: 10.1016/j.healun.2007.08.002.
15 Billingham ME. Dilemma of variety of histopathologic grading systems for acute cardiac allograft rejection by endomyocardial biopsy. J Heart Transplant. 1990;9(3 Pt 2):272-6. PMID: 2355282.
16 Stewart S, Winters GL, Fishbein MC, Tazelaar HD, Kobashigawa J, Abrams J, et al. Revision of the 1990 working formulation for the standardization of nomenclature in the diagnosis of heart rejection. J Heart Lung Transplant. 2005;24(11):1710- 20. doi: 10.1016/j.healun.2005.03.019.
17 Kobashigawa J, Crespo-Leiro MG, Ensminger SM, Reichenspurner H, Angelini A, Berry G, et al; Consensus Conference Participants. Consensus Conference Participants. Report from a consensus conference on antibody-mediated rejection in heart transplantation. J Heart Lung Transplant. 2011;30(3):252-69. doi: 10.1016/j.healun.2010.11.003.
18 Berry GJ, Burke MM, Andersen C, Bruneval P, Fedrigo M, Fishbein MC, et al. The 2013 International Society for Heart and Lung Transplantation Working Formulation for the standardization of nomenclature in the pathologic diagnosis of antibody-mediated rejection in heart transplantation. J Heart Lung Transplant. 2013;32(12):1147-62. doi: 10.1016/j.healun.2013.08.011.
19 Stobierska-Dzierzek B, Awad H, Michler RE. The evolving management of acute right-sided heart failure in cardiac transplant recipients. J Am Coll Cardiol. 2001;38(4):923-31. PMID: 11583860.
20 Mehra MR, Crespo-Leiro MG, Dipchand A, Ensminger SM, Hiemann NE, Kobashigawa JA, et al. International Society for Heart and Lung Transplantation working formulation of a standardized nomenclature for cardiac allograft vasculopathy-2010. J Heart Lung Transplant. 2010;29(7):717-27. doi: 10.1016/j.healun.2010.05.017. Erratum in: J Heart Lung Transplant. 2011;30(3):360.
21 Stapel B, Kohlhaas M, Ricke-Hoch M, Haghikia A, Erschow S, Knuuti J, et al. Low STAT3 expression sensitizes to toxic effects of b-adrenergic receptor stimulation in peripartum cardiomyopathy. Eur Heart J. 2017;38(5):349-361. doi: 10.1093/eurheartj/ehw086.
22 Bauersachs J, Arrigo M, Hilfiker-Kleiner D, Veltmann C, Coats AJ, Crespo-Leiro MG, et al. Current management of patients with severe acute peripartum cardiomyopathy: practical guidance from the Heart Failure Association of the European Society of Cardiology Study Group on peripartum cardiomyopathy. Eur J Heart Fail. 2016;18(9):1096-105. doi: 10.1002/ejhf.586.
23 Gevaert S, Van Belleghem Y, Bouchez S, Herck I, De Somer F, De Block Y, et al. Acute and critically ill peripartum cardiomyopathy and 'bridge to' therapeutic options: a single center experience with intra-aortic balloon pump, extracorporeal membrane oxygenation and continuous-flow left ventricular assist devices. Crit Care. 2011;15(2):R93. doi: 10.1186/cc10098.
24 Lueck S, Sindermann J, Martens S, Scherer M. Mechanical circulatory support for patients with peripartum cardiomyopathy. J Artif Organs. 2016;19(3):305-9. doi: 10.1007/s10047-016-0891-z.
25 Simon MA, Kormos RL, Murali S, Nair P, Heffernan M, Gorcsan J, et al. Myocardial recovery using ventricular assist devices: prevalence, clinical characteristics, and outcomes. Circulation. 2005;112(9 Suppl):I32-6. doi: 10.1161/CIRCULATIONAHA.104.524124.
26 Potapov EV, Loforte A, Weng Y, Jurmann M, Pasic M, Drews T, et al. Experience with over 1000 implanted ventricular assist devices. J Card Surg. 2008;23(3):185-94. doi: 10.1111/j.1540-8191.2008.00606.x.
27 Mouquet F, Mostefa Kara M, Lamblin N, Coulon C, Langlois S, Marquie C, et al. Unexpected and rapid recovery of left ventricular function in patients with peripartum cardiomyopathy: impact of cardiac resynchronization therapy. Eur J Heart Fail. 2012;14(5):526-9. doi: 10.1093/eurjhf/hfs031.