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Tratamento por Balão Farmacológico de Trombose de Stent Muito Tardia Causada por Neoaterosclerose Complicada

Tratamento por Balão Farmacológico de Trombose de Stent Muito Tardia Causada por Neoaterosclerose Complicada

Autores:

Fernando Alfonso,
Teresa Bastante,
Javier Cuesta,
Amparo Benedicto,
Fernando Rivero

ARTIGO ORIGINAL

Arquivos Brasileiros de Cardiologia

versão impressa ISSN 0066-782Xversão On-line ISSN 1678-4170

Arq. Bras. Cardiol. vol.106 no.6 São Paulo jun. 2016

https://doi.org/10.5935/abc.20160089

Resumo

Descrevemos o tratamento de um paciente apresentando trombose de stent muito tardia com a utilização de um balão farmacológico. Nesse paciente, a tomografia de coerência ótica revelou que a neoaterosclerose apresentava-se complicada e com ruptura, sendo portanto o substrato subjacente responsável pelo episódio de trombose de stent muito tardia. O uso potencial de balões farmacológicos nesse cenário especial é discutido.

Palavras-chave: Doença da Artéria Coronariana; Intervenção Coronária Percutânea; Stents Farmacológicos/efeitos adversos; Reestenose Coronária; Trombose Coronária/complicações

Abstract

We describe the treatment of a patient presenting with very-late stent thrombosis with the use of a drug-coated balloon. In this patient, optical coherence tomography disclosed that ruptured and complicated neoatherosclerosis was the underlying substrate responsible for the episode of very-late stent thrombosis. The potential use of drug-coated balloons in this unique scenario is discussed.

Keywords: Coronary Artery Disease; Percutaneous Coronary Intervention; Drug-Eluting Stents/adverse effects; Coronary Restenosis; Coronary Thrombosis/complications

Introdução

A reestenose intra-stent (RIS) e a trombose de stent permanecem as principais causas de falha do stent1-3. A RIS é geralmente o resultado da grave proliferação de células de músculo liso, mas dados recentes sugerem que a neoaterosclerose também pode ser o substrato patológico responsável3. O tratamento de pacientes com RIS geralmente envolve o uso de stents ou balões farmacológicos (BF)3. Alternativamente, a trombose de stent pode ocorrer como resultado da oclusão trombótica súbita de um stent anteriormente patente ou resultar de neoaterosclerose rompida com trombose associada. O tratamento de trombose de stent é bastante desafiador e inclui tratamento agressivo com angioplastia por balão ou reimplantação do stent1.

No entanto, que seja de nosso conhecimento, o uso do BF em pacientes com trombose de stent, como resultado de neoaterosclerose complicada, não foi relatada até o momento.

Relato de Caso

Um homem de 64 anos com hipercolesterolemia foi admitido devido a episódio prolongado (3 horas) de dor torácica em repouso associado a náuseas. Quatorze anos antes, ele havia recebido um stent não-farmacológico (SNF) devido a uma lesão grave na porção média da artéria coronária descendente anterior esquerda. Na admissão, o ECG mostrou extensa inversão da onda T nas derivações anteriores. A angiografia coronária de urgência revelou uma lesão focal grave e excêntrica, com certa opacidade, no segmento médio do stent, causando um fluxo coronário TIMI 2 (Figura 1A). A tomografia de coerência óptica (TCO) revelou um stent bem expandido e aposto, adequadamente coberto por um fino anel de neoíntima homogênea e brilhante nos segmentos proximal e distal do stent. No entanto, a neoaterosclerose (neoíntima brilhante recobrindo grandes concentrações de lipídios [+] sombreando as hastes subjacentes do stent) foi prontamente reconhecida na porção média do stent (Figura 2A). Além disso, uma óbvia ruptura confinada da capa fibrosa também foi identificada (setas amarelas, Figure 2B) nas proximidades de uma placa oclusiva de lipídios associada com um grande trombo vermelho (Figure 2C). A tromboaspiração foi bem sucedida em melhorar a imagem angiográfica e o fluxo coronário; no entanto, obteve apenas uma quantidade limitada de trombo vermelho. Dilatação de alta pressão (22 bar) com um balão não complacente resultou em bom resultado angiográfico. Em seguida, o BF (3 mm de diâmetro) foi inflado por 60 segundos nesse local, com excelente resultado angiográfico final e sem imagens de dissecções residuais (Figura 1B). A TCO confirmou um grande lúmen e neoíntima residual fina ao longo de todo o segmento do stent, mas revelou algumas dissecações menores intra-stent (setas brancas, Figura 2D, E, F) e alguns pequenos trombos repletos residuais em locais com neoaterosclerose residual. O paciente teve um desfecho clínico sem intercorrências (pico de troponina T 427 ug/L) e recebeu alta dois dias depois.

Figura 1 A) Angiografia coronária em projeção cranial mostrando uma lesão cerrada (resultando em um defeito de enchimento luminal) na parte média do stent (seta) na porção proximal da artéria coronária descendente anterior que tinha um fluxo TIMI 2. B) Resultado final após angioplastia com BF. 

Figura 2 Tomografia de coerência óptica após tromboaspiração. A) neoaterosclerose com neointima brilhante e um padrão heterogêneo causado por grandes concentrações de lipídios (+). Observe que a atenuação impede a visualização adequada das hastes dos stents metálicos subjacentes. B) Placa de neoaterosclerose rompida (setas). C) Neoaterosclerose oclusiva com trombo. D, E, F) Tomografia de coerência óptica após o tratamento com BF. Um grande lúmen foi visualizado ao longo de todo o comprimento do stent com neoíntima residual, pequenas dissecções e trombos residuais (setas). Zonas de lipídios residuais confinados (+) ainda foram reconhecidas dentro do stent. (* = Indica artefato fio). 

Discussão

A trombose de stent muito tardia continua a ser uma complicação rara, mas devastadora em pacientes submetidos a intervenções coronárias percutâneas1. Estudos recentes sugerem que a neoaterosclerose desempenha um papel importante em pacientes selecionados que apresentam essa grave complicação2. Estudos patológicos sugerem que a neoaterosclerose não só ocorre com mais frequência, mas também mais precocemente em pacientes tratados com stents farmacológicos, em comparação com aqueles que receberam stents não-farmacológicos convencionais2. Hoje em dia a TCO, com a sua resolução especial (15 µm), representa a técnica de escolha para o diagnóstico de neoaterosclerose. Vários estudos confirmaram a importância da TCO no diagnóstico de neoaterosclerose que resulta em reestenose intra-stent ou em trombose de stent1,3. Da mesma forma, o uso do BF em pacientes com reestenose intra-stent tem sido bem estabelecido3. Embora a neoaterosclerose constitua o substrato subjacente em alguns desses pacientes, principalmente naqueles tratados com stents farmacológicos, o papel do BF neste subconjunto anatómico específico ainda precisa ser elucidado. Nossos resultados fortemente sugerem que o BF também pode ser uma estratégia terapêutica atraente para pacientes selecionados com trombose de stent muito tardia, como resultado da neoaterosclerose. São necessários estudos prospectivos para melhor definir o papel potencial dessa nova terapia nesse cenário desafiador.

Conclusão

O BF constitui uma estratégia terapêutica atraente para pacientes selecionados com trombose de stent como resultado de neoaterosclerose complicada.

REFERÊNCIAS

1 Alfonso F, Sandoval J. New insights on stent thrombosis: in praise of large nationwide registries for rare cardiovascular events. JACC Cardiovasc Interv. 2012;5(2):141-4.
2 Nakazawa G, Otsuka F, Nakano M, Vorpahl M, Yazdani SK, Ladich E, et al. The pathology of neoatherosclerosis in human coronary implants bare-metal and drug-eluting stents. J Am Coll Cardiol. 2011;57(11):1314-22.1.
3 Alfonso F, Byrne RA, Rivero F, Kastrati A. Current treatment of in-stent restenosis. J Am Coll Cardiol. 2014;63(24):2659-73.