versão On-line ISSN 2316-9117
Fisioter. Pesqui. vol.23 no.3 São Paulo jul./set. 2016
http://dx.doi.org/10.1590/1809-2950/15703523032016
Es constante en investigaciones el tema sobre la evaluación del desarrollo infantil a través del cribado. Pero poco se sabe respeto de la realización y de los resultados generados en estos estudios en ámbito local. Para evaluar las investigaciones que estudiaron el desarrollo neuropsicomotor de niños brasileños por intermedio de la Prueba de Tamizaje del Desarrollo de Denver II, se llevó a cabo una revisión sistemática de literatura desde las recomendaciones PRISMA, en las bases de datos MEDLINE, LILACS, SciELO, Scopus, PubMed y Web of Science, en la cual se incluyeron artículos de investigación originales que evaluaron a los niños brasileños típicos y atípicos a través de la prueba de Denver II, publicados entre 2005 y 2015 en lengua inglesa y en portugués brasileño. De los 1.016 estudios hallados y tras la lectura de sus resúmenes y títulos, se eligieron 67 estudios de los cuales resultaron en 31, por estar bajo los criterios de inclusión. La mayoría de los trabajos evaluó el desarrollo de niños típicos en ambulatorios, moradores en la región Sudeste de Brasil y que tenían hasta 3 años de edad, y empleó abordajes de investigación transversal. El porcentaje de sospechas de retraso o retrasos en el desarrollo de niños típicos osciló entre 0 y 46,3%, y de los niños atípicos de 14,2 a 100%. Se observó que hay distintos factores de riesgo y elevados porcentuales de sospecha y retrasos en el desarrollo neuropsicomotor infantil, lo que muestra la necesidad de servicios de cribado estandarizados y distribuidos en la mayor parte del país. Los datos mencionados en este trabajo pueden proponer acciones de prevención a riesgos y retrasos en el desarrollo de niños brasileños.
Palabras clave: Desarrollo Infantil; Triaje
A triagem do desenvolvimento neuropsicomotor (DNPM) infantil refere-se ao processo de aplicação de testes em uma ampla população de crianças, a fim de detectar de forma prática e padronizada riscos ou atrasos no desenvolvimento1)- (3. Em relação aos fatores associados a atrasos, destacam-se aspectos que vão desde concepção, gravidez e parto, até causas neurológicas, má nutrição, fatores ambientais, familiares e socioeconômicos, ocasionando condições de atraso permanentes ou transitórias, pressupondo um acompanhamento infantil adequado e periódico3)- (7. Apesar de sua importância, poucos são os estudos nacionais, em especial de revisão sistemática da literatura, que apresentam como tema questões referentes à vigilância do desenvolvimento de crianças, tanto típicas como atípicas, e seus desfechos2), (3), (8), (9.
Dentre os principais instrumentos de triagem do DNPM utilizado em estudos nacionais, destaca-se o Teste de Triagem de Desenvolvimento Denver II (TTDD II), devido a sua praticidade, baixo custo e rápida aplicação em relação aos demais instrumentos existentes2), (5), (7)- (12. O TTDD II avalia as áreas pessoal-social, motricidade fina e ampla e linguagem, podendo ser aplicado em crianças de 0 a 6 anos, classificando-as como normais ou em suspeita de atraso de desenvolvimento.
Este estudo consiste em uma revisão sistemática da literatura baseada no modelo population, intervention comparison, outcome (PICO) (13, visando verificar estudos acerca da avaliação do DNPM de crianças brasileiras mediante o TTDD II e propor ações preventivas aos riscos e atrasos de desenvolvimento com base na análise de estudos empíricos já realizados. Este estudo destaca-se por traçar um panorama inédito da literatura nacional acerca da análise do desenvolvimento de crianças brasileiras típicas e atípicas por meio de triagens já realizadas.
Nesse sentido, espera-se contribuir com a sugestão de metodologias de pesquisa que utilizem procedimentos de triagem do desenvolvimento infantil, buscando identificar os fatores de risco prevalentes nas populações avaliadas e as regiões brasileiras onde as crianças têm sido menos consideradas para esse tipo de pesquisa.
Esta revisão está adequada ao modelo PRISMA13, o que compreende as fases de escolha das fontes de dados, eleição dos descritores, busca de artigos, análise dos títulos e resumos, leitura dos textos na íntegra, adoção de critérios de inclusão e exclusão, extração dos dados e avaliação das publicações selecionadas.
Foram incluídos artigos pertencentes às bases de dados MEDLINE, LILACS, SciELO, Scopus, PubMed e Web of Science, publicados entre janeiro de 2005 e julho de 2015, pois se pretendeu analisar aspectos mais atuais relacionados ao DNPM em crianças brasileiras. Foram utilizados termos presentes nos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e alguns termos livres: (desenvolvimento neuropsicomotor OR desenvolvimento infantil OR triagem) AND (Denver II OR teste Denver II OR Teste de Triagem de Desenvolvimento Denver II) AND (Brasil) e seus equivalentes em língua inglesa, com todos os cruzamentos possíveis de descritores.
Os artigos baixados foram adicionados ao software Mendley Desktop para verificação de duplicidade. Após esse procedimento, títulos e resumos foram lidos e, posteriormente, foi realizada leitura integral dos mesmos para a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, sempre por dois pesquisadores de forma independente.
Os critérios de inclusão adotados foram: estudos originais empíricos em português ou inglês, texto completo disponível para download gratuito e estudos que utilizaram o TTDD II para avaliar crianças brasileiras saudáveis (típicas) ou com alguma condição patológica (atípicas). Foram excluídos estudos com crianças não brasileiras ou avaliadas por outro teste de triagem e validação de instrumentos.
Após essa fase foram extraídas informações das variáveis "região e contexto de realização do estudo", "aspectos metodológicos", "utilização de instrumentos complementares" e "desfecho observado pelo TTDD II", as quais foram então inseridas em planilha eletrônica Excel também pelos mesmos dois pesquisadores em dupla entrada. Posteriormente, os estudos foram avaliados por um teste de relevância (TR) por três juízes externos, a fim de analisar a qualidade metodológica e a existência de possíveis vieses de pesquisa, decidindo pela inclusão ou não de cada estudo à revisão.
Por fim, aplicou-se fórmula para o cálculo do índice de confiabilidade (IC) entre os juízes, proposta por Polit et al. (14: IC= [(número de acordos) × 100] ÷ [(número de acordos) + (número de desacordos)], considerando-se aceitável IC≥80%. Neste estudo, obteve-se IC de 93,33% sendo, portanto, considerado passível de credibilidade.
Foram encontrados 1.016 estudos. Após a leitura dos títulos e resumos, restaram 67 estudos, em que foram aplicados os critérios de inclusão e exclusão pela leitura dos textos na íntegra, resultando em um total de 31 artigos submetidos ao TR entre os juízes. Estes decidiram pela inclusão dos 31 estudos à revisão (Figura 1).
Houve predomínio de estudos realizados na região Sudeste e em contextos ambulatoriais (Tabela 1). A maioria utilizou abordagens transversais, com pequenas amostras de crianças típicas de até 3 anos (Tabela 2). Quanto à utilização de outros instrumentos, predominou-se o uso de questionários socioeconômicos (Tabela 3).
Distribuição por regiões | N |
---|---|
Sudeste4),(6),(7),(15)-(28 | 17 |
Sul5),(8),(18),(29)-(33 | 8 |
Nordeste10),(34),(35 | 3 |
Centro-Oeste11),(36 | 2 |
Norte37 | 1 |
Total | 31 |
Contextos | |
Ambulatórios5)-(8),(16)-(18),(24),(28)-(32),(37 | 16 |
Creches e pré-escolas públicas4),(10),(11),(15),(18)-(22),(36 | 10 |
Hospitais25),(27),(33 | 3 |
Domicílio23 | 1 |
Instituição de acolhimento infantil34 | 1 |
Total | 31 |
aTeste de Triagem de Desenvolvimento Denver II
Abordagem/amostra | N |
---|---|
Transversal com crianças típicas4),(10),(11),(18)-(20),(22),(23),(26),(32)-(34),(37 | 13 |
Transversal com crianças atípicas16),(25),(30) | 3 |
Estudo de caso-controle transversal5),(6),(17),(18),(31 | 5 |
Longitudinal com crianças típicas8),(15),(21),(28),(36 | 5 |
Longitudinais com crianças atípicas7),(24),(29),(35 | 4 |
Estudo de caso-controle longitudinal27 | 1 |
Total | 31 |
Tamanho da amostra | |
<20 crianças16),(25),(28 | 03 |
Entre 20 e 40 crianças5),(6),(15),(17)-(18),(20),(21),(24),(26),(27),(30),(34),(36 | 14 |
>40 crianças4),(7),(8),(10),(11),(19),(22),(23),(29),(31)-(33),(35),(37 | 14 |
Total | 31 |
Idade das crianças | |
Recém-nascidos33 | 1 |
0 e 12 meses8),(20),(27),(29),(32),(35),(37 | 7 |
0 a 3 anos7),(16),(18),(19),(22),(24),(28),(31),(36 | 9 |
3 a 6 anos6),(10),(11 | 3 |
Outras idades4),(5),(15),(17),(18),(21),(23),(25),(26),(30),(34 | 11 |
Total | 31 |
a Teste de Triagem de Desenvolvimento Denver II
Instrumentos | N |
---|---|
Questionários socioeconômicos10),(11),(15),(21),(22),(23),(25),(35),(36) | 9 |
Instrumentos de avaliação de hábitos e comportamento da criança17),(18),(20),(23),(25),(27),(31),(32 | 8 |
Medidas antropométricas e nutricionais da criança4),(5),(16),(19),(32),(33),(36 | 7 |
Variáveis maternas, gestacionais e neonatais7),(10),(24),(28),(29),(35) | 6 |
Questionários ou exames de imagem para rastreamento de agravos à saúde ou confirmação diagnóstica6),(28),(30),(35 | 4 |
Instrumentos de avaliação do contexto22)-(24 | 3 |
Avaliação de fatores de risco materno27 | 1 |
Os desfechos do TTDD II revelaram percentuais de suspeita ou atrasos ao DNPM para crianças típicas entre 015 e 46,3%10 e de 14,216 a 100%6), (17), (38 para crianças atípicas.
Crianças típicas de todo o país avaliadas em contextos de creche e pré-escola apresentaram percentuais de suspeita de atrasos variando de 0 a 46,3%4), (10), (11), (15), (18), (20)- (22), (36. A área da linguagem foi aquela com maiores suspeitas ou atrasos4), (10), (15), (18), (22), (36, e em menores valores, as áreas pessoal-social11), (10), (15), (22 e motora ampla21. Além disso, pré-escolares do sexo masculino e com idades acima da mediana dos demais alunos avaliados obtiveram DNPM ligeiramente inferior11. Resultados similares foram encontrados em crianças brasileiras institucionalizadas34, com maior comprometimento da linguagem (18,1% suspeitas e 59,1% em atraso) e menor comprometimento da motricidade ampla (18,1% suspeitas e 18,1% em atraso).
Em ambiente domiciliar, 33% das crianças apresentaram suspeita de atraso ao DNPM, sendo a linguagem a área mais acometida (35% das crianças, e 4% de atraso), e a motricidade fina (19%)23, a menos acometida. Em crianças típicas avaliadas em ambulatórios, 12,8% apresentaram suspeita de atraso, em especial na área motora ampla37.
Condições atípicas de crianças em ambulatórios ou hospitais7), (16), (24), (25), (29)- (31), (35) como baixo peso ao nascimento e prematuridade constituíram-se como suspeitas de atraso ao DNPM7), (31, em especial nas áreas motora ampla e linguagem. Alterações neurológicas e de ultrassonografia transfontanelar, insuficiência respiratória e internação em UTI também contribuíram para pior desempenho ao TTDD II em todas as áreas29), (35.
A exposição ao HIV e a realização de terapia antirretroviral no período intrauterino e/ou neonatal constituíram-se como fatores para suspeita de atraso ao DNPM (50% das crianças), em especial na área da linguagem (50% suspeitas) e em menor grau na motricidade ampla (8,3% suspeitas) (25. Além disso, cardiopatias infantis contribuíram para suspeita de atraso ao DNPM, sendo a área motora ampla a mais afetada (50% suspeitas) (16. Epilepsia, crises convulsivas e exame de eletroencefalograma alterado também contribuíram para suspeita de atraso30), (38.
Crianças com desnutrição ou risco para desnutrição apresentaram maiores suspeitas de atraso no TTDD II em relação a crianças eutróficas nas áreas motora ampla (25% contra 12,5%), motora fina (80% contra 68,75%) e linguagem (85% contra 75%)5. Fenilcetonúria apresentou-se como fator para suspeitas de atraso no DNPM de crianças saudáveis, sendo as áreas mais afetadas a pessoal-social (40% suspeitas e 60% em atraso contra 10% suspeitas) e a linguagem (70% suspeitas e 30% em atraso contra 10% suspeitas) (6. Deficiência auditiva apresentou-se como fator para suspeita de atraso de DNPM em todas as áreas se comparado às crianças sem déficits auditivos (100% suspeitas contra 6,3%)17.
Os principais fatores associados a atrasos ao DNPM de crianças típicas ou atípicas brasileiras foram as más condições socioeconômicas, incluindo baixa escolaridade paterna23 e materna, má nutrição e baixo peso8), (26), (32, condições patológicas, más condições de nascimento e a exposição a determinadas terapêuticas. Filhos de mães com menos de seis consultas de pré-natal, ordem de nascimento da criança, ausência de água encanada, esquema vacinal incompleto e o desconhecimento da família sobre desenvolvimento infantil também podem influenciar o DNPM32. Contrariamente, depressão e ansiedade materna pós-parto, hipertensão e diabetes gestacional e o uso de hipoglicemiantes parecem não ter contribuído em grande parte das crianças para suspeitas ou atrasos ao DNPM27), (28), (33) pelo TTDD II.
Diversos estudos apontam a influência de fatores biológicos, nutricionais, socioeconômicos, familiares e a disponibilidade de acesso aos serviços como contribuintes para o DNPM reforçando seu potencial multifatorial4), (5), (7), (8), (23), (24), (26), (27), (32), (34), (37. Entretanto, observa-se que essas condições, em especial aquelas que induzem a um DNPM infantil atípico e que necessitam de triagem mais rigorosa em toda a infância, são pouco estudadas. Reafirma-se a necessidade de se realizar triagens que possam envolver todas as crianças ou a maior parte delas, independentemente de possuírem ou não necessidades especiais de saúde2, visto que mesmo naquelas consideradas típicas foram encontradas evidências de suspeita ou atraso no DNPM.
Condições das instituições de acolhimento e educação infantil como a proporção educadora/criança, qualificação das educadoras, idade da criança, qualidade e estrutura do local e o tempo de permanência da criança36 associaram-se às suspeitas de atraso ao DNPM22), (23), (36. Esses aspectos determinam o desempenho de relações interpessoais entre criança e educador, padrões de atividades e estímulos1) e a estabilidade e apego emocional da criança22. Assim, eles também podem ter contribuído para os altos atrasos de linguagem, devido à diminuição do repertório linguístico, à baixa estimulação da fala e à priorização do cuidado voltado às necessidades básicas da criança (higiene e alimentação) (36. Ressalta-se também a pouca atenção conferida à mensuração das características ambientais e o impacto dessas no desenvolvimento das crianças.
Em relação às instituições de acolhimento infantil, ressaltam-se a idade de ingresso da criança1) e as características socioeconômicas e parentais das famílias originais34. Ademais, embora o ambulatório configure-se como o principal contexto para avaliação do desenvolvimento infantil, é importante conhecer o contexto familiar e social da criança, informações sobre sua família, gestação, principal cuidador, sua rotina e possíveis fatores de risco2.
Além disso, houve predomínio de crianças entre 0 e 3 anos, supondo-se maior interesse dos pesquisadores em avaliá-las nessa idade por ser considerado período crítico do ponto de vista neural, particularmente suscetível a influências de fatores externos, tornando-as mais vulneráveis a riscos severos ao DNPM.
Embora tenha se encontrado quantidade considerável de estudos que avaliaram o DNPM de crianças brasileiras por meio de teste de triagem, ressalta-se que nacionalmente não existem parâmetros de avaliação infantil por testes normorreferenciados2), (3), (8), (25. Esse fato pode contribuir para que alterações no DNPM passem muitas vezes despercebidas, só se tornando evidentes quando a criança se encontra em idade escolar, justificando, assim, a necessidade de avaliação precoce e sistemática em diversos contextos e regiões do país, minimizando-se maiores danos ou atrasos. Ressalta-se também a necessidade da análise de estudos que utilizaram outros instrumentos de triagem do DNPM a fim de se obter resultados e discussões mais abrangentes para a população infantil brasileira.
Notam-se diversos fatores de risco e altos percentuais de crianças brasileiras com suspeitas ou atraso ao DNPM. Além disso, foram observadas diferenças regionais na distribuição dos estudos, ainda concentrados na região Sudeste do país. Assim, sugere-se o investimento em estudos e serviços de triagem do desenvolvimento infantil de forma padronizada e igualmente distribuídos entre as regiões brasileiras. Com isso, espera-se incentivar a realização de estudos sistemáticos e contextualizados, estimulando não só a detecção precoce de danos, mas também a implementação de aspectos assistenciais, socioeconômicos e familiares nas regiões mais pobres a fim de que se possa prevenir o agravamento das situações de vulnerabilidade em um período decisivo do DNPM.