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Um modelo diferente de brace para a reeducação da marcha hemiparética com genu recurvatum: efeitos sobre a distribuição das pressões plantares

Um modelo diferente de brace para a reeducação da marcha hemiparética com genu recurvatum: efeitos sobre a distribuição das pressões plantares

Autores:

Éder Kröeff Cardoso,
Alexandre Severo do Pinho,
Marcelo Faria Silva,
Luis Henrique Telles da Rosa

ARTIGO ORIGINAL

Fisioterapia e Pesquisa

versão On-line ISSN 2316-9117

Fisioter. Pesqui. vol.23 no.4 São Paulo out./dez. 2016

http://dx.doi.org/10.1590/1809-2950/15789423042016

RESUMEN

En una rodillera de neoprene se desarrolló un tipo de rodillera ortopédica, que lleva un manguito inflable, puesto en la región poplítea de la rodilla, y que les proporciona estímulos a las estructuras articulares, así como mejora la alienación biomecánica durante la fase de apoyo de la marcha. El propósito del estudio es cuantificar las alteraciones y adaptaciones producidas por el entrenamiento con este dispositivo ortótico en pacientes hemiparéticos. Se trata de un estudio casi experimental de tipo antes y después, del cual participaron doce adultos hemiparéticos debido al accidente cerebrovascular. Se utilizaron como marcadores los picos de presión plantar para comparar tres momentos del estudio: el inicio del estudio; el momento en que utilizaban la rodillera y tras entrenar la marcha. Después de las sesiones de rehabilitación de la marcha con ayuda de la rodillera, en la redistribución de las presiones plantares ocurrió un aumento en la simetría durante la fase de apoyo, principalmente disminución de la presión sobre el antepié parético (p=0,024) y aumento en el retropié en el lado parético (p=0,010). Además, estas alteraciones se las asociaron a la disminución de la presión sobre todas las regiones del pie no alterado, especialmente en el retropié en el momento posterior al tratamiento. Los resultados del estudio muestran un cambio en el patrón de marcha de los participantes después de utilizar este tipo de rodillera. Hubo una mayor simetría de los valores de los picos de presión plantar cuando se comparó el lado alterado con el no alterado. El entrenamiento con este tipo de rodillera ayudó en el proceso de rehabilitación, puesto que presentó valores baropodométricos cerca del patrón prestablecido de distribución plantar.

Palabras clave Accidente Cerebrovascular; Marcha; Aparatos Ortopédicos

INTRODUÇÃO

A reeducação da marcha depois de um acidente vascular encefálico (AVE) representa um dos grandes desafios do processo de reabilitação, uma vez que a locomoção permite maior autonomia e tem impacto direto sobre os níveis de funcionalidade1. Cerca de metade dos sobreviventes do AVE apresentam deficiências motoras, como fraqueza muscular, tônus muscular anormal e deficiências sensoriais, muitas vezes combinados com espasticidade ou contraturas dos músculos dos membros inferiores paréticos2. A marcha hemiparética é caracterizada por alterações nos parâmetros espaços-temporais e cinemáticos. Durante a fase de apoio, frequentemente ocorre a hiperextensão do joelho, conhecido como genu recurvatum2.

Do ponto de vista biomecânico, o genu recurvatum é caracterizado por um vetor de força de reação ao solo que passa exatamente na frente do joelho. Em pacientes com fraqueza do quadríceps, esse fenômeno gera um momento extensor do joelho, evitando a queda em flexão durante o apoio médio, como uma estratégia para obter maior estabilidade no membro inferior. Além de ser um problema estético na deambulação, ele pode provocar dor e, portanto, limitar a autonomia do paciente nas atividades da vida diária3. Pode ser causado em virtude de vários fenômenos como a fraqueza ou a espasticidade do músculo quadríceps, espasticidade e/ou contratura dos flexores plantares e déficits proprioceptivos2. O perfil da distribuição de pressão plantar de pacientes com AVE demonstra ser muito diferente do que é observado em indivíduos saudáveis4. Nesse sentido, a mensuração das pressões plantares permite quantificar o grau de comprometimento do paciente hemiparético e avaliar de forma objetiva a eficácia da intervenção com um dispositivo ortótico no processo de reabilitação2.

A abordagem tradicional de treinamento locomotor envolve a deambulação no solo ou em esteira. Assim, um melhor controle sobre a articulação do joelho afetado pode ser obtido por meio de recursos ortóticos que busquem facilitar uma resposta motora desejável e inibir as atividades motoras primitivas anormais5. A órtese utilizada nesse estudo foi desenvolvida com o intuito de reeducar a marcha e minimizar o genu recurvatum ao se considerar os aspectos neurofisiológicos e biomecânicos1. Nesse sentido, considerou-se a hipótese de que a aplicação de uma pressão moderada sobre estruturas do sistema musculoesquelético poderia efetuar mudanças nas estratégias de recrutamento muscular, promover melhor alinhamento do joelho, bem como contribuir na recuperação funcional da marcha sem bloquear ou limitar completamente o movimento articular. Consequentemente, as pressões plantares poderiam também ser alteradas e mensuradas pela baropodometria. Assim, o objetivo deste estudo foi avaliar a distribuição das pressões plantares durante a deambulação de indivíduos com hemiparesia depois do uso de um diferente brace para treinamento da marcha de hemiparéticos com genu recurvatum.

METODOLOGIA

Estudo quase-experimental do tipo antes e depois. Participaram doze (12) pacientes adultos com diagnóstico de AVE que recebiam acompanhamento de fisioterapia em uma clínica. Os critérios de inclusão foram a presença de hemiparesia após AVE com tempo de evolução entre 6 a 24 meses, capacidade de andar sem uso de recursos auxiliares e presença de genu recurvatum durante a fase de apoio médio na marcha. Os critérios de exclusão foram as condições que impossibilitassem a avaliação e treino com a órtese, como a presença de contraturas ou deformidades fixas em membros inferiores e comprometimentos de moderados a severos de origem cognitiva, perceptual, de atenção ou de linguagem. Essa primeira triagem foi realizada por um dos fisioterapeutas responsáveis pelo estudo por meio de avaliação física e funcional e pelos dados obtidos em prontuário do paciente.

O dispositivo ortótico utilizado foi desenvolvido pelos pesquisadores. Ele apresenta quatro tiras de neoprene fixadas com velcro anteriormente acima e abaixo da patela e que se unem na região posterior por meio de tecidos de neoprene e de couro (Figura 1A). Possui, também sobre a fossa poplítea, um balonete de borracha inflável também envolto em neoprene, devendo ser posicionado de forma a garantir maior pressão sobre esse local (Figura 1B).

Figura 1 Órtese para reeducação da marcha. (A) vista lateral das tiras de neoprene acima e abaixo da patela; (B) maior detalhe do posicionamento do balonete inflável sobre a região poplítea (seta) 

A pressão do balonete foi estabelecida em 0,35 kg/cm2 com auxílio de um sensor de calibragem, a fim de que pudesse oferecer um moderado grau de pressão sobre a região poplítea. Os velcros na face anterior da coxa e da perna foram ajustados de acordo com a resposta do paciente, devendo estar confortável e firmemente fixo.

Depois dos participantes receberem explicações sobre o estudo e assinarem o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), foi realizada a primeira avaliação da marcha. O fluxograma de avaliações e treinamento foi dividido em três momentos. No primeiro momento, realizou-se avaliação da medida das pressões plantares, cujos registros foram coletados por meio da baropodometria dinâmica. Para aquisição dos dados de baropodometria, utilizou-se um baropodômetro digital do tipo plataforma de pressão da marca Novel, modelo Emed-X (690 mm × 403 mm × 190 mm) resolução de 4 sensor/cm2, taxa de amostragem máxima de 100 Hz. A plataforma foi posicionada no centro de uma passarela de espuma vinílica acetinada (EVA) de, aproximadamente, 7 metros de comprimento. Foi solicitado ao paciente caminhar descalço de forma natural em velocidade autosselecionada sobre a passarela. O paciente iniciava a marcha com os pés paralelos a partir de marca previamente realizada, permitindo a realização do terceiro passo na plataforma, conforme protocolo de três passos6. Cada indivíduo andou cinco vezes o percurso, a fim de se familiarizar com os procedimentos e, depois desse período, habilitou-se o software para realização das aquisições. As variáveis de pico de pressão plantar em quilopascal (kPa) - máxima pressão registrada nas áreas plantares específicas, considerando quatro regiões do pé (retropé, mediopé, antepé e dedos) - foram estabelecidas por meio do software Novel Scientifc 12.3.30.

Foram adquiridos três registros do pé acometido e do pé não acometido sobre a plataforma. No momento 1, não se utilizou a órtese; essa primeira avaliação serviu como linha de base, ou seja, o padrão basal da marcha dos participantes. Depois de um intervalo de 30 minutos para descanso, no momento 2, esse mesmo procedimento de avaliação baropodométrica também foi realizado, com o paciente utilizando a órtese.

No dia seguinte a essa avaliação, os pacientes iniciaram período de cinco semanas de treinamento da marcha com a órtese, sob a orientação e a observação de fisioterapeuta que pertence ao grupo de autores deste estudo. Duas vezes por semana, antes das sessões na clínica de fisioterapia, os pacientes que participaram do estudo eram solicitados a deambularem com velocidade autosselecionada em terreno plano, um corredor com 50 metros de comprimento, sendo utilizada a órtese para reeducação da marcha no lado acometido durante quinze minutos. A quantidade de intervenções foi baseada em estudo que demonstrou efeitos significativos e duradouros no controle do recurvatum na marcha depois de dez sessões de biofeedback eletrogoniométrico7. No primeiro dia seguinte à décima sessão de treinamento, foi realizado o momento 3 para a avaliação das pressões plantares sem a utilização da órtese.

Processamento e análise de dados

Para a análise estatística foram calculados a média e o desvio padrão das variáveis de pico de pressão plantar de ambos os pés. Assim, oito análises independentes foram realizadas, com o objetivo de comparar as situações sem brace, com brace, e pós-treinamento, uma para cada membro e regiões do pé. Os valores de pico de pressão nessas regiões, de ambos os pés, foram comparados para os lados afetados e não afetados, em diferentes momentos de avaliação da marcha. Essas comparações foram feitas utilizando testes paramétricos (ANOVA para medidas repetidas) ou não paramétricos (teste de Friedman), de acordo com a presença ou a ausência de distribuição normal dos dados. Para testar a normalidade dos dados foi utilizado o teste Shapiro-Wilk. A versão 17 do programa SPSS® (Statistical Package for the Social Sciences, Inc., Chicago, USA) foi utilizado para analisar os dados. O nível de significância adotado foi de p≤0,05.

RESULTADOS

De um total de doze pacientes hemiparéticos, a média de idade foi de 61,5±10,7 anos, sendo sete destes do sexo masculino. A média do tempo pós-AVE foi de 12,9±5,6 meses. As representações gráficas das variáveis de pico de pressão nas quatro regiões dos pés no lado acometido (AC) e no lado não acometido (N-AC), sem e com o uso da órtese no joelho parético, estão expostos nas figuras 2, 3 e 4.

Figura 2 Representações gráficas das variáveis de pico de pressão comparadas entre o lado acometido com o lado não acometido sem órtese, com órtese e depois do treinamento nas diferentes regiões do pé 

Figura 3 Representações gráficas das variáveis de pico de pressão comparadas sem e com o uso da órtese no lado não acometido e no acometido em diferentes regiões do pé nos momentos 1 e 2 

Figura 4 Representações gráficas das variáveis de pico de pressão comparando a linha de base (Sem Uso) com os dados depois do treinamento (Pós Tr) no lado não acometido e no acometido em diferentes regiões do pé 

Momento 1 (linha de base)

No retropé, o comportamento da pressão plantar demonstrou valores médios significativamente diferentes no lado afetado em relação ao lado não afetado, com 209,65 (DP 51,38) e 349,16 (DP 120,68), respectivamente, (p=0,003). Assim como sobre a região dos dedos, os valores médios foram de 229,51 (DP 107,87) e 335,32 (DP 180,69), (p=0,004), com as maiores pressões distribuídas sobre o lado não afetado.

Momento 2 (usando o brace)

Na comparação entre o lado afetado com o lado não afetado, o uso em si da órtese não evidenciou mudanças no padrão identificado na linha de base. As diferenças nas pressões do retropé permaneceram com 215.55 (DP 50.52) e 322.62 (DP 109.16), (p=0,005), bem como nos dedos, com 260.44 (DP 118.15) e 327.92 (DP 133.06), (p=0,004), sendo as maiores pressões apresentadas sobre o lado sadio.

Ao se comparar o AC utilizando a órtese com seus valores da linha de base, foi identificado aumento nos picos de pressões plantares na região dos dedos, indo de 229.51 (DP 107.87) para 260.44 (DP 118.15), (p=0,007) e uma tendência à diminuição de pressões sobre o antepé no lado parético, indo de 287,53 kPa para 265,41 kPa. O lado sadio evidenciou diminuição dos valores em todas as regiões do pé, em especial sobre o retropé, de 349.16 (DP 120.68) para 322.62 (DP 109.16), (p=0,041).

Momento 3 (treinamento da marcha)

Os picos de pressão, comparando o lado AC com o N-AC, mantiveram as diferenças similares às observadas na linha de base. Na comparação da linha de base com os dados obtidos depois do treinamento, a região do antepé parético apresentou redução significativa do pico de pressão, indo de 287.53 (DP 150.18) para 243.76 (DP 128.62), (p=0,024), enquanto a região do retropé apresentou uma tendência ao aumento. Todas as regiões do pé N-AC - retropé, médiopé, antepé e dedos - também demonstraram reduções nas pressões plantares, porém só o retropé teve valor significativo, indo de 349.16 (DP 120.68) para 307.83 (DP 104.82), (p=0,010).

DISCUSSÃO

O padrão de contato com o solo dos pacientes avaliados em nosso estudo apresentou predomínio de maior pico de pressão sobre a região do antepé parético. Esse aspecto pode ser mais claramente observado ao se comparar, em formato tridimensional, as áreas de pressão no período do contato inicial de um paciente hemiparético com o de um indivíduo saudável. A Figura 5 apresenta um exemplo de comparação entre um pé parético com o de um indivíduo saudável. A insuficiente dorsiflexão e a espasticidade de plantiflexores podem explicar essa forma de “golpe do calcanhar” nos pacientes hemiparéticos4),(8.

Figura 5 Formas de visualização da distribuição da pressão em padrão tridimensional dos picos de pressões plantares durante o contato inicial do calcanhar. (A) caracteriza o padrão de marcha em indivíduo normal9; (B) apresenta exemplo de um paciente hemiparético com genu recurvatum 

Ao se comparar os valores dos picos de pressão entre o lado acometido com o não acometido, foram observados menores valores sobre a região do retropé e dos dedos no lado acometido sem a utilização da órtese, constituindo o padrão basal dos pacientes. A distribuição do pico de pressão plantar durante a marcha sem uso da órtese para reeducação da marcha apresentou padrões similares a outros estudos envolvendo baropodometria em hemiparéticos8),(10)-(13. A pressão plantar dinâmica de pacientes hemiplégicos exibe, no lado acometido, uma mudança de contato inicial, da região do retropé para a parte dianteira do pé, um aumento do apoio plantar lateral, um rolamento limitado e um movimento reduzido ou ausente de calcanhar-fora no apoio terminal14.

No lado afetado, as pressões são deslocadas principalmente sobre o antepé, em função da espasticidade de tríceps sural; já no lado N-AC, em pacientes com grave comprometimento motor, ocorre maior transferência do apoio sobre o pé não acometido15. O pico de pressão reduzido na base do terceiro metatarso, segundo estudos, denota maior arco transverso do antepé: isso estaria ligado à maior espasticidade dos músculos intrínsecos do pé13. A comparação do pico de pressão entre o lado não acometido e o acometido de nove pacientes hemiparéticos demonstrou que, no lado não acometido, ocorreram os maiores picos de pressão, enquanto no lado acometido, o antepé e o arco plantar lateral exibiram maiores valores8. Isso pode ocorrer devido ao equinismo e à espasticidade que comumente ocorrem em pacientes hemiparéticos, bem como pelo distúrbio de coordenação, alteração sensorial e insuficiente transferência de peso sobre o lado parético12. A análise da distribuição nos picos de pressão plantar de 25 pacientes hemiparéticos e de 31 pacientes saudáveis revelou redução da pressão de pico dos lados acometidos, principalmente na área medial metatarsal de pacientes hemiparéticos16. Outros estudos também observaram que a distribuição das pressões plantares dos pacientes hemiparéticos demonstrava baixo pico de pressão em todo o pé do lado acometido13.

No segundo momento do estudo, as assimetrias encontradas na linha de base permaneceram, a partir de uma comparação do lado acometido com a utilização da órtese versus o não acometido. Comparando os picos de pressão da linha de base com os da utilização no joelho parético, foram observadas algumas alterações: no lado acometido, a região dos dedos apresentou maior pressão contra o solo, uma tendência à diminuição das pressões sobre o antepé e de aumento sobre o retropé. Todas as regiões do pé não acometido evidenciaram diminuição do pico de pressão, principalmente na região do retropé. Estudos com análises de padrões normais de distribuição plantar consideram que ocorra uma sequência ordenada de eventos, durante o apoio, iniciando pelo calcanhar, aplainamento do calcanhar e antepé, somente o antepé e, por último, antepé e dedos. Nesse momento final de contato com o solo, o peso está sendo transferido para o outro pé, com o golpe de calcanhar14. Pode-se compreender que a redução da pressão sobre o retropé do lado N-AC depois do treinamento aconteceu em razão de melhor controle motor, conferido por melhor ângulo de entrada do calcâneo e consequente suavização no golpe do calcanhar, observado na melhor distribuição das pressões plantares na fase de apoio no lado AC.

A verificação dos efeitos da órtese na marcha, no momento 3 do estudo, demonstrou resultados funcionais positivos. Na região do antepé do lado acometido, local onde geralmente ocorrem os maiores picos de pressão no pé hemiparético13, houve redução significativa dos valores depois do treinamento. No lado não acometido, o pico de pressão plantar diminui em todas as regiões, em especial no retropé. A diminuição das pressões sobre as regiões do pé nesse lado, tanto ao usar a órtese quanto no pós-treino, sugerem que o peso corporal está sendo distribuído mais para o lado parético. É sabido que os indivíduos hemiparéticos transferem cerca de 70% do peso total sobre o membro inferior não afetado17. O alinhamento postural e a simetria nas transferências de peso, em pacientes com AVE, além de sua relação com habilidades funcionais, de equilíbrio e de marcha, são fundamentais para o desenvolvimento do sucesso da reabilitação18.

As irregularidades e assimetrias nos padrões de distribuição das pressões plantares entre os membros traduzem uma perturbação no movimento articular9),(10),(18. Possivelmente a diminuição da flexão dorsal por espasticidade do tríceps sural contribui para os maiores picos de pressão sobre o antepé no lado acometido. As dificuldades na transferência de carga do retropé ao antepé podem ser em razão do genu recurvatum, déficit de retroversão e extensão insuficiente de quadril no lado parético19.

Os resultados do estudo revelaram que a órtese desenvolvida deve necessariamente ser acompanhada por um período de adaptação e treinamento da marcha, a fim de melhores resultados em nível de antepé. Constatou-se que apenas o uso em si não provoca alterações significativas no padrão das pressões plantares. No entanto, depois de um período de dez sessões, houve distribuição mais adequada da pressão plantar para o retropé no lado acometido e maior simetria em relação ao lado N-AC. No lado não acometido, a pressão, que era maior no retropé, apresentou tendência em diminuir os picos nessa região, depois do treinamento. Pode-se, dessa forma, inferir que o treinamento com a órtese contribui para o processo de reabilitação, uma vez que esta proporciona alinhamento biomecânico favorável na articulação e assim melhor atuação dos músculos flexores de joelho, que se encontram mais fracos no genu recurvatum. Além disso, ela pode fornecer um input proprioceptivo, proporcionando ao paciente uma retroalimentação acerca da hiperextensão do joelho, informando ao paciente a necessidade de corrigir esse movimento indesejado.

Entre as limitações do estudo, além da amostra reduzida, destaca-se a falta de um grupo de controle para documentar as evoluções normais com o tratamento fisioterapêutico convencional. Em uma próxima avaliação, além da incorporação de grupo de placebo, seria importante obter dados da baropodometria associados à eletromiografia e/ou à cinemetria, a fim de se quantificar o grau do genu recurvatum em diferentes velocidades, correlacionando o comportamento muscular com as alterações nas pressões plantares e nos parâmetros cinemáticos.

Considerando as características mecânicas do brace, entendemos que ele, em relação aos outros recursos existentes, demonstra ser um manejo diferenciado da marcha com genu recurvatum em razão de não restringir o movimento do joelho em um ângulo fixo, mas “informar” ao paciente, por meio de estímulos táteis e proprioceptivos, a ocorrência da hiperextensão durante o apoio médio. Este estudo sugere um melhor padrão de marcha nos participantes, ao apresentarem maior simetria nos valores dos picos de pressão plantar, ou seja, um contato do pé com o solo mais próximo do normal. Podemos, dessa forma, inferir que o treinamento com a órtese pode auxiliar indivíduos hemiparéticos a obter melhor controle motor e alinhamento biomecânico do joelho durante a marcha.

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