versão impressa ISSN 0066-782X
Arq. Bras. Cardiol. vol.103 no.6 São Paulo dez. 2014 Epub 28-Out-2014
https://doi.org/10.5935/abc.20140158
As urgências cardiovasculares são causas importantes de procura por atendimento médico, sendo fundamentais a rapidez e a precisão no diagnóstico para diminuir sua morbimortalidade.
Avaliar o uso da ecocardiografia direcionada como complemento diagnóstico ao exame físico em um serviço terciário de emergências clínicas.
Foram incluídos cem pacientes adultos sem doenças cardíacas ou pulmonares conhecidas que procuraram atendimento de urgência com queixas cardiológicas. Foram excluídos pacientes com alterações isquêmicas no eletrocardiograma ou febre. A ecocardiografia direcionada foi realizada logo após a avaliação inicial do paciente na sala de emergência, com aparelho ultraportátil GE Vscan, avaliando subjetivamente: dimensões das cavidades, função sistólica ventricular, fluxos intracardíacos pelo mapeamento de fluxo em cores, pericárdio e aorta.
A idade média dos pacientes foi 61 ± 17 anos. O quadro clínico inicial foi dor torácica (52 pacientes), dispneia (32 pacientes), arritmia/avaliação da função ventricular (dez pacientes), hipotensão/tontura (cinco pacientes) e edema periférico (um paciente). Em 28 pacientes a ecocardiografia direcionada confirmou a hipótese diagnóstica inicial: 19 pacientes com insuficiência cardíaca, cinco com síndrome coronariana aguda, dois com tromboembolismo pulmonar e dois com tamponamento cardíaco. Em 17 pacientes, a ecocardiografia direcionada alterou o diagnóstico, afastando a hipótese clínica inicial em dez casos com suspeita de insuficiência cardíaca, dois com suspeita de tromboembolismo pulmonar, dois com hipotensão a esclarecer, e em cada um dos três restantes com suspeitas de síndrome coronariana aguda, tamponamento cardíaco e dissecção de aorta.
A ecocardiografia direcionada ultraportátil em serviço de emergências clínicas pode definir rapidamente o diagnóstico e, com isso, é possível iniciar mais precocemente o tratamento adequado.
Palavras-Chave: Ecocardiografia; Equipamentos para Diagnóstico; Serviços Médicos de Emergência; Diagnóstico por Imagem
Cardiovascular urgencies are frequent reasons for seeking medical care. Prompt and accurate medical diagnosis is critical to reduce the morbidity and mortality of these conditions.
To evaluate the use of a pocket-size echocardiography in addition to clinical history and physical exam in a tertiary medical emergency care.
One hundred adult patients without known cardiac or lung diseases who sought emergency care with cardiac complaints were included. Patients with ischemic changes in the electrocardiography or fever were excluded. A focused echocardiography with GE Vscan equipment was performed after the initial evaluation in the emergency room. Cardiac chambers dimensions, left and right ventricular systolic function, intracardiac flows with color, pericardium, and aorta were evaluated.
The mean age was 61 ± 17 years old. The patient complaint was chest pain in 51 patients, dyspnea in 32 patients, arrhythmia to evaluate the left ventricular function in ten patients, hypotension/dizziness in five patients and edema in one patient. In 28 patients, the focused echocardiography allowed to confirm the initial diagnosis: 19 patients with heart failure, five with acute coronary syndrome, two with pulmonary embolism and two patients with cardiac tamponade. In 17 patients, the echocardiography changed the diagnosis: ten with suspicious of heart failure, two with pulmonary embolism suspicious, two with hypotension without cause, one suspicious of acute coronary syndrome, one of cardiac tamponade and one of aortic dissection.
The focused echocardiography with pocket-size equipment in the emergency care may allow a prompt diagnosis and, consequently, an earlier initiation of the therapy.
Key words: Echocardiography; Diagnostic Equipment, Emergency Medical Services; Diagnostic Imaging
Os serviços de atendimento de urgências têm papel importante no atendimento de emergências cardíacas, como Síndrome Coronariana Aguda (SCA), dissecção aórtica, Insuficiência Cardíaca (IC) aguda, arritmias, fenômenos cardioembólicos e tamponamento cardíaco, sendo fundamentais o reconhecimento e o tratamento rápido dessas condições para melhores desfechos1,2.
Dados norte-americanos indicam que aproximadamente 10% dos pacientes que procuram esses serviços apresentam dor torácica ou dispneia3 como queixa principal, sendo que as doenças cardíacas isquêmicas e não isquêmicas representam as principais causas de internação hospitalar após atendimento de urgência3. Embora muitos avanços tenham ocorrido no diagnóstico desses indivíduos, alguns pacientes com SCA são dispensados sem receberem o diagnóstico correto4, o que, consequentemente, aumenta a mortalidade5,6.
A ecocardiografia é um exame não invasivo, de baixo custo e reprodutível7, com grande valor diagnóstico e prognóstico em pacientes com suspeita de SCA8 e IC aguda2, além de auxiliar na determinação da terapêutica adequada em pacientes com arritmias9,10.
Com o recente avanço tecnológico na área da ultrassonografia, foi possível a redução progressiva do tamanho dos aparelhos de ecocardiografia para dimensões pouco maiores que as de um smartphone, o qual pode ser carregado dentro do bolso de um jaleco, permitindo o uso rápido em um serviço de emergência, à beira do leito do paciente.
O objetivo deste estudo foi descrever a experiência inicial com o uso de um aparelho de ecocardiografia ultraportátil para realização de Ecocardiografia Direcionada (ED) em serviço de emergência, observando em quantos pacientes foi possível confirmar a hipótese diagnóstica clínica inicial e em quantos a hipótese diagnóstica inicial foi alterada após o exame, além de descrever eventuais dificuldades técnicas relacionadas ao uso desse aparelho.
Foram incluídos pacientes adultos que procuraram o pronto-socorro de clínica médica de um hospital terciário com queixa principal de dor torácica, dispneia ou palpitações, e que apresentavam alguma dúvida diagnóstica após avaliação inicial, composta de anamnese, exame físico e eletrocardiograma. Foram excluídos pacientes com doença cardíaca ou pulmonar conhecidas, com alterações isquêmicas ao eletrocardiograma (supra ou infradesnivelamento do segmento ST) ou com febre (temperatura axilar ≥ 37,8ºC).
Todos os participantes assinaram o termo de consentimento informado e o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da instituição (protocolo 16723413.7.0000.5505).
Os exames foram realizados no aparelho ultraportátil Vscan (GE Healthcare, Milwaukee, Wiscosin, EUA), apresentado na figura 1, e por um único médico cardiologista ecocardiografista. A ED foi realizada logo após avaliação clínica inicial e interpretação do eletrocardiograma, de forma direcionada, à beira do leito do paciente, com o objetivo de responder à dúvida diagnóstica. Foi realizada análise subjetiva das imagens bidimensionais e do mapeamento de fluxo em cores, focando nos seguintes aspectos: dimensões das cavidades, função sistólica global, avalição da contratilidade segmentar e global do Ventrículo Esquerdo (VE), função sistólica do ventrículo direito, aspecto anatômico das valvas mitral e aórtica, presença de refluxos significativos das valvas mitral e aórtica, presença de sinais indiretos de hipertensão pulmonar (dilatação das cavidades direitas, abaulamento do septo ventricular para a esquerda, dilatação do tronco pulmonar), presença de derrame pericárdico, avaliação das dimensões da aorta torácica (aorta ascendente e arco aórtico) e presença de linha de dissecção.
Os cálculos estatísticos foram realizados no softwareMicrosoft® Excel 2010. Dados contínuos foram descritos como média ± desvio padrão e dados categóricos em porcentagens.
Foram avaliados cem pacientes, sendo 54 do sexo masculino, com idade média de 61 ± 17 anos (variação de 15 a 95 anos).
A queixa principal mais frequente, entre os pacientes estudados, foi dor torácica (n = 52), seguida de dispneia (n = 32), palpitações (n = 10), mal-estar/tontura associada à hipotensão (n = 5) e edema de membros inferiores (n = 1), conforme apresentado na tabela 1.
Tabela 1 Queixa principal que motivou a procura do serviço de emergência
Queixa principal | n = 100 |
---|---|
Dor torácica | 52 |
Dispnéia | 32 |
Palpitações | 10 |
Tontura/hipotensão | 5 |
Edema | 1 |
A hipótese diagnóstica principal mais frequente, após anamnese, exame físico e eletrocardiograma, foi de SCA (n = 51), seguida de IC (n = 29), Tromboembolismo Pulmonar (TEP) (n = 4), derrame pericárdico ou tamponamento cardíaco (n = 3), choque de etiologia indeterminada (n = 2) e dissecção de aorta (n = 1). Além disso, em dez pacientes com arritmias (sendo sete pacientes com fibrilação atrial, dois com taquicardia ventricular e um com taquicardia juncional), a ED foi indicada para avaliar a função sistólica do VE e, assim, auxiliar na orientação terapêutica (Tabela 2).
Tabela 2 Hipótese diagnostica principal após anamnese, exame físico e eletrocardiograma
Suspeita clínica inicial | n = 100 |
---|---|
Síndrome coronariana aguda | 51 |
Insuficiência cardíaca | 29 |
Arritmia | 10 |
Tromboembolismo pulmonar | 4 |
Tamponamento cardíaco/derrame pericárdico | 3 |
Choque de etiologia indeterminada | 2 |
Dissecção de aorta | 1 |
Foi possível a realização da ED ultraportátil, com qualidade de imagem satisfatória, em todos os pacientes.
Dos 90 pacientes com incerteza diagnóstica inicial, a suspeita diagnóstica clínica na admissão pôde ser confirmada com a ED em 28 (31%) deles (Tabela 3), sendo 19 (68%) pacientes com IC, cinco (18%) com SCA, dois (7%) com TEP e dois (7%) com tamponamento cardíaco. Em um dos pacientes com IC e disfunção sistólica importante do VE, foi ainda observado trombo na região apical do VE (Figuras 2 a 4).
Tabela 3 Pacientes que tiveram a hipótese diagnostica inicial confirmada pela ecocardiografia ultraportátil (n = 28)
Diagnóstico final definitivo | |
---|---|
n (%) | |
Insuficiência cardíaca | 19 (68) |
Síndrome coronariana aguda | 5 (18) |
Tromboembolismo pulmonar | 2 (7) |
Tamponamento cardíaco | 2 (7) |
Figura 2 Paciente com queixa de dispneia. Ecocardiografia portátil revelou miocardiopatia dilatada com disfunção sistólica importante do ventrículo esquerdo (VE) e trombo em região apical (seta) na janela apical.
Figura 3 Derrame pericárdico (DP) importante ao corte subcostal, com sinais de restrição ao enchimento ventricular, em paciente com tamponamento cardíaco. VD: ventrículo direito; VE: ventrículo esquerdo.
Figura 4 Dilatação do ventrículo direito (VD) e retificação do septo ventricular, ao corte paraesternal transversal, em paciente com dispneia e suspeita de tromboembolismo pulmonar.
Ainda, desses 90 pacientes com incerteza diagnóstica após a avaliação inicial, a ED proporcionou mudança da hipótese diagnóstica inicial em 17 (19%) deles (Tabela 4). Em dez pacientes com suspeita inicial de IC, o ecocardiograma não demonstrou disfunção sistólica nem sinais indiretos compatíveis com disfunção diastólica (aumento do átrio esquerdo ou hipertrofia ventricular esquerda), embora tenha sido possível identificar outra causa cardíaca para o quadro de IC apresentado (miocardiopatia hipertrófica e estenose aórtica grave) em dois desses pacientes. Nos pacientes restantes, com suspeita de TEP (dois casos), de choque de etiologia indeterminada (dois casos) e de tamponamento cardíaco (um caso), a ED foi normal, afastando causa cardiológica. Nos dois pacientes com suspeita de TEP, a suspeita era intermediária e, com a ED normal, afastou-se clinicamente essa hipótese. Em um paciente com dor torácica e suspeita de SCA, a ecocardiografia observou achados compatíveis com pericardite (espessamento pericárdico associado a derrame discreto); em um paciente com suspeita de dissecção de aorta não havia dilatação da aorta, sinais de linha de dissecção e nem insuficiência aórtica à ED, sendo observada apenas hipertrofia ventricular esquerda significativa.
Tabela 4 Pacientes que tiveram a hipótese diagnóstica inicial alterada após a ecocardiografia ultraportátil (n = 17)
Hipótese diagnóstica inicial | Diagnóstico após ecocardiografia |
---|---|
Insuficiência cardíaca (n = 10) | DPOC (n = 4) |
IRA com hipervolemia (n = 2) | |
Pneumonia (n = 1) | |
Estenose aórtica grave (n = 1) | |
Miocardiopatia hipertrófica (n = 1) | |
Ansiedade (n = 1) | |
Tromboembolismo pulmonar (n = 2) | DPOC (n =1) |
Pneumonia (n =1) | |
Choque de etiologia indeterminada (n = 2) | Choque séptico (n = 2) |
Síndrome coronariana aguda (n = 1) | Pericardite |
Tamponamento cardíaco (n = 1) | Desidratação |
Dissecção de aorta (n = 1) | Angina de consumo |
DPOC: doença pulmonar obstrutiva crônica; IRA: Insuficiência renal aguda.
Dos dez pacientes que chegaram ao serviço de emergência com arritmias sintomáticas de início súbito (sendo sete com fibrilação atrial, dois com taquicardia ventricular e um com taquicardia juncional), foi observada disfunção sistólica do VE em quatro deles, sendo em dois com fibrilação atrial e em dois com taquicardia ventricular; os demais apresentaram função ventricular esquerda sistólica normal.
Em 45 (50%) dos 90 pacientes com incerteza diagnóstica após a avaliação inicial, a ED ultraportátil não trouxe dados que permitissem confirmar ou mudar a hipótese diagnóstica inicial, sendo necessária a realização de outros exames subsidiários.
Este estudo permitiu demonstrar a grande utilidade da ED realizada com um equipamento ultraportátil em um serviço de emergências clínicas, à beira do leito. Em pacientes em que ainda não havia certeza diagnóstica após anamnese, exame físico e eletrocardiograma, a ED ultraportátil possibilitou confirmação diagnóstica em 31% deles e, além disso, em 19% dos casos, fez que com a hipótese diagnóstica inicial fosse alterada.
O maior benefício clínico do uso da ED nesta amostra foi a confirmação ou o afastamento do diagnóstico de IC por disfunção ventricular esquerda, sendo que em dois pacientes foi possível o diagnóstico de outras cardiopatias (estenose aórtica e miocardiopatia hipertrófica) como causa da IC. Nos pacientes com suspeita de TEP, em metade deles o exame permitiu o diagnóstico mais rápido, com início mais precoce da terapêutica, assim como na suspeita de tamponamento cardíaco, em que dois, de três pacientes, tiveram o diagnóstico confirmado rapidamente, sendo possível a realização mais precoce da drenagem do líquido pericárdico.
Em 10% dos pacientes com dor torácica e suspeita de SCA nos quais o ECG não foi diagnóstico, a ED observou alteração contrátil segmentar. Esse achado, em paciente com história clínica compatível com isquemia miocárdica e sem história de doença coronariana prévia, pode ser utilizado para confirmar o diagnóstico clínico de SCA. Ainda, em um deles, o exame observou sinais de pericardite, alterando a hipótese diagnóstica inicial. Embora a porcentagem de pacientes com dor torácica, ECG normal e alteração contrátil segmentar ao ecocardiograma tenha sido pequena, esta é uma população frequente nos serviços de emergência e existem evidências bem claras de que, quanto mais precocemente é iniciado o tratamento na SCA, menor é a morbimortalidade1. Assim, essa ferramenta diagnóstica se reverte como de grande importância para esses pacientes.
Também foi importante, nesta amostra, o uso da ED para avaliação da função ventricular esquerda nos pacientes que chegaram com arritmias paroxísticas. Especialmente na fibrilação atrial, a escolha do fármaco para controle da frequência cardíaca e para cardioversão farmacológica deve considerar a presença ou não de disfunção ventricular esquerda10.
A possibilidade de confirmar ou excluir um diagnóstico rapidamente em pacientes graves, sem a necessidade de aguardar por exames mais complexos, demorados e nem sempre disponíveis imediatamente nos serviços de emergência, é essencial, pois permite o tratamento mais precoce de doenças graves, como SCA, dissecção aórtica, IC aguda, TEP e tamponamento cardíaco. Adicionalmente, o fato de o exame ser prontamente realizado à beira do leito com aparelho facilmente transportável, sem necessidade de remoção do paciente, confere vantagem exclusiva aos equipamentos ultraportáteis, com o rápido esclarecimento de questões específicas, agilizando o atendimento na emergência médica. Ainda, a ED permitiu evitar terapêutica desnecessária e, por vezes, potencialmente prejudicial, em um número significativo de pacientes.
Apesar do grande avanço laboratorial e tecnológico, ainda existem dificuldades para realizar o diagnóstico rápido das doenças cardiovasculares agudas potencialmente fatais. Aproximadamente 2 a 8% dos pacientes com SCA são dispensados dos serviços de emergência sem o diagnóstico correto4, o que resulta em aumento da mortalidade5,6.
Dispneia é uma causa importante de procura por atendimento médico de urgência e que necessita de diagnóstico rápido de sua etiologia11. As principais causas de dispneia, nesses pacientes, são de origem cardíaca ou pulmonar12; contudo, a diferenciação entre tais origens é difícil e, muitas vezes, a história clínica e o exame físico são inespecíficos13,14. Embora o diagnóstico de IC aguda possa ser realizado clinicamente em grande parte dos casos, por vezes a dúvida diagnóstica permanece. Neste estudo, o exame direcionado permitiu a rápida confirmação ou exclusão do coração como causa da dispneia, sem a necessidade do uso de elementos diagnósticos laboratoriais mais demorados e onerosos, como o BNP.
Estudos recentes com o aparelho ultraportátil também demonstraram sua utilidade para o diagnóstico clínico, embora incluindo pacientes estáveis internados em enfermaria. Estudo norueguês, que incluiu pacientes internados em enfermaria de clínica médica, avaliou o uso do aparelho ultraportátil e observou mudança da hipótese diagnóstica inicial em 18% dos casos15, resultado semelhante ao observado neste estudo, embora em populações com doenças diferentes. A ED também já foi testada como ferramenta para responder a uma questão clínica em pacientes internados em enfermaria cardiológica, tendo oferecido resposta para a maioria dos pacientes em que foi utilizada, além de boa concordância com o exame ecocardiográfico convencional16. Também no cenário ambulatorial, a ED melhorou a acurácia diagnóstica da anamnese/exame físico em pacientes com doenças diversas17. É importante notar que, diferentemente do presente estudo, nos estudos citados o exame direcionado foi realizado por médicos não especialistas em ecocardiografia, o que indica que o exame direcionado não necessita ser obrigatoriamente realizado por um especialista.
Contrastando com estudos anteriores15-17, este foi o primeiro a utilizar a ED ultraportátil apenas em pacientes atendidos em serviço de emergência, logo após anamnese, exame físico e eletrocardiograma. Além disso, este estudo foi realizado em um serviço de emergências clínicas em um hospital geral terciário, no qual existem pacientes com doenças clínicas agudas de diversas etiologias (cardíacas ou não), excluindo o viés de ser uma emergência exclusivamente cardiológica, situação em que a maioria dos pacientes atendidos possui doenças cardiovasculares agudas.
A ED não deve ser considerada um exame ecocardiográfico completo18,19, devendo ser utilizada como uma ferramenta para triagem de doenças cardíacas na população20 ou como complemento ao exame físico17,18, mediante um exame focado, respondendo a uma questão específica, e melhorando a rapidez e a acurácia diagnósticas18, exatamente como aqui demonstrado. A ED realizada no cenário de emergência tem como objetivo principal tornar mais rápido o diagnóstico, principalmente quando não houver disponibilidade da realização imediata de um ecocardiograma completo. A maioria dos pacientes submetidos ao exame direcionado necessitará oportunamente de um ecocardiograma convencional, com realização de todas as medidas estruturais e hemodinâmicas oferecidas pelo método, para ajuste fino da terapêutica, e seguimento em médio e longo prazos.
O aparelho ultraportátil utilizado neste estudo se mostrou eficaz para obter imagens bidimensionais e mapeamento de fluxo em cores de boa qualidade. O aparelho permitiu a realização de algumas medidas lineares, porém não foram realizadas medidas de cavidades em nosso estudo. O aparelho não possibilita obter medidas de área e nem de volume, e também não possui Doppler pulsado ou contínuo, limitando, assim, a realização de medidas objetivas, como fração de ejeção do VE pelo método de Simpson ou quantificação de insuficiências ou estenoses valvares.
Assim, este estudo demonstrou que o uso da ED em um serviço de emergências clínicas permitiu confirmar ou excluir hipóteses diagnósticas rapidamente, nos casos em que houve dúvida diagnóstica após anamnese, exame físico e eletrocardiograma.
Este foi um estudo descritivo, não havendo comparação do uso da ED com um exame convencional. Porém, essa comparação já foi realizada em estudos anteriores, validando o uso dessa nova ferramenta diagnóstica16,17,21-23.
Os exames deste estudo foram feitos por um único médico cardiologista com experiência em ecocardiografia. Entretanto, diversos estudos prévios demonstraram que a ED realizada por médicos não ecocardiografistas, como complemento ao exame físico, tem boa acurácia15-17,21-27. Além disso, já foi demonstrado que pode ser realizado um treinamento de curta duração para realização de ED por médicos não ecocardiografistas24,28.
A ecocardiografia ultraportátil direcionada em serviço de emergência permitiu confirmar ou excluir rapidamente um diagnóstico clínico e, com isso, iniciar mais precocemente o tratamento, além de evitar o uso de terapêutica inapropriada por diagnóstico incorreto. Por se tratar de um estudo descritivo, é necessária a realização de estudos comparativos e randomizados para confirmação dos resultados.