versão impressa ISSN 1677-5449versão On-line ISSN 1677-7301
J. vasc. bras. vol.14 no.3 Porto Alegre jul./set. 2015
http://dx.doi.org/10.1590/1677-5449.0025
A utilização de medidas de avaliação em saúde, publicadas em outro idioma, é cada vez mais relevante no contexto internacional1. No entanto, para utilização adequada e confiável dessas medidas, como as de qualidade de vida (QV), é necessário realizar a equivalência transcultural, que consiste nos processos de tradução, adaptação cultural e validação do instrumento proposto1,2.
A tradução e a adaptação cultural não são um procedimento simples3 e têm o objetivo de manter o sentido da versão original (significado, ideias, forma e valor) para o novo contexto4,5. Já a validação avalia e mede critérios específicos (clinimétricos), como consistência interna (capacidade de medição de um único conceito por vários itens), reprodutibilidade (capacidade de concordância de resultados, quando aplicado a indivíduo estável em diferentes momentos, por um mesmo observador – reprodutibilidade intraobservador – ou observadores diferentes – reprodutibilidade interobservador) e validade, entre outros3,6,7, que se correlacionam com a pontuação de outro instrumento considerado padrão ouro ou com outros instrumentos conceituais, na ausência do padrão ouro3.
Diante dos avanços tecnológicos relacionados à doença venosa crônica (DVC), a tendência atual é incorporar a investigação da QV à avaliação clínica, para captar seu real impacto e o alcance desses avanços na vida do indivíduo6. No entanto, poucos estudos avaliaram o impacto da DVC na QV8,9, percebendo-se uma crescente necessidade de promoção desse aspecto na vida dos indivíduos acometidos8 e de análises aprofundadas sobre a magnitude desse impacto, visto que uma visão abrangente dessa influência permite uma abordagem terapêutica direcionada e mais eficiente10.
Os instrumentos de avaliação da QV para DVC, em geral, estão disponíveis na língua inglesa, a exemplo do CIVIQ (Chronic Venous Insufficiency Questionnaire), do VEINES-QOL/Sym (Venous Insufficiency Epidemiological and Economic Study), do AVVQ (Aberdeen Varicose Veins Questionnaire) e do CCVUQ (Charing Cross Venous Ulcer Questionnaire)9,11. Os dois primeiros, já validados para o Brasil, avaliam a DVC como um todo, enquanto o AVVQ observa a percepção do indivíduo acerca de aspectos específicos da doença e o CCVUQ, em relação à úlcera venosa, maior complicação da DVC12.
O Aberdeen Varicose Veins Questionnaire (AVVQ) é uma medida específica de avaliação de QV e de gravidade da DVC, sensível a aspectos inerentes à doença, focalizando seus sinais e sintomas, e avaliando dimensões importantes comprometidas da QV9. Teve suas propriedades clinimétricas constatadas como boas, em seu país de origem13-15, sendo utilizado em vários estudos16.
Não foram encontrados na literatura estudos prévios ou em andamento sobre a validação do AVVQ para a população brasileira9. A inexistência de um instrumento confiável, reprodutível e válido no Brasil, para avaliação da QV na DVC, que permita uma visão dos seus pormenores6, motivou a validação do AVVQ, a fim de permitir avaliar os aspectos afetados pela doença e possibilitar maior detecção das alterações provocadas por determinadas intervenções, a partir da percepção do indivíduo.
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa – CEP – da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), sob o protocolo n.o 1108/10, sendo observacional analítica, para validação de questionário.
De amostragem não probabilística, os sujeitos foram selecionados em locais públicos de atendimento à DVC e um local privado de assistência a curativos, sendo abordados diretamente pelo pesquisador.
O tamanho da amostra baseou-se nos critérios definidos e recomendados internacionalmente para os processos de tradução, adaptação cultural e validação de questionários em saúde5,17.
O recrutamento dos indivíduos ocorreu em duas etapas distintas: etapa 1- Tradução e Adaptação Cultural, sendo recrutados dez indivíduos, e etapa 2- Validação, sendo recrutados 107 indivíduos. Os dados referentes à finalização da etapa 1 já estão publicados no Jornal Vascular Brasileiro, no artigo “Tradução e Adaptação Cultural do Questionário Aberdeen para veias varicosas”18, sendo descritos a seguir somente os dados da Validação do AVVQ – etapa 2.
Nessa etapa de Validação, foram incluídos indivíduos de ambos os sexos, com DVC comprovada por cirurgião vascular com base na classificação CEAP (clínica 1-6), através do exame clínico dos membros inferiores, sendo considerado o membro de maior classe e os classificados em 4a (pigmentação ou eczema) e 4b (lipodermatoesclerose ou atrofia branca) agrupados na Classe 4. Este sistema classifica a apresentação clínica da DVC e mede mudança na sua severidade19,20, estabelecendo: C1- telangiectasias e/ou veias reticulares; C2- veias varicosas; C3- edema; C4- hiperpigmentação e lipodermatoesclerose; C5- úlcera cicatrizada; C6- úlcera ativa10,20,21.
Foram excluídos indivíduos com faixa etária < 18 e ≥ 60 anos; com alterações cognitivas (Miniexame do estado mental); condições associadas (arterial e linfática); diabéticos; neuropatas; com erisipela, linfangite, trombose venosa profunda aguda e úlcera de origem não venosa; distúrbios psiquiátricos e/ou quadro demencial (diagnóstico médico); sem fala ou compreensão da língua portuguesa, além de fatores que alterassem a estabilidade clínica durante o período de investigação: uso de medicação antibiótica e/ou flebotrópica; escleroterapia de membros inferiores; debridamento cirúrgico e/ou outro procedimento cirúrgico; mudanças no método de curativo, como início do uso de bota de Unna, curativo multicamadas ou curativo com medicação tópica.
Atendendo aos critérios de inclusão e exclusão, foram convidados a participar durante o primeiro contato no serviço de atendimento e, ao aceitar, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, sendo então entrevistados.
Considerou-se variável primária a validação do questionário AVVQ, a partir da verificação das propriedades clinimétricas, e variáveis secundárias, a classificação clínica CEAP e os domínios do AVVQ e do SF-36. Os dados complementares investigados foram idade, gênero, escolaridade e classe econômica. Os métodos estatísticos utilizados foram alfa de Cronbach (consistência interna), coeficiente de correlação intraclasse – CCI (reprodutibilidade), coeficiente de correlação de Spearman e teste de Mann-Whitney (validade), com nível de significância de p< 0,05.
A validação foi realizada a partir de três tempos (T1, T2 e T3), em que 107 indivíduos com DVC foram chamados a responder os instrumentos a seguir descritos:
1.º Tempo (T1) – formulário de coleta de dados, questionário minimental, Critério de Classificação Econômica Brasil, questionário SF-36 e versão em português do AVVQ (AVVQ-Brasil), aplicados pelo observador 1.
2.º Tempo (T2) – nova aplicação da versão em português do AVVQ (AVVQ-Brasil), 30 minutos após a primeira, pelo observador 2.
3.º Tempo (T3) – mais uma aplicação da versão em português do AVVQ (AVVQ-Brasil), 7 a 15 dias após a primeira, pelo observador 1; após essa aplicação, recebiam orientações sobre a DVC, a forma de prevenção de seu agravamento e a prática de exercícios para casa, através de palestra e recebimento de folheto educativo.
As respostas foram coletadas sob a forma de entrevista ou autoaplicação. No caso de analfabetismo, o questionário AVVQ-Brasil foi lido em voz alta pelo pesquisador, seguindo rigorosamente instruções dadas pelo autor do original, a partir de um roteiro de entrevista pré-estabelecido, que se restringiu à leitura exata da instrução, das perguntas e das opções de respostas, e à repetição das mesmas quando necessário, sem interferir no processo de resposta.
A amostra constou de 165 pacientes com DVC. Dentre eles, dez participaram somente da Tradução e Adaptação cultural do AVVQ, 107 participaram somente da Validação do AVVQ e 48 foram excluídos, por não terem completado o AVVQ-Brasil no 2º e/ou 3º tempo de aplicação, ou por não terem atingido o ponto de corte do Miniexame do Estado Mental (MEEM).
A idade variou entre 18 e 82 anos, com média de 50,1 ± 14,7. A maioria era do gênero feminino (87,9%), assumindo ao longo da vida uma postura em ortostatismo prolongado (57,0%), que não realizava exercício físico (96,3%), com o Ensino Fundamental incompleto (25,2%), classe econômica C2 (36,4%) e gravidade C6 (23,3%).
Observou-se uma excelente reprodutibilidade interobservador e uma excelente a regular reprodutibilidade intraobservador, para os domínios do AVVQ (Tabela 1).
Tabela 1 Valores do coeficiente de correlação intraclasse (CCI), intervalo de confiança de 95% (IC 95%) e de p para os domínios do AVVQ entre a primeira (T1) e a segunda (T2) aplicações, 30 minutos após a primeira, e entre a primeira (T1) e a terceira (T3) aplicações, 7 a 15 dias após a primeira (n=107).
DOMÍNIO | T1 – T2 | T1 – T3 | Valor de p | ||
---|---|---|---|---|---|
CCI | IC 95% | CCI | IC 95% | ||
Pontuação AVVQ | 0,953 | [0,931-0,968] | 0,857 | [0,790-0,902] | 0,000* |
Dor e Disfunção | 0,923 | [0,887-0,947] | 0,893 | [0,843-0,927] | 0,000* |
Aparência estética | 0,905 | [0,861-0,936] | 0,857 | [0,791-0,903] | 0,000* |
Extensão da varicosidade | 0,927 | [0,893-0,950] | 0,675 | [0,523-0,778] | 0,000* |
Complicações | 0,946 | [0,921-0,963] | 0,893 | [0,844-0,927] | 0,000* |
*p<0,0001; CCI > 0,75 (excelente).
CCI = 0,40-0,75 (regular a boa). CCI < 0,40 (ruim).
A consistência interna variou entre excelente (α=0,767), moderada (α=0,544/0,294) e fraca (α=0,064) (Tabela 2).
Tabela 2 Valores do alfa de Cronbach para os domínios do AVVQ (n=107).
Domínio | Alfa de Cronbach |
---|---|
Pontuação total AVVQ (13 itens) | 0,544 |
Dor e Disfunção (4 itens) | 0,767 |
Aparência estética (2 itens) | 0,733 |
Extensão da varicosidade (3 itens) | 0,064 |
Complicações (4 itens) | 0,294 |
Valor significante: pelo menos 0,70.
Ao avaliar a QV na DVC, a pontuação total do AVVQ e o domínio Dor e Disfunção apresentaram correlação negativa com todos os domínios do SF-36. O domínio Aparência Estética se correlacionou negativamente com os domínios Dor, Vitalidade, Aspectos Sociais e Saúde Mental do SF-36. Já o domínio Extensão da Varicosidade só se correlacionou com o domínio Dor do SF-36 (Tabela 3).
Tabela 3 Correlações entre os domínios do SF-36 e do AVVQ.
DOMÍNIOS AVVQ (n=107) | |||||
---|---|---|---|---|---|
DOMÍNIOS SF-36 | Pontuação AVVQ | Dor e Disfunção | Aparência estética | Extensão da varicosidade | Complicações |
Capacidade funcional | -0,506** | -0,583** | -0,087 | 0,052 | -0,423** |
Aspecto físico | -0,521** | -0,485** | -0,153 | -0,089 | -0,415** |
Dor | -0,547** | -0,485** | -0,378** | -0,246* | -0,298** |
Estado geral de saúde | -0,316** | -0,395** | -0,13 | 0,086 | -0,267** |
Vitalidade | -0,282** | -0,447** | -0,305** | 0,047 | -0,148 |
Aspectos sociais | -0,476** | -0,511** | -0,345** | -0,089 | -0,336** |
Aspectos emocionais | -0,494** | -0,467** | -0,189 | -0,119 | -0,370** |
Saúde mental | -0,278** | -0,315** | -0,307** | -0,059 | -0,111 |
*significativo a 5%.
**significativo a 1%.
Coeficiente de correlação de Spearman: 0,75-1,00 (+ ou –) – muito boa a excelente; 0,50-0,75 (+ ou –) – moderada a boa; 0,25-0,50 (+ ou –) – razoável.
Ao avaliar a gravidade da DVC, demonstrou-se aumento gradativo da pontuação total do AVVQ ao modificar o CEAP, exceto no C4. Nos domínios do AVVQ, houve diferença estatística significante para a pontuação total e para o domínio Complicações (p<0,05) nos diferentes grupos de CEAPs, o que não ocorreu nos demais domínios (Tabela 4).
Tabela 4 Valores médios dos domínios e pontuação total do AVVQ por CEAP e valores da média e do desvio padrão para a pontuação total AVVQ e os domínios Dor e Disfunção, Aparência estética, Extensão da varicosidade e Complicações, segundo o CEAP (n=107).
Domínios | CEAP | CEAP 1, 2 e 3 (n=47) |
CEAP 4, 5 e 6 (n=60) |
Valor de p | |||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
C1 | C2 | C3 | C4 | C5 | C6 | Média | DP | Média | DP | ||
Pontuação AVVQ | 23,86 | 28,92 | 31,26 | 27,42 | 37,70 | 43,11 | 28,1 | 10,6 | 35,8 | 16,3 | 0,012 |
Dor e Disfunção | 19,71 | 40,33 | 57,74 | 39,14 | 52,76 | 58,01 | 40,0 | 29,6 | 49,5 | 34,0 | 0,159 |
Aparência estética | 75,95 | 71,72 | 82,12 | 73,03 | 72,85 | 50,33 | 76,8 | 25,1 | 63,5 | 38,0 | 0,167 |
Extensão da varicosidade | 24,84 | 23,84 | 23,26 | 19,40 | 31,08 | 24,73 | 23,9 | 14,4 | 23,8 | 15,5 | 0,725 |
Complicações | 11,88 | 18,74 | 15,77 | 19,30 | 29,39 | 53,19 | 15,5 | 12,5 | 35,3 | 25,4 | 0,000* |
*p<0,0001; p<0,05.
Não se pode presumir que as propriedades de teste da validação da versão original de um instrumento serão aplicáveis à versão adaptada3. Dessa forma, não sendo reprodutível e válido para a população-alvo3, não terá reconhecimento científico, demonstrando imprecisão do instrumento e a não medição do que se pretende medir22. No estudo, testaram-se a reprodutibilidade e a validade do AVVQ para torná-lo passível de aplicação à realidade da população brasileira.
De acordo com Meneses-Gaya et al.23, para o estudo da reprodutibilidade, é de fundamental importância um intervalo de tempo apropriado entre T1 e T2, pois, sendo este curto, aumentará a influência da memória; e se for longo, permitirá maiores mudanças individuais em relação ao que está sendo mensurado. Foi utilizado tempo de 30 minutos para avaliar a reprodutibilidade interobservador e de 7 a 15 dias, para a reprodutibilidade intraobservador, tempo recomendado por Terwee et al.7, buscando estabilidade clínica dos participantes durante os períodos de aplicação do AVVQ.
Maher et al.3 relatam que a reprodutibilidade verifica o instrumento em ocasiões diferentes e também com diferentes avaliadores, sendo fundamental que estes sejam capazes de alcançar respostas semelhantes em sua aplicação24. Seguindo essa orientação, utilizaram-se dois observadores distintos (observadores 1 e 2) que, após treinados, aplicaram o AVVQ em momentos diferentes.
Em estudo com pessoas soropositivas, observou-se nenhuma diferença significante entre as pontuações de instrumentos de QV administrados mediante entrevista e autoaplicação25. De acordo com Garrat et al.14, o AVVQ é autoaplicável, mas, devido aos importantes índices de analfabetismo da população brasileira, foi aplicado sob a forma de entrevista, técnica discutida com o autor do original, sendo autoaplicado somente nos indivíduos alfabetizados.
Para testar a validade, como não existia um questionário de QV específico para DVC já validado e utilizado no Brasil, comparou-se o AVVQ com o SF-36, como feito por Soárez et al.26, ao validar um questionário de QV no Brasil, e por Garrat et al.14, no processo de construção e validação do AVVQ original.
Também no teste de validade, comparou-se o AVVQ, como medida de gravidade da DVC, com a classificação CEAP (clínica), que, segundo Vasquez & Munschauer27, consiste numa descrição de informações acerca de seu diagnóstico, indicando uma reflexão das percepções dos pacientes sobre a gravidade da DVC19.
De acordo com Hora et al.28, para aplicar o alfa de Cronbach, o questionário deve estar agrupado em dimensões, validado pelo menos em outro idioma e aplicado a uma amostra significativa e heterogênea. Na verificação da consistência interna, foi utilizado o Alfa de Cronbach, pois o AVVQ é dividido em quatro domínios, validado nos idiomas inglês e holandês, sendo aplicado numa amostra significativa e heterogênea.
Os resultados indicaram excelente reprodutibilidade inter e intraobservador, com alta concordância de respostas entre suas aplicações, sugerindo clareza de seus itens e reduzindo possíveis vieses por parte dos observadores, como demonstrado por Leon et al.24. A redução da concordância intraobservador no domínio Extensão da Varicosidade para regular a boa, provavelmente ocorreu devido a erros aleatórios, como o efeito reativo das aplicações do instrumento sensibilizando o paciente e tornando este mais atento à sua condição, ou o efeito do tempo entre as aplicações, ocorrendo eventos de modificação na condição clínica e alterando as pontuações do questionário, fatos confirmados por Freitas29 na validação de índice para avaliação da osteoartrite.
As correlações entre o AVVQ e o SF-36 indicaram validade para a pontuação total do AVVQ e o domínio Dor e Disfunção, com correlação negativa significativa entre os valores destes e todos os domínios do SF-36, consideradas de razoável a boa magnitude, estando as maiores correlações com os domínios Capacidade funcional (r=-0506, p<0,01), Aspectos físicos (r=-0,521; p<0,01) e Dor (r= -0,547; p<0,01) do SF-36, conforme resultado encontrado por Klem et al.30 e confirmado por Garrat et al.14, no estudo da versão original. Estas correlações sugerem captura dos efeitos adversos da DVC pelo AVVQ, em todos os domínios do SF-36.
O domínio Aparência estética só teve correlação significativa com os domínios Dor (r=-0,378; p<0,01), principalmente; Vitalidade (r=-0,305; p<0,01); Aspectos sociais (r=-0,345; p<0,01), e Saúde mental (r=-0,307; p<0,01) do SF-36, diferentemente do encontrado por Garrat et al.15, com correlação maior com o domínio Saúde mental do SF-36. A ausência ou redução de correlação desse domínio com os demais do SF-36 pode ter ocorrido, segundo Rosanova et al.31, porque o SF-36 não é um questionário específico para condições que afetam a estética corporal, relevante na avaliação da QV na DVC.
Para o domínio Extensão da varicosidade, só houve correlação significativa com o domínio Dor (r=-0,246; p<0,05) do SF-36, diferentemente de Garrat et al.15, que demonstraram correlação maior com o domínio Aspecto físico do SF-36. Isto pode ter ocorrido devido à influência de fatores, como idade e escolaridade, nos resultados, em virtude da dificuldade de compreensão das questões desse domínio. No entanto, o domínio Complicações correlacionou-se com quase todos os domínios do SF-36, sendo a maior correlação com o domínio Capacidade funcional (r=-0,423; p<0,01), igualmente ao encontrado por Garrat et al.15.
As correlações entre o AVVQ e as classes CEAP (clínica) indicaram aumento individual da pontuação total do AVVQ à medida que o CEAP aumentou, demonstrando medição da gravidade da DVC, declínio na QV com o agravamento da doença e capacidade de discriminar os indivíduos, exceto para o C4. Isto possivelmente ocorreu porque os indivíduos não foram classificados nas subcategorias C4(a e b), ao reproduzir o procedimento de validação do original, e também pela natureza estática do CEAP para as classes C4 e C5, interferindo na avaliação e dificultando o acompanhamento ao longo do tempo, conforme afirma Vasquez & Munschauer27. Dezotti et al.32 consideram C4 indivíduos com lesão de pele intermediária, estando essa classe numa fase de transição entre a ausência e a presença da alteração de pele, o que pode ter dificultado a discriminação da QV desses indivíduos.
No domínio Complicações, foram obtidos valores mais altos da pontuação, nas classes C5 e C6, indicando menor QV nos indivíduos mais comprometidos clinicamente, semelhantemente aos dados encontrados por Moura et al.10 ao compararem o SF-36 com a classificação CEAP.
A pontuação total do AVVQ apresentou consistência interna com resultado inferior (α=0,544) aos valores obtidos nos estudos de validação para o inglês (α= 0,76) e o holandês (α=0,72)14,30, ainda assim indicando que o AVVQ tem uma consistência interna moderada, sendo confiável e homogêneo em seus itens. Cabe ressaltar que, nesses estudos, as amostras eram muito superiores, aumentando a probabilidade de um valor de Alfa de Cronbach mais alto, conforme visto também por Gasparin et al.33 em estudo de validação de outro questionário internacional.
Para os domínios do AVVQ, os resultados indicam uma consistência interna excelente para os domínios Dor e Disfunção, e Aparência estética, sendo moderada para o domínio Complicações e fraca para o domínio Extensão da varicosidade, apresentando valores do alfa de Cronbach superiores a 0,2; não foi necessária, dessa forma, a retirada de nenhum domínio ou questão, conforme relata Garrat et al.14, já que os valores do alfa de Cronbach recomendados por diversos autores na literatura devem servir como base e não como critério definitivo de classificação34.
Alguns autores referem que o impacto negativo da DVC na QV ocorre particularmente em relação aos domínios Dor, Função física e Mobilidade10. Em concordância, percebeu-se que todos os pacientes apresentaram alteração na QV geral e específica, havendo maior correlação entre o AVVQ e o SF-36 nos domínios Dor, Aspecto físico e Capacidade funcional, afirmando o encontrado por Garrat et al.14, na construção do AVVQ, e por Klem et al.30, em estudo posterior de avaliação das propriedades clinimétricas de sua versão holandesa. Isto traz fortes evidências de sua validade como uma medida de QV.
A ideia do estudo seguiu a orientação proposta pelo sexteto mágico de pesquisa quanto à forma correta de planejamento, execução e divulgação da pesquisa35. Indicou alguns caminhos para novas investigações na apresentação de uma escala válida e confiável para uso em pesquisas na área vascular, podendo o AVVQ-Brasil (AVVQ-Br) contribuir para utilização dos dados expressos como referência em futuras pesquisas sobre revisão das propriedades clinimétricas do AVVQ e elucidação correlacional entre QV e gravidade C4 da DVC, devido à sua relevância para pesquisadores da área e para a sociedade.
O AVVQ-Br trará apoio diagnóstico à avaliação da DVC, ao fornecer dados mensuráveis sobre o indivíduo, identificando problemas, facilitando a intervenção terapêutica e possibilitando novas estratégias de investigação da doença. Poderá ser referência de registro da mudança na QV do indivíduo com DVC, ao documentar os aspectos que sofreram essa modificação, sendo utilizado no futuro como parte da avaliação da DVC, elevando a QV ao patamar do princípio essencial para os sistemas de saúde.
O questionário AVVQ se encontra validado no Brasil como uma medida de avaliação da QV e de gravidade da DVC.