Compartilhar

Versões reduzidas para protocolo clínico de enfrentamento das disfonias

Versões reduzidas para protocolo clínico de enfrentamento das disfonias

Autores:

Gisele Oliveira,
Fabiana Zambon,
Thays Vaiano,
Flavia Costa,
Mara Behlau

ARTIGO ORIGINAL

CoDAS

versão On-line ISSN 2317-1782

CoDAS vol.28 no.6 São Paulo nov./dez. 2016 Epub 12-Dez-2016

http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20162015177

INTRODUÇÃO

As formas pelas quais pacientes enfrentam seu problema de saúde produzem consequências que influenciam a evolução do quadro e o resultado de seu tratamento(1-3). Evidências mostram que há relação entre estratégias de enfrentamento e resultados de tratamento, sendo que as estratégias voltadas para o controle da emoção geralmente estão associadas a um efeito pior de tratamento(1,2). É por meio de estratégias de enfrentamento que o indivíduo produz ajustes para promover o equilíbrio no seu bem-estar. O reconhecimento dos problemas enfrentados pelo paciente e a seleção das melhores estratégias para lidar com a doença e suas consequências, podem contribuir para o desenvolvimento de habilidades autorreguladoras(1,2).

Indivíduos com distúrbios vocais apresentam dificuldades de se comunicar e como consequência podem apresentar uma redução em seu bem-estar e qualidade de vida(3,4). Ajustes de adaptação são necessários para que se possa lidar com um distúrbio vocal e controlar o estresse por ele produzido.

Epstein et al.(3) produziram um protocolo que avalia as estratégias de enfrentamento nos distúrbios vocais (Voice Disability Coping Questionnaire-VDCQ), o qual é o único instrumento de avaliação do enfrentamento nas disfonias. Esse instrumento tem 27 itens e, embora tenha demonstrado ser útil na compreensão de como um indivíduo lida com uma disfonia, é longo para aplicação clínica. Por ser um protocolo de autoavaliação complementar no processo diagnóstico do paciente de voz, ele deve ser um instrumento rápido e simples de ser administrado. Portanto, é importante que protocolos em versões reduzidas sejam estudados para uso na clínica vocal. Por esse motivo, as duas versões reduzidas do Protocolo de Estratégias de Enfrentamento na Disfonia PEED (PEED-10 e PEED-15) são apresentadas e comparadas à versão original (PEED-27) neste estudo. O PEED-15 foi criado e apresentado em estudo anterior(5). Esse protocolo contém 15 questões e 4 subescalas: Busca de suporte, Desabafo, Aceitação defensiva e Minimização. O PEED-10 vai ser apresentado nesta comunicação breve.

Pesquisas no Brasil foram recentemente realizadas com sujeitos disfônicos em geral(5,6) e também com professoras com e sem problema de voz(7), utilizando a versão brasileira deste protocolo chamada Protocolo de Enfrentamento nas Disfonias - PEED. O objetivo do presente estudo é explorar a possibilidade de se utilizarem as duas versões reduzidas do instrumento: PEED-10 e PEED-15.

MÉTODO

Esta pesquisa é um estudo retrospectivo que utilizou um banco de dados de questionários de 100 pacientes com distúrbio vocal, 37 homens e 63 mulheres, com idade média de 43,7 anos.

O Protocolo de Estratégias de Enfrentamento na Disfonia – PEED foi traduzido e adaptado culturalmente para o português brasileiro a partir do VDCQ-27 (Voice Disability Coping Questionnaire(2)) de acordo com as regras internacionais do Scientific Advisory Committee of Medical Outcome Trust(6).

Os protocolos reduzidos (PEED 10 e 15 – Anexos A e B) foram derivados de resultados do banco de dados do estudo de Oliveira et al.(6). Somente os questionários PEED-27 de indivíduos com queixa vocal (N=87) foram analisados(5). Os 27 itens foram submetidos a dois conjuntos de Análises de Componentes Principais com rotação oblíqua. A análise fatorial teve como objetivo investigar a estrutura de componentes do protocolo nessa amostra. Os dados foram inicialmente analisados por meio do Teste de Esfericidade de Bartlett. A Medida de Adequação de Amostra de Kaiser-Meyer-Olkin foi realizada para avaliar quais os itens individuais deveriam permanecer na análise. Com o objetivo de maximizar o teste de Kaiser-Meyer-Olkin, a medida de adequação de amostra dos itens individuais foi analisada na diagonal da matriz de correlação de anti-imagem. Itens com medida de adequação de amostra menor que 0,600 foram removidos da análise e uma nova matriz foi gerada. Esse processo foi repetido até que todos os itens apresentassem uma medida de adequação de amostra maior que 0,600, portanto os itens restantes foram submetidos à Análise de Componentes Principais. O scree plot, que é um procedimento gráfico utilizado para determinar o número dos componentes principais para a análise, foi utilizado para definir o número de fatores extraídos. Além disso, se assegurou que a porcentagem de variância da amostra fosse maior que 5% e os valores-próprios de cada fator fossem maiores que 1,00.

Para a produção da primeira versão reduzida do protocolo, foram mantidos na matriz final apenas os itens com carga acima de 0,600. Para a segunda versão do protocolo, foram mantidos os itens com carga fatorial acima de 0,500. Em ambas as análises, caso a solução fatorial produzisse fatores que pareciam conter muitos itens de um mesmo tipo de enfrentamento, a Análise de Componentes Principais era realizada novamente para tais itens para determinar um menor número de fatores.

Após esse processo, os protocolos PEED-10 (Anexo A) e PEED 15 foram produzidos. O PEED-10 apresenta 10 itens e 4 subescalas: busca de informação, ressignificação, autocontrole e evitação/passividade. O PEED-15 (Anexo B) contém 15 itens e também 4 subescalas: Busca de suporte, Desabafo, Aceitação defensiva e Minimização.

Para o presente estudo, os resultados dos itens do PEED-27, do PEED-15 e do PEED-10 foram comparados para se verificar suas correlações, similaridades e diferenças. Para análise da correlação, utilizou-se o teste de Correlação de Spearman. Para análise das similaridades e diferenças, foram utilizados o teste de Friedman e Teste dos Postos Sinalizados de Wilcoxon, ajustado pela Correção de Bonferroni, para verificação de qual instrumento se diferencia dos demais, quando comparados par a par.

RESULTADOS

O teste de correlação de Spearman (Tabela 1) mostrou que os três protocolos apresentam um nível elevado de correlação (PEED 27 x 15, r=+0,910, p< 0,001; PEED 27 x 10, r=+0,873, p<0,001; PEED 15 x 10, r=+0,924, p< 0,001).

Tabela 1 Análise da correlação e par a par entre os três instrumentos: PEED-27, PEED-15 e PEED-10 

Par de variáveis Correlação de Spearman Wilcoxon Test
Coeficiente (r) Significância (p) Significância (p)
PEED 27 x PEED 15 +0,910 < 0,001 < 0,001
PEED 27 x PEED 10 +0,873 < 0,001 0,310
PEED 15 x PEED 10 +0,924 < 0,001 0,014

(alfa de Bonferroni = 0,017)

O teste de Friedman mostrou que os três protocolos se diferenciaram (p=0,008), portanto eles foram comparados par a par para confirmação das diferenças encontradas. O Teste dos Postos de Sinalizados de Wilcoxon, ajustado pela Correção de Bonferroni (Tabela 1), mostrou que PEED-10 assemelha-se mais ao PEED-27 (p=0,310) do que o PEED-15 (p<0,001).

DISCUSSÃO

Ambos os protocolos representam versões reduzidas, simples e rápidas de serem administradas, que oferecem resultados comparáveis à versão original do PEED-27. O PEED-15 constitui uma versão mais abrangente, pois inclui as dez questões do PEED-10 além dos seguintes itens: “É mais fácil lidar com meu problema de voz quando os outros são amáveis”; “Falar com amigos e familiares sobre meu problema de voz me ajuda”; “Eu acho mais fácil lidar com meu problema de voz procurando compreendê-lo melhor”; “Eu guardo para mim as frustrações causadas pela minha voz e poucos amigos sabem o que sinto”; e “Eu peço ajuda aos outros por causa do meu problema de voz”.

O PEED-10 demonstrou resultados mais semelhantes ao PEED-27, contudo os resultados da comparação do PEED-15 com o PEED-27 não podem ser considerados inadequados, eles apenas estão aquém dos resultados da comparação do PEED-10 e PEED-27. Na prática clínica, a vantagem de se utilizar o PEED-15 seria para se obter um pouco mais de informação sobre os tipos de estratégias utilizadas pelo indivíduo, uma vez que o protocolo contém 5 questões adicionais se comparado ao PED-10.

Estudos comparando as duas versões em relação ao protocolo original estão sendo conduzidos para identificar alguma especificidade que possa contribuir com a compreensão do problema e com a verificação de intervenção específica para ajudar o paciente a obter um bom rendimento na terapia vocal.

CONCLUSÕES

O PEED-10 e o PEED-15 são as versões reduzidas e adaptadas para o português brasileiro e mostraram avaliar as estratégias de enfrentamento utilizadas por indivíduos disfônicos para enfrentar seu problema de voz. O PEED-10 produziu resultados mais semelhantes ao PEED-27. O clínico deve definir qual versão prefere usar, de acordo com o tempo disponível.

REFERÊNCIAS

1 Ridder D, Schreurs K. Developing interventions for chronically ill patients: is coping a helpful concept? Clin Psychol Rev. 2001;21(2):205-40. PMid:11293366. .
2 Cruess S, Antoni MH, Hayes A, Penedo F, Ironson G, Fletcher MA, et al. Changes in mood and depressive symptoms and related change processes during cognitive–behavioral stress management in HIV-infected men. Cognit Ther Res. 2002;26(3):373-92. .
3 Epstein R, Hirani SP, Stygall J, Newman SP. How do individuals cope with voice disorders? Introducing the voice disability coping questionnaire. J Voice. 2009;23(2):209-17. PMid:18538984. .
4 Schwartz SR, Cohen SM, Dailey SH, Rosenfeld RM, Deutsch ES, Gillespie MB, et al. Clinical practice guideline: Hoarseness (Dysphonia). Otolaryngol Head Neck Surg. 2009;141(3, Supl 2):S1-31. PMid:19729111. .
5 Oliveira G, Hirani S, Epstein R, Yazigi L, Behlau M. Validation of the Brazilian Version of the Voice Disability Coping Questionnaire. J Voice. 2016;30(2):247.e13-21. PMid:26474711. .
6 Oliveira G, Hirani S, Epstein R, Yazigi L, Behlau M. Coping strategies in voice disorders of a brazilian population. J Voice. 2012;26(2):205-13. PMid:21550778. .
7 Zambon F, Moreti F, Behlau M. Coping strategies in teachers with vocal complaint. J Voice. 2014;28(3):341-8. PMid:24495425. .